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domingo, 5 de setembro de 2010

Religiosidade ultraortodoxa e tecnologia moderna

Notícia da Gazeta do Povo de Curitiba (PR):


Sem-tecnologia dão um jeitinho para sobreviver


Grupos religiosos que recusam modernidades contratam gente de fora para usar internet e inovam em adaptações

Helena Carnieri

Um fazendeiro da Pensilvânia é condenado a passar 90 dias na cadeia por se recusar a instalar um sistema de esgoto na “casinha” da escola que dirige. Em Israel, um grupo de rabinos proíbe seus se­­guidores de surfar na internet, mas desenvolve um buscador que respeita rígidas regras: não mostra qualquer conteúdo sensual e trava aos sábados. Grupos como os amish norte-americanos e os judeus ultraortodoxos são exemplos excêntricos de pessoas que re­­jeitam a tecnologia, mas dão um jeito de se beneficiar dela.

A recusa em adotar modernidades pelas comunidades amish, formadas por descendentes de suíços anabatistas do século 16, foi retratada no filme A Teste­­mu­­nha, com Harrison Ford (Peter Weir, 1985).

A professora de Ciências Hu­­manas Ambientais da Univer­­si­­dade do Missouri Jana Hawley precisou se adaptar a essa realidade. Para a pesquisa de seu doutorado, ela passou um ano entre os amish da cidade de Jamesport, no estado do Missouri. “Fiz pão em um forno a lenha, lavei roupas em uma máquina movida a diesel, doces em um fogão a querosene e sidra em uma prensa manual” relata em artigo. Mas ela também se admirou com inovações do grupo, como lamparinas instaladas em lustres.

Em conversa com a Gazeta do Povo, Hawley contou que outro trabalho para o qual foi muito requisitada foi o de motorista: os amish da comunidade com a qual fez amizade não podem dirigir nem possuir carros, mas pegam carona de bom grado. “Fiz 55 mil milhas (88,4 mil quilômetros) na­­quele ano”, recorda.

A aceitação desta ou daquela inovação foi justamente o motivo das divisões entre o grupo original que migrou da Suíça para os EUA. Hoje os 300 mil membros de co­­munidades amish espalhados pe­­lo campo norte-americano têm di­­ferentes níveis de tolerância a carros, motores para trator e roupas moderninhas. Algumas co­­mu­­nidades se espalharam até o Canadá e o México.

“Em alguns quesitos, eles vi­­vem como no século 18, mas em outros estão como em 1960”, disse Jana à reportagem. A lógica por trás da vida amish é estar separado do mundo, conforme interpretação do versículo bíblico que diz: “Não vos conformeis com este mundo” (Romanos, 12:2).

Motivação semelhante, mas que remonta ao Velho Testa­­men­­to, têm grupos ultraortodoxos do judaísmo, que recusam diversos tipos de tecnologia. Restrições que foram contornadas via inovação. A internet “kosher” (termo que designa a alimentação preparada de acordo com os preceitos judaicos) é um exemplo, e serve pa­­ra informar sobre produtos e serviços em Israel sem o “risco” de cair em páginas com pornografia ou violência. Buscar palavras como “televisão”, “rádio” ou “má­­quina” no site www.koogle.co.il, porém, é perda de tempo.

Os ortodoxos também criaram formas de usar a eletricidade no sábado, dia sagrado, sem ferir a lei judaica, e, por incrível que pareça, têm feito avançar as pesquisas de teste genético. Casais em que o ho­­mem e a mulher são portadores de genes ligados a alguma doença são desencorajados a ter filho.

Características comuns entre as comunidades amish e ultraor­­todoxa são a recusa em servir ao Exército e o emprego de mão de obra externa ao grupo para “ma­­ni­­­pu­­lar” tecnologias indesejadas. Tam­­bém, o tino comercial. “Os amish andam em carroças bem simples, mas fazem modelos bem sofisticados para vender. É nelas que os turistas dão voltinhas no Central Park de Nova York”, conta Jana.

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