Páginas

sábado, 3 de setembro de 2011

Nazismo e religião

O Estadão de hoje publica uma ótima entrevista com o escritor e historiador britânico Richard Evans, autor do livro "O Terceiro Reich no Poder", que acaba de ter sua versão em português lançada no Brasil pela Editora Planeta. Abaixo, destaque para o trecho final da entrevista, em que ele fala sobre a relação entre Hitler e a religião:


Qual foi o peso dos protestantes no sucesso das políticas antissemitas dos nazistas?

A Igreja Protestante na Alemanha foi durante muito tempo a Igreja do Estado. Em meados dos anos 30, ela foi dominada pelos "cristãos germânicos", que declararam que Jesus não era judeu e rejeitaram o Velho Testamento por ser trabalho dos judeus. Mas os fundamentalistas bíblicos opuseram-se a isso fortemente e criaram uma dissidência. Nenhum lado realmente venceu a batalha, mas Hitler se desiludiu e desistiu da ideia de uma síntese entre nazismo e protestantismo. Mesmo a dissidência protestante, contudo, não era livre de sentimentos antissemitas. Católicos eram mais distantes do regime, mas havia elementos antissemitas entre eles também. O antissemitismo nazista era racial, e não religioso, mas foi capaz de florescer sobre uma longa tradição de antissemitismo religioso na Alemanha e obter aval para suas políticas.

Podemos ver o nazismo como uma religião?

Certamente o nazismo foi um movimento que usou símbolos religiosos e rituais em alguma escala, e Hitler não era avesso ao uso de linguagem e imagens religiosas em seus discursos. A propaganda nazista o apresentava como uma espécie de messias que veio para redimir o povo alemão. Mas o nazismo não tinha nada a dizer a respeito da vida após a morte, como as religiões verdadeiras fazem. Não representava a redenção final, mas propagava a ideia de uma luta sem fim. Hitler condenava as tentativas de nazistas como Himmler de estabelecer uma religião alternativa ao cristianismo, baseada em rituais pseudogermânicos. O nazismo, ele disse, não era um culto, mas uma doutrina fria, científica e baseada na realidade.

Como o processo de inversão moral levado adiante pelos nazistas foi possível na Alemanha, cuja população era tão sofisticada?

Muitos alemães aceitaram apenas parcialmente a ideologia nazista, e alguns aceitaram mais que outros. Foi mais forte entre os jovens doutrinados pelas escolas e pela Juventude Hitlerista. Os alemães mais velhos, cujos valores tinham sido formados antes de 1933, eram mais resistentes. O terror e a intimidação tiveram peso na repressão. Os alemães não se manifestavam contra a violência e a brutalidade do nazismo porque acabaram se acostumando com a violência política da República de Weimar. A promessa nazista de regeneração conseguiu superar as reservas de muita gente. Os triunfos diplomáticos de Hitler cimentaram sua popularidade. A vitória sobre a França em 1940 a elevou a seu ponto mais alto. O nacionalismo era forte na Alemanha e levou muita gente tanto a apoiar o nazismo como a ignorar seu extremo radicalismo.



A íntegra da entrevista pode ser lida no site do Estadão.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigado por visitar O Contorno da Sombra!
A sua opinião é bem-vinda. Comentários anônimos serão aprovados desde que não apelem para palavras chulas ou calúnias contra quem quer que seja.
Como você já deve ter percebido, nosso blog encerrou suas atividades em fevereiro de 2018, por isso não estranhe se o seu comentário demorar um pouquinho só para ser publicado, ok!
Esforçaremo-nos ao máximo para passar por aqui e aprovar os seus comentários com a brevidade possível.