Alguns dias atrás, a Igreja Católica do Paraguai pediu desculpas por ter - desastradamente - interferido no processo democrático do país ao pedir que o ex-presidente (também ex-bispo) Fernando Lugo deixasse o poder sem se contrapor ao impeachment-relâmpago que sofreu.
Parece que o novo tipo de golpe de Estado patrocinado pelo Congresso paraguaio significou mais que um revés na ingenuidade católica de fazer política por aqueles lados, e ameaça se imiscuir inclusive na liturgia romana.
Foi o que aconteceu esta semana, no último dia 6 de setembro, quando o atual presidente Federico Franco interrompeu a eucaristia celebrada pelo bispo de Misiones, Monsenhor Melanio Medina, durante missa realizada na paróquia de Villa Florida, no departamento de Misiones, a cerca de 250 km a sudeste da capital Asunción.
Durante a homilia, Monsenhor Medina criticou a medida governamental que autorizou a importação de sementes transgênicas de milho e algodão, dizendo que elas "são prejudiciais à vida e ao meio ambiente" e "podem causar a morte".
A investida do bispo contra a engenharia genética que recheia os cofres das multinacionais do setor não passou despercebida pelo presidente paraguaio, que participava da missa.
A exemplo de todo "bom" golpista latinoamericano que se preze, Federico Franco se levantou de sopetão, soltando um sonoro "Me permite, voy a explicar Monseñor", subiu ao altar e tomou de assalto o microfone da mão do bispo, ante a massiva surpresa de todos que acompanhavam o rito religioso.
Enquanto a hóstia esperava o momento de ser repartida, o mandatário paraguaio, microfone em punho, se dirigiu ao bispo dizendo: "se o senhor me apresentar um documento científico ou de um pesquisador que demonstrem que os transgênicos causam dano, reverei minha posição".
Federico Franco ainda passou alguns minutos defendendo os transgênicos - assim, gratuitamente, sem que ninguém lhe houvesse pedido ou dado procuração para tanto - e, para sorte do bispo, candidamente devolveu a este o microfone, o que não costuma acontecer quando eles tomam as cadeiras dos presidentes democraticamente eleitos da região.
Vendo que a missa desandava, ao Monsenhor Medina não restou outra alternativa senão por panos quentes no constrangimento causado, contemporizando na base do "vamos deixar este tema por aqui, mas há que revisar a utilização de sementes transgênicas".
Terminada a cerimônia, o bispo de Misiones esclareceu aos jornalistas presentes que não se havia incomodado com a inoportuna intervenção presidencial e disse ainda que "é normal aqui em Villa Florida que as missas sejam dialogadas e que as pessoas participem, isso é algo totalmente válido e a mim não me perturba", acrescentando que "costumamos inclusive incentivar as pessoas a falarem".
Monsenhor Medina não titubeou, entretanto, ao afirmar que é a primeira vez que um presidente o interrompe, reconhecendo que "eu estou acostumado a que falem, mas é a primeira vez que um presidente da República faz isso, já que também é a primeira vez que um deles assiste a uma missa que eu presido", deixando transparecer um suspiro de lamento pelo fato de que nem Fernando Lugo o havia brindado com essa honra quando ocupou o mais alto cargo do país.
Parece, contudo, que multinacionais do agronegócio têm muito mais poder no Paraguai do que a nossa vã filosofia, política ou teologia conseguem alcançar.
Manda quem pode, obedece quem tem juízo (mas não o juiz a seu favor)...
Manda quem pode, obedece quem tem juízo (mas não o juiz a seu favor)...
A fonte das informações acima é a ACIPrensa.
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