Ontem, 5 de dezembro de 2013, faleceu um dos homens mais extraordinários que o mundo conheceu, e que a nossa geração teve a felicidade de acompanhar boa parte da sua luta e história de vida: Nelson Mandela.
Nascido em 18 de julho de 1918, Mandela (também conhecido pelo seu nome tribal "Madiba") enfrentou o apartheid da minoria branca que comandava a África do Sul desde os tempos coloniais britânicos e holandeses, o que lhe valeu uma condenação à prisão perpétua a partir de 1962.
Entretanto, os conflitos internos, os seguidos massacres de negros e a reação internacional à discriminação, com massivos boicotes políticos, esportivos e econômicos mundiais, foram paulatinamente minando o regime racista sul-africano, até que a situação se tornou insustentável.
Depois de intensas negociações e 27 anos detrás das grades, Mandela foi liberado em 1990, o que lhe permitiu conduzir seu povo em relativa paz no caminho da união nacional, dividindo o prêmio Nobel da Paz de 1993 com Frederik de Klerk, até que foi eleito presidente em 1994, obtendo 62% dos votos nas primeiras eleições livres e diretas do país.
Faltava ainda unificar - tanto quanto possível à época - a África do Sul, o que Mandela conseguiu ao pregar o perdão, a reconciliação e a não retaliação contra a minoria branca por todo o mal que ela havia feito à maioria negra por décadas a fio.
Boa parte deste objetivo foi conseguido durante a Copa do Mundo de Rugby de 1995, disputada na África do Sul e vencida pelos locais.
O rugby era tido como um esporte exclusivamente de brancos e um símbolo do apartheid, e o apoio de Mandela à seleção nacional na sua campanha vitoriosa fez com que o país se irmanasse em torno da equipe dos springboks, apelido dos sul-africanos naquele esporte.
O episódio foi retratado no excelente filme "Invictus" (2009), dirigido por Clint Eastwood e estrelado por Matt Damon e Morgan Freeman, este no papel de Nelson Mandela.
Foi esta simplicidade de vida, aliada a uma rara genialidade política, que fizeram de Mandela uma das figuras mais admiradas e respeitadas da história contemporânea.
Obviamente, como você percebe pelo nosso relato aqui, desde sua vitória sobre o cárcere já havia a tendência de canonizá-lo em vida, mas Mandela teve a sabedoria e a ombridade de combater a hagiografia que se desenvolveu em torno do seu nome.
Depois da autobiografia "Longa Caminhada Até a Liberdade" (1994), Mandela foi - aos poucos - se incomodando com a auréola que crescia em torno de sua imagem, até que em 2011 lançou o livro "Conversas Que Tive Comigo", em que procura mostrar o seu lado humano e falível.
É deste livro a frase "Nunca se esqueça de que os santos são pecadores que continuam tentando", com a qual finalizou a carta à sua então esposa Winnie Mandela em 1975.
Dada a grandeza hercúlea de sua obra, entretanto, talvez seja tarde demais para separar o homem do mito.
Entre as suas muitas frases célebres, destacamos uma que dá uma dimensão resumida do seu credo de perdão e reconciliação:
"A paz não é simplesmente a ausência de conflito, a paz é criação de um entorno em que todos possamos prosperar, independentemente de raça, cor, credo, religião, sexo, classe, casta ou qualquer outra característica social que nos distinga. A religião, as características étnicas, o idioma e as práticas sociais e culturais são elementos que enriquecem a civilização humana, que se somam à riqueza de nossa diversidade. Por que deixar que se convertam em causa de divisão e violência? Estaríamos degradando nossa humanidade comum se permitirmos que isso ocorra".
Com a sua morte, fecha-se um ciclo na África do Sul, que, mesmo com as feridas tão recentes do apartheid, parece ter aprendido a conviver em paz com todas as suas minorias e diferenças.
O gigante ser humano Nelson Mandela morreu ontem, aos 95 anos de idade, personagem de uma vida à qual não faltou intensidade, tenacidade e dignidade, mas seus ideais durarão enquanto o sol nascer e se por sobre a imensa savana africana.
Obrigado, Mandela! Por você e com você, desejamos uma longa vida de paz à África do Sul!
Como nossa singela homenagem, reproduzimos abaixo um vídeo de sua visita ao Rio de Janeiro em 2 de agosto de 1991, e outro vídeo com o maravilhoso hino nacional da África do Sul, que une melodia e letras das várias etnias do país com base em Nkosi Sikelel' iAfrika ("Deus Abençoe a África"), hino composto pelo pastor metodista Enoch Sontonga, então professor de uma escola missionária em Johannesburg, em 1897:
Por fim, como sinal de esperança pela paz perene na África do Sul, celebramos Madiba com a tradicional canção "Shosholoza" (algo que pode ser traduzido como "siga em frente!"), executada pelos jovens negros e brancos do multirracial coral The Drakensberg Boys:
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