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sábado, 4 de janeiro de 2014

Primeira visita de um papa à Terra Santa faz 50 anos hoje

Selo jordaniano comemorava o 1º aniversário da visita de Paulo VI à Terra Santa

Exatos cinquenta anos atrás, no dia 4 de janeiro de 2014, chegava a Amã, capital da Jordânia, o primeiro papa a fazer uma visita à Terra Santa.

Paulo VI foi recebido pelo então rei jordaniano, Hussein I, que providenciou toda a logística para que o pontífice católico pudesse visitar Jerusalém em segurança.

O ano era 1964, e a Jordânia ainda tinha o controle do território da Cisjordânia, onde está compreendida Jerusalém, então dividida em suas partes Oriental (sob controle jordaniano) e Ocidental (sob controle israelense).

Ainda que Jerusalém tivesse sido declarada como capital quando da formação do Estado de Israel, a capital de fato era Tel-Aviv.

Só após a Guerra dos Seis dias de 1967 é que Israel finalmente encamparia Jerusalém como parte do seu território.

Foi nesse contexto que o papa Paulo VI decidiu peregrinar à Terra Santa, sabendo dos problemas que o esperavam.

Entretanto, ao contrário da impressão que os dados acima possam apontar, a tônica da visita papal não foi a política ou a diplomacia entre judeus e árabes.

A ênfase da viagem do papa foi encontrar e se reconciliar com os ortodoxos orientais, os dois grandes ramos do cristianismo que haviam se separado no cisma de 1.054 d. C.

A ida do papa ao Oriente Médio havia sido anunciada somente um mês antes, em 4 de dezembro de 1963, num período em que o Vaticano e Israel ainda não tinham selado laços diplomáticos.

O motivo oficial anunciado pelo Vaticano era "honrar os lugares santos onde Cristo nasceu, viveu, morreu e ressuscitou, e subiu ao céu".

Assim, em sua oração na Basílica do Santo Sepulcro, Paulo VI pediu perdão pelos erros do passado e exortou os ouvintes a "tomarem consciência de nossos pecados, dos pecados de nossos pais, dos pecados da história passada e dos pecados de nossa época".

Além do rei Hussein I da Jordânia, o papa ainda se encontrou com o presidente israelense, Zalman Shazar e os patriarcas armênio e ecumênico de Jerusalém.

O ponto alto da visita, entretanto, foi o encontro de Paulo VI com Atenágoras I, o patriarca ecumênico de Constantinopla, no último dia de sua visita à Terra Santa, em 6 de janeiro de 1964.

O abraço entre os dois líderes abriu um caminho de diálogo e reconciliação entre católicos e ortodoxos que, ainda que não tenha acabado com o cisma até hoje, produziu frutos perenes como a revogação dos decretos de excomunhão mútua de 1.054, que o papa Leão IX e o patriarca Miguel I haviam dirigido um ao outro.

Essa revogação se deu quase 2 anos depois, no dia 7 de dezembro de 1965, com a Declaração de União Católico-Ortodoxa, que anulou as excomunhões recíprocas de 5 séculos antes.

De certa forma, o encontro entre Paulo VI e Atenágoras I marcou todo o diálogo ecumênico que se seguiu. O papa criou naquele mesmo ano de 1964 o Secretariado para as Religiões Não-Cristãs e em 1967 fundaria o Pontifício Conselho Justiça e Paz.

Todo esse esforço de reconciliação era produto, também, do trauma da Segunda Guerra Mundial, em que a religião foi usada para as maiores atrocidades contra os judeus e outras minorias segregadas.

Quando ainda era o padre Giovanni Battista Montini, Paulo VI sentiu na carne os horrores do fascismo na Itália na década de 1920 e, como secretário de Pio XII durante a Segunda Guerra,  viu a que ponto a barbárie nazista podia chegar, como de fato chegou.

Desarmar os espíritos era, portanto, imperativo, e tanto o papa como o patriarca de Constantinopla souberam entender o momentum e começaram a desativar a bomba do fanatismo e da intolerância religiosa, que, lamentavelmente, ainda não foram desarticulados por completo.

Outro fator que pode ser cogitado como causa da reaproximação entre as duas igrejas foi a Guerra Fria que se seguiu ao conflito global.

A ameaça comunista era um fenômeno muito real para ser ignorado por ambas, e os ressentimentos do passado deviam ser abandonados em prol de uma estratégia possível de sobrevivência e convivência.

Demorou bastante, entretanto, para que as relações entre católicos e judeus se estabilizassem e chegassem a um denominador comum.

As relações diplomáticas entre Vaticano e Israel somente foram estabelecidas em 1994, e o papa Francisco visitará Israel, Jordânia e Palestina entre 24 e 26 de maio de 2014 para celebrar os vinte anos de amizade oficial entre os dois Estados e os cinquenta anos da visita histórica de Paulo VI.



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