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quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Família judia "adota" refugiado muçulmano em Berlim

Família Jellinek em Berlim:
o cachorro meio deslocado na foto
é só um detalhe...
Uma história real (e quase inacreditável nos dias de hoje) sobre amor, respeito, rejeição de valores desumanos atuais e herdados do passado obscuro, além de tolerância, publicada no Estadão de 11/09/16:

Família judia abriga refugiado sírio em Berlim

Filho e neto de nazistas, Chaim Jellinek e sua mulher, Kyra, apostam em colaborar com integração de imigrantes como solução para ‘crise’

Adriana Carranca

As cenas da massa que chegou à Europa por mar e atravessou suas fronteiras em trens lotados, a pé por trilhos e campos, dormindo ao relento, no último ano, compõem o retrato do maior êxodo desde a 2.ª Guerra. Essas duas pontas da História se encontraram agora no universo privado de um apartamento espaçoso no coração de Berlim. Ali, vivem o médico judeu alemão Chaim Jellinek, a mulher dele, Kyra, três dos quatro filhos do casal e, desde novembro, o jovem muçulmano Kinan, refugiado sírio que a família acolheu em casa.

Jellinek e Kyra, como Kinan hoje, tiveram suas vidas profundamente afetadas pela guerra. Mas vítimas de tragédias distintas. A família de Kyra sobreviveu ao Holocausto no gueto de Budapeste. Já o marido, Jellinek, nasceu e cresceu em uma família nazista, filho e neto de integrantes do Partido Nacional-socialista dos Trabalhadores Alemães, de Adolf Hitler. O pai lutou Operação Barbarossa, a invasão alemã da União Soviética na 2.ª Guerra.

Ele se converteu ao judaísmo e adotou novo nome quando a mulher engravidou do primeiro filho, após um longo período de revisão do próprio passado. “Perdi minha família muito tempo antes de conhecer Kyra. Chegamos a um ponto em que meu pai achava que eu deveria defender o nacional-socialismo. Ele nunca falou sobre a máquina industrial de matar pessoas montada por Hitler, não o ouvi defender o extermínio de judeus, esse não era um assunto em casa. Mas assim que passei a pensar por mim mesmo, comecei a indagar sobre o que sua geração e a do meu avô fizeram. E entendi que meu avô era, sim, um criminoso.”

Jellinek rompeu com a família e saiu de casa aos 20 anos. Quando conheceu Kyra, uma década depois, Jellinek tocava em uma banda punk e tinha se tornado um ativista antifascismo “sem nenhum pensamento religioso”. A gravidez do primeiro filho trouxe de volta fantasmas do passado. “Comecei a pensar no significado da família e no que gostaria de deixar para os filhos”, diz. Foi então que decidiu se converter à religião dela. “Porque o maior símbolo do judaísmo é a família”, diz.

Ele reencontrou o pai apenas uma vez, quando estava morrendo. “Mas já não havia mais conexão entre nós. Nada.” Ao olhar para trás, hoje, julga-o também como vítima. “Ele foi abusado psicologicamente e teve a juventude roubada pelo meu avô e pelos nazistas.”



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