SUPERSTIÇÃO
Erguer-se-á um rei poderoso de aparências.
(Daniel 8:23)
Jerônimo traduziu: “descarado”, mas em hebraico está escrito: “oz panim” – “poderoso de aparências”. O [verbo] “erguer-se-á” não se refere a uma pessoa, mas a todo o reino e seus sucessores; e dá a entender que este reino não será apenas por breve tempo. Assim também Cristo diz que a abominação está posta no lugar santo [Mt 24.15], quer dizer, ela está firme, estável, corroborada por muitos adeptos. E Paulo também não diz que o filho da perdição vai passar, mas vai se assentar no templo de Deus [2 Ts 2.3s].
É de fato estranho o poder deste rei monstruoso, que não é poderoso de chifres nem de patas, nem de espada nem de armas, mas “poderoso de aparências”, totalmente diferente de todos os demais. E não diz “poderoso de aparência”, mas de “muitas aparências”. Por essa razão não se enquadra com o turco nem com qualquer outro reino que é sustentado pelo poder e pelas armas. Os reinos desta espécie são representados por dentes, chifres, patas. E também não é o reino de Cristo, que não tem absolutamente nenhuma aparência e consiste no Espírito e luta com o chifre espiritual, que é a palavra de Deus. Assim este reino não será nem espiritual nem secular, e não é construído nem por armas espirituais nem temporais. Por meio de que armas então? Pelas aparências, isso é, pela aparência externa, pela pompa, ou então, para dizê-lo em uma só palavra, pelas superstições, rituais, cerimônias, que são expostas à vista nas vestes, comidas, pessoas, moradias, gestos e coisas semelhantes. Entre todas essas aparências e fachadas a superstição e a hipocrisia, que é a aparência da piedade e a aparência religiosa, são as mais poderosas e mais agradáveis, e por isso as mais prejudiciais. Nem as aparências profanas, como por exemplo, das moças, dos jovens, das riquezas, dos amigos, das diversões ou qualquer outra coisa, atraem, prendem e cativam desta maneira. Por outro lado, [as aparências] sagradas, por simularem o divino e apresentarem sinais das coisas eternas, prendem e enganam inclusive os mais sábios, mais santos, mais poderosos e até mesmo os eleitos [cf. Mt 24.24].
Portanto fica evidente que este rei é o anticristo, isso é, o adversário de Cristo e de seu reino. Pois Cristo é um rei potente na verdade, um veemente adversário das aparências e fachadas, como vemos no Evangelho. Este rei, porém, é potente nas aparências, veemente adversário da verdade. Por isso não é sem razão que os apóstolos Pedro e Paulo nos inculcam tantas vezes o vocábulo “verdade” e nos dissuadem da aparência. Paulo diz o seguinte, ao expor este assunto: “Haverá homens egoístas, etc.” E segue: “tendo a aparência da piedade, negando-lhe, porém, o poder” [2 Tm 3.2,5].
(LUTERO, Martinho. Resposta a Ambrósio Catarino. 1520. MARTINHO LUTERO. Obras Selecionadas. Tradução de Ilson Kayser. São Leopoldo: Sinodal. Porto Alegre: Concórdia. Canoas: Ulbra. 2. ed., 2007. vol. 3, págs. 41-42]
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