No último 1º de abril lembramos aqui do tradicional "dia da mentira" e do aniversário de Rachmaninoff, mas ficou faltando homenagear um grande cantor popular que - 30 anos atrás - partiu de maneira trágica exatamente neste dia, assassinado pelo próprio pai, que era pastor pentecostal.
Este cantor era Marvin Gaye, nascido em 2 de abril de 1939 com o nome de Marvin Pentz Gay, Jr., quando a palavra "gay" ainda não tinha a conotação moderna que tomou na segunda metade do século XX.
Seu pai, de quem herdou o mesmo nome, era pastor de uma igreja pentecostal chamada "House of God" ("Casa de Deus"), e, segundo relatos dos familiares e do próprio Marvin Gaye quando chegou à fase adulta, ele era constantemente espancado pelo pai desde que tinha sete anos de idade, o que não o impediu de cantar na igreja.
Como era de se esperar, o pai o expulsou de casa quando ele ainda era um adolescente, e após algumas experiências com grupos vocais menores, já com o nome artístico de Marvin Gaye, ele passou a cantar profissionalmente, obtendo algum sucesso no início da década de 1960.
Seu estouro nas paradas se deu com a música "Ain't no Mountain Higher Enough", gravada em dueto com Tammi Terrel em 1967 e depois regravada por Diana Ross em 1970, e que até hoje é muito conhecida:
Em 1968, Marvin gravou o seu primeiro sucesso solo a atingir o topo das paradas, "I Heard It Through The Grapevine", que pode ser apreciada aqui na sua exitosa apresentação no Festival de Montreux de 1980:
Na mesma edição de Montreux, você pode ouvi-lo cantando mais três enormes sucessos: "Mercy Mercy Me", "What's Going On" e Let's Get It On":
Não podemos esquecer, é claro, de seu último grande sucesso, "Sexual Healing":
"Sexual Healing" ganhou o Grammy de melhor canção de 1982 e marcou o retorno de Marvin Gaye à cena musical depois de anos lutando contra seu vício em cocaína.
Marvin ainda conseguiu se manter em turnê para uma série de shows que o trouxeram de volta ao topo das paradas, mas teve uma recaída no final de 1983 e voltou para a casa dos pais, com o fim de se cuidar e ficar perto da mãe que se recuperava de uma cirurgia renal.
Entretanto, a relação entre pai e filho, os dois Marvins, era a pior possível. Marvin pai fazia de tudo para não estar perto do filho, chegando a morar em outra casa por um período a fim de evitar maiores confusões.
Curiosamente, Marvin Gaye deu ao pai, como presente de Natal de 1983, uma arma, o mesmo revólver calibre 38 da Smith & Wesson com que seria morto alguns meses depois. Teria premeditado algo? Dúvida cruel...
As discussões com o pai continuaram a cada visita deste à casa onde estavam Marvin Gaye e sua mãe, e os familiares posteriormente contaram que viam uma tendência paranoica suicida no cantor, difícil de ser controlada.
No dia 1º de abril de 1984, após outra altercação mais violenta com o pai, este não se conformou em ser agredido física e verbalmente pelo filho, e se lembrou daquela mesma arma que havia ganho de presente de Natal, retornando para o quarto de Marvin Gaye e alvejando-o com um tiro no coração à meia distância e outro quase à queima-roupa.
Segundo o depoimento de membros da família, o pastor Marvin Pentz, Sr., havia deixado claro desde a infância de seus filhos que, se algum deles um dia o agredisse, a punição seria a morte. Crônica de uma tragédia anunciada.
Seu irmão Frankie foi o último a vê-lo com algum fiapo de vida, e, segundo seu testemunho, as últimas palavras de Marvin Gaye teriam sido: "Tive o que eu queria... eu não conseguiria fazer isto por mim mesmo, então ele fez isso por mim... é bom, eu corri a minha carreira, não há mais nada para mim".
O pai-assassino ficou esperando a polícia na frente da casa, foi julgado e - devido ao seu estado de saúde e idade avançada - o juiz lhe aplicou uma pena de 6 anos com sursis, ou seja, não chegou a ficar preso, mas se mostrou profundamente arrependido pelo que havia feito. Só que era tarde demais, pois sua esposa se divorciou dele, os demais filhos se afastaram e nada podia ser feito para trazer Marvin filho de volta.
Já era noite da véspera do seu 45º aniversário quando Marvin Gaye foi declarado morto. Terminava ali a carreira de um grande cantor de rhythm & blues e soul music. Sua obra, felizmente, não morreu.
Naquele mesmo ano de 1984, Diana Ross gravou a música "Missing You" ("Sentindo Sua Falta"), dedicada a Marvin Gaye, uma das mais belas canções fúnebres de que se tem notícia:

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