sábado, 28 de junho de 2014

100 anos do assassinato que deu causa à Primeira Guerra Mundial

"Aff.. vem aí um péssimo século"

No dia 28 de junho de 1914, por volta das 10:45 h da manhã de Sarajevo, hoje capital da Bósnia-Herzegovina e naquela época capital da província de mesmo nome que fazia parte do Império Austro-Húngaro, eram assassinados o arquiduque Francisco Ferdinando e sua esposa Sofia.

Foi o estopim da Primeira Guerra Mundial, conflito que nunca pode deixar de ser analisado em conjunto com a Segunda Guerra que lhe seguiu, eventos que marcaram profundamente o século XX e transformaram para sempre o mundo em que vivemos.

O arquiduque Francisco Ferdinando era herdeiro do trono do Império Austro-Húngaro, este próprio uma ficção geopolítica criada em 1867 que, mediante a união das coroas de Áustria e Hungria, reunia uma série de países e nacionalidades na imensa colcha de retalhos pátrios que caracterizava a Europa do século XIX.

Para que o leitor tenha uma ideia da diversidade territorial e cultural do Império Austro-Húngaro, basta lembrar que ele compreendia regiões que hoje estão espalhadas (parcial ou totalmente) em 13 países: Áustria, Hungria, República Tcheca, Eslováquia, Eslovênia, Croácia, Bósnia e Herzegovina, Sérvia, Montenegro, Itália, Romênia, Polônia e Ucrânia.

Quem acompanha os atuais incidentes entre as nacionalidades ucraniana e russa na região fronteiriça entre os dois países consegue imaginar o quanto era complicado manter todos esses povos vivendo debaixo do mesmo teto no início do século XX.

Francisco Ferdinando não nasceu para ser imperador, pois era sobrinho do soberano Francisco José I e o terceiro na linha sucessória. Ocorre que o príncipe-herdeiro, seu primo Rodolfo, se suicidou em 1889, e - após a renúncia ao direito de sucessão por seu pai - Ferdinando passou a ser o pretendente ao trono.

Casou-se em 1900 com a condessa Sofia Chotek que, por não pertencer a nenhuma casa real europeia, fez com que o casamento fosse considerado morganático, ou seja, ela jamais poderia ser chamada de imperatriz nem seus filhos poderiam herdar o trono, pesada obrigação que o amargurado imperador Francisco José impôs à união.


Sofia e Francisco Ferdinando: um final infeliz

Além disso, Sofia não podia se sentar ao lado do arquiduque em cerimônias oficiais, mas podia acompanhá-lo caso Francisco Ferdinando estivesse fazendo uma visita militar, o que era o caso daquele dia 28 de junho de 1914.

Sarajevo estava em polvorosa naqueles dias devido às intrigas entre os austro-húngaros e o Reino da Sérvia, que queria ver independentes os países eslavos do Império, tanto a Bósnia como a Croácia, com os quais formaria depois a união que ficou conhecida como Iugoslávia, Estado pan-eslavo que só seria desmembrado - também com muito derramamento de sangue inocente - nos anos 1990.

O Império Alemão, comandado pelo kaiser Guilherme II e aliado da Áustria-Hungria, acompanhava de perto o desenrolar daquele perigoso jogo geopolítico, interessado que estava em estender sua influência por toda a Europa.

Parece que Francisco Ferdinando não percebeu a gravidade do momento ou não deu atenção aos fantasmas que assombravam a Europa do início do século XX.

Com a intenção de mostrar seu poderio militar e também agradar sua esposa, exibindo-a ao público numa situação em que isso não era proibido, Francisco Ferdinando resolveu se aventurar em Sarajevo num carro aberto, crendo - talvez - que ninguém ousaria levantar a mão contra o herdeiro do trono.

Ali os esperava a resistência sérvia, organização que se opunha à aproximação de seu país com o Império Austro-Húngaro, e era organizada em várias facções terroristas, sendo uma delas a Mão Negra, da qual um jovem chamado Gavrilo Princip era membro.

A Mão Negra havia preparado um atentado contra Francisco Ferdinando naquele dia. Vários terroristas estavam dispersos na multidão, prontos para matar o arquiduque.

Um deles conseguiu lançar uma granada que explodiu a poucos metros do carro aberto em que ele e Sofia estavam, ferindo cerca de 20 pessoas.

Visivelmente contrariado, Francisco Ferdinando ainda foi até a sede da Prefeitura, onde lideranças cristãs, muçulmanas e judias de Sarajevo o esperavam.

O arquiduque cancelou parte da agenda que deveria cumprir naquele dia para visitar os feridos no hospital local. Antes de chegar lá, entretanto, seu motorista se perdeu na cidade convulsionada, entrou na rua errada e o carro terminou indo na direção de Gavrilo Princip, que, ao ver o herdeiro do trono e sua esposa, não titubeou e atirou neles com a pistola Browning calibre 7,65 x 17 mm que portava.

Baleados, ambos não resistiram aos ferimentos e morreram poucos minutos depois.  O segundo atentado no mesmo dia foi fatal.


O assassino Gavrilo Princip é preso pouco depois de atirar no casal imperial.

Essa misteriosa força chamada "acaso" fizera o arquiduque ir parar no exato lugar onde, "por acaso", havia alguém pronto para matá-lo.

Terminava ali uma história de amor que havia vencido a proibição imperial, juntamente com o próprio Império que não resistiria ao final da guerra, 4 anos depois.

Obviamente, não foi o duplo assassinato a grande causa do início da guerra, mas abriu a torneira para que jorrassem os interesses imperialistas dos países europeus.

O Império Austro-Húngaro, insuflado pelo kaiser Guilherme II, propositalmente exigiu reparações e condições que a Sérvia, apoiada pelo tzar Nicolau II, além de França e Grã-Bretanha, jamais poderia aceitar, e o conflito começou 30 dias depois dos atentados de Sarajevo.

Vinham pela frente 4 anos de terror, com milhões de mortos, inclusive entre os reis. Francisco José morreu em 1916 e Nicolau II foi assassinado pelos bolcheviques em 1918, depois de ter sido deposto pela Revolução Russa de 1917. Guilherme II também perderia a coroa no fim da guerra. 

Na verdade, a Primeira Guerra Mundial foi o prelúdio da Segunda, e o mundo nunca mais foi o mesmo a partir de então.

E até hoje sofremos, de certa maneira, as consequências do assassinato cometido exatos 100 anos atrás.

Os fantasmas do passado continuam voando por aqui, agora em escala global. Para espantá-los, é fundamental relembrar o passado para nunca mais repeti-lo.

O arquiduque e sua esposa em foto tirada 5 minutos antes do atentado que os matou


A mesma foto, colorizada por computador

A BBC Brasil preparou uma simulação muito interessante, de como teria sido uma cobertura nos padrões atuais, minuto a minuto, dos acontecimentos daquele fatídico dia 28 de junho de 1914. Para visualizá-lo, clique aqui.



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