quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

O que aprendi com Niemeyer


O grande arquiteto brasileiro Oscar Niemeyer morreu ontem, 5 de dezembro de 2012, aos 104 anos de idade.

Segundo informaram os médicos que dele cuidaram, esteve lúcido até a manhã do último dia de sua longa e profícua vida, e o que mais lhes chamou a atenção no paciente famoso foi o seu imenso desejo de viver.

Esta belíssima ânsia da vida em ser vivida já é, por si só, uma das maiores lições que Niemeyer deixou a um mundo onde se dá tão pouco valor à existência própria e à dos outros.

Entretanto, há outras lições que o gênio da arquitetura nos legou, e elas merecem ser pensadas e divulgadas para que as novas gerações nunca percam a capacidade de se reinventarem e construírem um mundo melhor.

Mesmo não sendo nenhum especialista em arquitetura, tive a oportunidade de conhecer ao vivo e a cores várias obras de Niemeyer, em São Paulo, Belo Horizonte, Curitiba, Rio de Janeiro, Niterói e sua obra-prima Brasília.

Como ele mesmo gostava de dizer, você pode gostar ou não de suas obras, mas jamais passará indiferente por elas.

Seja no Copan de São Paulo, na Pampulha de BH, nos museus de Curitiba e Niterói ou no Sambódromo da Sapucaí, suas obras de arte são exatamente isso, arte, e interagem ludicamente com as pessoas e o ambiente em que estão inseridas.

Brasília, apesar da má fama que - injustamente - maus políticos lhe atribuem, é um capítulo à parte. Seja pela imensidão do seu horizonte em 360º, seja pelos prédios monumentais plantados no cerrado, tudo ali respira Niemeyer.

Na minha modesta opinião, nenhuma obra dele comunica mais do que a catedral de Brasília. Poucos monumentos no mundo captaram tão bem o significado "das trevas para a luz".




Se vista de fora, os seus arcos invertidos já lembram mãos em oração, quando se está lá dentro, a imensidão da luz que os céus de Brasília enviam de fora para dentro do templo fazem da experiência arquitetônica um vislumbre transcendental.

Pelo menos para mim, ainda que a entrada já seja de uma beleza profunda, o momento mais, digamos, luminoso, aconteceu ao sair da catedral pela rampa que leva de volta ao mundo real.

Não sei se foi o horário em que lá estive, ou as condições climáticas daquele dia específico, mas ao me deparar com a rampa de saída, havia uma espécie de explosão de luz que nos chamava lá de fora.

Ali entendi que o ateu e comunista Oscar Niemeyer havia transmitido - através de uma câmara negra - uma crítica subliminar em sua arquitetura religiosa: "vocês estão aí dentro rezando, mas a luz está aqui fora".

No fundo, ele tinha uma boa dose de razão. Por mais que os templos sejam lugares sagrados de oração e adoração, suas palavras e seus ideais pouco significam se não forem traduzidos em ações concretas no mundo real.

Do ponto de vista cristão, uma igreja que se isola e se encapsula dentro de si mesma nunca será sal da terra nem luz do mundo.

O Brasil perdeu um grande homem, que deixou marcas profundas que serão lembradas por muito tempo ainda.

Fosse ele cristão, talvez pudesse pregar com suas obras arquitetônicas Mateus 5.13-16:
Vós sois o sal da terra; ora, se o sal vier a ser insípido, como lhe restaurar o sabor? Para nada mais presta senão para, lançado fora, ser pisado pelos homens.
Vós sois a luz do mundo. Não se pode esconder a cidade edificada sobre um monte; nem se acende uma candeia para colocá-la debaixo do alqueire, mas no velador, e alumia a todos os que se encontram na casa.
Assim brilhe também a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai que está nos céus.




Sugerimos a leitura, também, do artigo "As igrejas do ateu Oscar Niemeyer"



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