segunda-feira, 30 de março de 2009

Reencontro selvagem

O amor é uma linguagem universal...

Esses dois jovens criaram este filhote de leão a que eles deram o nome de Christian. Infelizmente, ele ficou muito grande para eles cuidarem e eles decidiram libertá-lo para que ele pudesse viver como um leão selvagem. Depois de um ano, eles foram à África para vê-lo. Eles foram alertados de que o leão não se lembraria dele. Este vídeo foi feito quando eles o encontraram.


quarta-feira, 25 de março de 2009

Grandes canciones - 4

Um pouco de música folclórica argentina:

COSA PELIGROSA

por Los Nocheros


Me bastará tan sólo de tu boca oír te amo
y desde la distancia al infinito te hallaré
en cada movimiento pendular de un triste otoño
veré todo el verano resbalar sobre mi pie

Me bastará tan sólo que un "te quiero" de tu boca
se escape cielo adentro hacia una nueva dimensión
así aceptar que sólo yo comprendo esta locura
y nadie más divulgue lo increible de este amor

Pero mira que cosa tan graciosa es mi ilusión
yo aquí soltando sueños y esperanzas a los vientos
Pero mira que cosa peligrosa es tu querer
te juegas al azar y apuestas con mis sentimientos

El río va llevando las caricias de tus manos
y el aire aquel momento que inventamos la pasión
No existe fiel testigo que describa con palabras
el beso que provoca mi peregrina tentación

Pero mira que cosa tan graciosa es mi ilusión
yo aquí soltando sueños y esperanzas a los vientos
Pero mira que cosa peligrosa es tu querer
te juegas al azar y apuestas con mis sentimientos

pero mira que cosa que cosa peligrosa
pero mira que cosa que cosa peligrosa


terça-feira, 17 de março de 2009

As crônicas de Marvin - 05

A maravilhosa fama

7 de agosto de 2051, 7:00

Não foi fácil dormir aquela noite. Agora como um “profeta”, muitas possibilidades surgiram para mim. Pensei nas formas mais cruéis de me vingar daquelas pessoas que não só me enganaram, mas me ignoraram... De certa forma, eu tinha que expor o extremo puxa-saquismo deles...
Bem, já era segunda-feira, e eu tinha que agir... Infelizmente não tinha mais tempo para vinganças pessoais, tinha que trabalhar. Quem mandou ser pobre? De qualquer forma eu tinha que recuperar o dinheiro gasto em minha vingança, senão não poderia fazer as contribuições voluntárias dignas de um “profeta”. Comi apressadamente o meu cereal matinal, e corri para o ponto de ônibus.
Se estivéssemos falando de qualquer dia normal, e de qualquer ponto de ônibus normal, eu não estaria assustado ao vê-lo cheio de pessoas. Mas por incrível que pareça, ao virar a esquina e me deparar com o ponto de ônibus onde costumo pegar meu ônibus, tive uma grande surpresa: ele estava lotado. Mas não de quaisquer pessoas, estava lotado de testemunhas de Jeová... Pessoas que nunca vi pegando ônibus, pessoas que pegavam ônibus em outros horários. Até pessoas que pegavam outros ônibus. Estavam todos ali, e abriram um grande sorriso quando me viram.
Me aproximei lentamente, como quem ainda estava esperando acordar de algum pesadelo. Mas não acordei, e ele ficava cada vez pior. Cheguei perto do ponto, para ouvir meus caros irmãos, e suas explicações. O irmão Pedro foi plenamente capaz de explicar aquele aglomerado humano:
- Irmão, ontem ao voltar do congresso, e ver que você preferiu pegar um ônibus ao invés de uma carona, comecei a refletir sobre esta sua atitude... Você está certo, meu irmão. Como se diz em Revelação 11:18, Jeová Deus virá para destruir os que destroem a terra, e nós não podemos contribuir com isto. Por isto, vamos todos andar mais de ônibus, para diminuir a poluição gerada. E já que estamos fazendo isto, aproveitamos para acompanhá-lo, de forma que possamos aprender alguma coisa com o irmão.
A irmã Marta ainda completou:
- Puxa irmão, você demorou, hein! Eu deixei 3 ônibus passarem para ver se te encontrava...
Como dizia o sábio filósofo Homer Simpson, “Duh!!”. Era tudo que eu precisava. Um grupo de testemunhas de Jeová com sérios problemas espirituais (perdão pelo pleonasmo). Enquanto tirava umas fotos com a irmã Marta, que queria uma lembrança minha, pensava em como iria sair desta fria... Não me ocorreu nada. O pior foi decidir quem iria comigo, afinal o ônibus não conseguiria levar muita gente... Falei para entrarem em ordem de chegada.
Foi a pior viagem de ônibus que tive. Me incomodava o fato de aqueles que foram sentados estavam com seus caderninhos a postos para anotar qualquer coisa que eu dissesse ou fizesse. Fui em pé, apesar da insistência geral. Podia até deixar para alguém pagar minha passagem, mas minha consciência não permitiu. Fui obrigado a fazer uma mini-palestra sobre o cristão e o trabalho. Não foi muito difícil, apesar de tudo. Basicamente falei para não se mentir em hipótese alguma (puxa, como sou hipócrita), mesmo que isto custe seu emprego. Qualquer coisa que termine com o famoso “não somos parte do mundo” tem um grande poder de deslumbramento...
Consegui descer do ônibus, e ir rapidamente para meu serviço. Bem, eu trabalho com manutenção de computadores. Um nerd tem que fazer aquilo que sabe com maestria. Além disto, é um trabalho que não exige contato com o cliente. Pelo menos eu pensava assim, até que as vendas da loja aumentaram 50% naquele dia. Parece que meus irmãos concluíram que o computador não é tão mau assim, já que um de seus “profetas” trabalhava com eles. Tive que parar meu serviço 16 vezes para trocar algumas palavrinhas com os irmãos, exigência do chefe. Pelo menos assim ele reparou em minha existência. Talvez eu peça um aumento em momento oportuno.
Não costumo sair do serviço pela janela, aliás acho que ninguém faz isto. Não fazia. O pior de ser famoso é ser um famoso pobre. Pelo menos os ricos possuem seguranças, carros e coisas assim para despistar as multidões. Tive que correr e pegar um ônibus diferente desta vez... Mas correu tudo bem. Eu pelo menos teria a chance de ver o documentário que eu queria ver na televisão, e que há muito tempo esperava. Era sobre energia renovável, algo que sempre me interessou.
Cheguei em casa e fui preparar algo para comer. A história de despistar os irmãos me fez demorar muito para chegar. Estava quase na hora do documentário... Quando o telefone tocou. Era o irmão Osvaldo:
- Olá, irmão Marvin. Aqui é o irmão Osvaldo! Eu não te vi saindo da loja hoje, você está bem?
Respondi com desânimo:
- Estou sim, como vai irmão Osvaldo?
- Eu estou indo...
Podia mesmo ir, e me deixar ver o meu programa...
- Bem, irmão Marvin, eu te liguei por que eu queria te perguntar algo muito sério... Sabe, há muito tempo eu e minha esposa temos brigado muito, e isto nos entristece muito. Sabe, eu amo ela demais, e ela também me ama, e nós gostaríamos de nos dar bem, mas confessamos que precisamos de ajuda... Os anciãos já conversaram conosco, e não adiantou ainda... Então decidimos pedir sua ajuda, já que você foi apontado pelo Escravo como uma das duas testemunhas de Revelação...
Foi aí que me caiu a ficha... Eu entrei na maior furada de minha vida, e livremente. Tinha acabado de assinar meu contrato de conselheiro gratuito e vitalício... Eu tinha dificuldades até para falar bom dia para todo mundo, agora dar conselhos? Tinha que pensar rápido em uma solução, o documentário estava para começar...
- Irmão, eu só tenho uma coisa a dizer. Você possui algum objeto que foi dado por um espírita, e este objeto está causando todos estes problemas.
- Puxa, irmão, você tem certeza? Pois os anciãos já falaram sobre isto, e eu até me desfiz de um monte de objetos que possuíam alguma relação com o espiritismo...
É claro. Eu peguei a solução básica para este tipo de problema, e esqueci que ela seria a primeira que os anciãos tentariam... Bem, eu não estava muito criativo naquele dia...
- Irmão, ainda tem algum objeto relacionado com o espiritismo em sua casa. Você não se livrou de todos. Se você valoriza seu casamento mesmo, você deveria começar a procurar imediatamente. Ache este objeto, ele está aí em algum lugar. Chame mais pessoas e procure. Seu casamento depende disto!
Desliguei o telefone, e corri para a televisão. O programa tinha acabado de começar. Com sorte, o irmão Osvaldo ficaria pelo menos um mês procurando. Mas o irmão Osvaldo não era o único com problemas... Por isto, o telefone tocou mais uma vez. Resolvi não atender.
Passados 10 minutos do documentário, toca a campainha. Era o ancião Marcos no portão, para minha infelicidade. Agora não dava para fazer de conta que não estava em casa, as luzes estavam acesas, a televisão ligada. Tive que atendê-lo...
- Irmão Marvin, boa noite... Eu peço desculpas por vir aqui a esta hora, mas eu tentei te ligar, e ninguém atendeu...
- Sério? Puxa, eu não ouvi ele tocando... Deve ser quando eu estava tomando banho...
- Tudo bem, não tem problema. Foi melhor vir pessoalmente, pois o assunto é sério.
- Assunto sério? Sobre o quê se trata?
- Bem, há algumas coisas que você não conhece sobre nossa congregação... E achei melhor te contar antes que você ouça de outras pessoas.
- Hummm, e o que seria?
- Eu acredito que o irmão Jonas não aprova algumas coisas que eu faço pela congregação. A verdade é esta.
- O irmão Jonas? Mas vocês são anciãos há tanto tempo, sempre demonstraram ser amigos.
- Sim, pois não seria um bom exemplo para a congregação ter dois anciãos que discutissem entre si. Mas a verdade é que muitos procedimentos adotados por ele não são corretos.
- Ah, não?
- Não. Por exemplo, não acho apropriado que um ancião faça um discurso de casamento para pessoas que sequer são batizadas.
- Ah, disto eu não sabia.
- Isto mesmo. O irmão Jonas não é rigoroso, dá muitas concessões. E por isto, é o mais procurado. Claro, é mais fácil afrouxar aqui e ali, do que seguir as orientações do Escravo.
Uma disputa por poder, completamente oculta aos cristãos comuns... Esta foi inesperada para mim, e por um momento até me esqueci do meu documentário. Quem seria capaz de imaginar isto? Mas o irmão Marcos estava ali, bem na minha frente, tentando fazer minha cabeça contra o irmão Jonas. Provavelmente movido pelos ciúmes...
Nisto toca o telefone... Eu estava ignorando, mas o irmão Marcos interrompeu seus “reclames” para dizer:
- Irmão, se quiser pode atender o telefone...
- Ah, tá, tudo bem, vou ver quem é...
Atendi então o telefone. Sem nenhuma identificação, alguém grita do outro lado da linha:
- ACHHHHHEEEEEIIIIIIII, IRMÃÃÃÃOOOOO!!!
- Irmão.... Osvaldo??
- Isto mesmo, irmão. Puxa, você é um homem de Deus mesmo! Eu sabia que poderia contar com você!
- Puxa, achou mesmo?
- Sim, claro. Minha esposa tinha um anel que foi dado pela irmã de uma mulher cujo marido é espírita... Como ela não queria se desfazer do anel, que é caro, então ela escondeu isto de mim.
- Puxa, sério?
- Sim! Ainda bem que você é guiado pelo espírito de Jeová. Pode ter certeza que vou contar isto para todos os irmãos! Temos um profeta entre nós!! Puxa, como estou feliz... E então, o que devemos fazer agora, irmão?
Como diria outro sábio chamado Dick Vigarista, “Raios, raios duplos!!”. Antes mesmo de todas as nações se unirem para congregar no templo de Deus, no novo mundo, elas se congregarão aqui em casa, me impedindo de viver... Agora não tinha mais jeito...
- Ora, irmão, basta queimar...
- Mas irmão, é um anel... Ele não vai queimar...
- Tem razão. Então faz o seguinte. Pegue todo mundo que você encontrar, e vá até a Vila Esperança. Encontre um lote vago, faça um buraco e enterre. Depois, faça uma oração. Vou pedir para o irmão Marcos te acompanhar, já que ele é ancião.
- Puxa, muito obrigado, irmão Marvin. Mas a Vila Esperança não é muito longe não?
- Exatamente por ser longe que eu estou te mandando para lá. Você vai querer que este objeto que tanto prejudicou seu casamento fique perto de vocês?
- Puxa, irmão, é mesmo!! Como sou tolo, é claro que não. Vamos fazer isto agora.
- Tudo bem então, vou mandar o Marcos. Não saia sem ele.
Desliguei o telefone, e falei para o Marcos:
- Irmão, seja o que for que você tem para me dizer, acho que pode esperar. Eu quero que você ajude o irmão Osvaldo a se livrar de um objeto dado por um espírita. É urgente, vai lá agora.
- Mas irmão...
- Irmão, eu sei o que é bom para você e o Osvaldo. Por ora, vá. Teremos muito tempo para falar disto depois.
- Está bem então. Até mais.
Matei dois coelhos com uma cajadada só. Espero que agora eu tenha um pouco de paz... Me despedi do irmão Marcos, e corri para o sofá. Por via das dúvidas, apaguei as luzes e fechei as cortinas. Ao me sentar, descobri que o programa estava quase no fim... A esta altura, o telefone toca de novo... Já tinha perdido todo o programa, não ia entender mais nada mesmo, então resolvi atender...
- Olá, irmão Marvin. Aqui é a irmã Rosa.
- Olá, irmã. Como está?
- Hummm, eu não estou muito bem... Irmão, eu queria um conselho... Estou me sentindo muito solitária...
- Mas irmã, você mora com 5 pessoas!!
- Eu sei... Mas aqui em casa cada um vai para seu canto. Ninguém quer saber sobre meu dia, sobre como me sinto, o que eu desejo... Ninguém liga para mim... Estou muito triste...
Se eu dissesse que eu também não ligo para ela, eu pioraria mais as coisas. Tudo bem, hora de fingir de novo... Eu sempre me impressiono com a habilidade humana de conseguir sempre piorar as coisas. Infelizmente não fiz curso de psicologia. Eu repasso.
- Irmã, você tem que deixar claro para as pessoas de sua casa, que você precisa deles. Por quê não conversa com todos, e expõe o que está sentindo?
- Mas irmão, eles não iriam me escutar. Nunca me escutaram!!
- Irmã, muita coisa nesta vida não vem fácil. Se você deseja conquistar algo, deve lutar sem vacilar...
Depois de uma longa conversa, consegui despistar a irmã Rosa. Sugeri que ela visitasse um psicólogo. Além de estarem mais preparados, são pagos para isto. Finalmente entendi por que ela tem seu famoso dom da fala. Ninguém conversava com ela, e por isto alguém tinha que escutá-la. Foram 2 horas de conversa que não deram em nada. Depois disto desliguei o telefone, as luzes, e fui dormir. Pelo menos tentei, já que tive um pesadelo maluco onde testemunhas de Jeová cercavam minha casa como zumbis, dizendo “Me ajude, Marvin”, e eu corria para o quintal, onde os passarinhos cantavam “Me ajuuuddeee, Marrrvinnn”. Então me viro para o lado e vejo 7 vacas magras e 7 vacas gordas, cada uma com uma letra, que formava a palavra “INTERPRETE-NOS”. No fundo, Golias enfrentava a besta de sete cabeças e dez chifres em um campeonato de vale tudo, Golias agora com um capacete de motoqueiro. Ambos gritavam “É tudo sua culpa, é tudo sua culpa!!!”. O pior de tudo é que eu não bebo... Agora eu entendo por Michael Jackson escreveu Thriller, afinal, ele também foi TJ um dia...

sexta-feira, 13 de março de 2009

O mais jovem santista

JJJ - Jiu-Jitsu de Jesus (?!)

Pra começo de conversa, três esclarecimentos são necessários:


1) O título deste texto é apenas uma generalização do vale-tudo para aproveitar a sigla JJJ. Para quem não conhece, jiu-jitsu não é sinônimo de vale-tudo, embora o vale-tudo (hoje conhecido por MMA - Mixed Martial Arts) possa eventualmente incluir o jiu-jitsu entre as técnicas de luta desenvolvidas no combate, como a própria sigla MMA fala por si só;


2) Não tenho nada contra jiu-jitsu, MMA ou outras artes marciais. Pelo contrário, considero-as verdadeiras artes, como o próprio nome indica. Se as pessoas fazem mau uso delas, é outra história;


3) Também não tenho nada contra cristãos que as praticam. Apenas questiono, a seguir, a conveniência de se misturar templo, adoração e evangelismo no mesmo recinto.


É que a Folha de S. Paulo de ontem trouxe artigo (reproduzido na Folha Online) sobre um ringue de vale-tudo montado no templo da Igreja Renascer de Alphaville (bairro rico do município de Barueri, na Grande São Paulo), em que jovens são atraídos para as lutas de vale-tudo, segundo os pastores da igreja, para "propósitos evangelísticos". Fica difícil entender como é que algum pastor considera "normal" ver rapazes em trajes sumários lutando jiu-jitsu dentro da igreja, afinal a única manifestação de ira de Jesus, relatada nos evangelhos, diz respeito à expulsão dos vendilhões do templo, mas não consta que ele tenha recorrido ao vale-tudo para fazer isso. Graças a Deus não havia pitbulls naquela época.


Definitivamente, o profano se instalou em algumas igrejas que se dizem "evangélicas". Há uma polêmica antiga envolvendo o boxe, em que há muita gente que diz que não se trata propriamente de um esporte, mas de violência gratuita. O mesmo não se diz de lutas marciais como o judô, o karatê, o tae-kwon-do e o jiu-jitsu, que têm toda uma moderação nos golpes (e proteção nos lutadores) que os tornam mais parecidos com arte do que propriamente com esporte. Se já é discutível levar nobilíssimas lutas de judô para dentro de um templo, muito mais questionável é fazer do vale-tudo um ritual litúrgico. Afinal, a força do evangelho reside muito mais no Espírito do que no corpo. Por outro lado, esses tropeços têm o seu lado positivo (como quase tudo na vida): revelam que para algumas igrejas (e seus pastores) vale tudo mesmo...



Atualização: veja uma entrevista com o Pr. Caio Fábio sobre este tema,
clicando aqui.

veja também:

Pregação pode ser feita de qualquer jeito?

Mais vale-tudo na igreja

O lutador ungido

quarta-feira, 11 de março de 2009

Ceticismo, Cristianismo e Hedonismo



por Paul Tillich:


Esse vasto projeto dos filósofos gregos de criar um mundo de significados começou a desmoronar no apagar das luzes do mundo antigo e produziu o que chamo de epílogo cético do desenvolvimento antigo. Originalmente, o termo skepsis queria dizer "observar as coisas". Mas assumiu um sentido negativo de examinar os dogmas, até mesmo as dogmata das escolas gregas de filosofia, para rejeitá-los. Os céticos, assim, duvidaram de todas as formulações das escolas de filosofia. Não que essas escolas não contivessem em seu ensino boa parte desses elementos céticos, como, por exemplo, a academia platônica. O ceticismo não conseguiu avançar além do probabilismo enquanto que as outras escolas tornaram-se pragmáticas. Assim, essa atmosfera cética invadiu todas as escolas e permeou a vida toda no mundo antigo de então. Tratava-se de assunto vital e muito sério. Não se tratava novamente de se sentar em mesas de estudo para descobrir que se podia duvidar de todas as coisas. Essa tarefa seria comparativamente fácil. Na verdade, esse movimento significava o desabamento de todas as convicções. A conseqüência dessa atitude – bastante característica da mentalidade grega – foi uma espécie de paralisia da ação. Se não somos mais capazes de pronunciar juízos teóricos, não podemos agir na prática. Portanto, introduziram a doutrina da epoché, "suspensão de juízo, reserva, não julgar nem agir, não decidir nem teórica nem praticamente". A doutrina da epoché significava a resignação do juízo em todos os aspectos. Por isso, os céticos retiraram-se para os desertos vestidos de uma simples túnica ou manto. Os monges cristãos, mais tarde, seguiram-nos nessa atitude, porque eles também se desesperaram sobre a possibilidade de se viver neste mundo. Alguns céticos da igreja primitiva eram sérios e agiam de acordo, ao contrário de certos céticos esnobes de nossos dias que não se animam a arcar com as conseqüências de seu ceticismo, que levam vidas alegres e confortáveis enquanto duvidam de todas as coisas. Os céticos gregos retiraram-se da vida e assim mostraram-se consistentes.

O ceticismo foi, pois, um dos importantes elementos para a preparação do cristianismo. As escolas gregas, como os epicuristas, os estóicos, os acadêmicos, os peripatéticos e os neopitagóricos, não eram escolas no sentido em que temos hoje escolas filosóficas, como a escola de Dewey ou a de Whitehead. As escolas filosóficas gregas eram também comunidades cúlticas; eram meio rituais e meio filosóficas. Seus membros queriam viver de acordo com as doutrinas de seus mestres. Quando surgiu o movimento cético, procuravam acima de tudo a certeza; queriam-na para poder viver. Acreditavam que os grandes mestres, Platão ou Aristóteles, o estóico Zenão ou Epicuro, e mais tarde Plotino, não eram apenas pensadores ou professores, mas homens inspirados. Muito antes do cristianismo existir, a idéia de inspiração já se desenvolvia nessas escolas gregas: seus fundadores eram inspirados. Quando membros dessas escolas entraram mais tarde em discussão com cristãos, diziam, por exemplo, que não era Moisés o inspirado, mas Heráclito. Essa doutrina da inspiração também ajudou o cristianismo a entrar no mundo. A razão pura não era capaz de construir a realidade na qual se pudesse viver.

O que se dizia sobre os fundadores dessas escolas filosóficas era semelhante ao que os cristãos diziam a respeito do fundador de sua igreja. É curioso notar que um homem como Epicuro – de tal maneira atacado pelos cristãos que só restam dele poucos fragmentos – era chamado soter pelos discípulos. Essa palavra era usada no Novo Testamento para significar "salvador". Assim, o filósofo Epicuro era conhecido como salvador. Por quê? Em geral, Epicuro é considerado um homem que sempre viveu bem nos seus agradáveis jardins e que ensinou uma filosofia hedonista rejeitada pelos cristãos. Mas o mundo antigo não tinha essa idéia sobre Epicuro. Era chamado de soter porque fizera a coisa mais importante que alguém poderia fazer pelos seus seguidores: libertava-os da angústia. Epicuro, com seu sistema materialista de átomos, libertava as pessoas dos demônios presentes na totalidade da vida do mundo antigo. Vê-se bem que a filosofia era assunto muito sério nessa época.

Outra conseqüência desse espírito cético era o que os estóicos chamaram de apatheia (apatia), que significa ausência de sentimentos em relação às forças e impulsos da vida, como desejos, alegrias, dores, indo-se além de tudo isso ao estado da sabedoria. Sabiam que somente algumas pessoas conseguiram alcançar esse estado. Os céticos que se retiraram para os desertos demonstravam até certo ponto essa capacidade. Por trás de tudo isso, naturalmente, situava-se a crítica anterior aos deuses mitológicos e aos ritos tradicionais. A crítica da mitologia deu-se na Grécia cerca da mesma época em que o Segundo Isaías fazia o mesmo na Judéia. Essa atividade crítica minava a crença nos deuses do politeísmo.



(TILLICH, Paul. História do Pensamento Cristão. São Paulo: ASTE, 2000, 2ª ed., pp. 26-28)

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