"“O que habita no esconderijo do Altíssimo e descansa à sombra do Onipotente diz ao SENHOR: Meu refúgio e meu baluarte, Deus meu, em quem confio.” (Salmo 91:1)
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quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Arte cristã de Bernini sobreviveria aos "cristãos" brasileiros de 2017?


A "crentaiada" pudica que se associa ao que há de pior no fascismo brasileiro é uma ameaça a todas as liberdades civis que a humanidade conquistou - a duras penas - nos últimos séculos.

A indecência não está na mostra de arte X ou Y que afronta este ou aquele símbolo cristão. Vai lá quem quer, já sabendo de antemão se vai se ofender ou não.

Eu jamais entraria numa exposição (seja do que for) que ofende meu sistema de crenças ou simplesmente o meu - acho eu - bom gosto, mas nem por isso vou tentar impedir que quem quer que seja exiba ou queira apreciar aquilo que eles chamam de "arte". Ou uma dobradinha. É um problema deles, simples assim. 

Eu prefiro poupar meu precioso tempo e meu suado dinheirinho, se é que me entende...

Não por acaso, antes da 2ª guerra e mesmo durante o conflito, Hitler fazia questão de rodar pela Alemanha com a sua mostra de "arte degenerada", segundo os seus dizeres.

Aquilo que hoje consideramos "arte moderna" é o que Hitler, fanzoca da arte clássica greco-romana e renascentista, chamava de "arte degenerada", mas - incrível para os padrões fascistas atuais - Hitler promovia um tour de deboche pela Alemanha mostrando o que era aceitável ou não do ponto de vista nazista no quesito "arte".

Nem isso os boçais radicais brasileiros são capazes de fazer.

Os "compenetrados" Himmler, Goebbels e - ali na frente - Hitler observam a "arte degenerada" em Munique, 1937.
Nossos censores militontos decidem o que é ruim e fazem campanha para exterminá-lo. 

Hoje, o gosto artístico de Hitler é lembrado apenas para ridicularizá-lo.

Entretanto, perceba o contraponto: Hitler aproveitava o que chamava de "arte degenerada" - principalmente o moderno expressionismo - para contrapô-la ao seu ideal "artístico" e promover sua política da eugenia, ou seja, o extermínio de tudo e todos que fogem à "normalidade" genética ou cultural da estética nazista.

Tudo termina, para o fascista, em extermínio...

O expressionismo foi o grande inimigo da "estética nazista"
Sim... "estética" nazista. É incrível como os fascistas de ontem e de hoje continuam preocupados com a "beleza", mas na verdade há outro nome para isso, bem nu e cru: fetiche!

Seguindo seu profeta mal humorado de um tal Movimento Brasil Livre, de "Kinta Katiguria", os "cristãos" brasileiros se esquecem do conselho bíblico de que "o que eles fazem em oculto, até dizê-lo é torpe" (Efésios 5:12) e se põem a divulgar o que dizem condenar, atuando mais como promotores do que censores da libido alheia.

E, para tanto, se valem do discurso pornográfico, tão afeto ao fanatismo, conforme já tivemos oportunidade de comentar aqui no blog.

Se realmente lessem a Bíblia, não divulgariam nem se importariam com essas coisas, mas não: -  é preciso militar, proibir, divulgar e coibir.

Isso, sim, tem nome: fetiche!

Os que se dizem cristãos se esquecem - convenientemente - de que Jesus veio ao mundo em carne e osso num período em que orgias de todos os tipos eram patrocinadas pelos palácios imperiais e nem por isso Ele deixou de colocar seus sacrossantos e ensanguentados pés empoeirados nas mansões de Herodes e Pilatos, para - sobretudo e sobre todos - pregar o evangelho que transformou o mundo.

Fico imaginando o que os que se dizem "cristãos" atualmente diriam quando o gênio do barroco italiano Gian Lorenzo Bernini (1598-1680), responsável "só" pelo conjunto arquitetônico da Praça e da Basílica de São Pedro, no Vaticano, entre tantas outras obras, quisesse exibir seus monumentos "O Êxtase de Santa Teresa" e o tumular "Beata Ludovica Albertoni", só para citar dois deles.

Indubitavelmente, Bernini seria apedrejado na Praça da Sé de São Paulo em 2017 como tarado.

Confira você mesmo, prezado fascista com mente poluída, o que há de errado, primeiro com a "Beata Ludovica Albertoni":


Esse olhar perdido e lânguido da beata, meu Pai do Céu, como é que pode?


E depois, se os seus olhos ainda puderem ver tamanha afronta à sua "fé", horrorize-se com "O Êxtase de Santa Teresa":


Esse "êxtase", esse anjo com cara de safado, essa flecha, sei não...


Que horror, oh, que horror...

Mas, poxa, Bernini, e esse "Rapto de Prosepina" que fica na Galleria Borghese de Roma?



E a Santa Bibiana com seus raios dourados na igreja que lhe é dedicada em Roma, hein, Bernini?



Ah, Bernini, seu tarado! Como ousas ofender nossos sacrossantos olhos castos?

Ai, minha Santa Rita do Passa Quatro, dá um "passa moleque!" nesse tarado que só pensa naquilo...

E, por gentileza, mal humorados de plantão, nos poupem dos seus comentários supostamente indignados.

Aos "cristãos" que queiram discutir a questão de maneira mais apaixonada e aprofundadamente teológica, recomendamos o excelente ensaio crítico de Mario Persona, no seu blog "O que respondi?", intitulado "Devo protestar contra a exposição de arte LGBT?".

E não se esqueçam de atirar a primeira pedra, ok?!



quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Juiz defende extensão de aborto legal a casos graves de microcefalia


Matéria publicada na BBC Brasil:

Juiz defende direito a aborto em casos de microcefalia com risco comprovado de morte

Ricardo Senra

As consequências da epidemia de microcefalia, que atinge pelo menos 20 Estados brasileiros, além do Distrito Federal, vão além do cotidiano de mães, hospitais e clínicas de saúde de família, e chegam também aos tribunais.

À BBC Brasil, o juiz goiano Jesseir Coelho de Alcântara, que autorizou uma série de abortos legais em casos de anencefalia (mal que impede o desenvolvimento cerebral do feto) e outras doenças raras, disse que a interrupção da gravidez em casos de microcefalia com previsão médica de morte do bebê é "válida" e precisa ser avaliada "caso a caso".

"Se houver pedido por alguma gestante nesse caso de gravidez com microcefalia e zika, com comprovação médica de que esse bebê não vai nascer com vida, aí sim a gente autoriza o aborto", afirma o titular da 1ª Vara dos Crimes Dolosos Contra a Vida de Goiânia, que já permitiu interrupção de gestações em casos de síndromes de Edwards e de Body-Stalk, anomalias que inviabilizariam a sobrevida do bebê fora do útero.

A afirmação foi feita no momento em que Pernambuco, principal epicentro da doença no Brasil, registra aumento nas mortes de bebês com microcefalia associada ao zika vírus.

Mesmo em casos comprovados de morte do bebê, a interrupção da gravidez está longe de ser unanimidade no país e gera intenso debate entre juristas, ativistas e sociedade civil.

Formado por membros da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), da Federação Espírita Brasileira (FEB), do Fórum Evangélico Nacional de Ação Social e Política (FENASP), entre outros, o Movimento Brasil Sem Aborto afirma que interrupções em gestações de fetos com microcefalia ou outras má-formações são "inaceitáveis" sob qualquer aspecto.

Na opinião do juiz, entretanto, se o aborto é permitido por lei em casos de fetos anencefálicos, "cuja vida após o nascimento é inviável", também se justifica em "gestações em que o feto comprovadamente nascerá sem vida", devido à microcefalia.

"A anencefalia e a microcefalia severa, com morte no nascimento, são casos similares", argumenta o juiz Alcântara, por telefone. Ele afirma que, para que tomar a decisão, são necessários três laudos médicos, mais parecer favorável do Ministério Público.

Procurado, o Conselho Federal de Medicina disse discordar dessa visão. Em nota, a entidade afirma que "no caso de fetos com diagnóstico de microcefalia, em princípio, não há incompatibilidade com a vida."

Pouca informação

Há poucos dados oficiais sobre mortes de fetos e recém-nascidos microcefálicos no Brasil - e os que existem estão desatualizados.

Questionado sobre o tema, o Ministério da Saúde diz que só tem informações consolidadas sobre mortes de recém-nascidos com a doença em território nacional até 2014, período anterior à epidemia. A pasta diz que depende de informações enviadas pelos Estados para obter números mais atuais.

À BBC Brasil, o Conselho Federal de Medicina afirmou que "a interrupção antecipada da gestação deve ser definida à luz do que determinam o Código Penal do Brasil e o Supremo Tribunal Federal (STF). A incompatibilidade com a vida foi a essência para a fundamentação do STF, quando se manifestou favoravelmente pelo aborto de fetos anencéfalos."

No Código Penal, são previstas duas formas legais de aborto: em casos de risco de vida para a mãe ou em gestações resultantes de estupro. Em 2012, o STF admitiu uma terceira hipótese e a interrupção de gestações de fetos anencéfalos deixou de ser considerada crime.

Eugenia?

Nas redes sociais, em blogs e páginas religiosas, críticos do aborto afirmam que a interrupção de gestações por conta da microcefalia seria uma forma de "eugenia".

O termo se refere a técnicas que visam "melhorar qualidades físicas e morais de gerações futuras", segundo o dicionário Michaelis, e frequentemente é associado a políticas de controle social adotadas por Adolf Hitler durante o regime nazista alemão.

A professora de direito da Universidade de Brasília e especialista em bioética, a antropóloga Debora Diniz, vê "eugenia" nas políticas públicas que envolvem o controle de nascimentos: "Eugenia é quando o Estado pede que mulheres não engravidem, como foi feito", disse ela à BBC Brasil.

Em localidades como Colômbia, El Salvador, Equador e Jamaica, as autoridades pediram que mulheres não engravidassem, por medo da microcefalia ligada ao zika. No Brasil, em novembro, o diretor de Vigilância de Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde chegou a recomendar que as mulheres adiassem seus planos de gravidez. Dias depois, voltou atrás.

"Quando o país pede que suas mulheres não engravidem, quando isso portanto é uma política pública, o estrago é muito maior que o resultado das escolhas individuais das mulheres", afirma Diniz. "Controlar liberdades da população é o pior caminho que o Estado pode seguir. A solução do problema não pode vir pelo controle dos úteros."

Forte crítica às políticas do ministério da Saúde para erradicação da doença, a antropóloga, que tem passagens como professora visitante nas universidades de Leeds (Reino Unido), Michigan (Estados Unidos), Cermes (França), entre outras, diz as mulheres não podem ser punidas pelo "ato de negligência do país em não ter controlado o mosquito Aedes aegypti", que transmite o zika vírus.

"Ou o Estado oferece as melhores condições e cuidado permanente aos recém-nascidos com microcefalia, ou permite que as mulheres possam fazer a escolha individual de interromper suas gestações", diz. "O aborto não é uma solução para esta tragédia, mas seria uma forma de proteger as mulheres vítimas da falta de políticas efetivas para erradicação da doença."



domingo, 8 de fevereiro de 2015

Reino Unido aprova paternidade tripla


É o que informa a BBC Brasil:

Parlamento britânico dá aval a bebês com material genético de 3 pais

A americana Alana Saarinen faz parte de um pequeno grupo de entre 30 e 50 pessoas que têm um pouco de mitocôndria (e, dessa forma, um pouco de DNA) de três pais biológicos. Ela foi concebida por meio de uma técnica pioneira de fertilidade que, pouco depois, foi banida nos Estados Unidos.

Agora, casos como o dela podem se tornar mais comuns no Reino Unido: em uma iniciativa histórica, a Câmara dos Comuns do Parlamento britânico aprovou, por 382 votos a 128, a concepção de bebês com o DNA de duas mulheres e um homem.

O projeto ainda tem de passar pela Câmara dos Lordes. Se aprovado, é possível que já no ano que vem nasçam bebês sob a técnica de substituição mitocondrial, que consiste no uso de mitocôndria de uma doadora para eliminar determinados males genéticos graves.

Com isso, o país pode se tornar o primeiro do mundo a promover leis que permitam que bebês tenham o material genético de três pessoas. A técnica visa impedir que doenças genéticas sejam transmitidas de mãe para filho.

Defensores argumentam que a medida pode beneficiar pais com problemas genéticos graves e fatais. Já críticos alegam que a técnica levanta diversas preocupações éticas e de segurança médica.

Técnica

A mitocôndria consiste em pequenos compartimentos dentro de quase todas as células do corpo que convertem comida em energia. Elas têm seu DNA próprio, mas que não afetam características como a aparência.

Falhas na mitocôndria, que são passadas apenas pelo DNA da mãe, levam a problemas cerebrais, musculares, cardíacos e oculares.

A técnica de substituição mitocondrial usa uma versão modificada da fertilização in vitro para combinar o DNA dos dois pais à mitocôndria saudável de uma mulher doadora. A ideia é que os bebês tenham 0,1% de seu DNA vindo de uma segunda mulher - uma mudança genética permanente que seria passada adiante às gerações seguintes.

O tema gerou um intenso debate no Parlamento britânico.

A ministra de Saúde Pública, Jane Ellison, disse à Casa que a aprovação da medida "é um passo ousado para o Parlamento, mas é um passo bem informado. E, para muitas famílias afetadas, é uma luz no fim de um túnel muito escuro".

Um dos casos que se tornou símbolo no país foi o de uma mulher que perdeu seus sete filhos por conta de doenças mitocondriais raras - os três primeiros morreram pouco depois do parto, e os outros padeceram de males cerebrais ou cardíacos. Em tese, ela poderia ter sido beneficiada pelo procedimento.

Já o parlamentar Robert Flello disse temer que famílias como essa se decepcionem por conta de incertezas ainda geradas pela técnica. Em resposta, o ex-ministro Frank Dobson argumentou que a incerteza está "na natureza da medicina e da ciência" e que a fertilização in vitro nunca teria ido adiante se tivesse-se exigido certeza absoluta da técnica.

O premiê britânico, David Cameron, alegou que a aprovação não significa que os parlamentares estejam "brincando de Deus". "Apenas estamos garantindo que dois pais que queiram um bebê saudável possam tê-lo."

Temores

Na semana passada, as igrejas Católica e Anglicana da Inglaterra fizeram oposição à medida, alegando que ela não é segura nem ética. Alguns cientistas também disseram ainda não estarem seguros quanto à eficácia da técnica.

Outros grupos advertiram que a iniciativa poderia abrir a porta para modificações genéticas mais profundas que alterassem características estéticas e de inteligência ou promovesse a concepção de bebês "livres de doenças".

"Se você cruza a linha da ética, fica difícil não dar o próximo passo, de 'projetar' bebês", argumentou o ativista David King.

Mas a especialista em reprodução ética Gillian Lockwood disse à BBC que a substituição mitocondrial consiste em uma "mudança pequena" na legislação.

"O maior problema é que o processo está sendo descrito como uma fertilização in vitro de três pais. Mas na verdade são dois (pais) mais 001", afirmou.

Ela argumenta que, de tão pequena a parcela genética adicionada, "não será parte do que nos faz o que somos geneticamente - não afeta altura, cor do olho, inteligência ou musicalidade".

No caso da americana Alana, ela nasceu no ano 2000 por meio de um tratamento chamado transferência citoplasmática.

Sua mãe, Sharon Saarinen, vinha tentando ter filhos havia dez anos, usando diversos métodos de fertilização in vitro, até que os médicos passaram a suspeitar que a infertilidade derivava de um problema genético na mitocôndria.

Os especialistas transferiram um pouco de citoplasma (contendo mitocôndria) de uma doadora ao óvulo de Sharon, depois fertilizado com o esperma do marido dela.

Outros dezessete bebês nasceram da mesma técnica na mesma clínica que tratou Sharon, sendo que alguns casos apresentaram problemas de saúde. Em 2002, porém, a FDA, agência reguladora de medicamentos e alimentos nos EUA, pediu a interrupção de transferências citoplasmáticas, por preocupações de segurança e ética.

Mas Sharon disse que, com a Alana, a técnica teve bons resultados. "Não poderia pedir por uma filha melhor. Ela é inteligente, bonita por dentro e por fora, adora matemática e ciência, vai muito bem na escola e me ajuda na casa... quando não está teclando (no celular)", contou à BBC no final do ano passado.

"Ela sempre foi saudável, nunca teve mais do que uma gripe comum, nenhum problema de saúde."



sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Dawkins diz que grávida deve abortar feto com síndrome de Down

Não tem jeito de esconder a "moral" ateísta, ela sempre se revela, como mostra essa notícia d'O Globo sobre a versão deles para a eugenia:

Richard Dawkins diz que "é imoral" uma mulher dar à luz um filho com síndrome de Down

Cientista afirma que toda mãe deve abortar assim que a deficiência do feto for diagnosticada

RIO - O biólogo britânico Richard Dawkins, um dos principais cientistas do mundo no estudo da evolução das espécies, tornou-se o centro de um caloroso debate sobre o aborto na internet. Ele utilizou sua conta no Twitter para afirmar que uma mulher, se estivesse grávida de um feto com síndrome de Down, "deveria abortar e tentar novamente. Seria imoral para trazê-lo para o mundo, se você tem a escolha"

Ateu declarado, Dawkins é autor de diversos livros, como "Gene egoísta" (1976) e "Deus, um delírio" (2006). Nesta quarta-feira, ele publicou no Twitter, para seus mais de 1 milhão de seguidores, o link de um artigo da revista liberal "New Republic" intitulado "A Igreja Católica prefere barbárie medieval ao aborto moderno". Ao publicar, Dawkins comentou: “a Irlanda é um país civilizado, exceto em uma área", referindo-se às conservadores leis irlandesas sobre aborto.

Foi o bastante para se iniciar, então, uma discussão sobre o tema. Dawkings recebeu uma saraivada de críticas de internautas. Em uma das respostas, o católico irlandês Aidan McCourt perguntou-lhe: “994 seres humanos com síndrome de Down deliberadamente mortos antes do nascimento na Inglaterra e no País de Gales em 2012. Isso que é civilizado?”.

Dawkins respondeu: "Sim, é muito civilizado. Esses são os fetos, diagnosticados antes que eles tenham sentimentos humanos”. Mais tarde, ele acrescentou: "Aprenda a pensar em formas não-essencialistas. A questão não é 'é humano', mas 'ele pode sofrer? '".

O debate se estendeu por toda a quarta-feira. Momentos depois da primeira declaração de Dawkins, outra internauta comentou afirmando que não saberia o que fazer se fosse informada que estaria grávida de uma criança com síndrome de Down, tachando a questão de um “dilema ético real”. Foi nesta ocasião que o biólogo retrucou em tom frio e seco: "Abortar e tente novamente. Seria imoral para trazê-lo para o mundo, se você tem a escolha".

PEDIDO DE DESCULPAS

Nesta quinta, no site da sua fundação, o biólogo se posicionou ao pedir desculpas pelo "frenesi" criado no feed da sua conta do Twitter. Após dar uma explicação sobre a síndrome, Dawkins afirma que geralmente os pais que cuidam de filhos com síndrome de Down formam fortes laços de afeto com eles, como fariam com qualquer criança, provavalmente tendo sido o que causou alguns dos tweets de ódio que recebeu.

Adiante no texto, ele afirma que quando a síndrome é detectada, "a maioria dos casais optam por aborto e a maioria dos médicos recomenda isso".

Em seguida, desenvolve o que teria dito para a mulher se tivesse mais do que 140 caracteres:

"Obviamente, a escolha seria sua. A quem interessar possa, minha escolha seria de abortar o feto com síndrome de Down e, assumindo que você quer ter um bebê, tentaria de novo. Tendo a chance de fazer um aborto cedo ou deliberadamente trazer a criança com Down no mundo, eu acho que a escolha moral e sensata seria abortar. E, de fato, isso é o que a grande maioria das mulheres, nos Estados Unidos e especialmente na Europa, fazem. Eu pessoalmente iria além e diria que, se sua moral é baseada, como a minha é, no desejo de aumentar a soma de felicidade e reduzir o sofrimento, a decisão de deliberadamente dar à luz o bebê com Down, quando você tem a chance de abortar no começo da gravidez, pode realmente ser imoral do ponto de vista do próprio bem estar da criança. Concordo que essa opinião pessoal é controversa e precisa ser mais discutida, possivelmente para ser afastada. Em todo caso, você provavelmente estaria condenando a si mesmo como mãe (ou como um casal) a uma vida de cuidar de um adulto com necessidades de criança. Seu filho vai provavelmente ter uma expectativa de vida curta, mas, se ele viver mais que você, você provavelmente vai ter que se preocupar com quem irá cuidar dele depois que você se for. Não me admira que a maioria das pessoas escolha aborto quando têm essa opção. Dito isso, a escolha seria inteiramente sua e eu nunca sonharia em tentar impor minha visão em você ou em qualquer outra pessoa."



terça-feira, 23 de abril de 2013

Darwin e o instinto moral

Alguns dias atrás (11/04/13), repercutimos aqui um artigo sobre o efeito Dunning-Kruger, que, no final, cita uma frase de Charles Darwin que abre o seu livro "A Descendência do Homem":"a ignorância gera confiança com mais frequência do que o conhecimento".

Já no domingo, dia 21/04/13, reproduzimos aqui uma matéria do mesmo jornal sobre o mais recente livro de Steven Pinker, "Os Anjos Bons da Nossa Natureza", que também fala sobre a diminuição da violência humana ao longo dos milênios.

Naquele mesmo dia 21 de abril, a Folha de S. Paulo trouxe uma resenha muito interessante de Carlos Alberto Dória sobre essa mesma obra esquecida de Darwin, "A Descendência do Homem", baseada na obra de Patrick Tort, "L'Effet Darwin: Séléction Naturelle et Naissance de la Civilisation" (Seuil, 2008).

No meio de tantas informações interessantes, não deixa de ser um tanto quanto, digamos, "patrioticamente" constrangedor, perceber como o contato de Darwin com o triste fenômeno da escravidão no Brasil do século XIX foi decisivo na formulação de seu pensamento.

Eis a íntegra do artigo:

Antropologia de Darwin: Os fundamentos materiais da moral

CARLOS ALBERTO DÓRIA

RESUMO "A Descendência do Homem" (1871), de Charles Darwin, foi praticamente ignorado em nome da ideia liberal de "guerra de todos contra todos". Releituras e pesquisas recentes em torno do livro revelam uma verdadeira teoria antropológica darwiniana que aponta para as raízes biológicas da moral.

Um dos casos mais intrigantes da epistemologia das ciências biólogicas é a quase absoluta ignorância que se seguiu à publicação de "A Descendência do Homem" (1871), de Charles Darwin.

Quase ninguém se deu conta de que a obra encerrava uma revolução no conhecimento, tão importante quanto "A Origem das Espécies" (1859).

Tão certos estavam os seguidores e detratores de Darwin de que se tratava de uma "continuação" ou "aplicação" da "Origem" à espécie humana, contestando a natureza divina do homem, que nem se deram ao trabalho de lê-la. Do mesmo modo, parte do trabalho --sobre o mecanismo da seleção sexual-- foi considerado um ensaio independente, sem conexão com a origem do homem. Passou em brancas nuvens esta que é considerada agora a "segunda revolução darwiniana".

A obra vale por não repetir argumentos da "Origem", constituindo uma verdadeira antropologia na qual se fundem as dimensões biológica e cultural, como nunca se vira antes e não se viu depois, pois as ciências humanas se desenvolveram de costas para a biologia e a cultura foi considerada algo além do mundo orgânico ("superorgânica") --isto é, a vida simbólica já aparece como plenamente constituída.

Essa antropologia só é possível porque Darwin não vê diferenças de natureza, e sim de grau, naquilo que une o homem às demais espécies animais. As habilidades, os instintos, a inteligência, a capacidade de comunicação (linguagem), os comportamentos são caracteres animais difundidos por infinitas espécies.

O impacto político dessa antropologia é enorme. Ao "animalizar" o homem e seus instintos mais "nobres", deixava a igreja falando sozinha, mesmo sem haver pensado a obra como um libelo antideísta. O livro mostra que os homens pertencem a uma espécie polimórfica, na qual todos são iguais, e as diferenças secundárias, como a cor da pele, foram desenvolvidas ao longo de milênios, através de escolhas estéticas de grupos humanos.

POLÍTICA

Mas por que Darwin escreveu esse livro, se as ciências humanas não eram seu foco de atenção? A razão foi de ordem política e humanitária, conforme hoje se sabe, graças ao estudo dos biógrafos de Darwin sobre suas anotações e diários (Adrian Desmond e James Moore, "Darwin's Sacred Cause: Race, Slavery and the Quest for Human Origins", Penguin Books, 2009).

Quando Darwin esteve no Brasil, horrorizou-se com a escravidão e, desde o distante ano de 1837, começou a reunir elementos para provar a origem comum e a igualdade entre os homens no plano biológico, de modo a sepultar as principais teses dos escravistas, com destaque para a tese da poligenia (tomando raças ou variedades como se fossem espécies "criadas" independentemente, segundo sugeria a leitura que faziam da Bíblia) com a qual "justificavam" o direito à escravizar seres aparentemente distintos.

Do ponto de vista historiográfico, a trajetória intelectual de Darwin também é surpreendente: uma obra sobre o homem, provando sua igualdade (monogenia), foi ideia anterior à concepção da seleção natural. Assim, se o estudo sobre a origem das espécies favoreceu sua compreensão sobre a animalidade do homem, ela contribuiu igualmente para o amadurecimento de sua antropologia.

A nova leitura esclarecedora de "A Descendência do Homem" deve-se ao trabalho de quase 20 anos do epistemólogo francês Patrick Tort, cujo livro "L'Effet Darwin: Séléction Naturelle et Naissance de la Civilisation" (Seuil, 2008) é síntese dessa trajetória persistente.

A primeira questão que Tort busca explicar é o desprezo pela antropologia de Darwin. E sua explicação é relativamente simples: a ideia de "luta pela vida" era extremamente conveniente para a economia política liberal; reforçava a noção de luta de "todos contra todos" e triunfo dos mais fortes, e os evolucionistas liberais, como Herbert Spencer, a ela se aferraram.

"A Descendência do Homem", ao contrário, é a obra na qual Darwin sofistica os mecanismos de seleção --faz até um mea-culpa por haver exagerado o papel da seleção natural-- introduzindo na história natural as noções cruciais da cooperação e "altruísmo".

Contudo, só nos países sem tradição de economia política liberal esses mecanismos de evolução foram percebidos e valorizados, como na Rússia czarista, resultando em algumas obras discrepantes em relação à interpretação dominante, como a de Peter Kropotkin, "Ajuda mútua: Um Fator de Evolução" (1888).

Em "A Descendência do Homem", Darwin mostra como esse animal surge da evolução de formas mais simples através da convergência fortuita de vários processos: a pedestrialização (quando o animal desce das árvores), o bipedismo, a encefalização (aumento do cérebro) e o desenvolvimento da linguagem simbólica. Mas não foram só as transformações físicas que Darwin captou. Ele indicou que, ao se desenvolver no plano social, criou-se uma ruptura com o processo anterior, no qual, por força de pressões ambientais, os animais se adaptavam mediante a transformação física milenar.

O Homo sapiens já não se transforma fisicamente, mas age sobre o ambiente, adaptando-o às suas necessidades (produz vestimentas, habitação etc.). Do mesmo modo, o instinto animal evolui e aprofunda seu caráter social, impondo formas cooperativas, tornando-o um animal social bastante sofisticado, capaz de várias ações altruístas.

Mas por que o altruísmo? Não se trata da manifestação de uma "essência humana", fruto de um sopro divino, mas de uma necessidade material da vida. O instinto social é característica de várias espécies --como as abelhas, as formigas e vários mamíferos superiores. Através dele, a reprodução do grupo entra em causa, condicionando as ações e escolhas individuais.

NOVO PERCURSO

No homem, desde a divisão de trabalho entre macho e fêmea para cuidar da cria (longamente inabilitada para, sozinha, prover a vida) até o desenvolvimento das instituições sociais, como a ciência ou a medicina, um novo percurso evolutivo se instaura quando crianças, velhos e indivíduos menos aptos são protegidos, em vez de eliminados.

Uma seleção natural de instintos e comportamentos antieliminatórios (ou "antisselecionistas") vai tomando corpo e reprimindo as ações eliminatórias.

O resultado cego desse longo processo é a civilização, isto é, a repressão sistemática da "lei do mais forte" na medida em que padrões encontram formas de se impor ao grupo e se sobrepor aos do indivíduo. Tort verá nesse mecanismo a "reversão da seleção natural", ou o nascimento da civilização sem ruptura com a dimensão biológica da vida. Em outras palavras, a base material, natural, da moral.

"A Descendência do Homem" traz uma segunda parte, sobre a "seleção sexual". Nela, o cientista inglês mostra justamente a necessidade do altruísmo --a capacidade de dar a vida por outros membros da espécie-- como fator de evolução. Por que em certas espécies, notadamente de aves, o macho é muito mais belo e exuberante que as fêmeas? Simplesmente porque, ao se desenvolverem dessa forma, eles têm mais chances de serem "escolhidos" pelas fêmeas e criarem descendência. Mas o pavão, por exemplo, ao desenvolver sua beleza perde a capacidade de voar, ficando à mercê dos predadores. Essa inabilitação adquirida só se explica pelo "altruísmo": correr riscos, o autossacrifício em nome do outro, da descendência.

Por esse mecanismo da seleção sexual, o homem também terá capacidade de alterar seus caracteres secundários. Sendo espécie polimórfica, variará na cor da pele e outros traços físicos exteriores ao perseguir padrões de beleza restritos a cada grupo humano isolado. O "belo ideal" é um conceito social que se materializa nos indivíduos que ocupam a chefia do grupo, nas mulheres que utilizam adornos, nas estátuas que representam os deuses e assim por diante.

Esses padrões se tornam dominantes na medida em que passam a intervir nas escolhas matrimoniais e, por esse processo, disseminam-se pelo grupo. Nada disso precisa ser consciente para agir sobre o homem, como o instinto não é consciente no animal.

Caminhos como esse mostram, mais de um século depois, a dimensão insuspeitada de uma obra que parecia "caduca" aos olhos das ciências naturais e ciências humanas. Trata-se de um clássico que, finalmente, impõe sua grandeza intelectual.



sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Decisão judicial manda esterilizar deficiente mental

E quando você achava que a eugenia nazista era um fantasma preso num irrepetível passado remoto, eis que vem uma notícia do Estadão para te deixar boquiaberto. O horror, ah, o horror...:

Defensoria tenta reverter decisão de esterilizar mulher com deficiência

WILLIAM CARDOSO

A Defensoria Pública tenta reverter uma decisão judicial que determinou a realização de laqueadura em uma mulher de 27 anos, sem filhos, moradora de Amparo, no interior paulista. A sentença, de 2004, da juíza Daniela Faria Romano, veio após uma ação protetiva do Ministério Público Estadual, que levou em consideração o perfil socioeconômico e o fato de a mulher sofrer retardamento mental moderado para pedir a esterilização. Atualmente, ela tem namorado fixo. E sempre manifestou o desejo de, um dia, ser mãe.

Desde que foi alvo da decisão judicial, a mulher se submeteu a um tratamento contraceptivo, tomando injeções e usando um dispositivo intrauterino (DIU) para evitar a gravidez. Foi a forma encontrada para evitar a cirurgia. O DIU venceu no ano passado e a paciente se recusou a substituí-lo, por temer que seja feita a laqueadura durante o procedimento.

Diante da recusa da paciente em substituir o DIU, a juíza Fabiola Brito do Amaral, que cuida atualmente do caso, determinou em outubro que fosse cumprida a sentença de 2004. A laqueadura estava prevista para o dia 21 de dezembro, mas a mulher não foi encontrada, porque se escondeu em outra cidade, por temer que a encontrassem e fizessem a cirurgia que a impediria de se tornar mãe. Uma nova data será marcada para o procedimento.

Em 2004, não houve recurso e a decisão já transitou em julgado, dificultando qualquer manobra jurídica para contestá-la. Mesmo assim, a Defensoria Pública considerou absurda a sentença e apontou que ela contraria a Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência, da Organização das Nações Unidas (ONU).

"Ela é capaz segundo a lei e, mesmo que não fosse, os incapazes têm direito às escolhas existenciais de suas vidas. A esterilização sem critério não encontra fundamento. Na realidade, faz relembrar medidas drásticas de épocas não democráticas. Esterilização por pobreza ou por deficiência mental moderada não deve acontecer. Desrespeita a lei do planejamento familiar", disse a coordenadora assistente do Núcleo de Direitos Humanos, Daniela Skromov.

A defensora pretende acionar a Justiça em Amparo formalmente, por meio de uma petição, na tentativa de reverter a decisão que, na prática, condenou a mulher à esterilidade. "Isso ofende a dignidade da pessoa, ainda mais por ela não ter um filho e manifestar o claro desejo de algum dia tê-lo. Ter filho não é privilégio dos normais, senão se parte para a eugenia."

No decorrer do processo, a mulher demonstrou angústia, ansiedade e medo de passar pela esterilização, contra a qual se manifestou todas as vezes em que foi questionada pela Justiça. Ainda em 2004, ela disse que "mais para a frente", quando arrumasse um "namorado bom", pretendia ter um filho. Também afirmou que não era "uma cachorra para ser castrada". Parentes da mulher afirmaram que ela sempre teve uma disposição natural para cuidar de crianças.

Justiça. Promotor que responde atualmente pelo caso, Rafael Belucci afirmou que precisa saber em que circunstância se deu a decisão na época e que não tinha os detalhes do processo no momento. "Existem novos documentos que foram juntados pela equipe de saúde do município que vão ser analisados para saber da real necessidade da aplicação dessa medida."

O Tribunal de Justiça de São Paulo informou que as magistradas responsáveis pelo caso estão legalmente impedidas de se manifestar, pelo fato de o processo "tratar de interesse de incapaz e de dignidade humana, com trâmite em segredo de Justiça". Segundo o TJ, a magistrada que assumiu o processo atualmente "está apenas procurando cumprir a decisão judicial com trânsito em julgado referente à proteção da incapaz".



segunda-feira, 16 de julho de 2012

Eugenia universal

Segundo a Wikipedia, eugenia é um termo cunhado em 1883 por Francis Galton (1822-1911), significando "bem nascido". Galton definiu eugenia como "o estudo dos agentes sob o controle social que podem melhorar ou empobrecer as qualidades raciais das futuras gerações seja física ou mentalmente".

Esta aberração, digamos, "sociológico-genética", teve muita repercussão na virada do século XIX para o XX, mas atingiu seu ápice no regime nazista de Hitler na Alemanha (1933-1945), quando leis e experiências científicas macabras, desenvolvidas sobretudo contra e com os judeus, macularam a história da humanidade para sempre.

No último dia 13 de julho, Edir Macedo publicou um artigo que, de tão nojento, nem merece ser transcrito aqui (basta acessar a Arca Universal para ter o desgosto de lê-lo - na verdade - depois da péssima repercussão - já tiraram do site, mas você pode lê-lo clicando aqui), em que dá uma maquiada e ressuscita as bases da eugenia para a sua organização.

Basicamente, o prócer da universal defende que os homens não se casem com mulheres que sejam mais velhas (de dois anos para cima), e que os casais sejam da mesma "raça" (quando o correto seria dizer "etnia"), para evitar problemas de racismo especialmente para os filhos.

Edir Macedo chega a dizer o seguinte:
O homem de Deus não pode simplesmente dizer: "Ela tem o Espírito de Deus e eu também. Nós nos amamos e vamos nos casar". Não! Não deve ser apenas isto! Ele tem o futuro totalmente comprometido com uma missão de extrema importância, e não pode ser limitado. É preciso que haja uma avaliação esmerada quanto aos passos no presente.
Conforme você percebe, na hierarquia particular do líder da universal, o Espírito Santo lhe deve obediência.

Como tudo na universal deve ser analisado sob a ótica econômica, é muito provável que eles estejam tendo prejuízos em razão dessas situações que seu bispo-mór agora combate.

Curioso, por exemplo, que ninguém fala nada sobre mulheres se casarem com homens mais velhos.

As últimas investidas de Edir Macedo apenas comprovam a tese de quem defende que certos comportamentos bizarros e hipócritas, quando reprimidos e dissimulados por muito tempo, terminam virando aberrações.

Aberrações tão nojentas que eles nem percebem o absurdo do que pregam.



quarta-feira, 15 de junho de 2011

Como eugenia nazista e tabus sexuais se mesclaram nos EUA até 1979


Esta notícia da BBC Brasil - de arrepiar os cabelos e envergonhar a humanidade - mostra que os ideais nazistas de pureza racial não morreram com o fim da Segunda Guerra Mundial. Pelo contrário, duraram muito tempo ainda bem longe da Alemanha, mais exatamente nos Estados Unidos, numa mescla macabra da eugenia à la Josef Mengele com puritanismo religioso da pior espécie. Em uma só palavra: racismo "puro", que deve ser sempre lembrado e repudiado para que jamais se repita.

Americanos esterilizados em programa de eugenia lutam por indenização do Estado

Daniel Nasaw
Da BBC News, Washington


Em 1968, nos Estados Unidos, Elaine Riddick foi violentada por um vizinho que ameaçou matá-la se ela relatasse o ocorrido a alguém.

Criada em ambiente cercado de abusos, filha de pais violentos, na empobrecida cidadezinha de Winfall, na Carolina do Norte, a adolescente tinha 13 anos de idade.

Nove meses mais tarde, quando estava no hospital, dando à luz uma criança - fruto do crime de que tinha sido vítima - Riddick foi violentada pela segunda vez, agora pelo Estado - ela diz.

Uma assistente social que a tinha declarado "mentalmente fraca" pediu ao Eugenics Board - órgão americano encarregado de implementar no país as ideologias da Eugenia - que esterilizasse a adolescente.

Hoje tida como uma falsa ciência, a Eugenia foi um dos pilares do Nazismo na Alemanha e chegou a ser considerada um ramo respeitável das Ciências Sociais.

O termo quer dizer "bom nascimento" e foi criado em 1883 pelo britânico Francis Galton. A ideologia propunha o estudo de agentes capazes de melhorar ou empobrecer as características raciais de gerações futuras, física ou mentalmente.

Mais de 60 mil americanos foram esterilizados, muitos contra a vontade, como parte de um programa que terminou em 1979. Seu objetivo, na prática, era impedir que pobres e deficientes mentais procriassem.

Décadas mais tarde, um Estado americano - a Carolina do Norte - está considerando indenizar as vítimas.

Coerção

As autoridades da Carolina do Norte forçaram a avó de Riddick a escrever um "x" no formulário de autorização. Após fazer o parto do bebê por cesariana, os médicos esterilizaram Riddick.

"Mataram meus filhos", ela diz. "Mataram os meus antes de chegarem", diz Riddick, que sofreu décadas de depressão e outras doenças, e hoje tem 57 anos.

Quase 40 anos após a última pessoa ter sido esterilizada como parte do programa de Eugenia da Carolina do Norte, o Estado criou um grupo de trabalho para tentar localizar as 2.900 vítimas que, estima-se, ainda estariam vivas.

O grupo espera reunir as histórias pessoais das vítimas e recomendar ao Estado que lhes ofereça alguma forma de indenização. Entretanto, com as finanças públicas sob pressão, não está claro se o Legislativo vai concordar.

"Sei que não posso corrigir (a injustiça) mas ao menos posso reconhecê-la", disse o deputado estadual Larry Womble.

Ele espera "contar ao mundo que coisa horrenda o governo fez com jovens meninos e meninas".

O movimento de esterilização nos Estados Unidos foi parte de um amplo esforço para "limpar" a população do país de características considerados indesejadas.

Entre as políticas adotadas estavam evitar a mistura de raças e o estabelecimento de cotas de imigração rigorosas para europeus do leste, judeus e italianos.

Um total de 32 Estados americanos aprovaram leis permitindo que as autoridades esterilizassem pessoas consideradas não aptas a procriar, começando com a Indiana, em 1907. O último programa terminou em 1979.

As vítimas foram criminosos e jovens delinquentes, homossexuais, mulheres de tendências sexuais tidas como "anormais", pessoas pobres recebendo ajuda do Estado, epiléticos ou pessoas com problemas mentais.

Em alguns Estados, as grandes vítimas do programa foram populações de origem africana e hispânica.

Puritanismo

Segundo historiadores, as esterilizações, aparentemente feitas com o "consentimento" de vítimas e familiares, aconteciam, na prática, à base de coerção.

Camponeses analfabetos recebiam formulários para assinar, detentos eram advertidos de que não seriam libertados com seus corpos intactos, pais pobres eram ameaçados de perder assistência pública se não aprovassem a esterilização de filhas "depravadas".

Entre alguns dos pedidos de esterilização recebidos pelo Eugenics Board em outubro de1950 estavam:

Uma jovem de 18 anos, separada do marido, que tinha "comportamento anti-social"
Uma vítima de estupro, negra, com 25 anos, que apresentava "tendências sexuais anormais"

Uma menina de 16 anos que tinha sido enviada para uma instituição do Estado por "delinquência sexual" e cuja tia havia dado "assinatura de consentimento"
Uma mulher branca, casada, com três filhos, cuja família havia dependido do Estado por muitos anos, e que tinha um "histórico de casamentos com índios e negros".

Segundo o historiador e especialista em leis Paul Lombardo, da Georgia State University, a motivação por trás das medidas era a indignação com a ideia de que pessoas que haviam desrespeitado códigos de conduta sexual acabariam precisando de assistência pública.

"Nesse país, sempre fomos muito sensíveis a noções de histórias públicas de sexualidade inapropriada", disse.

"É nossa formação puritana entrando em conflito com nosso senso de individualismo".

Os programas de esterilização também se baseavam em critérios raciais.
Segundo Lombardo, o discurso era: "Quanto menos bebês negros tivermos, melhor. Vão todos acabar dependendo de ajuda do Estado".

Carolina do Norte

Embora os especialistas calculem que milhares em vários Estados americanos tenham sido esterilizados como parte do programa no século 20, a Carolina do Norte se destacou por sua eficiência em implementar as medidas.

A maioria dos Estados promoveu esterilizações de detentos e pacientes em prisões e outras instituições.

Na Carolina do Norte, no entanto, assistentes sociais atuando na comunidade podiam fazer petições ao Estado para que indivíduos fossem incluídos no programa.

As autoridades de saúde calculam que dos 1.110 homens e 6.418 mulheres esterilizados na Carolina do Norte entre 1929 e 1974, cerca de 2.900 estejam vivos.

Hoje, vários Estados examinaram seu passado e fizeram pedidos oficiais de desculpas. No caso da Carolina do Norte, isso ocorreu em 2003. Mas alguns no Estado querem que o processo vá mais além.

O deputado estadual Larry Womble continua a fazer campanha por indenização monetária para as vítimas.

Com a crise nas finanças públicas, no entanto, há poucas chances de que legisladores aprovem um pedido de US$ 58 milhões em indenizações - US$ 20 mil para cada vítima.

Uma das pessoas envolvidas na campanha é Charmaine Cooper, diretora-executiva do grupo de trabalho Justice for Sterilization Victims Task Force, criado pelo Estado.

"Minha esperança é de que o Estado reconheça que nunca haverá um bom momento para indenizações".

Entre as vítimas que deverão prestar depoimento está Riddick, que hoje vive em Atlanta. Para ela, a perspectiva de uma indenização de US$ 20 mil é um insulto.

"Deus disse, sejam fecundos, multipliquem-se. Eles não pecaram apenas contra mim, pecaram contra Deus".

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