quarta-feira, 9 de abril de 2008

Carta aos Romanos - 19

Continuando a escrever aos romanos, no capítulo 16, Paulo passa às saudações, recomendações e despedidas pessoais, mostrando que havia muitas pessoas que o ligavam, de alguma maneira, à igreja de Roma. Febe (v. 1) era uma mulher de nome grego, o que a caracteriza provavelmente como gentia, muito valiosa ao evangelho e querida à igreja, e tudo indica que tenha sido a portadora da carta aos romanos. Servia à época na igreja de Cencréia, que era o porto que servia a Corinto, indicando que Paulo estava nesta cidade quando escreveu a carta. Priscila e Áquila (v. 2) talvez sejam as pessoas mais conhecidas deste capítulo. Era um casal de fabricantes de tendas, como Paulo (Atos 18:1-3) e tinham encontrado com ele em Corinto após terem sido expulsos de Roma por um decreto do imperador Cláudio (do ano 41 ao 54) que banira os judeus. Depois de acompanharem Paulo a Éfeso (Atos 18:18), foram os responsáveis pelo discipulado de Apolo, "expondo-lhe com mais precisão o caminho de Deus"(Atos 18:24-26). Por isso, Paulo os chama de "meus cooperadores em Cristo Jesus, os quais pela minha vida arriscaram a sua própria cabeça" (v. 4). Na época desta carta, eles já haviam retornado a Roma e havia uma igreja que se reunia na casa deles (v. 5). Isto mostra que, no início do cristianismo, não havia templos ou locais especialmente dedicados à adoração coletiva, mas que os irmãos se reuniam em casas. Epêneto (v. 5), chamado de "primícia da Ásia para Cristo" era, provavelmente, um dos primeiros convertidos naquela região, e que agora estava em Roma. Quanto a Maria (v. 6), pouco se sabe, além de ter sido uma mulher muito importante na igreja primitiva de Roma. Quanto a Andrônico e Júnias (v. 7), Paulo os chama de "meus parentes", provavelmente por serem judeus e pertencerem à mesma tribo, de Benjamin. Foram também seus "companheiros de prisão". Houve durante longo tempo uma polêmica sobre se eram um casal, e se Júnias era um nome feminino, já que Paulo os chama de "notáveis entre os apóstolos". A questão hoje está pacificada no sentido de que Júnias era efetivamente uma mulher:

As feministas cristãs contestam o modo como a Bíblia foi traduzida e interpretada. Elas realizaram suas próprias pesquisas históricas para mostrar um quadro diferente de como o mundo se apresentava no período da Igreja primitiva e construíram teologias cristãs feministas. É só nos últimos trinta anos que as mulheres estudam as línguas das Escrituras (hebraico, grego e aramaico). Com esses instrumentos, hoje elas podem ler os textos nas línguas originais e oferecer traduções e interpretações diferentes das disponíveis à tradição. Por exemplo, Bernadette J. Brooten constatou que o nome de uma das pessoas saudadas em Rm 16,7 não é Júnias, mas Júnia. Isso significa que a tradução dessa passagem mudou. Na tradução RSV* da Bíblia, lemos "Saudai Andrônico e Júnias, meus parentes e companheiros de prisão, os quais são muito estimados entre os apóstolos e se tornaram discípulos de Cristo antes de mim". A tradução NRSV** da passagem diz, "Saudai Andrônico e Júnia, meus parentes e companheiros de prisão, apóstolos exímios que me precederam na fé em Cristo". A redação da RSV indica que todos os participantes são homens. Brooten descobriu que essa alteração foi feita na Idade Média, uma vez que os primeiros manuscritos e traduções mencionam Júnia ou Júlia, mas se referem claramente a essa pessoa como mulher. Brooten pesquisou a história do nome Júnias para ver se aparecia com alguma regularidade como nome de homem e não encontrou nenhuma outra ocorrência do seu uso, enquanto Júnia era nome comum para mulher. As provas foram suficientemente cabais para convencer os tradutores da NRSV que o nome devia ser mudado. Na tradução mais recente, Júnia é mulher e é mencionada com Andrônico como "apóstolos exímios". Levar uma perspectiva feminista a este texto significava não presumir que somente homens podiam ser apóstolos, caso em que o nome deve identificar um homem, mas que se deve estar aberto à possibilidade de que também mulheres podiam ser apóstolos.

LORENZEN, Lynne Faber. Introdução à Trindade. Ed. Paulus, 2002, pp. 97-98

*RSV = versão inglesa da Bíblia, "Revised Standard Version", Novo Testamento publicado pela 1ª vez em 1946
** NRSV = versão inglesa da Bíblia, "New Revised Standard Version", lançada em 1989

Nas versões em português, as traduções de Romanos 16:7 mantêm o nome Júnias:

1) Almeida Revista e Corrigida:

Saudai a Andrônico e a Júnias, meus parentes e meus companheiros na prisão, os quais se distinguiram entre os apóstolos e que foram antes de mim em Cristo.

2) Almeida Revista e Atualizada:

Saudai a Andrônico e a Júnias, meus parentes e meus companheiros de prisão, os quais são bem conceituados entre os apóstolos, e que estavam em Cristo antes de mim.

3) Nova Versão Internacional:

Saúdem Andrônico e Júnias, meus parentes que estiveram na prisão comigo. São notáveis entre os apóstolos, e estavam em Cristo antes de mim.
4) Bíblia do Peregrino:

Saudações a Andrônico e Júnia, meus patrícios e companheiros de prisão, que sobressaem entre os apóstolos e foram cristãos antes de mim.

5) Bíblia de Jerusalém:

Saudai Andrônico e Júnia, meus parentes e companheiros de prisão, apóstolos exímios que me precederam na fé em Cristo.

Por "apóstolos" aqui devem ser entendidas não os doze diretamente ligados a Jesus, mas as pessoas proeminentes que exerciam algum tipo de liderança espiritual profundamente reconhecida pelas primeiras comunidades cristãs.

Supõe-se que Amplíato (v. 8) era, provavelmente, um escravo cujo nome aparece em uma lápide na catacumba de Domitila, sobrinha do imperador Domiciano (do ano 81 ao 96). Há uma corrente minoritária que o identifica como Amplias, que posteriormente foi bispo de Odessa, na Moésia, uma província romana onde hoje é o território da Sérvia. Urbano ("cooperador em Cristo") e Estáquis (v. 9) eram nomes comuns a escravos, sendo o primeiro tipicamente romano e o segundo, grego, havendo quem associe Urbano a um bispo da Macedônia nos anos seguintes e Estáquis a um bispo de Bizâncio ordenado pelo próprio apóstolo André. Apeles (v. 10) foi confundido com Apolo por Orígenes, mas se realmente fosse Apolo, Paulo certamente teria falado mais a respeito dele, como fez com os coríntios (1 Cor 3). Suspeita-se que tenha sido posteriormente bispo em Esmirna, mas não há nenhuma evidência conclusiva a respeito. Aristóbulo, cuja casa (família) merece saudação coletiva de Paulo, era um nome comum a gentios gregos, tendo havido um Aristóbulo judeu, entretanto, que tinha servido como mestre de Ptolomeu em Alexandria, mas não há pistas de quem realmente tenha sido. Herodião (v. 11) talvez tenha sido parente ou servido a Herodes, de onde lhe viria o nome, mas é geralmente tido como um dos setenta discípulos enviados por Jesus a pregar o evangelho (Lucas 10) e que posteriormente se tornou bispo de Tarso. A seguir, Paulo saúda a casa de Narciso, que muitos imaginam ter sido o ajudante do imperador Cláudio, o César que havia sido forçado por Agripina, mãe de Nero (enteado de Cláudio) a cometer suicídio. Provavelmente Narciso já estivesse morto ou tinha fugido, razão pela qual Paulo, sabedor da sua importância na história de Roma àquela época, saúda a sua família.
(continua)

Um comentário:

  1. Adoro passear aqui, me encontro.Seus textos são ótimos de se ler, ainda conto a história de Herodes. Hoje fiz uma nova postagem, se tiveres um tempo, dá uma passadinha por lá. Um abraço, e obrigada por me manter com cultura suficiente.

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