O contorno das sombrasPonto de vista alternativo, 3 de setembro de 2051, 00:00A noite sem lua mergulhava as ruas em completa escuridão. A chuva, que castigava a cidade, impedia que seus moradores saíssem, transformando aquela cidade em um completo vazio. Esta era a noite perfeita para sair sem ser visto, para falar sobre o que não pode ser ouvido. Fazer pactos que não podem ser conhecidos.
Em algum lugar da cidade, um galpão que deveria estar abandonado, agora abrigava 11 vultos. Aguardavam em silêncio, reunidos em um círculo. Intencionalmente, não havia luz. Havia escuridão, havia tensão. O silêncio foi quebrado apenas quando o 12º vulto apareceu de uma das portas e se juntou aos 11 originais.
- Vejo que todos estão aqui. – disse.
- Sim, acabamos de chegar também. – disse um dos vultos.
- Então podemos começar nossa primeira reunião, cavalheiros. Creio que todos já sabem os motivos para a convocação. Como estão os números?
- Segundo relatórios, já são 60% de desassociados. Eu diria que estes números são preocupantes, se continuarem aumentando assim. – comentou outro vulto.
- Sim, mas no momento, não há nada que possamos fazer sobre isto.
- Por quê, Moshe? – perguntou um dos vultos.
O vulto que se intitulava Moshe, parou por um instante, refletindo sobre sua resposta. Então continuou:
- Cavalheiros, não seria bom tentar desfazer o que já foi feito agora... Os fiéis ficariam chocados se isto fosse feito...
Um dos vultos que escutava, escorado em uma das paredes, deu uma pequena risada sarcástica, comentando em seguida:
- Ora, foi exatamente para isto que a doutrina de novas luzes foi criada... enquanto esta doutrina existir, a disputa pelo poder ficará mascarada por uma correção divina...
- Sim, Eliyahu, mas não podemos esquecer que esta doutrina só é bem sucedida, quando aplicada a longo prazo. E com certeza, não teremos estas condições agora...
- Hummm, entendo onde você quer chegar... Então, este é o motivo de nossa reunião, não é?
- Sim...
Houve um breve silêncio, até que o outro vulto chamado de Eliyahu retomou a discussão:
- Bem, acredito que será bem mais fácil pegar uma pessoa, do que todo o Corpo Governante...
- Não contaria com isto. – respondeu Moshe.
- Hummm... qual seria a dificuldade?
- Bem, o jovem que estamos falando foi capaz de planejar uma forma de controlar todo o Corpo Governante, e está conseguindo, com sucesso, acabar com a Torre de Vigia. Ele é bem habilidoso, não acha?
- Entendo... Então foi por isto que me pediu para buscar informações sobre ele... – comentou outro dos vultos.
- Sim, Yekhezqe'l... Como está nosso detetive?
- Ainda buscando informações... Teremos dados importantes em breve...
- Muito bom. Enquanto isto, Yeshayahu, vamos colocar algumas testemunhas para vigiá-lo...
- Tudo bem... Mas, o quê diremos a eles, Moshe?
- Diga que são ordens do Corpo Governante, que é um chamado especial, e que é para manter isto em segredo. Diga também que a questão é tão sigilosa, que não poderão saber os motivos pelos quais estão sendo chamados para vigiar tal pessoa. E mais uma coisa: peça para eles não deixarem que ele descubra. Ele não pode sonhar que está sendo vigiado... Ele é esperto, e pode chegar até nós, se quiser...
- E se eles continuarem perguntando?
- Dispense eles do serviço de campo, e lhes dê uma boa quantidade de horas. Eles acharão isto o máximo.
- Este rapaz não estaria disposto a vir para nosso lado? – perguntou mais um vulto.
- Não acho que seria possível, Yona... Pelo que sei, ele andou se tornando uma espécie de idealista, do pior tipo. Pessoas como ele não estão interessadas no poder... Ele podia ter visto desde o princípio, que possuía em mãos o controle total sobre um grande número de pessoas. Um controle que foi habilmente construído durante anos. Eu tenho que elogiar nosso caro Juiz Rutherford, ele é um gênio. Ele pegou um grupo de pessoas idealistas e inocentes, e transformou aquilo em um instrumento perfeito de controle. Quando ele colocou a Torre de Vigia como único canal de comunicação com Deus, ele simplesmente fez com que todos os questionamentos teológicos tivessem que passar por sua aprovação. Assim, até mesmo para se questionar a Torre de Vigia, era necessário sua permissão. Nem mesmo o papa conseguiu tanto sucesso, embora eles tenham o mesmo tipo de ensino. Se os católicos não tivessem tanta liberdade como possuem hoje, certamente nosso alvo seria o Vaticano. Talvez algum dia, se os tradicionalistas conseguirem derrubar o Concílio Vaticano II, as condições na igreja Católica permitam um domínio tal qual a Torre possui. Por isto é importante para a Torre fechar-se ao mundo. A igreja Católica se abriu um pouco, e tudo foi buraco abaixo...
- Sim, mas agora isto pode ser perdido, se não impedirmos aquele garoto.
- Sim... E vamos impedí-lo... Este é o primeiro passo. Temos que neutralizá-lo. Mandaremos as testemunhas de Jeová vigiarem ele. Ele deve cometer algum deslize... E quando cometer...
Fez-se por algum tempo, silêncio na sala... Por fim, Moshe disse em tom solene:
- Cavalheiros, por hoje é só. Quando Yekhezqe'l obtiver mais dados sobre nosso objeto, voltaremos a nos reunir.
Um a um, cada um dos 12 foram se afastando. O último a sair foi aquele que chegou por último. Lentamente se deslocando para a porta, sussurrou suas últimas palavras...
- Em breve, Juiz, retomaremos seus passos...
A chuva caia mais forte lá fora, escondendo em cumplicidade aqueles 12 homens...
3 de setembro de 2051, 10:00Para compensar as traquinagens do sábado, decidi que eu merecia dormir até mais tarde aquele dia... Foi bom assim, pelo menos eu estava com mais disposição para as viagem daquele dia.
Tomei logo meu café, peguei minhas coisas e saí. Havia muita coisa para se fazer ainda. O ônibus demorou um pouquinho, como era costume nos domingos.
Estava novamente mergulhado em meus pensamentos, e sobre o que eu iria dizer... Eu estava para fazer algo totalmente diferente do que já havia feito até aquele momento. Certamente se eu contasse o que eu faria para o Estêvão, ele iria me reprovar. Por isto não mencionei nada a ele.
Em certo ponto, o ônibus parou para pegar os passageiros. Eu observava aquelas figuras, indo para seus trabalhos, passeios... Mas uma delas chamou mais atenção: um rapaz, de uns 27 anos mais ou menos, vestido de terno, levando uma pastinha. Com o cabelo penteado como se uma vaca tivesse lambido, e com um ar celestial. Pensei: “Droga, uma testemunha de Jeová... Fui encontrado...”. Disfarcei o máximo que pude, mas ele não pareceu me reconhecer.
Chegando no centro, na avenida Tocantins, desci em meu ponto. Pelo visto ele não tinha me reconhecido. Desci a avenida até a Anhanguera, para pegar o eixo. Mas algo me incomodava... Decidi olhar para trás, e eis que vejo novamente o mesmo jovem. Rapidamente ele começou a falar com a pessoa mais próxima dele, que levou um susto. Pelo canto do olho pude ver ainda ele pegando de sua pequena pastinha, uma Sentinela... “É mesmo uma testemunha de Jeová”, pensei. Mas por que estaria me seguindo, sem ao menos vir me puxar o saco? Toda testemunha de Jeová gosta de cumprimentar seus superiores...
Tudo aquilo era muito estranho para mim... E não estava disposto a ser seguido por uma testemunha. Felizmente, na esquina da Tocantins com a Araguaia, havia uma cigana, que me entregou um folheto, e me perguntou:
- Senhor, gostaria que eu lesse sua mão? Quer saber seu futuro?
Olhei para ela por um instante, e logo a respondi.
- Bem, minha senhora, eu realmente não posso. Mas vou te contar um segredo. Logo passará por aqui um jovem de terno e com uma pasta na mão. Ele está se fazendo passar por testemunha de Jeová, por que ele quer encontrar uma pessoa que consiga convencê-lo a fazer algo contra a vontade dele. Sabe, estes ricaços excêntricos inventam cada uma... Eu tentei por cerca de meia hora convencê-lo a passar o Natal lá em casa, e ele se manteve em sua posição...
Ela me olhou com uma cara de espanto.
- Mas, moço, o quê acontece se eu convencê-lo?
- Bem, aquela pasta dele está cheia de dinheiro. Alguém me disse que ele juntou o que podia dentro dela, e vai oferecer para aquele que o convencer. É por isto que ele vai negar até a morte que não é testemunha de Jeová, e não vai aceitar ser convencido do contrário...
Seus olhos arregalaram ainda mais... Deixei a mulher para trás, e entrei no pequeno terminal de ônibus. Logo, o rapaz veio atrás, mas foi abordado pela cigana.
O terminal tinha uma visão privilegiada daquela cena. A velha ficou na frente do rapaz, dizendo várias coisas. O rapaz tentava educadamente se livrar dela, e como não conseguia nada, se colocou para orar na frente dela. A velha, percebendo que sua conversa não estava surtindo resultados, segurou a mão do rapaz, que se assustou, gritando:
- MINHA SENHORA, LARGUE MINHA MÃO AGORA. EU NÃO QUERO SABER DE LEITURA DE MÃO, PREVISÃO DO FUTURO. NADA!!! ISTO É COISA DE SATANÁS, O DIABO!!!!
Vendo que não tinha jeito mesmo, a mulher começou a dizer:
- Bem, já que é assim, eu acho que vou começar então a ler suas revistas...
Então com um pulo, pegou a pasta do rapaz e saiu correndo. Logo se via uma cena de perseguição, uma velha correndo como um velocista, e o jovem quase sem fôlego, gritando:
- PEGA ESTA SENHORA, ELA ROUBOU MINHA PASTA!!!
As pessoas observavam aquela cena grotesca, enquanto comentavam:
- Puxa, ela está em forma, hein!!
Não pude ver o resto, pois o meu ônibus tinha chegado. Entrei no eixo Anhanguera, e logo achei um lugar, perto da porta. Ainda estava pensando sobre aquele fato, quando o ônibus parou no próximo ponto, onde dois jovens bem arrumados entraram pela porta que eu estava. Usavam camisa, calça social e sapato de couro.
- Então, vamos marcar uma festa para esta noitinha? – conversavam.
Droga, me encontraram novamente!!! E não vieram falar comigo... Alguma coisa estava acontecendo... Será que eles não tinham serviço de campo a cumprir não? Por quê estavam me seguindo? Quem estava mandando eles fazer aquilo? Ainda não tinha respostas para aquilo. Mas não poderia deixá-los ver que eu havia percebido que estavam me seguindo. Primeiro, por que não queria dar satisfações para ninguém de onde eu estava indo. Segundo, por que se eu os alertasse, faria com que eles tomassem mais cuidado. Eu posso descobrir depois quem estava mandando me seguir.
Fiquei refletindo sobre aquilo até chegarmos ao terminal da praça da Bíblia. Decidi descer por ali, e não fiquei surpreso de ver aqueles dois me seguirem. Saí do terminal, e atravessei a rua, na frente de um ônibus, o que obrigou os dois a esperarem do outro lado. Ruim para eles, já que comecei a correr em seguida.
Percebendo o que eu estava fazendo, eles começaram a correr também. Eu não sou um atleta, então teria que fazer algo, e rápido. Peguei meu celular e disquei 190.
- Alô, eu preciso de ajuda, por favor.
- O que aconteceu, senhor?
- Estou sendo perseguido por dois homens bem vestidos, se não me engano, acho que vi uma arma na cintura de um deles.
- Onde o senhor está? – disse o policial.
- Estou na praça da Bíblia.
Se eu fosse católico, certamente faria uma oração a santo Expedito para que os policiais aparecessem antes que eu perdesse o fôlego. Como não era, resolvi garantir minha segurança...
- O senhores virão logo? Antes de ser perseguido, aqueles dois estavam falando o quanto os policiais desta área são lerdos e bundões.
Em um minuto a viatura da polícia parou na frente dos dois jovens. Dois policiais irados saíram do carro, apontando suas armas e gritando:
- PARADOS, POLÍCIA!! PARA O CHÃO, AGORA!!
Sem saber o que estava acontecendo, os dois obedeceram. Continuei correndo até encontrar um moto-taxista. Como tinha deixado o ônibus que eu queria, pensei que fosse uma boa idéia continuar o trajeto de moto mesmo. Informei então o endereço ao motorista, e fomos. Descemos a mesma avenida pela qual eu estava subindo, tendo a oportunidade de ver um dos policiais lançando o um dos jovens no porta-malas da viatura, enquanto o outro chutava a perna do outro.
Continuando pela Anhanguera, tive que retomar o fôlego, pensando sobre o quê significava tudo aquilo. Paramos no primeiro sinaleiro, e enquanto descansava, parou ao nosso lado outro motoqueiro. Sapatos de couro, calça social, camisa... Como? Esperei o sinal abrir, e pedi para o motorista:
- Senhor, me faz um favor?
- Sim, se não for difícil...
Tirei o panfleto da cigana do bolso e entreguei para ele.
- Entrega isto para aquele motoqueiro de roupa social ali atrás... Inventa qualquer motivo...
No próximo sinaleiro, o motoqueiro parou novamente ao nosso lado. O moto-taxista então cumpriu o prometido:
- Senhor, minha mulher é vidente, e estou distribuindo os panfletos dela...
- Me desculpe, senhor, mas eu não estou interessado.
- Pode ficar com o papel, às vezes algum conhecido seu está.
Ele então colocou o papel na mão do motoqueiro engomado, que logo amassou o papel e o jogou no chão.
- O senhor está maluco? Eu disse que não queria.
Então o sinal abriu, e o moto-taxista foi embora.
- Senhor, aquele cara ali atrás está me seguindo... Por acaso o senhor consegue despistá-lo?
- Bem, eu vou então para a BR, depois te trago de volta, OK?
Você normalmente não diz a um moto-taxista para andar rápido. Seria loucura, uma perda completa da razão... Mas não havia jeito ali.
Rapidamente o moto-taxista se dirigiu para a rodovia. Tive que tomar cuidado com os retro-visores, pois ele passava muito rápido por eles... Eu poderia ficar preso em algum. Meu coração quase saiu pela boca, quando entramos na BR-153, na frente de um caminhão que estava embalado pela descida do viaduto. A moto amarela urrava, enquanto zigue-zagueava entre os carros da estrada. A esta velocidade, nosso perseguidor já estaria para trás, já que eles não costumam arriscar as próprias vidas. Olhei para trás, para me certificar, mas não gostei do que vi.
O mesmo motociclista estava atrás de nós, correndo até mais do que nós. Desesperado, virei para frente e disse:
- Senhor, ele está nos alcançando!!
Ele então acelerou o que podia, enquanto nos dirigíamos para perto do Serra Dourada. Ali, encontramos um carro ultrapassando outro. O moto-taxista, não sei por quê razão, achou melhor passar entre os dois. Enquanto isto, o testemunha de Jeová nos seguia quase na mesma velocidade. Sinceramente jamais pensei que eles corressem tanto assim...
Passando o Serra Dourada, nos deparamos com 3 caminhões desta vez, um entrando na rodovia, outro ao seu lado e o terceiro, tentando ultrapassar o segundo, mas desenvolvendo uma velocidade um pouco maior. “Me lasquei”, pensei. Torci para o moto-taxista não resolver fazer o que fez com os últimos dois carros, mas felizmente, ele foi sensato desta vez, e passou pelo acostamento. Por um tempo, esperou nosso perseguidor aparecer também pelo acostamento, então mudou para o outro lado da pista, e foi para trás de outro caminhão que estava mais adiante.
- Tive uma idéia, rápido, vista esta jaqueta.
Rapidamente me deu uma jaqueta que estava vestindo.
- Mas isto é seguro?
- Vai por mim, acho que vamos despistá-lo.
Então, tentei fazer o que ele me disse, o mais rápido possível. Não era seguro usar apenas uma mão para me prender àquela moto. Felizmente consegui vestir a jaqueta antes de nosso perseguidor nos encontrar. Neste momento, o moto-taxista acelerou, finalmente ultrapassando o caminhão, agora já em frente ao Carrefour, se direcionando ao jardim botânico. Enquanto corríamos, o moto-taxista me dizia:
- Muito bem, agora eu quero que você ligue para o número que vou te falar...
Demorou um certo tempo para nosso perseguidor perceber que éramos nós. Isto nos fez distanciar dele. Infelizmente, nossa moto tinha mais pessoas, e corria menos por isto. Então, logo ele estaria nos alcançando novamente. Passamos pelo jardim botânico, onde saímos da rodovia, e fomos em direção ao Parque das Laranjeiras. Antes de chegarmos neste bairro, viramos em uma das ruas, que em um domingo de manhã não tinha muita gente. Havia apenas um mendigo, envolvido em seus cobertores.
O perseguidor então veio com cautela, pois em sua mente, ele não havia sido percebido ainda... Dobrando a esquina daquela rua, se assustou imensamente ao ver a nossa moto vindo na direção contrária, com toda velocidade. Somente o mendigo naquela rua foi capaz de ouvi-lo ele dizendo:
- Droga!! Ele acabou de mudar de posição. Diga aos outros que ele voltou a seguir para o Parque das Laranjeiras!!
Então, acelerou sua moto, e seguiu a moto amarela, em direção ao Parque das laranjeiras. Aquela barulheira parecia ter acordado o velho mendigo, que agora se revolvia por baixo dos cobertores.
Nosso perseguidor então se manteve atrás, sempre atento à direção que o moto-taxista escolhia. Estranhamente, o moto-taxista não corria mais como antes. Não demorou muito para que chegasse ao seu destino. Qual não foi a surpresa de nosso perseguidor, quando o passageiro desceu daquela moto, e ele não era eu? A jaqueta ajudou a disfarçar bem aquela pessoa, e a pressa do nosso perseguidor não permitiu que ele visse as diferenças entre mim e aquela pessoa ali.
Na verdade, aquele não era o destino do passageiro. Nem do moto-taxista. Eles apenas pararam, pois ficaram sabendo que tudo havia corrido conforme nosso plano. Um outro moto-taxista, conhecido do primeiro, logo chegou àquela rua do mendigo. Ao vê-lo, não teve dúvidas de se aproximar e perguntar:
- É o senhor que se chama Marvin?
Finalmente pude sair debaixo daquele cobertor. Pelo menos ele serviu para seu propósito: pude finalmente confirmar algumas suspeitas minhas. A primeira é que eu estava realmente sendo seguido. Segundo, que os meus perseguidores estavam usando celulares e não rádios. Isto significa que a pessoa que gerenciava a operação estava de longe, o que lhe daria a possibilidade de deslocar a quantidade de pessoas necessária para me seguir. Eles também dificultariam para mim, tentar escutar sua conversa. Rádios costumam usar frequência aberta, e os que codificam a mensagem costumam ser mais caros. Com celulares, o perseguidor não precisaria investir recursos, e não chamaria atenção.
Subi na nova moto, não sem antes devolver a coberta àquela mulher, que aguardou escondida na outra esquina. Ela ainda me emprestou outra jaqueta, para que não corresse o risco de outro testemunha de Jeová me encontrar. Sorte minha que o primeiro moto-taxista morava por perto. Agradeci à senhora, e finalmente seguimos nosso destino.
3 de setembro de 2051, 12:00Finalmente cheguei ao meu destino, em algum lugar de Senador Canedo. Olhei o pedaço de papel em meu bolso, para confirmar o endereço que haviam me passado. Me aproximei da porta, e toquei a campainha. Logo alguém veio me atender.
- Olá, eu queria saber se é aqui que mora Elizabete dos Santos?
A mulher sorriu, respondendo:
- Sim, sou eu mesma.
- Ah, que bom. Há muito tempo queria vir aqui, falar com você sobre um assunto um pouco delicado...
- Puxa, e o quê seria.
- Bem, seria sobre sua mãe... A dona Ana Clara...