Farah Jorge Farah, ao que tudo indica, se suicidou ontem, 22/09/17, em circunstâncias tão bizarras e mórbidas, cujos detalhes sórdidos decidimos poupar os nossos leitores, mas se alguém não resistir à tentação e curiosidade de saber o que aconteceu, recomendamos a leitura cautelosa do Vice, mas alertamos que as pessoas mais impressionáveis e/ou depressivas não devem ler o artigo.
Isto porque tanto a morte como o crime brutal que cometeu em 2003 indicam que Farah era uma alma perturbadíssima, em níveis bem maiores do que aquelas perturbações que assolam tantas pessoas por aí.
Por isso, decidimos relembrar uma matéria do portal R7 de abril de 2010, na qual ele se dizia adventista, mas parecia atormentado demais para ter algo que minimamente parecesse com "vida".
Farah cumpriu apenas 4 anos de cadeia.
¿Haverá, em algum lugar do universo, compaixão para Farah?
Eis a matéria de 2010:
“Perante Deus, já paguei meus pecados”,
diz ex-médico que esquartejou paciente
Dois anos após condenação, Farah Jorge Farah diz esperar a hora da morte
João Varella, do R7
Farah Jorge Farah, 61 anos, estudante de direito e gerontologia [estudo de questões relacionadas à velhice], diz sentir falta de ternura e carinho. Ele sabe que, se não fosse pelo “ocorrido”, receberia mais abraços e beijos, demonstrações de afeto das quais diz ter saudade.
O “ocorrido” a que ele se refere é o assassinato da ex-amante Maria do Carmo Alves, em 2003, pelo qual Farah foi condenado a 13 anos de prisão por esquartejamento e ocultação do fígado e do coração da vítima. A decisão da Justiça, da qual ele apela em liberdade, completa dois anos neste sábado (17). Após quatro anos preso, o advogado de Farah, Roberto Podval, o mesmo do caso Isabella, conseguiu decisão judicial que permite ao condenado ficar solto até que se esgotem todos os recursos.
Não há data para o julgamento da apelação no STF (Supremo Tribunal Federal). Os processos de Farah não têm movimentação desde 2008 em todas as instâncias, segundo consultas processuais nos sites da Justiça.
Desde que o caso veio à tona, Farah passou a ser reconhecido como “estripador” ou “assassino”, rótulos que ele refuta por dar a ideia de “alguém que já cometeu vários crimes”. Apenas uma vez, ele matou e guardou os pedaços do corpo de Maria do Carmo em cinco sacos plásticos no porta-malas de seu do carro.
A reportagem do R7 almoçou com ele no refeitório da USP Leste (Universidade de São Paulo), onde Farah cursa gerontologia, e viu quando ao menos duas jovens apontaram o dedo para o condenado, do lado de fora do salão. Na Fuvest, o vestibular da USP, ele passou em 17º, entre os 210 admitidos no curso – o R7 noticiou com exclusividade a entrada dele no campus leste da instituição. Por ter sido aprovado, Farah teve que trancar a faculdade de filosofia que fazia na Unesp (Universidade Estadual Paulista).
Antes do crime, ele chamava atenção por suas habilidades como cirurgião plástico. Maria do Carmo conheceu Farah quando o então médico removeu uma marca da perna dela. Ele recorda como era respeitado por colegas de profissão e pela família.
– Eu era o grande doutor Farah. Hoje sou apontado como o esquartejador na rua.
Depois do crime, Farah foi expulso de todas as associações de que participava. Seu registro no CRM (Conselho Regional de Medicina) foi cassado em 2006. Com voz levemente aguda, Farah diz que é o mesmo homem de antes do crime, salvo pela decadência de seu corpo.
– Depois dos 60 anos, o corpo humano começa a definhar. Eu estou aqui fazendo hora extra no mundo. Estou esperando a hora da morte.
Farah tem uma carteirinha de posto de saúde cheia de registros de consultas. A saúde frágil fica clara já no caminhar. Ele usa uma bengala, porque teve um nódulo retirado das costas e, por isso, perdeu parte do equilíbrio da perna esquerda.
– Eu, não tenho a menor vergonha de admitir, estou usando fraldas desde o ano passado. Meus pais também usaram fraldas um ano antes de morrer.
Farah, que hoje vive sozinho num apartamento da Vila Mariana (zona sul), fica visivelmente agitado quando fala sobre os pais; o hábito de roçar as unhas compridas das mãos umas nas outras fica mais evidente. Mas, longe desse assunto, o ex-médico mistura, com propriedade, filosofia e questões cotidianas. Nas duas horas em que esteve com o R7, Farah citou os iluministas franceses Voltaire e Montesquieu e os pensadores gregos clássicos Platão e Sócrates – a este, chegou a chamar de “titio”. Quando usa um desses nomes difíceis, pede desculpa e diz que não quer parecer “esnobe”.
Os pais de Farah morreram enquanto ele cumpria pena na carceragem do 13º Distrito Policial, na zona norte de São Paulo. Ao saber da notícia, tentou se matar três vezes. Por isso, passou a ser vigiado 24 horas pelos policiais. Quando pensa no que o levou a tentar se matar, Farah diz não querer lembrar. E chora. Para ele, a pena de morte é melhor do que a vida na cadeia, "uma escola de criminosos que não ressocializa ninguém".
O crime
Sobre o assassinato, Farah conta que sua última lembrança foi a luta que travou com Maria do Carmo em seu consultório. Quando fala disso, Farah puxa uma folha da pasta em que carrega. É a notícia de um vereador que surtou e virou catador de papel, em 2007 - história que compara ao seu "surto". Farah e Maria do Carmo começaram uma relação atribulada em 1996, com vários registros de boletins de ocorrência de ameaças.
Ele diz que não é “anjinho” e que tem culpa. Questionado se a punição é suficiente, Farah tenta desviar do assunto, dizendo que ainda está estudando e não poderia avaliar o caso. Além do curso de gerontologia, o ex-médico está no terceiro ano de direito na Unip (Universidade Paulista). Promete que, “se estiver vivo, um dia vai concluir os todos os cursos” - a rotina se divide entre as faculdades e as consultas médicas.
Questionado mais uma vez sobre a condenação, Farah não altera a voz suave, em ritmo pausado, e vai ao ponto com apenas uma frase.
– Perante Deus, já paguei os meus pecados.
Adventista, Farah não deixou de frequentar os cultos, onde tem amigos. O ex-cirurgião, que também diz seguir alguns dogmas judaicos, afirma não ver incoerência na mistura ecumênica. Apesar de ser apontado nas ruas como "aquele" Farah Jorge Farah, o ex-médico não se intimida e segue em frente com a nova vida. Nas faculdades, diz ter sido discriminado quando os colegas se davam conta de seu passado. Já foi abordado por pessoas indignadas no ônibus e no metrô, mas não deixa de usar o transporte público.
– Aqui as pessoas não abraçam, não beijam. Na cadeia, eu recebia até mais carinho do que aqui fora.