Faleceu ontem em Tel Aviv, aos 85 anos de idade, o comandante militar e ex-primeiro ministro de Israel Ariel Sharon, após passar 8 anos em coma em decorrência de um acidente vascular cerebral.
Figura controversa no já complicadíssimo tabuleiro do jogo político no Oriente Médio, Sharon passa para a história responsabilizado pelo massacre dos campos de refugiados palestinos de Sabra e Chatila, no Líbano, um horroroso episódio que, por mais que tenham tentado abafar, jamais se descolará de sua biografia.
Naquele dia 16 de setembro de 1982, Sabra e Chatila representaram a conjunção tenebrosa de todos os fatores políticos e religiosos que continuam alimentando a guerra na chamada "Terra Santa".
Guga Chacra, colunista do Estadão e da Globo News e - ele próprio - descendente de cristãos libaneses , publicou em seu blog sua opinião sobre esse vergonhoso episódio que a humanidade nunca se esquecerá:
Qual o papel de Sharon (1928-2014) no massacre de Sabra e Shatila, cometido por cristãos libaneses?
Ariel Sharon morreu hoje, aos 85 anos, depois de passar os últimos oito em coma. Será sempre lembrado como herói por alguns e como criminoso de guerra por outros. Inclusive, dentro de Israel, sua imagem variou de acordo com o período. Há dezenas de ótimos obituários sobre a vida dele. Muitos neutros, alguns defendendo, outros atacando. Em português, recomendo o ótimo texto do Caio Blinder, na Veja . Eu vou me concentrar apenas no massacre de Sabra e Chatila porque já estive nestes campos três vezes, entrevistei sobreviventes e também milicianos cristãos envolvidos nas mortes.
Israel entrou no Líbano em 1982 supostamente por 48 horas para se vingar da morte de um diplomata israelense em Londres em ação atribuída à OLP. No fim, permaneceu em partes do território até 2000. O comando palestino, incluindo Yasser Arafat, estava no Líbano desde os anos 1970. A Guerra Civil libanesa havia se iniciado em 1975 e tinha diferentes facções cristãs, sunitas, xiitas e drusas, além do envolvimento do Exército da Síria.
Uma vez dentro do Líbano, Israel ocupou Beirute e levou adiante uma aliança com a facção cristã Phalange, fundada em 1936 com inspiração no Estado nazista de Hitler, comandada por Bashir Gemayel, então, com apenas 34 anos. O objetivo de Sharon era consolidar seus aliados cristãos no poder e assinar um acordo de paz com eles.
Gemayel foi eleito presidente do Líbano e, três semanas mais tarde, morreu em atentado terrorista. Seus seguidores, que atribuíram o ataque aos palestinos, decidiram se vingar. Ariel Sharon era ministro da Defesa de Israel, que controlava os campos de Sabra e Shatila e não impediu os cristãos falangistas de entrarem para cometer o massacre. Foram cerca de 2.000 mortos, incluindo mulheres e crianças, muitas vezes cortadas em pedaços pelos milicianos cristãos. Os soldados israelenses em nenhum momento os interromperam.
Posteriormente, o governo de Israel estabeleceu uma comissão investigadora comandada pelo juiz Yitzhac Kahan, que recomendou a saída de Sharon do posto de ministro da Defesa. Ele não foi considerado responsável direto, mas deveria, de acordo com o chefe da Justiça de Israel, ter previsto o que poderia ocorrer ao permitir a entrada dos cristãos falangistas, liderados por guerrilheiros de vinte e poucos anos.
Resumo– Israel controlava os campos de Sabra e Shatila. Quem cometeu os massacres foram os cristãos libanesas (em tempo, eu tenho origem cristã libanesa). Segundo a Justiça israelense, Sharon deveria ter previsto que os milicianos cristãos cometeriam os massacres