A informação foi publicada no Estadão em 12/01/14:
Após anos de brigas, Supremo Tribunal Federal define rumo da TFP
Fundadores e dissidentes da entidade religiosa travam batalha judicial desde 1997
José Maria Mayrink
O futuro da Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade (TFP), fundada em 1960 pelo professor Plínio Corrêa de Oliveira, depende do Supremo Tribunal Federal (STF). Em uma disputa iniciada em 1997, uma ala dissidente entrou na Justiça contra a direção da entidade para reivindicar a extensão a todos os associados do direito de voto, então restrito a oito fundadores da entidade (hoje são seis). Perderam em primeira instância, mas ganharam em segunda e conseguiram manter a decisão, enfrentando recursos e agravos que agora serão julgados em Brasília.
A TFP original, cujos membros, de capas e estandartes vermelhos, defendiam a propriedade privada e combatiam o comunismo, a reforma agrária, o divórcio e o aborto, foi proibida de usar a sigla, trajes e símbolos que a identificavam. Os remanescentes criaram a Associação dos Fundadores, o Instituto Plínio Corrêa de Oliveira e a Aliança de Fátima, enquanto a nova TFP passava para o controle dos dissidentes. Despejados pelos fundadores do casarão da Rua Maranhão, em Higienópolis, os dissidentes ocupam uma sede provisória em Santana.
O engenheiro e empresário Adolpho Lindenberg, de 89 anos, primo-irmão do fundador da entidade, é o presidente do Instituto Plínio Corrêa de Oliveira. "A TFP está engessada, não sabemos por ordem de quem, nas mãos de dissidentes cuja atividade quase exclusiva é de caráter religioso, no seio da associação Arautos do Evangelho", diz. Ele e o diretor Paulo Corrêa de Brito Filho, de 82 anos, prometem manter o legado de Plínio Corrêa de Oliveira.
O superintendente da nova TFP, Roberto Kasuo Takayanagi, de 63 anos, da Diretoria Administrativa e Financeira Nacional, diz que o "Doutor Plínio era um democrata e não tomava atitude sem ouvir os sócios", o que justificaria que, após a morte do fundador, em 1995, o direito de voto fosse estendido aos associados, segundo a lei brasileira. Ao ganhar esse direito, os sócios efetivos destituíram os fundadores em assembleia-geral e tomaram posse, sob garantia do juiz da 3.ª Vara Cível. Obrigados a entregar cargos e bens, os fundadores entraram com agravos e embargos para reverter o caso. Não conseguiram.
Kazuo afirma que os dissidentes foram à Justiça, em dezembro de 1997, porque cerca de 800 membros de dedicação exclusiva estavam ameaçados de expulsão, o que os deixaria sem alimentação, moradia e assistência à saúde. Como perderam em primeira instância, segundo ele, membros efetivos começaram a ser expulsos. Sem recursos para sobreviver, muitos deixaram a instituição. "Estamos meio acampados", conta Kazuo, ao informar que a entidade não conseguiu ainda recuperar todo o patrimônio controlado pelos fundadores. Ele diz que os sócios fundadores transferiram receitas para a Associação Aliança de Fátima irregularmente, entre 2002 e 2004. A disputa judicial entre as partes envolve dezenas de ações, petições, embargos e agravos.
Para entender. A Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade (TFP) é uma organização católica tradicionalista e conservadora brasileira fundada em 1960 por Plínio Corrêa de Oliveira. Trata-se de uma sociedade civil sem fins lucrativos que nasceu como ferrenha defensora de posições políticas à direita e liderou marchas contra a reforma agrária, o divórcio, o aborto e o comunismo. Hoje, sua agenda é mais religiosa que política.
Maconha e união gay viram alvo de oposição
Embora engessada, a TFP original não está parada. Seus sócios, cerca de 300, fazem campanhas contra as causas de sempre, agora com alguns itens atualizados. "O aborto, o pseudo casamento homossexual, a liberação da maconha e, em geral, as reivindicações das chamadas minorias visíveis, que dividem de alto a baixo a sociedade brasileira, estão na primeira linha de debate da Associação dos Fundadores", diz Adolpho Lindenberg, presidente do Instituto Plínio Corrêa de Oliveira.
Os militantes da antiga TFP não usam mais capas vermelhas nem carregam estandartes com a estampa do leão rompante (heráldico), mas uma estola amarela. Seu apostolado concentra-se na divulgação da devoção a Nossa Senhora de Fátima. Em caravanas, percorrem cidades do interior para divulgar livros publicados pelo Instituto Plínio Corrêa de Oliveira.
Os membros da TFP dissidente vestem capas vermelhas e empunham estandartes do leão heráldico apenas em ocasiões especiais. Enquanto a questão judicial não é decidida, preferem ser mais discretos. O superintendente Roberto Kazuo afirma que a associação obedece aos bispos e ao papa, sem as divergências do passado. Os recursos financeiros vêm da contribuição de simpatizantes.
A devoção a Nossa Senhora de Fátima é bandeira comum da TFP e do Instituto Plínio Corrêa de Oliveira, assim como da Associação Arautos do Evangelho, entidade fundada pelo monsenhor João Scognamiglio Clá Dias, de 74 anos, que foi secretário de Plínio Corrêa de Oliveira por 20 anos. A associação atua em 78 países e tem sede em São Paulo, onde construiu vistosos seminários, em Caieiras e Cotia. Seus membros usam uniformes de desenho medieval e botas de cano longo, de estilo militar. Os meninos entram aos 12 anos. São confundidos, muitas vezes, com membros da TFP./ J.M.M.