terça-feira, 31 de outubro de 2017

Celebrando os 500 anos da Reforma com Lutero - parte 31


PELA EDUCAÇÃO DOS FILHOS

Uma prédica de Martinho Lutero para que se mandem os filhos à escola

A todos os meus prezados senhores e amigos, pastores e pregadores que seguem fielmente a Cristo, Martinho Lutero.

Graça e paz em Cristo Jesus, nosso Senhor.

Meus muito amados senhores e amigos. Vedes com vossos próprios olhos como o asqueroso Satã nos ataca agora de todos os lados com violência e com astúcia, e nos aflige com toda sorte de pragas, para destruir o santo Evangelho e o reino de Deus. Ou então, não podendo destruí-los, pelo menos procura por obstáculos e atrapalhar por todos os meios para que não progrida ou alcance o predomínio. Entre suas artimanhas uma das mais importantes (se é que não é a mais importante) consiste em aturdir e enganar as pessoas simples de tal maneira que não queiram mandar seus filhos à escola nem encaminhá-los para o estudo. Ele lhes insufla os seguintes pensamentos perniciosos: como já não existe mais a perspectiva da monjaria masculina ou feminina e do clericato, como vinha acontecendo até agora, não há mais necessidade de pessoas instruídas nem de muito estudo; o que interessa é tratar de conseguir alimento e riquezas.

Isso me parece uma verdadeira obra de mestre da arte diabólica. Ao ver que hoje já não pode fazer e agir como quer, procura impor sua vontade a nossos descendentes, preparando-os diante de nossos olhos de maneira que nada aprendam e nada saibam, a fim de que quando estivermos mortos, tenha à disposição um povo despreparado, despojado e indefeso, com o qual possa fazer o que quer. Pois se desaparecerem a Escritura e as ciências, nada mais restará na Alemanha do que uma rude e selvagem horda de tártaros e turcos, e, quem sabe, uma pocilga e uma súcia de animais selvagens. Por enquanto, porém, lhes esconde sua intenção, cegando-os com maestria, a fim de que, quando as coisas chegarem a esse ponto e eles o enxergarem com seus próprios olhos, possa rir-se de todo o lamento e choro daqueles que, ainda que quisessem, não mais podem remediar a situação, e tenham que confessar: tarde demais. Daí então estariam dispostos a dar cem florins por um erudito medíocre, enquanto agora não teriam dado sequer dez por dois eruditos completos.

É o que mereceriam, porque agora não querem manter nem sustentar mestres e professores íntegros, honestos e disciplinados, postos à disposição e esforço, e além disso com pouco gasto e dinheiro. Em troca, recebem mestres de aluguel e professores auxiliares, grosseiros, asnos e lorpas, como os tiveram anteriormente, os quais somente ensinaram a seus filhos como ser burro, apesar dos altos custos. Em contrapartida, violentam suas mulheres, filhas e empregadas, pretendendo ser senhores da casa e dos bens, como vinha acontecendo até agora. Esta deve ser a recompensa para sua grande e escandalosa ingratidão, para a qual o diabo os induz com tanto ardil.

Visto que, como curas das almas, devemos ser vigilantes contra esse e outros ardis maliciosos, por força de nosso ministério, certamente não podemos cochilar neste ponto de tamanha importância; devemos, muito antes, estimular, advertir, encorajar, instigar com toda a força, empenho e cuidado, para que o homem simples não se deixe enganar e seduzir tão miseravelmente pelo diabo. Por isso cada qual deve ficar atento e desempenhar seu ministério, para que não cochile nesta matéria, permitindo que o diabo seja Deus e senhor. Pois se silenciarmos e dormirmos nesse ponto, deixando a juventude no abandono e permitindo que nossos descendentes se tornem tártaros e animais selvagens, então será por culpa de nosso silêncio e ronco, e teremos que prestar contas rigorosas sobre isso.

Sei perfeitamente que muitos dentre vós levam esse assunto adiante também sem minha exortação, melhor do que o poderia fazer e aconselhar. Além disso publiquei anteriormente um livrinho especial sobre essa matéria, dirigido aos conselheiros nas cidades. No entanto, caso alguém tivesse esquecido o assunto ou quisesse seguir meu exemplo com mais afinco, enviei-vos este sermão, pronunciado mais do que uma vez cá entre os nossos, para que percebais com quanta fidelidade estou colaborando convosco e que sempre estamos cumprindo nossa parte, de modo que perante Deus estamos desculpados no que se refere a nosso ministério. Sem dúvida, o assunto agora depende de nós, porque vemos que também os chamados clérigos procedem nessa matéria como se quisessem ver a ruína de todas as escolas, da disciplina e do ensino, e inclusive estão dispostos a colaborar para seu destroçamento, porque já não têm a mesma liberdade arbitrária como até agora. É o diabo que efetua isso através deles. Que Deus nos ajude. AMÉM.

(LUTERO, Martinho. Uma prédica de Martinho Lutero para que se mandem os filhos à escola. 1530. Tradução de Ilson Kayser. MARTINHO LUTERO. Obras Selecionadas. São Leopoldo: Sinodal. Porto Alegre: Concórdia. 1995. Vol. 5, págs. 331-333)



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