sexta-feira, 13 de outubro de 2017

Milagre nos Andes, 45 anos depois


A foto em preto e branco acima é o retrato definitivo de uma das mais belas e - simultaneamente - trágicas páginas da história da humanidade.

Celebra o espírito humano em suas dimensões mais extremas (e - por que não dizer - polêmicas) e nos dá um exemplo único e incomparável do que significa viver.

É que hoje faz exatos 45 anos do acidente aéreo que entrou para a História como o caso dos sobreviventes dos Andes, no dia 13 de outubro de 1972, uma sexta-feira 13 que - lamentavelmente - fez jus à superstição.

Essa é uma das histórias mais conhecidas de acidente aéreo no mundo, numa época em que era praticamente impossível que alguém sobrevivesse a tragédias com aviões.

Hoje, felizmente, a indústria aeronáutica evoluiu tanto que os acidentes se tornaram muito menos frequentes, e já não são mais raras as oportunidades em que haja um bom número de sobreviventes quando um avião sofre uma avaria qualquer.

Naquele tempo, entretanto, a notícia do desaparecimento do voo 571 da Força Aérea Uruguaia quando sobrevoava a Cordilheira dos Andes, na fronteira entre Argentina e Chile, despertou os piores temores e o longo período de buscas infrutíferas provocou a certeza de que ninguém havia sobrevivido.

O avião modelo Fairchild Hiller FH-227 transportava o time amador de rugby dos "Old Christians", do Colégio Stella Maris de Montevidéu, que disputaria uma partida em Santiago do Chile, que no dia anterior já havia feito uma parada forçada em Mendoza, na Argentina, por conta do mau tempo.

Eles não sabiam até então, mas 23 dos 78 aviões Fairchild 227 fabricados no mundo sofreram graves acidentes ao longo de sua vida (in)útil em razão de problemas de potência no motor, matando 393 pessoas no total.

Tudo indica que foi exatamente o motor fraco, associado ao cálculo equivocado dos fortes ventos contrários (que reduziram dramaticamente a velocidade real em comparação com aquela apontada pelos controles do avião), que levou os pilotos a se chocarem contra as montanhas numa área de ínfima visibilidade.

Milagrosamente, depois dos seguidos choques com a crista da montanha, que foram tirando as asas e a fuselagem traseira do avião, só sobrou o "charuto" anterior, onde se concentraram os sobreviventes.

Das 45 pessoas a bordo, (40 passageiros e 5 tripulantes), 7 desapareceram lançados aos ares nos primeiros choques e 6 morreram instantaneamente no impacto final com o solo.

Havia 32 sobreviventes quando os restos do avião "estacionaram" na neve após deslizarem por centenas de metros no local conhecido como "Glaciar de las Lágrimas", a 3.500 m de altitude sobre o nível do mar, 2 km abaixo de onde a cauda se havia despedaçado ao tocar o primeiro pico.

Na madrugada e no dia seguintes, mais 4 passageiros não resistiram aos graves ferimentos provocados não só pelo choque como pela "avalanche" de poltronas que se amontoaram nos bancos da frente.

6 corpos dos 7 desaparecidos lançados aos ares foram encontrados por uma expedição no dia 24 de outubro, mas não havia nem sinal do avião, cujos ocupantes agonizavam num local de difícil acesso e visualização pelas equipes de resgate.

No domingo, 29 de outubro de 1972, uma avalanche soterra os sobreviventes por 3 dias, matando 8 deles que até então resistiam bravamente às intempéries e à tragédia anunciada.

Nos dias 15 e 18 de novembro, e 11 de dezembro, morrem mais 3 corajosos (até então) sobreviventes, um em cada dia.

Desde o começo, eles haviam racionado os poucos alimentos que tinham, mas diante da impossibilidade de encontrar comida animal ou vegetal no local em que estavam, são obrigados a se valer dos corpos enterrados na neve, de seus amigos e familiares, para continuarem vivos.

Talvez tenha sido o canibalismo que mais chamou a atenção do mundo do que o acidente em si, mas um dos sobreviventes, José Pedro Algorta buscou uma referência religiosa - na eucaristia católica - para justificar o ato e dar ânimo aos demais dizendo que "seus amigos lhes davam os seus corpos para sua vida física, assim como Jesus  lhes havia dado o seu corpo para sua vida espiritual".

Foi esta decisão radical - verdadeira injeção de ânimo - que lhes permitiu seguirem vivos, até que três deles, Antonio Vizintín, Fernando Parrado e Roberto Canessa, inconformados com o decreto de morte certa, um dia após a última morte de um companheiro, decidem se aventurar pela cordilheira em busca de socorro, já que não havia mais esperança sequer de que alguém continue tentando encontrá-los.

Com muito esforço, eles haviam feito o rádio do avião funcionar e já sabiam que eram dados como mortos e as buscas já tinham sido suspensas.

Depois de 3 dias de caminhada, Vizintín escorrega e se machuca, voltando ao improvisado "acampamento", e depois de percorrerem 55 km, 10 dias após haverem iniciado a marcha equivocadamente para oeste (no Chile, quando seria muito mais rápido e fácil serem localizados indo para leste, na Argentina), Parrado e Canessa encontram o chileno Sergio Catalán, que chama os carabineiros para socorrerem os 16 sobreviventes.

No dia 22 de dezembro de 1972, para delírio e alívio do mundo que acompanhava o drama (inclusive deste que vos escreve, então com 9 anos de idade) termina o resgate do último sobrevivente, 72 dias após o terrível acidente.

Essa é, sem dúvida, uma das mais emocionantes, famosas e impressionantes histórias de resgate de vítimas e superação humana de que se tem notícia, razão pela qual se tornou objeto de muitos livros e filmes ao longo desses 40 anos.

Em 2010, não muito longe dali, só que no deserto de Atacama, 33 mineiros chilenos manteriam o mundo em suspense até seu resgate espetacular. Estranha (e feliz) propensão dessa região a proporcionar histórias quase inacreditáveis de sobrevivência em ambientes hostis.

Se os Andes por si só já representam um milagre da natureza, um presente de Deus para os sulamericanos, a história dos heróis uruguaios da humanidade será contada para sempre como um dos mais belos milagres que se tem notícia.

O Terra preparou um belo infográfico para celebrar a data, e abaixo seguem dois vídeos, o primeiro da reconstituição do acidente no filme "Vivos" ("Alive" - 1993) e o segundo um excelente documentário ("Estou Vivo: Milagre nos Andes") na íntegra do History Channel:







Último grupo de sobreviventes na última noite no avião,
felizes por saber que seriam resgatados na manhã seguinte.
Os 16 sobreviventes se encontram anualmente no dia do resgate para celebrar a vida.


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