A notícia abaixo, publicada na Folha de S. Paulo de hoje, é daquelas que envergonham o país e mostram como o apartheid não consegue deixar de mostrar a sua cara, mesmo quando veementemente negado e dissimulado:
Aluno morre na USP e corpo só é retirado 6 horas depois
Estudante de filosofia ficou exposto ao sol e à garoa na praça do Relógio Solar
Hospital do campus diz que ambulâncias não podem ser usadas em resgate; prefeitura nega demora na retirada
TALITA BEDINELLI
DE SÃO PAULO
Um estudante de filosofia de 42 anos passou mal na manhã de ontem dentro da Cidade Universitária (zona oeste de São Paulo), não teve atendimento, morreu e ficou estirado por quase seis horas à espera de remoção.
A causa da morte ainda não é conhecida. Samuel de Souza chegou à USP por volta das 9h30 acompanhado de amigos.
Ele desceu de um ônibus e caminhou até a praça do Relógio Solar, onde desmaiou. A guarda universitária foi chamada. Segundo relatos de estudantes e do sindicalista Claudionor Brandão, que estava no local, os guardas ligaram para o resgate, que teria dito que não tinha ambulâncias disponíveis.
Brandão pediu então que um funcionário do sindicato pedisse auxílio no HU (Hospital Universitário). Segundo o hospital, porém, suas ambulâncias não podem ser usadas para fazer resgate.
Às 10h05, um membro da guarda universitária tentou medir a pulsação de Souza. Nada. O estudante também não respirava mais. O próprio guarda declarou o óbito, conta a funcionária Rosana Bullara, que acompanhava.
A polícia foi chamada. Um delegado compareceu ao local e pediu a retirada do cadáver, contou a Secretaria da Segurança Pública.
O corpo só foi levado às 15h49, após passar pelo sol das 12h e pela garoa das 14h. Coberto por um lençol e depois por sacos de lixo preto, ele ficou deitado a 230 metros da reitoria da universidade e a 3 km do HU -trajeto que uma ambulância não levaria nem dez minutos para percorrer nas ruas sem trânsito do campus.
"Foi discriminação", diz Bullara. "Ele só ficou aí porque era estudante, pobre e negro", diz. Souza era morador do Crusp (conjunto residencial da universidade). A mãe mora em Juazeiro do Norte (CE), para onde o corpo será encaminhado. O estudante se formaria no ano que vem.
Revoltados, os colegas reclamavam da atuação dos guardas universitários. "Eles diziam que não poderiam fazer nada. Nem massagem cardíaca", disse uma aluna do 4º ano de letras que não quis ser identificada.
A USP diz que os guardas já encontraram Souza morto. A prefeitura, responsável pela remoção do corpo, negou que tenha demorado seis horas para recolhê-lo. Disse que o serviço funerário foi chamado por volta das 14h e, às 16h, estava no local.
Nenhum responsável do Corpo de Bombeiros foi localizado para falar a respeito.
Colaboraram ADRIANO BRITO e PATRÍCIA GOMES
Aluno morre na USP e corpo só é retirado 6 horas depois
Estudante de filosofia ficou exposto ao sol e à garoa na praça do Relógio Solar
Hospital do campus diz que ambulâncias não podem ser usadas em resgate; prefeitura nega demora na retirada
TALITA BEDINELLI
DE SÃO PAULO
Um estudante de filosofia de 42 anos passou mal na manhã de ontem dentro da Cidade Universitária (zona oeste de São Paulo), não teve atendimento, morreu e ficou estirado por quase seis horas à espera de remoção.
A causa da morte ainda não é conhecida. Samuel de Souza chegou à USP por volta das 9h30 acompanhado de amigos.
Ele desceu de um ônibus e caminhou até a praça do Relógio Solar, onde desmaiou. A guarda universitária foi chamada. Segundo relatos de estudantes e do sindicalista Claudionor Brandão, que estava no local, os guardas ligaram para o resgate, que teria dito que não tinha ambulâncias disponíveis.
Brandão pediu então que um funcionário do sindicato pedisse auxílio no HU (Hospital Universitário). Segundo o hospital, porém, suas ambulâncias não podem ser usadas para fazer resgate.
Às 10h05, um membro da guarda universitária tentou medir a pulsação de Souza. Nada. O estudante também não respirava mais. O próprio guarda declarou o óbito, conta a funcionária Rosana Bullara, que acompanhava.
A polícia foi chamada. Um delegado compareceu ao local e pediu a retirada do cadáver, contou a Secretaria da Segurança Pública.
O corpo só foi levado às 15h49, após passar pelo sol das 12h e pela garoa das 14h. Coberto por um lençol e depois por sacos de lixo preto, ele ficou deitado a 230 metros da reitoria da universidade e a 3 km do HU -trajeto que uma ambulância não levaria nem dez minutos para percorrer nas ruas sem trânsito do campus.
"Foi discriminação", diz Bullara. "Ele só ficou aí porque era estudante, pobre e negro", diz. Souza era morador do Crusp (conjunto residencial da universidade). A mãe mora em Juazeiro do Norte (CE), para onde o corpo será encaminhado. O estudante se formaria no ano que vem.
Revoltados, os colegas reclamavam da atuação dos guardas universitários. "Eles diziam que não poderiam fazer nada. Nem massagem cardíaca", disse uma aluna do 4º ano de letras que não quis ser identificada.
A USP diz que os guardas já encontraram Souza morto. A prefeitura, responsável pela remoção do corpo, negou que tenha demorado seis horas para recolhê-lo. Disse que o serviço funerário foi chamado por volta das 14h e, às 16h, estava no local.
Nenhum responsável do Corpo de Bombeiros foi localizado para falar a respeito.
Colaboraram ADRIANO BRITO e PATRÍCIA GOMES