sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Muito Shrek e pouco Jesus no Natal

Notícia do jornal O Estado de S. Paulo de hoje:


Decoração de Natal ''esquece'' do Menino Jesus


Papais Noéis, animais e até o personagem Shrek substituíram o tradicional presépio em ruas e shopping centers paulistanos

Na celebração do Natal deste ano, esqueceram de chamar o aniversariante. O Menino Jesus, que até pouco tempo era presença obrigatória em presépios e enfeites em qualquer lugar do País, está sendo deixado de lado nas principais decorações de São Paulo. Uma overdose de Papais Noéis, duendes e animais exóticos - como girafas, pinguins e elefantes - e até o personagem Shrek são hoje protagonistas da festa paulistana, embora o mundo cristão celebre o Natal como data do nascimento de Jesus Cristo.

A reportagem visitou nove locais decorados, de shoppings à Avenida Paulista, e só encontrou o Menino Jesus em uma delas - no Shopping Anália Franco, na zona leste. Lá, um pequeno presépio enfeita a capela da "Villa Anália", uma pequena aldeia em estilo europeu com prédios e comércios conduzidos pelos tradicionais duendes natalinos e pelo Papai Noel.

Em todas as outras decorações, quem mais dá a cara é o bom velhinho - que quase sempre faz o papel de um "personagem" diferente baseado no tema dos enfeites.

No Pátio Higienópolis, por exemplo, o Papai Noel é o maquinista de um carrossel gigante onde as crianças podem entrar e dar uma volta. No Shopping Center 3, ele dá uma de maestro, em pé e de batuta em riste sobre um pequeno pedestal onde um coral se apresenta várias vezes por dia na calçada da Avenida Paulista. No Iguatemi, nos Jardins, zona oeste, é o passageiro de um trem prestes a partir de uma estação. E no Shopping Bourbon, na Pompeia, também na zona oeste, o velhinho é o maquinista de um trenzinho aberto para passeios infantis.

Mais Papai Noel. Mas há decorações que abusam um pouco mais da figura do presenteador oficial da época. É o caso do casarão do Banco Itaú na Paulista, onde cinco Papais Noéis, duas Mamães Noéis e vários duendes de Natal simulam situações diárias numa vila europeia como a do Anália Franco. Na Praça de Natal montada no palco da avenida, a poucos metros dali, as cenas são ainda mais inusitadas: animais como girafas, leões, macacos e pinguins - cada um tocando um instrumento - formam uma pequena orquestra do lado de fora. E, no Shopping Interlagos, na zona sul, o personagem principal do Natal é o personagem de desenho animado Shrek.

Para o teólogo Joaquim Alberto Pereira, autor do livro É Natal, a ausência do tradicional motivo da comemoração reflete um aumento da pluralidade da sociedade brasileira. "É um momento diferente que a sociedade brasileira está vivendo. Nosso povo, que antes era basicamente católico, hoje tem ateus, judeus, muçulmanos e protestantes. É normal que a decoração natalina reflita essa realidade."

Pereira considera que o caráter consumista também conta nesse processo, pois o Papai Noel é um reflexo do ato de presentear os outros nessa época. No entanto, ele acredita que não está havendo uma secularização da festa de Natal por causa disso. "Essa tradição de presépio é uma tradição portuguesa, espanhola, italiana. E, no fundo, ela sempre esteve muito ligada a esse caráter cultural", afirma.

Competição. Já Paola Dale, gerente de marketing da Cecília Dale, empresa responsável pela decoração de seis shoppings na capital, não acha que exista uma diminuição do lado religioso nos enfeites natalinos. "Tudo depende da mensagem que cada shopping quer passar para o cliente", comenta. Um exemplo seria o Anália Franco, onde o presépio na capela é ligado à história da imigração no bairro (leia acima).

Segundo ela, o aumento do número de shoppings acabou criando uma concorrência de enfeites natalinos entre eles.

"Cada um quer uma decoração única e que seja a cara do shopping. Por isso fizemos inovações, como o trenzinho do Bourbon e o carrossel do Higienópolis", afirma. A temática escolhida, em sua opinião, também ajudaria a diminuir eventuais rusgas religiosas. "Tentamos fazer algo mais neutro, porque esses shoppings têm, principalmente, um público judeu considerável", afirma.

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