domingo, 4 de julho de 2010

Bento XVI homenageia papa que renunciou

Os gestos e discursos dos líderes políticos e religiosos mais influentes do mundo são sempre revestidos de um simbolismo que nem sempre está explícito, mas indica atitudes ou tendências que eles querem, de alguma maneira, valorizar ou repudiar. Por isso, chama particularmente a atenção o fato do papa Bento XVI ter incluído entre suas 4 visitas pastorais anuais na Itália a ida - hoje - à tumba (com o corpo insepulto) do papa Celestino V (apr. 1215-1296), monge eremita beneditino que foi alçado ao papado mas depois renunciou em meio à peste negra e aos jogos de poder da Idade Média, conforme noticia O Estado de S. Paulo de ontem, 03/07/10:


Bento XVI homenageia papa que renunciou


Celestino V abdicou seis meses após sua eleição, em 1294; administrador incompetente, foi colocado por Dante no Inferno da ''Divina Comédia''

José Maria Mayrink - O Estado de S.Paulo

São Celestino V, papa que renunciou em 1294, seis meses após sua eleição, receberá a veneração de Bento XVI, que vai rezar junto de seu túmulo amanhã, em Sulmona, na Província de Áquila. A peregrinação a essa região devastada por terremoto em 2009 é uma das quatro visitas pastorais que o papa faz este ano na Itália.

Pietro del Murrone, monge eremita do mesmo século de São Francisco de Assis e de São Domingos, tinha 85 anos quando foi eleito papa em 5 de julho de 1294 por um colégio de 12 cardeais que, em 27 meses de conclave, não tinham chegado a um acordo para a escolha do sucessor de Nicolau IV. Os eleitores optaram pelo nome do eremita, pobre e com fama de santo, quando ele lhes escreveu exortando-os a resolver logo o impasse. Escoltado por Carlos II, rei da Sicília e de Nápoles, seu protetor, chegou em um burrinho a Áquila. Era papa e, como tal, bispo de Roma, mas foi morar em Nápoles por ordem do rei.

De vida espiritual irretocável, era um administrador incompetente. Dava emprego a quem o monarca indicava e chegou a nomear dois ou três ocupantes para o mesmo cargo. No auge da Idade Média, não sabia latim, língua oficial da Igreja.

Decidido a voltar às orações na solidão de um mosteiro, Celestino V tentou confiar a administração a um colegiado de três cardeais. Como juristas canônicos argumentaram que não seria possível, ele resolveu renunciar e consultou o cardeal Benedetto Caetani sobre a legalidade da decisão. Caetani encorajou Celestino V e se fez eleger papa em seu lugar, num conclave-relâmpago, escolhendo o nome de Bonifácio VIII. Foi um choque para a Igreja, pois muitos perguntavam se um pontífice poderia renunciar.

Renúncia. Celestino V costuma ser apontado como caso único, mas pesquisadores enumeram mais quatro papas que foram forçados a abdicar: Ponciano, em 235; Silvério, em 537; João XVIII, em 1009; e Gregório XII, em 1415. Bento IX também abdicou, em 1045, em favor do padrinho, mas foi reempossado dois anos depois. Pietro del Murrone tentou voltar ao eremitério, mas Bonifácio achou mais prudente encarcerá-lo na torre de um castelo. Celestino não teria sido maltratado, mas permaneceu isolado até o fim da vida, em 1296.

Sob pressão do rei Felipe IV, da França, o papa Clemente V canonizou Pietro del Murrone em 1313. Santo no altar, mas um indolente na avaliação de Dante, que o mandou para o Inferno entre os ignavos, no Canto 3 da Divina Comédia, pelo pecado de ter proporcionado com sua renúncia a eleição de Bonifácio VIII, inimigo da família Alighieri. É a Celestino V que Dante se refere quando escreve, na tradução de Hernâni Donato: "Pude reconhecer alguns dos vultos, e entre estes, de repente, distingui a sombra daquele que fez a grande renúncia."

Um comentário:

  1. Caro irmão,

    Publiquei recentemente em meu blog uma reflexão sobre gratidão. Li que o senhor estava interessado no assunto. Caso queira dar uma verificada, o blog é www.gloriosaesperanca.blogspot.com e o post é "A Chave que Abre Portas de Graça".

    Abraço!

    Marcos Duarte

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