segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Adeus a Peter O'Toole, o Lawrence da Arábia do cinema

Para tristeza de todos os fãs da sétima arte, morreu no dia 14/12/13 o grande ator irlandês Peter O'Toole, aos 81 anos de idade.

Ainda que relativamente desconhecido para os jovens apreciadores do cinema, felizmente, não passou despercebido o seu falecimento.

Homenagens mais que merecidas foram feitas ao redor do mundo.

Alguns críticos de cinema e cinéfilos dizem que - curiosamente - o "grande pecado" de O'Toole foi ter começado por cima.

Tendo iniciado sua carreira na telona em 1960, já em 1962, aos 30 anos de idade, emplacou o papel-título pelo qual ficaria eternamente conhecido: Lawrence da Arábia.

Com apenas dois anos de filmografia, portanto, Peter O'Toole já havia alcançado o ápice a que um ator com sua fleuma e seu gabarito poderia almejar.

A partir daí, suas atuações em tantos outros filmes como "O Homem de La Mancha" (1972), "Calígula" (1979), "O Último Imperador" (1987) e "Troia" (2004), ou a brilhante e esquecida obra televisiva "O Caçador" ("Rogue Male", 1977), se tornaram meras notas de rodapé à sua inesquecível encarnação de "Lawrence da Arábia", dirigido por David Lean e inspirado no vulto histórico T. E. Lawrence, personagem real de uma das grandes aventuras da época da Primeira Guerra Mundial.

O que pouca gente sabe é que tanto Peter O'Toole como T. E. Lawrence, a quem ele deu vida no cinema a ponto se ser confundido com o personagem, tinham profundas raízes cristãs, que, cada um a seu modo e tempo, foram sendo diluídas durante suas trajetórias no planeta.

De origem galesa, T. E. Lawrence (1888-1935), que passou para a posteridade como o "Lawrence da Arábia", foi uma das mais emblemáticas figuras que emergiram do primeiro conflito que envolveu o mundo todo, de 1914 a 1918.

Numa época em que o colonialismo europeu iniciava sua decadência e aquela certa dose de, digamos, "cavalheirismo" medieval cedia vez à barbárie da (ainda incipiente) tecnologia moderna de guerra, T. E. Lawrence viajou em 1911 à Arábia, então pertencente ao Império Otomano (hoje Turquia), como assistente nas escavações arqueológicas promovidas pelo Museu Britânico.

Ainda que seu trabalho no Oriente Médio tenha se concentrado nas ruínas dos hititas e das Cruzadas, seu esforço científico lançou as bases da moderna arqueologia bíblica naquelas terras.

As profundas raízes cristãs de sua família - enfronhada em Oxford - fizeram com que Lawrence, desde a mais tenra idade, se interessasse pelos relatos bíblicos, e já em 1909 a sua correspondência enviada à Grã-Bretanha dava conta de que ele havia visitado e esquadrinhado 36 castelos e fortalezas (a maioria em ruínas) na região da Síria, Líbano e Palestina.

Com o estouro da Primeira Grande Guerra, em 1914, Lawrence, então na Inglaterra, é chamado de volta pelo exército britânico para trabalhar no Oriente Médio, que ele conhecia tão bem.

Seus laços com a comunidade nativa árabe, cultivados durante suas viagens nômades e seu trabalho arqueológico, fizeram com que Lawrence, insuflado pelos britânicos, os estimulasse a lutar contra o imperialismo otomano, que, aliado à Alemanha, era o inimigo comum de ambos os povos naquela zona conflagrada.

Antes de T. E. Lawrence morrer por
traumatismo craniano decorrente de um
acidente de motocicleta, ninguém pensava
em usar esse tal "capacete".
Depois de ajudar a consolidar a independência dos países árabes em relação à nascente Turquia, embora colocando-os sob a esfera britânica, Lawrence voltou para a Inglaterra, onde levou uma vida relativamente pacata até morrer num acidente de motocicleta em 19 de maio de 1935.

Curiosamente, outra de suas contribuições para a humanidade, ainda que involuntária, é que somente depois de sua morte o governo britânico investiu na cultura do capacete para motociclistas, o que veio a salvar milhões de vidas no mundo todo a partir de então.

Peter O'Toole, por seu lado, foi criado como católico na anglicana Leeds, tendo inclusive estudado num colégio de freiras durante os bombardeios nazistas da Segunda Guerra Mundial, embora tenha abandonado a fé a partir de sua adolescência.

Além de "Lawrence da Arábia", foi indicado 8 vezes ao Oscar da Academia de Hollywood, sendo sempre preterido até que finalmente, cônscios de seu erro, lhe outorgaram um Oscar honorário pelo conjunto de sua obra em 2003.

Entretanto, o já consagrado ator não conseguiu deixar a lembrança de Jesus para trás. Mais tarde, confessou: "Ninguém consegue tirar Jesus de mim... não há qualquer dúvida que ele foi uma figura histórica de tremenda importância, com enormes ensinamentos. Como a paz, por exemplo".

Não se sabe a extensão exata da fé de O'Toole e Lawrence, mas a feliz congruência desses dois grandes homens num personagem cinematográfico da maior relevância neste mundo moderno tão contraditório e ansioso por símbolos de fé e de coragem, faz com que a gente agradeça o privilégio de  ter conhecido as suas histórias de vida.

Peter O'Toole no papel-título de "Lawrence da Arábia" (1962)

Foto autografada de Peter O'Toole no papel de um dos três
anjos que visitam Abraão no épico "A Bíblia" (1966)



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