sábado, 21 de dezembro de 2013

Prática da meditação avança no mundo empresarial


Artigos publicados no jornal Valor Econômico em 07/10/13:

Meditação para aguentar a crise

Por John Paul Rathbone | Do Financial Times

Nos últimos 20 anos, todos os dias, duas vezes por dia, o executivo encarregado de aplicar dezenas de bilhões de dólares do fundo soberano de investimentos de Cingapura não pensa em nada. Ele faz isso sentando-se em silêncio e repetindo algo em sua cabeça. Depois de alguns minutos, sua respiração fica mais calma, os músculos de seu rosto relaxam e suas pálpebras param de tremer.

Sei disso porque estou sentado diante de Peter Ng. Mas, ao contrário dele, sou amador em meditação. Na metade de nossa sessão de 20 minutos, abri meus olhos após me ocupar com um pensamento: será que isso é mesmo compatível com o mundo cruel das finanças? A pergunta faz sentido, uma vez que Ng está sentado em uma almofada com uma propaganda do Chartered Financial Analysts Institute (CFA), um organismo definidor de normas para gestores de fundos e analistas financeiros.

Ao longo da última década, a meditação - a prática de se libertar dos pensamentos e emoções que representam nosso fluxo de consciência - deixou de ser algo esotérico para se transformar em uma atividade quase tão onipresente quanto os exercícios físicos ou o uso do fio dental. O Google e a General Mills, por exemplo, encorajam a prática para tornar seus funcionários mais produtivos.

Agora, a meditação também está entrando na área de finanças. Ray Dalio, fundador do Bridgewater, o maior fundo de hedge do mundo, com US$ 150 bilhões em ativos, não tem dúvidas quanto aos seus efeitos. "A meditação, mais do que qualquer outra coisa, é responsável por todo sucesso que já tive", garante. "Quando medito, adquiro uma tranquilidade que me permite ver as coisas de uma perspectiva mais elevada e, assim, tomar decisões mais sábias."

Lord Myners, ex-presidente do conselho de administração da Marks & Spencer e ministro do Tesouro britânico, também busca na prática uma ajuda para se concentrar. "A meditação faz com que eu me acalme e consiga ver as coisas de forma mais clara e abrangente", afirma. "Provalmente eu seja mais eficiente por causa dela, embora não vá dizer que a meditação me tornou uma pessoa melhor. Isso seria medonho!"

A ideia de que a meditação pode proporcionar uma sensação maior de tranquilidade já foi provada em testes clínicos e é conhecida pela neurociência. O CFA Institute ministra aulas de meditação e as escolas de negócios cada vez mais oferecem cursos sobre suas "vantagens comportamentais". No ano que vem, como parte de seu programa de MBA, a Universidade Georgetown terá um módulo liderado por Laurence Freeman, um monge beneditino que preside a Comunidade Mundial de Meditação Cristã.

Embora faça proselitismo dos benefícios da prática, Freeman é ciente de que seu componente espiritual pode afugentar muitas pessoas. "A meditação é um aspecto de uma tradição cristã muito antiga e universal que pode ser compartilhada com qualquer um", diz. "A distância que ela mantém das religiões formais proporciona uma zona de conforto."

Mesmo assim, muitos se mostram céticos de que "executivos macho-alfa" possam deixar seus egos de lado enquanto meditam. Grande parte dos profissionais do mercado financeiro ainda veem a prática como uma atividade "new age" duvidosa. Lord Leitch, presidente do conselho de administração da Bupa, organização privada de serviços de saúde, diz que a meditação pode gerar reações negativas. "Às vezes recebo olhares estranhos quando menciono algo sobre isso. Definitivamente não é para todos, mas acho que deveríamos estar abertos para técnicas que possam ser úteis em nossa vida."

Um problema mais difícil é encontrar tempo. "É o maior desafio, e o motivo que mais leva as pessoas a parar", diz Dalio, que medita desde 1969 e garante que as pessoas que a praticam por seis meses nunca mais voltam atrás. "Não consigo dizer qual é a diferença entre as pessoas que meditam e as que não, mas é possível notar uma mudança de comportamento em alguém que faz isso regularmente."

Para Sean Hagan, conselheiro do Fundo Monetário Internacional (FMI), que começou a meditar há 30 anos quando era um advogado novato do J.P. Morgan, é preciso estabelecer prioridades. "Você chega ao escritório todas as manhãs e sempre há muitas coisas para fazer. Essa situação é opressiva e pode provocar uma sensação de pânico", afirma. A meditação, desse modo, o ajuda a manter o foco e a fazer, com calma, uma coisa de cada vez. "Como a prática me proporciona muitos benefícios, ela é uma prioridade para mim", diz.

Outros, como Philipp Hildebrand, vice-presidente do conselho de administração da BlackRock e ex-presidente do Swiss National Bank, que medita há sete anos, arrumam um espaço em suas agendas quando podem - o que inclui aeroportos ou quando estão em trânsito entre reuniões. "Em um mundo de telas, textos, celulares e informação por toda parte, passar 20 minutos sem pensar em nada é uma coisa maravilhosa", diz Hildebrand.

Dominar a mente pode ajudar gestores a ter mais energia na vida profissional diária, mas é particularmente útil durante uma crise, "quando mercados voláteis e suas implicações para os lucros e as perdas podem realmente desequilibrar você", enfatiza Ng.

Nenhum dos entrevistados sugeriu que a meditação é um passaporte para o nirvana, ou algo incrível que acontece quando você simplesmente desliga o iPhone. "Não se trata de mágica", diz Lord Leitch. Na verdade, embora pareça estranho que profissionais do mercado financeiro, sempre criticados pela falta de ética, estejam interessados em meditação na esteira da crise, pode ser exatamente por causa dos problemas na economia que muitos estejam se voltando para ela.

"Em períodos de turbulência, as pessoas, especialmente as mais jovens, procuram você não só em busca de conhecimento técnico", diz Hildebrand. Nesse contexto, a meditação parece ter aumentado a disposição de alguns executivos em explorar sua própria interioridade. Se isso fará alguma diferença na ética do mundo financeiro, porém, ainda não se sabe.




Hábito zen desperta certo preconceito

Por Letícia Arcoverde | De São Paulo

No Brasil, o operador de ações da BI&P Indusval Fabio Galdino de Carvalho tem como hábito meditar entre 30 e 40 minutos antes de começar o dia. Quando "o corpo pede", o executivo até repete a dose à noite, após o expediente. Para ele, a prática ajuda no condicionamento físico e mental, e especialmente no relacionamento com clientes e colegas de trabalho.

Hoje no cargo de "equity sales trader", Carvalho trabalha no mercado financeiro há 28 anos e sabe que esse ambiente pode ser muito estressante. "Tenho mais discernimento para reagir em uma situação adversa", diz. "A meditação diminui o conflito, e tento transmitir isso para quem estou atendendo durante o dia". O costume começou em 2008, quando participou de uma atividade de autoconhecimento por sugestão de um colega do banco onde trabalhava. Isso abriu portas para outros cursos - um deles sobre meditação.

No entanto, ele conta que nem todos entendem como o hábito zen se relaciona com o trabalho e diz que há até um certo preconceito. "A meditação é algo que não tem apelo material, e o ambiente do mercado é oposto. Esses caminhos alternativos não fa



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