sábado, 18 de abril de 2015

Dietrich Bonhoeffer, 70 anos depois de sua morte

No dia 9 de abril de 1945, um mês antes da capitulação da Alemanha nazista frente aos aliados, Dietrich Bonhoeffer foi enforcado nu por ter tido a coragem de se opor à insanidade que havia tomado conta do país.

Em homenagem ao grande teólogo protestante alemão, reproduzimos o artigo abaixo publicado no IHU:


O desafio de Bonhoeffer ao nazismo.
Artigo de Alberto Melloni


Bonhoeffer não é um homem forçado a viver sob o nazismo: ele poderia ter ficado nos Estados Unidos ou em Londres, onde ele tinha sido levado pelo seu trabalho como teólogo e onde sonhou um concílio de todas as Igrejas para anunciar a paz de Cristo ao mundo em delírio.

A opinião é de Alberto Melloni, historiador da Igreja, professor da Universidade de Modena-Reggio Emilia e diretor da Fundação de Ciências Religiosas João XXIII de Bolonha. O artigo foi publicado no jornal Corriere della Sera, 09-04-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

Era dezembro de 1931. Um jovem livre professor evangélico, pároco dos estudantes da escola técnica de Berlim, ávido leitor do livro de capa violeta de Otto Dibelius, O século da Igreja, vai escutar uma palestra do admirado teólogo, superintendente geral da Igreja Luterana em Berlim.

E conta a Erwin Sutz a cena hilariante que se revela a ele: "Dibelius nos informou em uma conferência sobre o fato de que a Igreja tem 2.500 estudantes a mais e que, por isso, aos teólogos poderão ser feitos pedidos particulares, incluindo, em primeiro lugar, a disponibilidade ao martírio, em uma luta em que estariam entrelaçados ideais políticos e religiosos! (...). Os ouvintes pisoteavam como loucos: viva a 'Igreja violeta'".

O ouvinte afiado e cortante daquela infantil arrogância era Dietrich Bonhoeffer: jovem teólogo de alta linhagem acadêmica (o bisavô era o historiador da Igreja Karl August von Hase, chamado por Goethe a Jena, o avô era o pregador da corte Karl Alfred), cuja figura e cuja obra marcam um antes e um depois na história do cristianismo.

Bonhoeffer não é um homem forçado a viver sob o nazismo: ele poderia ter ficado nos Estados Unidos ou em Londres, onde ele tinha sido levado pelo seu trabalho como teólogo e onde sonhou um concílio de todas as Igrejas para anunciar a paz de Cristo ao mundo em delírio.

De volta à pátria, trabalhou no seminário clandestino da Igreja Confessante, na que Dibelius também tinha entrado: e aceitou entrar na contraespionagem alemã, posição essencial para uma ação de resistência que visava a matar Hitler.

Preso no dia 5 de abril de 1943, deu-se conta, depois do fracasso do complô de Canaris, que não tinha saída e, da prisão de Tegel, escreveu, em forma de pensamentos, cartas e poesias, textos que cumpriam o percurso teológico iniciado com a tese sobre a Communio sanctorum em 1927 e que continuou nos cursos (o de 1932 saiu em italiano no dia 22 de abril, com o título Tra Dio e il mondo [Entre Deus e o mundo], pela editora Castelvecchi, traduzido por Nicholas Zippel, p. 64 e 69).

Assim, naquela série de textos que seria reunida com o título Resistência e submissão, Bonhoeffer marca uma ruptura no modo de pensar Deus com uma "fé concreta". Em torno dessa interrogação da responsabilidade se desdobrará a sua vida como prisioneiro até o dia 9 de abril de 1945, quando, em uma Alemanha já derrotada, Bonhoeffer foi levado ao castelo de Flossenbürg, submetido a um processo rocambolesco para salvar as formas e enforcado pouco antes da chegada dos Aliados.

Bonhoeffer não vive esse trajeto com a alma febril dos pisoteadores exaltados da "Igreja violeta", mas com a dolorosa ternura de quem viu a dupla "substituição vicária" da Igreja e do mundo, colocada, uma, lá onde deveria estar o outro, em um deslocamento em que o Cristo se revela como tal "para o mundo" e não "para si mesmo".

Ele já tinha escrito isso em uma pregação de 1932: "É possível que o cristianismo, iniciado de modo tão revolucionário, seja agora e para sempre conservador? (...) Se é realmente assim, não devemos nos admirar que até mesmo a nossa Igreja volte ao tempo em que será pedido o sangue dos mártires. Mas esse sangue, admitindo-se que ainda tenhamos a coragem, a honra e a fidelidade para derramá-lo, não será tão inocente e luminoso como o das primeiras testemunhas. Sobre o nosso sangue, haverá o peso de uma nossa grandes culpa: a culpa do servo inútil, que é jogado para fora, nas trevas".

Mas, ao se reconhecer assim, ele descobre a graça cara. E, ao mesmo tempo, descobre que somente "o Christus intercedens nos assegura da graça de Deus".



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