domingo, 2 de agosto de 2009

Feridos pelo caminho

Não vou revelar nomes nem local – afinal, o que vou relatar acontece todo dia no Brasil - mas, há muitos anos atrás, acompanhei o processo de divisão de uma igreja tradicional, em que um dos seus líderes, incentivado por um conhecido líder evangélico, e descontente com a frieza que ele nela apontava, levou um grupo de irmãos a formar outra igreja, e, ainda que não fôssemos membros de nenhuma delas, eu e um irmão – alguns dias depois - fomos visitar a nova congregação, onde, após o culto, o líder em questão comentou conosco:

- Sabe o que é, irmãos, as igrejas que estão crescendo hoje são pentecostais, e por isso eu decidi fundar uma igreja pentecostal. É isso que funciona!

Apenas ouvimos a afirmação do recém-empossado pastor da recém-fundada igreja e ao sair de lá, o irmão que me acompanhava comentou, um tanto quanto assustado:

- Se o critério que o levou a abrir de uma igreja é o crescimento nos dias atuais, ele podia usar a mesma razão para montar um centro de umbanda ou espírita, já que eles também estão crescendo bastante.

Teologias e sarcasmos à parte, o motivo invocado pelo pastor para fundar uma nova igreja (“funciona!”) ainda era pretexto, no começo dos anos 80, para um movimento que estava no seu estágio inicial no meio evangélico brasileiro. 

Por mais que seus objetivos fossem nobres (“pregar o evangelho”), as suas palavras já revelavam a influência do utilitarismo nas igrejas, esta corrente filosófica que diz que “os fins justificam os meios” e que é hegemônica no mundo atual. 

Sem querer querendo, ele estava se tornando mais um refém do discurso utilitário do que propriamente um discípulo do evangelho. 

Afinal, as suas razões não estavam calcadas num exame mais aprofundado das Escrituras nem num espírito cristão de amor e compreensão. 

Queria, como qualquer utilitário, resultados rápidos e visíveis com o mínimo custo possível, ainda que não perdurassem no longo prazo. Afinal, muito mais valor se dá ao “pelos frutos os conhecereis” do Sermão do Monte (Mateus 7:16-20) do que ao “eu vos escolhi a vós, e vos designei, para que vades e deis frutos, e o vosso fruto permaneça” do discurso em que Jesus aprofunda o tema (João 15:16). 

Bem, se eles não se preocupavam com as pessoas que ficaram machucadas pelo processo de divisão, a questão da permanência dos frutos passava – inconscientemente, creio eu – a ser secundária. 

Aliás, eu tenho a impressão de que Deus se preocupa muito mais com os irmãos que ficam feridos pelo caminho do que aqueles que vêm à igreja, ficam por um tempo e depois somem no mundo. 

Como diz o próprio Jesus, “qualquer que fizer tropeçar um destes pequeninos que creem em mim, melhor lhe fora que se lhe pendurasse ao pescoço uma pedra de moinho, e se submergisse na profundeza do mar” (Mateus 18:6).

Pois bem, passaram-se os anos, as décadas, e daquele grupo inicial, muita gente se afastou e nunca mais quis saber de igreja, e vários outros líderes, formados na nova igreja, também invocaram as mesmas razões utilitárias para dividirem os irmãos e fundarem as suas próprias igrejas. 

Isto sem contar que o pastor-mor, que havia sido mentor do primeiro líder-divisor, muitos anos depois se envolveu num adultério, que terminou confessando apenas para o seu filho (também pastor), que, incapaz de lidar com a história sozinho, terminou me contando o fato, que também era conhecido (ou suspeitado) por outros irmãos. 

O pastor-mor não quis se retratar e confessar o pecado à sua congregação, talvez por achar que uma confissãozinha a seu filho podia quebrar o seu galho e aliviar a sua consciência. Até protestantes tornam-se católicos quando convém.

Por fim, deixo uma mensagem aos que ficaram feridos pelo caminho. Infelizmente, vocês viram, da pior maneira possível, como uma visão do evangelho distorcida e contaminada pelo utilitarismo, pode afastá-los do verdadeiro prazer de ser cristão, compartilhar suas dores e bênçãos, orar e estudar a Bíblia, e ajudar a construir um mundo melhor. 

Não existe igreja perfeita, isto é fato, mas há muitos crentes imperfeitos que NÃO são hipócritas nem querem se locupletar às custas do sofrimento alheio. 

 Aqueles que promovem divisões darão conta de si mesmo a Deus, que os acusa de serem sensuais e não terem o Espírito (Judas 1:19). 

A palavra aí traduzida por “sensuais” é, no original grego, ψυχικός – psuchikos – que quer dizer, literalmente, “governados pelas próprias paixões, pelo próprio apetite”. 

Entreguem-nos, portanto, ao justo juízo de Deus, mas não fiquem lambendo indefinidamente as suas feridas. 

Vocês aprenderam como NÃO fazer a obra de Deus, agora estão preparados para fazê-la da maneira correta, com toda a humildade, mansidão e perdão. 

Não permitam que farsantes e falsificadores do evangelho retenham o seu perdão, nem bloqueiem o seu caminho até Deus. Voltem! A Igreja e os seus irmãos precisam de vocês.

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