sábado, 19 de novembro de 2016

"Strange Fruit", de Billie Holiday, a 1ª canção de protesto

Tempos bicudos esses em que estamos vivendo, não é mesmo?

Parece que esse tal "progresso" da civilização humana é só uma balela que nos vendem para entorpecer nossos sentidos a fim de que não percebamos como a depravação é inerente à nossa espécie inacreditavelmente chamada de "sapiens".

Rumos estranhos esses que o nosso planeta está tomando. Protestar resolve?

É tão difícil responder essa questão com o mínimo de isenção como estabelecer qual foi a primeira "canção de protesto".

Afinal, se você considerar por um certo ângulo, a Marselhesa (o hino nacional da França) é um canto de guerra (composto em 1792 pelo oficial Claude Joseph Rouget de Lisle) que não deixa de ser uma canção de protesto contra os "feróces soldats" que vêm "égorger ("degolar") vos fils, vos compagnes", com o inconveniente hoje politicamente incorreto de "que um sangue impuro banhe o nosso solo" (qu'un sang impur abreuve nos sillons!).

Só que a marcial e revolucionária "La Marsellaise" dá um pique e tanto, você há de concordar. Basta ouvi-la antes dos jogos de futebol da seleção francesa que até o time adversário se sente intimidado.

Já "Strange Fruit" tem uma história mais singela, mas igualmente carregada de dor e pavor.

Originalmente composta em 1937 na forma de poema por um militante comunista norteamericano (sim, eles existiram um dia), Abel Meeropol, sob o pseudônimo de Lewis Allan, ele depois a musicou e a cantou junto com sua esposa e a cantora Laura Duncan em vários comícios em Nova York, inclusive no mítico Madison Square Gordon.

Meeropol compôs o poema depois que viu a foto de dois homens negros, Thomas Shipp e Abram Smith, pendurados (enforcados) em 1930 numa árvore num dos muitos linchamentos por motivação racista que eram comuns no Sul dos Estados Unidos até a década de 1960.

Evitando ferir susceptibilidades, não publicamos a foto aqui, mas ela pode ser vista na página da Wikipedia que trata do acontecimento. 

Em 1939, a canção chegou à lenda chamada Billie Holiday, que após muita resistência dela própria, de sua gravadora e de seu empresário, terminou gravando aquela que ficou conhecida como a primeira canção de protesto da história, pelo menos no que diz respeito à era da popularização da música e da massificação da informação.

Billie dizia que "Strange Fruit" lhe trazia à memória a morte de seu pai, que - devido ao racismo - não pode ser tratado do problema de pulmão que o incomodava.

Ouça, portanto, este clássico, cuja letra e tradução segue mais abaixo:





STRANGE FRUIT

Southern trees bear a strange fruit
Blood on the leaves and blood at the root
Black bodies swinging in the southern breeze
Strange fruit hanging from the poplar trees

Pastoral scene of the gallant south
The bulging eyes and the twisted mouth
Scent of magnolias, sweet and fresh
Then the sudden smell of burning flesh

Here is fruit for the crows to pluck
For the rain to gather, for the wind to suck
For the sun to rot, for the trees to drop
Here is a strange and bitter crop




FRUTA ESTRANHA

Árvores do sul produzem uma fruta estranha
Sangue nas folhas e sangue nas raízes
Corpos negros balançando na brisa do sul
Fruta estranha penduradas nos álamos

Pastoril cena do valente sul
Os olhos inchados e a boca torcida
Perfume de magnólias, doce e fresca
Depois o repentino cheiro de carne queimada

Aqui está a fruta para os corvos arrancarem
Para a chuva recolher, para o vento sugar
Para o sol apodrecer, para as árvores deixarem cair
Aqui está a estranha e amarga colheita



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