quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Igreja não dá voto, mas tira

Interessante análise do inesperado (e fulminante) esvaziamento de votos de Celso Russomanno no 1º turno da eleição paulistana, publicado no Valor Econômico de 10/10/12. 

Só fiquei curioso para saber quem eram os membros dessa tal "comissão de notáveis" montada pelo deputado estadual Campos Machado (PTB).

Talvez tenham se esquecido do velho ditado que ensina que "não existem almoços grátis". Eis a matéria:

A desconfiança que rifou Russomanno

Cristian Klein

Dez dias antes do debate que marcou o início da queda livre de Celso Russomanno (PRB) nas pesquisas de intenção de voto, a campanha do candidato derrotado no primeiro turno da eleição à Prefeitura de São Paulo já detectava a dificuldade de manter a liderança na reta final. Pesquisas internas mostravam que 33% dos eleitores de Russomanno consideravam que sua maior fraqueza era o despreparo. O candidato era visto como o "gente boa", o "amigão", mas não saberia administrar a cidade.

"Havia um elemento de dissuasão, faltava o gatilho. O PT viu isso", afirma Fábio Gomes, diretor do instituto Informa, que realizou pesquisas para Russomanno.

No sábado, 15 de setembro, Fábio Gomes apresentou os resultados de uma pesquisa qualitativa não muito otimista à cúpula da campanha. "Eles diziam: 'Você nos fala de números bons, mas põe uma pulga atrás da nossa orelha...'", conta Gomes.

A pesquisa indicava o que o sociólogo chama de "rejeição latente": Russomanno era querido pelo eleitor, mas não inspirava confiança quanto à capacidade administrativa. Quando o flanco começou a ser explorado, criou uma espécie de círculo vicioso. O pesquisador considera que houve um reforço mútuo de três "gatilhos".

O primeiro foi o ataque de Fernando Haddad (PT) à proposta de se cobrar uma tarifa de ônibus proporcional ao trajeto percorrido. Com isso, Haddad conseguiu recuperar os eleitores da periferia, que estavam em peso com Russomanno, mas tradicionalmente votam no PT. O tema ganhou importância quando o petista criticou a proposta do adversário no debate da TV Gazeta, no dia 24.

O segundo gatilho foi a mobilização da Igreja Católica. No domingo, dia 16, padres de 300 paróquias leram durante as missas um artigo do cardeal arcebispo dom Odilo Scherer com críticas à "manipulação política da religião". Era uma referência à ligação do partido de Russomanno com a Igreja Universal do Reino de Deus. Calcula-se que cerca de 600 mil fiéis teriam participado das missas. "Isso reverberou. Igreja não dá voto, mas tira", afirma Fábio Gomes.

O terceiro gatilho veio como consequência dos dois anteriores: o início da queda nas pesquisas provocou uma espécie de efeito dominó. O pesquisador afirma que a preferência por Russomanno estava muito baseada num voto útil, em virtude de sua liderança. Quando o candidato começou a perdê-la, o resto desmoronou mais facilmente. "Mas a bala de prata foi o ataque à proposta de transporte", afirma.

Gomes concorda que faltou à campanha um programa de governo "mais consistente" e afirma que uma resposta mais eficiente aos ataques não foi possível por dois motivos. Em primeiro lugar, porque o pouco tempo de propaganda no rádio e TV foi insuficiente quando o candidato passou a ser alvejado por todos os adversários, não só Haddad. "Para crescer, o tempo de TV não foi problema, mas para responder ao volume de ataque dos outros, era curto para se proteger", diz.

A segunda razão seria estratégica. O deputado estadual Campos Machado (PTB), presidente do conselho político, teria decidido abordar a questão do transporte no segundo turno, já que o primeiro estava praticamente garantido. "Imperou a palavra do Campos Machado, a quem respeito e que dizia que a gente poderia resolver depois. Ele não queria criar um fato (político)", afirma.

Campos Machado nega a decisão. "Pelo contrário, eu propus que se viesse a público para dizer que, tendo em vista a reação das pessoas, que estávamos voltando atrás. O D'Urso é testemunha", rebate.

O deputado diz que até o debate na TV Gazeta "desconhecia totalmente" a proposta de Russomanno sobre transporte, já que o plano de governo "foi feito pelo PRB e não pela coligação". "Eu era presidente do conselho político. Plano de governo, marketing, TV, isso tudo estava com o PRB. Não era minha atribuição. Só agi quando o assunto virou um fato político. Constituímos uma comissão de notáveis para fazer o programa. Mas quando você precisa explicar muito alguma coisa é que você se complica. Não foi problema de religião. Um plano elaborado pelo terceiro escalão dá nisso", diz Campos Machado, numa crítica aos supostos autores da ideia - funcionários da prefeitura ligados a Russomanno.

Ainda sobre as pesquisas qualitativas, Fábio Gomes conta que o julgamento do mensalão nunca apareceu como tema relevante nos grupos de discussão. E que embora Haddad também despertasse dúvida sobre a capacidade administrativa, tinha o crédito de confiança por ser indicado pela presidente Dilma Rousseff e pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.



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