quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Confusão entre delegado e igreja do Tupirani termina em tentativa de homicídio no RJ

Em junho de 2011, já divulgávamos aqui as confusões em que se mete a igreja do Tupirani no Rio de Janeiro. Ontem, 03/09/14, parece que a coisa extrapolou ainda mais, segundo noticia O Globo:

Delegado que investiga casos de desrespeito a religiões é preso após atirar em fiel de igreja

Caso aconteceu no 5º Juizado Especial Cível, em Copacabana. Confusão começou no fim de audiência

Dandara Tinoco (Extra), Gustavo Goulart, Luã Marinatto (Extra) e Marcel Tardin

RIO — Uma longa história de antagonismos entre seguidores da igreja Geração Jesus Cristo e o delegado Henrique Pessoa, encarregado de combater a intolerância religiosa no estado, terminou, nesta quarta-feira, com a prisão em flagrante do policial por tentativa de homicídio, após ele ter baleado um fiel. O incidente aconteceu por volta das 15h30m no 5º Juizado Especial Cível, na Rua Siqueira Campos, em Copacabana, onde o delegado move uma ação contra um integrante da igreja que o perseguia por meio de redes sociais. Em 2008, o delegado colaborou com um inquérito no qual seguidores da Geração Jesus Cristo foram acusados de terem depredado um centro espírita. Ao fim da audiência, houve confusão entre Pessoa e um grupo de 20 fiéis. Cercado, o delegado, que foi agredido por evangélicos, fez o disparo, ferindo na barriga Carlos Gomes, de 29 anos, que está internado no Hospital Miguel Couto e não corre risco de vida.

EM 2008, INVASÃO A CENTRO ESPÍRITA

Há seis anos, três homens e uma mulher integrantes da igreja, que tem sede no Morro do Pinto, no Santo Cristo, foram denunciados pela invasão ao Centro Espírita Cruz de Oxalá, no Catete, onde quebraram imagens de santos e agrediram frequentadores. Em 2009, o pastor da Geração Jesus Cristo, Tupirani da Hora Lores, e o fiel Afonso Henrique Alves Lobato se tornaram as primeiras pessoas presas no país por intolerância religiosa. Lobato havia divulgado um vídeo, com o consentimento do pastor, no qual fazia ofensas a religiões de matriz africana, afirmando, por exemplo, que “todo pai de santo é homossexual” e que “centro espírita é lugar de invocação do diabo”. O fiel foi um dos acusados de depredar o templo no Catete.

Na época, o delegado Henrique Pessoa, representante da Polícia Civil na Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR), disse que imagens e textos postados por fiéis da igreja na internet foram provas importantes no inquérito. Os dois acusados, no entanto, ficaram menos de um mês na prisão. Depois de serem soltos, divulgaram dezenas de vídeos com ofensas ao candomblé e à umbanda, intensificando os atritos com o delegado.

Em 2010, a Polícia Civil criou o Núcleo de Combate à Intolerância Religiosa, comandado por Henrique Pessoa. No mês passado, em entrevista ao GLOBO sobre o assunto, ele chegou a afirmar:

— A internet tem sido usada de forma deliberada. As pessoas acham que a rede é terra de ninguém, então, atualmente, esse é um dos principais meios de disseminação das ofensas.

AÇÃO POR DANOS MORAIS

A vítima baleada nesta quarta-feira não era o alvo da ação judicial movida pelo policial, que, além de atuar no núcleo e na CCIR, trabalha na 79ª DP (Jurujuba). O delegado está processando por danos morais um outro fiel, o cabeleireiro Márcio Pereira Carvalho, de 35 anos, que teria revelado o endereço residencial de Pessoa ao divulgar documentos no Facebook, onde também teria postado um texto com ofensas a ele. O delegado alegou que, depois da audiência de conciliação, na qual não houve acordo, foi cercado por cerca de 20 seguidores da igreja. Pessoa afirmou ainda que foi atacado e que atirou para o chão, para se defender.

— Eles (os fiéis) se organizaram pelo Facebook, e hoje (quarta-feira) havia um grupo de cerca de 20 homens no juizado. Quando fui atacado, tentei me desvencilhar. Acabei puxando a pistola e dando um tiro. Tomei muitos chutes. Estou com a cabeça arrebentada e muito abalado — disse Pessoa, que conversou com o GLOBO pouco antes de ser internado sob custódia da polícia no hospital Copa D’Or.

Filha e advogada do delegado, Luciana Pessoa também afirmou que o policial foi atacado:

— Ele sofreu escoriações na cabeça e chegou a desmaiar durante a confusão. Atirou em legítima defesa.

No entanto, segundo a delegada Izabela Santoni, titular da 12ª DP (Copacabana), imagens das câmeras de segurança do juizado — que não foram divulgadas — mostram que o policial atirou diretamente contra o fiel. De acordo com ela, quando sair do hospital, Pessoa será autuado por tentativa de homicídio. Em seguida, ele deverá ser levado para o complexo penitenciário de Gericinó.

— No vídeo, é possível ver que não houve legítima defesa, por isso apresentei uma representação pela prisão — justificou a delegada.

POLICIAL DO TJ TENTOU INTERVIR

Segundo a assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça (TJ) do Rio, um policial militar lotado no juizado teria tentado intervir na briga. No entanto, ainda de acordo com o TJ, o delegado teria atirado contra o fiel por baixo de um braço do PM.

O pastor Tupirani, que estava nesta quarta-feira com fiéis da Igreja Geração Jesus Cristo no 5º Juizado Especial Cível, também acusou o delegado: disse que ele o agrediu durante a confusão.

— No momento em que a briga aconteceu, ele me deu uma cabeçada — disse Tupirani.

O juizado fica no Shopping Cidade Copacabana, também conhecido como Shopping dos Antiquários. De acordo com uma mulher que participava de uma audiência no local, na hora da confusão, houve pânico.

— Eu tinha visto, na sala de espera, umas cinco pessoas usando camisetas pretas com inscrições estranhas, como “Morro por Cristo e não morro pela pátria”. Durante a audiência, começamos a ouvir sons que pareciam ser de luta corporal e gritos de “assassino”. Em seguida, ouvimos o barulho de um tiro. Nós nos deitamos no chão e ficamos cerca de dez minutos trancados na sala. Quando saí, vi que um dos jovens de camiseta preta estava no chão, baleado. O tiro o atingiu no lado esquerdo da barriga, mas ele estava consciente. Havia uma ambulância do lado de fora do juizado e muitos policiais militares — contou ela.

FIÉIS: TENTATIVA DE LINCHAMENTO

Outra testemunha, que trabalha num antiquário do shopping e preferiu não se identificar, disse que o delegado teria rendido um segurança da audiência antes de fazer o disparo que atingiu o fiel. Depois, segundo ela, seguidores da igreja tentaram linchar o policial, já na Rua Siqueira Campos.

— Eu havia saído da loja para me encontrar com meu marido na rua quando ouvi uma gritaria. Aí, vi o delegado sendo perseguido por um grupo de fiéis da igreja, que estavam revoltados. Foi uma confusão enorme, eles bateram nele. Perguntei a uma menina do grupo o que tinha acontecido e ela me disse que, durante a audiência, o policial conseguiu render um segurança e tentou atirar no pastor, mas errou e deu cabeçadas em outros rapazes. Foi uma loucura — disse a testemunha.

Uma perícia foi feita no local. De acordo com a Polícia Civil, a corregedoria interna da corporação também vai investigar o caso.

DENÚNCIA, PRISÃO E ESCALADA DE ACUSAÇÕES

Depois da investigação sobre o ataque ao centro espírita do Catete, que levou à prisão do pastor e de um membro da Geração Jesus Cristo, começaram as provocações e acusações de fiéis da denominação contra o delegado Henrique Pessoa. Após sair da cadeia, o próprio Tupirani deu início a uma campanha contra o policial, principalmente usando a internet, onde divulgou uma série de vídeos contra Pessoa, alguns com legendas em inglês. Num desses vídeos, o pastor diz que, quando foi preso, o delegado se apresentou a ele como “macumbeiro”. Tupirani relata ainda que o policial teria afirmado: “Armei tudo isso para você”.

Num outro vídeo, de 40 minutos, intitulado “Pastor massacra delegado”, Tupirani chama Pessoa de “delegadinho de merda” e “babaca”. Também o ameaça: “Você não vai sair daqui. Sua vida, que não é tão longa assim quanto você pensa, vai ser tentando vencer aqui, a mim. E eu não vou deixar você escapar para canto nenhum. Eu te cerquei, te enlacei no pescoço e é aqui que você vai ficar. Tu vai ter que tratar comigo agora, todos os seus dias você vai ter que tratar comigo. Você não vai conseguir se mexer para canto nenhum. Eu jurei pelo meu sangue que você tinha acendido a fogueira e que ela não ia se apagar’’.

Tupirani, que diz ser ‘‘o primeiro pastor preso pela ditadura democrática do Brasil”, instituiu o que chama de Dia do Pastor Perseguido: 19 de junho. Nessa data, ele e seus seguidores realizam, todos os anos, protestos em frente à Polícia Civil e ao Tribunal de Justiça.



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