segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Pastores batistas afroamericanos são a grande força da esquerda nos EUA


Ao contrário do que ocorre no Brasil, onde pastores evangélicos se candidatam a Presidente da República com uma agenda neoliberal, tida como de "direita" no espectro ideológico, como ocorreu recentemente com o pastor Everaldo, do PSC, nos Estados Unidos muitos pastores evangélicos se identificam com uma ideologia em que o Estado é mais intervencionista para garantir os direitos básicos das minorias e dos setores mais pobres da população, uma das características daquilo que se entende por "esquerda".

Há que se reconhecer, também, que o arco ideológico norteamericano não é tão amplo assim, já que ninguém pretende mudar o sistema capitalista do país, mas em geral se considera o Partido Democrata à esquerda e o Republicano à direita das opções eleitorais.

Por outro lado, é claro que há pastores de esquerda no Brasil assim como pastores de direita nos Estados Unidos. O que varia - talvez - seja a tendência do momento.

Como amanhã, 4 de novembro de 2014, haverá eleições para o Congresso americano, pastores batistas de ascendência africana estão se mobilizando para influenciar nos resultados.

A matéria foi publicada na Folha de S. Paulo de 31/10/14:

Aleluia, Obama!

Pastores evangélicos negros, todos de esquerda, viram esperança dos democratas para evitar derrota na eleição congressual de terça-feira

RAUL JUSTE LORES

Um grupo de pastores, quase todos negros, de igrejas batistas do sul dos EUA criou uma versão evangélica do "Occupy Wall St.", movimento contra os excessos do capitalismo surgido em 2011.

Semanalmente, eles organizam marchas de protesto e ocupam assembleias legislativas e outros prédios públicos em cidades como Charlotte e Raleigh (Carolina do Norte), Atlanta (Geórgia) e Charleston (Carolina do Sul).

Chamados de pastores progressistas, eles querem o aumento do salário mínimo, lutam contra cortes na educação e na saúde e se opõem a restrições ao voto das minorias. Defendem o direito ao aborto e o casamento gay

Às vésperas das eleições legislativas americanas, na próxima terça (4), eles têm liderado comícios bem mais animados que os dos candidatos democratas que tentam desafiar o controle republicano do conservador sul do país.

Como o Partido Democrata do presidente Barack Obama pode perder o controle do Senado (e continuar sendo minoria na Câmara), os pastores viraram a esperança de aumentar a participação de um eleitorado desanimado com a gestão de Obama. O voto nos EUA não é obrigatório.

Na quarta (29), o reverendo Raphael Warnock, 44, líder da Igreja Ebenezer, em Atlanta, fez um minicomício na calçada em frente ao templo. Ao lado do candidato democrata ao governo da Georgia, Jason Carter, o pastor dizia que "economia é boa quando não só os negócios crescem, mas quando os pobres e a classe média vivem melhor".

Com oratória empolgante e usando "Amém" entre as frases, foi bastante mais aplaudido que o apagado neto do ex-presidente americano Jimmy Carter.

"Tem algo errado quando você precisa ter dois empregos e mal consegue pagar seu plano de saúde. E quando o governo de seu Estado se nega a participar do plano de saúde do governo federal", continuou o pastor, diante da igreja onde Martin Luther King Jr., herói do movimento contra a segregação racial, foi pastor nos anos 60.

Em rápida conversa com a Folha, ele brincou que "pregava para os convertidos". "Os fiéis aqui sabem que política é parte integral do que somos", disse.

OCUPAÇÕES E PRISÕES

O movimento começou no ano passado na Carolina do Norte, logo depois do governo estadual republicano aprovar um pacote de leis que cortavam fundos para serviços sociais, dificultavam o registro de eleitores de minorias e se negar a participar do plano de saúde universal do governo federal americano.

O reverendo William Barber 2º e a pastora lésbica Nancy Petty, de igrejas batistas de Raleigh, começaram a fazer as "Moral Mondays" (segundas-feiras morais), marchas que combinam atos de desobediência civil.

Já nas primeiras manifestações, dezenas de pastores foram presos. Mas o movimento continuou a crescer --estima-se que 900 pessoas já tenham sido presas durante as ocupações, que se espalharam para outros 11 Estados.

Numa delas, dezenas se sentaram pelo gabinete do presidente da Assembleia Legislativa local. Foram retirados pela polícia.

Na semana passada, em um evento em Charlotte, que a Folha pôde assistir, o reverendo Barber 2º disse que sua plataforma vai além dos partidos políticos.

"Nossa agenda é antipobreza, antirracismo, antiguerra e antidiscriminação", disse o carismático e corpulento pastor de 50 anos de idade. Isso apesar de claramente fazerem campanha para os democratas (do jeito que outras igrejas no Texas militam para os republicanos).

"Toda religião diz que amor e justiça deveriam estar no centro da política", discursou Barber. E citou a Bíblia, capítulo 10 do profesta Isaías: "Ai dos que decretam leis injustas que privam dos direitos os mais necessitados".



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