terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Feliz 2009!

Uma meditação para o ano que se inicia daqui a pouco:




O MELHOR ANO DA SUA VIDA

Leitura bíblica:

"Porque sou eu que conheço os planos que tenho para vocês", diz o Senhor, "planos de fazê-los prosperar e não de lhes causar dano, planos de dar-lhes esperança e um futuro. Então vocês clamarão a mim, virão orar a mim, e eu os ouvirei. Vocês me procurarão e me acharão quando me procurarem de todo o coração."

(Jeremias 29:11-13)


Meditação:


O sinal seguro de que temos um relacionamento autêntico com Deus é crermos mais no futuro que no passado. O passado não pode ser fonte de confiança nem de condenação. Na sua graça, Deus dividiu nossa vida em dias e anos para que pudéssemos abrir mão de nossos ontens e antegozar os nossos amanhãs. Para os erros passados, ele oferece-nos o perdão e a habilidade de esquecer. Para nossos amanhãs, ele nos dá a dádiva da expectação e da emoção.

O que o Senhor disse ao povo de Israel que se definhava no exílio babilônico aplica-se a qualquer de nós que nos encontramos exilados dele, sem esperança para o futuro. Ele tem planos para cada um de nós - bons planos para nosso crescimento em sua graça - a fim de que tenhamos um futuro com esperança. Emil Brunner disse: "O que o oxigênio é para os pulmões, a esperança é para a alma." A esperança possibilita uma qualidade de vida imprescindível; liberta-nos para ousar, dá-nos a confiança para as frustrações diárias e a coragem para viver a vida venturosamente. A dádiva da esperança para o futuro é a chave que abre as comportas do poder do Senhor e destranca o fluxo de suas possibilidades surpreendentes e ilimitadas.Muitos dizem: "Precisamos ter esperança!" como se a esperança fosse algo que pudéssemos conseguir por nós mesmos. A esperança vem de algo ou de alguém. A esperança autêntica vem de Cristo, por causa do que ele é e do que ele pode fazer. Sua ressurreição é a fonte suprema de esperança. Nada pode derrotar a Cristo". O pior que o homem fez no Calvário foi seguido da melhor esperança para todas as eras. Ele se encontra conosco hoje a fim de dar-nos ânimo para o futuro.

Ele está no controle deste novo ano. Ele tem um plano! Entregue-lhe o ano que você tem pela frente, agradeça ao Senhor, pois tudo o que lhe vai acontecer está de acordo com o que ele planejou a fim de ajudar-nos a nos tornarmos mais à sua semelhança. Tenha um ano cheio de alegria!


Pensamento do dia:


O melhor que Deus tem para a minha vida começa com uma esperança vibrante para o futuro.


(Lloyd John Ogilvie, em "O QUE DEUS TEM DE MELHOR PARA A MINHA VIDA", Ed. Vida, meditação de 1º de janeiro)

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Crescimento evangélico no Brasil




O crescimento das igrejas evangélicas no Brasil é um fenômeno relativamente novo, e, ao que parece, pode ser mensurado muito mais quantitativa do que qualitativamente. 

Atribui-se o sucesso recente à massificação da pregação de algumas igrejas, nem sempre comprometidas com o evangelho, diga-se de passagem. 

Este não deixa de ser um fator importante na atual conjuntura, mas gostaria de ir mais fundo na busca das raízes deste crescimento, sem preocupações metodológicas, mas apenas pelo prazer de investigar. 

Para tanto, vou desconsiderar também, como ferramenta de análise(por óbvio) o fator espiritual. 

É claro que, como cristão, creio firmemente que o Senhor incentiva e fortalece a pregação da Sua palavra. 

Entretanto, a abordagem que proponho é mais histórica.

A partir desse pressuposto, creio que o fenômeno do crescimento da população evangélica brasileira tem suas raízes na década de 70. 

A ditadura militar deu o golpe de 1964 com muito apoio de todas as igrejas, mas principalmente a Católica, que era majoritária. 

Com o passar dos anos, e as torturas e tudo mais, a Teologia da Libertação ganhou força e muitos padres e bispos passaram a combater a ditadura abertamente, enquanto as poucas igrejas evangélicas que havia no país continuavam ao lado dos militares, com raras exceções.

Curiosamente, o papa João Paulo II, depois de assumir o Vaticano em 1978, passou a combater a Teologia da Libertação, e enquanto os católicos brigavam entre si, sem o apoio da ditadura, houve um desencanto de muitos católicos que saíram da Igreja, e com a abertura democrática em 1985, o terreno estava aberto para novas igrejas, com muitas se aproveitando da abertura e desenvolvimento dos meios de comunicação.

Houve também um movimento mundial de teologia da prosperidade, que já era forte na década de 70, mas fazia parte da ideologia americana de promover o capitalismo, promover também a teologia da prosperidade contra a teologia da libertação socialista. 

Afinal, vivíamos em plena Guerra Fria, que só acabou no começo dos anos 90. 

O final do século XX presencia também o fortalecimento de uma corrente filosófica majoritária hoje em dia, o utilitarismo, ou seja, a ideia de que "os fins justificam os meios" e é sempre importante "maximizar os lucros e minimizar as perdas", que hoje você pode reparar como é predominante na mensagem de algumas igrejas em que eles apelam para os "resultados" que apresentam, ou seja, a fé verdadeira é, para eles, a fé que apresenta resultados. 

Qualquer semelhança com o utilitarismo não é mera coincidência. 

Suponho, portanto, que a proliferação das igrejas evangélicas no Brasil tenha se dado num contexto em que múltiplos fatores concorreram para promovê-la.

Tudo isto, é claro, apenas a título de contribuições iniciais e despretensiosas para um debate que precisa ser aprofundado.

Urgentemente!



segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Epicuro e a existência de Deus

Atribui-se a Epicuro a frase 'Se Deus pode acabar com o mal mas não quer, é monstruoso; se quer, mas não pode, é incapaz; se não pode nem quer, é impotente e cruel; se pode e quer, por que não o faz?', que é comumente usada para se questionar a existência de Deus, muitas vezes sem a referência correta, até para que se evitem as seguintes observações:

Primeiro, Epicuro, filósofo grego pai do epicurismo (muitas vezes confundido com o hedonismo), acreditava na existência de Deus, conforme se pode ver no começo da "Carta a Meneceu", que pode ser lida - baixando o arquivo em PDF - clicando aqui.

Segundo, a frase é propositalmente contraditória, pois, argumentativamente falando, duvidar da existência de Deus é - pelo menos para Ele - intrinsecamente mau, logo, se Deus acabasse com o mal, acabaria também com a possibilidade de se discutir a Sua existência.

Terceiro, acabar com o mal, na visão cristã, significa acabar com a humanidade, já que a maldade é inerente ao homem pelo pecado original. A proposta cristã é a da redenção final futura pela fé em Jesus.

Quarto, segundo C. S. Lewis, a maldade é, no fundo, uma bondade corrompida (leia o texto clicando aqui), já que a pessoa má busca através - da maldade que perpetra - uma bondade pervertida, ou seja, algo que lhe dá um determinado prazer mórbido. Logo, uma interpretação possível da frase de Epicuro, é que Deus é tão bom que permite (ou tolera) que o homem livre faça uma maldade imaginando que ela seja perversamente boa para si mesmo.

Bondade x Maldade - por C. S. Lewis



"Qual é então o problema? O de um universo que contém muitas coisas evidentemente más e aparentemente desprovidas de sentido, mas que contém igualmente criaturas como nós, que sabem que existem coisas más e absurdas. Ora, há apenas dois pontos de vista que levam em consideração todos os dados desse problema. Um deles é o cristão, segundo o qual este mundo é um mundo bom que se corrompeu em boa parte, mas que continua a manter viva a memória do que deveria ter sido. O outro é o do chamado dualismo, segundo o qual há dois poderes iguais e independentes por trás de todas as coisas, um bom e outro mau, e este universo é o campo de batalha em que travam um contra o outro uma guerra sem fim. Pessoalmente, penso que, depois do cristianismo, o dualismo é a ideologia mais nobre e sensata que se encontra à disposição no mercado. Mas padece de um defeito de fabricação.

Os dois poderes, ou espíritos, ou deuses – o bom e o mau -, são vistos como completamente independentes. Ambos existem desde toda a eternidade. Nenhum deles fez o outro, nenhum deles tem mais direito que o outro de chamar-se Deus. Cada um, presumivelmente, pensa que ele é que é bom e outro é mau. Um deles aprecia o ódio e a crueldade, o outro prefere o amor e a misericórdia, e cada um está disposto a defender o seu ponto de vista. Ora bem, que queremos nós dizer quando chamamos a um deles o Poder Bom e ao outro o Poder Mau? Há apenas duas opções: ou estamos dizendo simplesmente que preferimos um ao outro – como quem prefere cerveja a vinho -, ou estamos dizendo que um deles realmente está errado ao considerar-se bom, pouco importando o que eles próprios pensem a respeito um do outro e qual deles nós, os homens, prefiramos no momento.

Ora, se o que queremos dizer é apenas que, pessoalmente, preferimos o Poder Bom, então temos que deixar de lado de uma vez por todas as expressões “bem” e “mal”. Porque a palavra Bem significa justamente aquilo que se deve preferir sempre, sejam quais forem os nossos gostos ou disposições num determinado momento. Se “ser bom” não significasse mais do que alistar-se na facção que nos “caiu bem” sem termos qualquer motivo real para fazê-lo, então o Bem não mereceria ser chamado Bem. Portanto, afirmar que há um “Poder Bom” e outro “Mau” só faz sentido se pretendemos significar que um deles está objetivamente errado e o outro objetivamente certo.

No momento em que reconhecemos esta verdade, porém, estamos aceitando implicitamente que existe no universo uma terceira coisa além desses dois poderes: algum tipo de lei, de padrão ou regra do bem, com o qual um desses poderes – o bom – está de acordo, e o outro não. Mas, se ambos devem ser julgados por esse padrão, então esse mesmo padrão – ou o Ser que o fez – é anterior e superior aos dois: ele é que é o verdadeiro Deus. Na verdade, o que queríamos dizer ao falar num Poder Bom e num Poder Mau era apenas que um deles está na relação correta com o verdadeiro e definitivo Deus, e o outro numa relação errada.

Podemos chegar à mesma conclusão por outro caminho. Se o dualismo fosse verdadeiro, o Poder Mau teria que consistir num ser que amasse a maldade pela maldade. Ora, não conhecemos absolutamente ninguém que ame a maldade simplesmente por ser má. O que mais se aproxima disso é a crueldade. Mas, na vida real, uma pessoa só é cruel por uma de duas razões: ou porque é sádica, isto é, sofre de uma perversão sexual que a faz encontrar prazer na prática da crueldade; ou porque é capaz de tirar da crueldade algum benefício, como dinheiro, poder ou segurança. Mas o prazer, o dinheiro, o poder e a segurança são coisas boas em si mesmas, embora apenas de maneira limitada. O mal consiste em procurar obtê-las por métodos errados, ou por meios ilícitos, ou ainda em medida excessiva.

Não quero dizer com isto que uma pessoa que pratique a crueldade não possa ser terrivelmente perversa. Quero dizer que a maldade, se nos detivermos a examiná-la, se revela apenas como procura de algum bem de uma maneira errada. Ou seja, podemos ser bons por simples amor à bondade, mas não podemos ser maus por simples amor à maldade. Podemos realizar uma ação boa quando não nos sentimos bons nem nos dá prazer nenhum realizá-la, unicamente porque a bondade é correta; mas nunca ninguém cometeu uma ação cruel unicamente porque a crueldade é errada – mas apenas porque a crueldade lhe era aprazível ou útil. Noutras palavras, a maldade não consegue sequer ser má da mesma forma que a bondade é boa. A bondade é, por assim dizer, ela mesma; a maldade não passa de bondade corrompida."

(C. S. Lewis, “Mero Cristianismo”, Ed. Quadrante, 1997, págs. 53/55)

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

A origem da festa do Natal.

Algumas pessoas e seitas costumam dizer que a festa do Natal tem origem pagã, e que Jesus não teria nascido no dia 25 de dezembro. Ora, todo mundo sabe que a data escolhida é apenas uma convenção, mas essa é apenas mais uma daquelas historinhas que contam pra assustar cristão. A primeira evidência havia uma celebração litúrgica do Natal pelos primeiros cristãos de Roma é do ano 336, mas há evidências também de que essa era uma prática antiga das primeiras igrejas cristãs, tanto do Oriente (tradição grega) como do Ocidente (tradição latina). Havia um debate entre essas tradições sobre a data exata de se comemorar a Páscoa, até porque o calendário em vigor era o juliano, diferente do nosso atual gregoriano, em vigor desde o séc. XVI, e mais diferente ainda do calendário lunar judaico, que, a princípio, devia regular a festa da Páscoa para aquele povo. Os gregos ficaram com o dia 6 de abril, os latinos com o dia 25 de março. Havia também uma tradição rabínica (judaica, portanto), chamada de "idade integral", que dizia que os profetas do Velho Testamento haviam morrido no mesmo dia em que haviam sido concebido, ou seja, 9 meses antes do dia do seu nascimento. Assim, sendo a Páscoa, para os ocidentais, no dia 25 de março, data aproximada da morte e ressurreição de Jesus, o seu nascimento teria acontecido no dia 25 de dezembro. Leia mais sobre isso clicando aqui (em inglês).

É claro que se trata tudo de convenção, porque ninguém sabe exatamente o dia em que Jesus nasceu, nem a Bíblia faz questão de relatá-lo, mas espero que essa historinha de festa pagã seja esquecida, até porque esse negócio de "festa pagã do solstício de inverno" também é lorota. O que aconteceu é exatamente o contrário: o imperador Aureliano, que governou Roma de 270 a 275, era perseguidor dos cristãos, e inventou a tal festa do solstício, em honra ao nascimento do Sol Invicto, justamente para rivalizar com a tradição cristã do Natal, que já existia, como o imperador bem sabia e fez questão de confrontar.

Então, deixemos que os cristãos comemorem o que quiser, sem culpa, pela graça de Deus que nos foi revelada no nascimento de Seu Filho entre nós.

Grandes filmes - 7


Já comentei anteriormente sobre o livro "Na Natureza Selvagem", do Jon Krakauer, no qual foi baseado o filme de mesmo nome (clique aqui para ler o texto e ver o trailer). 

Como o filme ficou muito pouco tempo em cartaz nos cinemas, só agora pude vê-lo em DVD, e realmente é tão forte e marcante como o livro, baseado na história real de Chris McCandless, que abandou família e o mundo dito "civilizado" para viver uma aventura fatal no gelo do Alaska.

O filme - brilhantemente dirigido por Sean Penn e com uma trilha sonora de primeira - reforça a sensação de que o mundo perdeu um grande cara, cuja história não conheceríamos se não houvesse o desfecho trágico. 

Apresenta alguns dados novos, talvez posteriores ao livro de Krakauer, já que a repercussão foi enorme nos EUA. 

Salta aos olhos a impressão de que Chris não conseguia perdoar seus pais, mesmo tendo eles lhe dado as melhores condições possíveis dentro da sua típica vida pequeno-burguesa americana. 

A rígida moral que o aventureiro se propõe não permite falhas, nem retorno. 

Talvez tivesse voltado para casa algum tempo depois, se tivesse a chance de amadurecer um pouco mais. 

Não deve ter sido fácil para ele crescer e conviver numa sociedade tão materialista e competitiva como a norte-americana. 

Chris McCandless era um espírito livre que talvez se desse melhor em outro país, outra cultura. 

De qualquer maneira, a família McCandless se expõe de uma maneira rara em situações como esta, em que o personagem principal realmente existiu em carne e osso (a foto acima o demonstra). 

E foi em carne e osso que Chris McCandless terminou sua trajetória neste planeta, e ao ver sua história retratada na película, a gente fica com aquela sensação estranha de uma enorme perda, de ter saudade de alguém que nunca conhecemos.

Tribos da fé

É comum vermos algumas pessoas se reunirem em um determinado grupo religioso, sectarista, que despreza aqueles que não comungam da mesma fé. Muitas vezes, é criada toda uma linguagem própria, uma indumentária peculiar, usos e costumes que identificam os membros daquela igreja ou confissão religiosa, num verdadeiro comportamento tribal, vedado aos não iniciados ou a quem pensa diferente.

Longe de propor um tratado sobre o tema, quero me concentrar no fato de que muita gente encara a religião como uma forma de integração e ascensão social, dentro do seu pequeno mundo em que as oportunidades de conseguir isso são ínfimas. Nesses casos, se freqüenta a igreja não por uma fé pura e simples, mas por um processo de racionalização em que os fins justificam os meios. Assim, uma igreja ou religião se transforma em um gueto, na base do "nós x eles", e a pessoa (e o grupo) precisa sempre estar reafirmando a si mesmo que eles são especiais, únicos, exclusivos, e que aquilo que a vida não lhes deu (trabalho, educação, bens), é trocado por uma suposta superioridade espiritual que dispensa essas coisas, e descarta inclusive o convívo do próximo, afinal, na visão deles, o próximo vai queimar no mármore do inferno mesmo, então não há necessidade de se relacionar com ele, até porque ele representa uma ameaça à coesão tribal tão duramente alcançada e mantida sob rédeas curtas.

Obviamente, esses são processos que se travam no inconsciente individual e coletivo desses grupos, e ainda que esta conduta seja reprovável sobre todos os aspectos, deve ser pelo menos compreendida não como um preconceito (ainda que, tecnicamente falando, seja), mas como uma defesa dessas pessoas sofridas contra as agruras da vida, pois esta foi a única maneira que eles encontraram de aliviar o seu sofrimento.

Henri Nouwen e a dor




INTEGRE A SUA DOR



Você se pergunta se é bom partilhar sua luta com outros, especialmente com aqueles de quem deve ser o pastor. Acha difícil não falar das suas dores e tristezas com aqueles que você está tentando ajudar. Sente que o que pertence à essência da sua pessoa humana não deve ser mantido em segredo. Deseja ser um companheiro de viagem, não um guia distante.

A principal questão é: “Você integrou a sua dor?” Enquanto não tiver feito isso – isto é, integrado a sua dor no seu modo de viver -, há o perigo de usar o outro com a finalidade de obter a sua própria cura. Quando conversa com os outros sobre o seu sofrimento, sem que o tenha aceito integralmente, espera deles algo que não são capazes de dar-lhe. Como conseqüência, sente-se frustrado, e aqueles a quem queria ajudar irão sentir-se confusos, desapontados e até mais sobrecarregados.

Mas quando integra o seu sofrimento por completo e não espera que os fiéis do seu rebanho o aliviem, pode abordar o assunto com verdadeira liberdade. Então, pode tornar-se proveitoso partilhar a sua luta; a sua franqueza sobre o que lhe diz respeito pode dar coragem e esperança a outros.

Para que seja capaz de, ao partilhar a sua luta, fazer um bem, é também essencial que haja pessoas a quem possa recorrer nas suas próprias necessidades. Você sempre precisará de pessoas confiáveis com as quais possa desabafar, sempre vai precisar de pessoas que não precisam de você, que possam acolhê-lo e ajudá-lo a reencontrar-se, sempre precisará daqueles que o ajudem a integrar a sua dor e a persistir na luta.

Assim, a questão central no seu ministério é: “Partilhar a minha luta é proveitoso para aqueles que buscam a minha ajuda?” A resposta a essa pergunta só pode ser positiva quando realmente integrar a sua dor e nada esperar daqueles que procuram o seu ministério.

(Henri J. Nouwen, em “A Voz Íntima do Amor”, Paulinas, 2001, p. 76)

Integrar a dor

As pessoas tendem a fugir da dor. Afinal, analgésicos existem para isso. Não é à dor física que me refiro, entretanto, mas à emocional, resultante de uma perda, de um rompimento, de algo que nos põe pra baixo por algum tempo. A tendência, como disse antes, é fugir da dor, escondê-la, relevá-la, pelo menos enquanto for possível, mas ela sempre volta cobrando a fatura com multa e juros de mora. Por isso, eu prefiro vivenciar a dor. Para mim, é a melhor maneira de superá-la, experimentando-a, tomando cuidado de não ser masoquista nem se fazer de vítima. Entrar em contato com a sua dor em essência é um dos maiores desafios de um ser humano, mas também é uma das experiências mais ricas que se pode ter nessa existência. Henri Nouwen chama isso de "integrar a dor" (leia o texto clicando aqui). Ela tem que ser vivenciada, absorvida, integrada no nosso ser, para ser apreendida e aprendida, e a gente possa seguir em frente depois de superá-la, sem ter que ficar voltando atrás para remoê-la.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Morte lenta



Morre lentamente quem se transforma em escravo do hábito, repetindo todos os dias os mesmos trajetos, quem não muda de marca, não arrisca vestir uma cor nova e não fala com quem não conhece. Morre lentamente quem faz da televisão seu guru.

Morre lentamente quem evita uma paixão, quem prefere o escuro ao invés do claro e os pingos nos is a um redemoinho de emoções, exatamente a que resgata o brilho nos olhos, o sorriso nos lábios e coração aos tropeços.

Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz no trabalho, quem não arrisca o certo pelo incerto, para ir atrás de um sonho.

Morre lentamente quem não se permite, pelo menos uma vez na vida, ouvir conselhos sensatos.



Morre lentamente quem não viaja, não lê, quem não ouve música, quem não encontra graça em si mesmo.



Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da sua má sorte, ou da chuva incessante.



Morre lentamente quem destrói seu amor próprio, quem não se deixa ajudar.



Morre lentamente quem abandona um projeto antes de iniciá-lo, nunca pergunta sobre um assunto que desconhece e nem responde quando lhe perguntam sobre algo que sabe.

Evitemos a morte em suaves porções, recordando sempre que estar vivo exige um esforço muito maior que o simples ar que respiramos. Somente com infinita paciência conseguiremos a verdadeira felicidade.




(Pablo Neruda)

Ser, ter, crer, ser...

Uma das críticas que se fazem à religião é que ela anula o ego, pois "ter um crer escraviza o ser". 

Bonita afirmação que, entretanto, não resiste a uma análise mais profunda, pois pressupõe que exista um ser totalmente liberto, o que sabemos que não é verdade. 

Pode até ser liberto da religião organizada, mas não do senso (ou instinto) moral. 

Pelo contrário, um ser totalmente liberto tem uma tendência preocupante a ser um psicopata, como vemos nos crimes mais absurdos cometidos pelo mundo.

Além disso, arrisco-me a dizer que todo mundo tem um "crer", não necessariamente religioso. 

Dizer o contrário é admitir que o ser humano é totalmente imune a um senso (ou instinto) místico, qualquer que seja, mas a história da humanidade desmente essa visão, já que não há registro confiável de qualquer civilização, primitiva que fosse, que não inculcasse nos seus membros um mínimo de senso místico, como regulador e organizador social.

O "eu", portanto, se faz tanto de ser, como ter como crer. 

O que varia é o que se é, o que se tem, e o que se crê. 

E tudo retorna ciclicamente ao velho e conhecido "ser".

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

E o massacre continua...

Passei de novo pela Rodovia Raposo Tavares no trecho entre Itapetininga e Paranapanema. Na segunda-feira, indo na direção da capital, havia um tamanduá-bandeira adulto atropelado no km 215. Hoje, na volta, havia outro exemplar adulto atropelado no km 276. Já perdi a conta de quantos tamanduás-bandeira eu vi atropelados naquele trecho, e pelo jeito, em breve estarão extintos no Sul do Estado de São Paulo. Enquanto isso, nosso querido governador está preocupado em cobrar pedágio no Rodoanel...
Atualização de 20/03/09: Passei pelo trecho em questão hoje e havia um tamanduá-bandeira morto, atropelado que foi no km 219.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Preconceito às avessas

Vez por outra, alguém reclama que só se pune o preconceito racial de branco contra negro, mas não o contrário, numa dessas frases efeito talvez aprendidas no Jornal "Somos Todos Brancos" Nacional, aquele que tem como diretor um cara que escreveu um livro dizendo que não existe racismo no Brasil (me engana que eu gosto...). Não deixa de ter algum apelo a queixa, mas ela resiste apenas na superfície, quando quem a ouve ou lê não pára para pensar.

O princípio constitucional da igualdade, ao contrário do que muita gente pensa, não significa tratar a todos igualmente, mas:

- tratar igualmente os iguais

- tratar desigualmente os desiguais

Portanto, se considera racismo o tratamento pejorativo ou degradante de brancos contra negros, porque brancos escravizaram negros no passado. Desta maneira, se negros houvessem escravizado brancos, hoje poderíamos considerar racismo o tratamento pejorativo ou degradante de negros contra brancos. Entretanto, nem isso existe, ou raramente acontece, porque negros não estão em posição econômica ou social superior à dos brancos. Quando isto acontece, é exceção, e geralmente não é bem vista.

Logo, deve-se considerar o racismo com todos os seus componentes históricos e sociais, e não apenas um fato isolado e instantâneo do presente. Isto se chama comodismo ou má fé.




Para ver uma abordagem deste mesmo assunto, mas com muito bom humor, confira "Racismo reverso e karma" neste mesmo blog.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Auto-estima, por Lloyd John Ogilvie

ANTES DE PODERMOS AMAR OS OUTROS

Leitura bíblica: Marcos 12:28-34

Versículo-chave: Amarás, pois, o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de toda a tua força. O segundo é: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Não há outro mandamento maior do que estes (Marcos 12:30-31)

Meditação: Não é fácil cumprir o segundo grande mandamento de Jesus, de amarmos o nosso próximo como a nós mesmos. Por que é tão difícil amar as pessoas sem exigências, padrões e imagens do que desejamos que elas sejam? O motivo encontra-se no próprio mandamento: devemos amar os outros como a nós mesmos. E aí está a dificuldade. Muitas vezes não amamos a nós mesmos.


Friedrich Nietzsche, embora fosse pagão, chegou bem perto da verdade, ao dizer: "O amor ao próximo é o amor ruim por si mesmo. A pessoa sente pelo próximo o que sente por si mesma e gostaria de transformar esse sentimento em virtude. Eu, porém, percebo o seu "altruísmo". A pessoa não agüenta consigo mesma e não ama a si mesma o suficiente".

Temo que ele esteja com a razão. Temos falado de auto-aceitação e de amor próprio sadio. A marca da maturidade cristã é o crente poder dizer: "Está certo, é isso o que sou; são estes os meus talentos; são estes os meus problemas e os meus dons". Todos nós recebemos dons singulares de Deus, e todos nós temos talentos que podemos usar para a sua glória. Certa garotinha ganhou um vestido novo. Dando voltas pela sala, ela entoou: "Estou contente em ser eu!" Que auto-apreciação simples, pura e sadia. Quantos de nós poderíamos dizer o mesmo? Quantos estão contentes de ser o que são e estar onde estão? Eis uma oração pedindo a auto-estima centrada em Cristo: "Senhor Deus, dê-me a auto-apreciação sadia de poder dizer: "Estou contente em ser eu!" Ajude-me a ver tudo o que o Senhor me tem dado e como me tem abençoado e dirigido através dos anos. E então, com verdadeira liberdade, ajude-me a desfrutar da vida que o Senhor me deu. Amém."

Pensamento do dia: O amor pelos outros flui de uma auto-estima sadia, firmada no amor de Deus.

(Lloyd John Ogilvie, em "O que Deus tem de melhor para minha vida", meditação de 27 de novembro)

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Preconceito ou Posição?

O preconceito religioso existe de todas as partes, mas é preciso diferenciá-lo de um simples posicionamento, ainda que dogmático, a respeito das crenças de uma determinada religião, ou mesmo da descrença na ausência dela. 

Muitas vezes os crentes são criticados por pregar contra o preconceito, mas vivê-lo na prática.

Todos nós temos o nosso sistema de crenças, independentemente de sermos religiosos ou não, crentes ou descrentes. 

E isto varia de povo para povo, de cultura para cultura, e, de etnia para etnia. 

Para mim, preconceito é uma atitude mecânica, automática, de excluir o outro de antemão. 

Alguém é preconceituoso quando se nega a interagir com o outro em qualquer nível, apenas porque ele tem uma etnia, crença, cultura, idioma, origem social, etc., diferente da sua. 

"Pregar" contra o preconceito não tem nada a ver com crença ou descrença. 

Eu, como cristão, posso muito bem me unir a um ateu para pregar contra o preconceito racial, por exemplo. 

De fato, há muitos religiosos que excluem de antemão pessoas de outras religiões, ou que não creiam em nada, assim como há muitos ateus que excluem religiosos sem nem pensar no assunto. 

O fato deles agirem assim não deve ser generalizado, nem se pode confundir as diferenças doutrinárias entre grupos que dizem seguir uma mesma base religiosa, por exemplo. 

O fato de eu ser enquadrado como protestante não pode nem deve me impedir de conversar com um ateu, um católico ou o espírita. 

O fato de eu crer em alguns dogmas da minha religião, não me impede de debatê-los respeitosamente com quem quer que seja, e esta minha crença neste determinado dogma não se confunde com "preconceito", porque não excluo ninguém da possibilidade de discuti-lo. 

Apenas o tenho por certo devido à minha experiência de vida, que me permitiu pensar e repensar sobre ele durante muito tempo, e, embora não creia que alguém venha a mudá-lo um dia, não tenho medo de expô-lo a um debate crítico sério que me permita, inclusive, aprender muito mais sobre ele quando o submeto à avaliação de alguém que pensa diferente.

A mesma coisa vale para TODAS as nossas relações sociais. 

Se, por um desses acasos do destino, eu tenho que interagir com um muçulmano polígamo, ainda que a minha cultura (e a lei do meu país) diga que a monogamia é o relacionamento conjugal aceitável, eu tenho toda a liberdade de interagir com um polígamo, por entender que na cultura, na legislação e na religião dele, esse comportamento é admissível. 

Aí não se trata de preconceito, mas de uma questão cultural. 

Da mesma maneira, eu não posso excluir alguém porque gosta de um estilo musical que eu abomino, que é típico da sua cultura e da sua região. Aí também não se trata de preconceito, mas de gosto musical. 

E o que dizer de quem come cachorro, escorpião, barata, gafanhoto, etc., como acontece na China? Vou desistir de ir lá só porque eles tem um paladar diferente do meu? 

Posso até sentir asco quanto à comida, mas de maneira alguma eu vou deixar de interagir com os chineses por causa disso. 

E falando de China ainda, eu acho que é um país que tem um governo autoritário e ditatorial, e que oprime o Tibete. 

Sei, entretanto, que há uma série de fatores que fazem com que esta situação perdure até hoje, mas não tenho preconceito contra o governo chinês. O que eu tenho é uma oposição política.

Quanto a "julgar", todos nós julgamos todos os dias, em todos os instantes da vida.

Estamos sempre avaliando o que é melhor para nós, para nossa família, nossos amigos, nossa cidade, nosso país, nossa cultura. 

O problema acontece quando nós condenamos imediatamente, sem dar ao outro a oportunidade de interagir conosco e, se for o caso, defender o seu ponto de vista. 

Portanto, todos nós, crentes e ateus, temos o direito de pregar contra o preconceito, porque diferença de opinião não deve ser confundida com preconceito, é apenas uma questão de posicionamento.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Uma ferida que ainda sangra...

O site Cristianismo Hoje traz um artigo lembrando os 30 anos do suicídio coletivo de mais de 900 seguidores da seita Templo do Povo (People's Temple), fundada pelo pastor americano Jim Jones, que havia reunido todas essas pessoas na Guiana, num vilarejo que ele também fundou, chamado de Jonestown. No dia 18 de novembro de 1978, a alucinação religiosa coletiva chegou ao final, mas para quem acompanhou as terríveis notícias (e as imagens) da época, parece que foi ontem.

Por falar nisso, ontem a Fox News exibiu algumas fotos inéditas da barbárie, que ainda chocam e arrepiam da mesma maneira que há 30 anos atrás... talvez seja por isso que este massacre não recebeu até hoje uma análise mais aprofundada. Houve até um seriado muito bom que a Globo exibiu ali na virada dos 70's para os 80's, mas, até onde sei, nunca se procurou medir o impacto que este massacre teve nas igrejas evangélicas (e na pregação do evangelho) a partir de então.

Eu me converti em 1983, 5 anos depois, mas a minha geração de crentes sentiu na pele o medo e a desconfiança que este episódio gerou, além das piadas macabras e dos comentários maldosos que todos nós éramos obrigados a ouvir. O próprio Chico Anisio se inspirou no massacre para criar o personagem cômico Tim Tones, algum tempo depois, aquele da música "Tim Tones, glória, Tim Tones" e do "vamos passar a sacolinha". Era uma sátira aos televangelistas americanos da década de 70, nem todos sérios, que marcaram a "virada" de um modelo de igreja muito mais comprometido com a pregação da Palavra para outro(s) modelo(s) em que o dinheiro e a mídia eram (muito) mais importantes. O acontecido em Jonestown talvez os tenha obrigado a mudar seu foco para algo mais light, mais "consumível", mais palatável, menos tenebroso e menos arriscado. Daí termos partido para o outro extremo, em que a igreja se assemelha mais a um clube de serviço para as pessoas trocarem afáveis cartões de visita. Afinal, business is business...

De qualquer maneira, ainda existem muitos loucos dirigindo seitas fanáticas mundo afora, mas acho que a possibilidade de algo parecido acontecer de novo é remota no meio dito "evangélico", já que os Jims Joneses de hoje prometem o paraíso na Terra, com cartões, carrões e mansões, e no momento que um deles ordenasse alguém a tomar a poção de cianeto, a sua máscara (e o seu veneno) cairia por terra...

Infelizmente, são lições macabras que podemos tirar das tragédias, mas nada trará de volta os inocentes (principalmente as dezenas de crianças) que um louco conseguiu enganar e submeter ao seu desatino, isso em nome do (seu) evangelho, mas que pelo menos sirva para os crentes de hoje examinarem melhor o que dizem seus "profetas", muitos não menos perigosos do que Jim Jones ou menos ridículos e gananciosos que Tim Tones.

domingo, 16 de novembro de 2008

Atropelágio

Enquanto o governo estadual paulista continua pensando somente em arranjar estradas para privatizar a tarifas estratosféricas, os tamanduás-bandeira da Rodovia Raposo Tavares continuam pagando o preço, que este blog já vem denunciando há tempos nos seguintes textos:

Bandeira 2 para o tamanduá

Uma bandeira para o tamanduá

Passei este fim-de-semana pela citada rodovia, e o trecho entre Angatuba e Paranapanema continua sendo o holocausto dos tamanduás, conforme mostram as tristes fotos abaixo, tiradas nos km 210 e 239, onde dois exemplares da espécie jaziam. 

Talvez o nosso querido governador Serra esteja esperando o extermínio dos tamanduás-bandeira das nascentes do Rio Paranapanema, para que eles não atrapalhem as nossas não menos queridas concessionárias de rodovias, e, para usar um verbo que tucano aprecia, os quase-extintos animais não "impactem" demais a planilha de custos de nossos dedicados cobradores de pedágio. 

Apesar disso, este blog seguirá tocando a corneta, alertando a consciência ecológica deste país, se é que ela existe (ou um dia existiu).








quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Mãe de Deus, Encarnação e Trindade




A expressão Mãe de Deus - associada a Maria - desde o quarto século é uma expressão polêmica no meio cristão, e poucas pessoas compreendem seu real significado. Não é à toa que ela foi a principal causa de dois Concílios Ecumênicos e gerou uma das maiores controvérsias do cristianismo.


Hoje ela está automaticamente ligada ao catolicismo, e se tornou uma expressão mariológica, a exemplo de Theotokos (do grego Θεοτόκος), na ortodoxia oriental. Por isto mesmo, no meio evangélico, há uma espécie de aversão instantânea a esta expressão, o que faz com que as pessoas a rejeitem sem ao menos refletir sobre o seu real significado.


Desta maneira, poucos conhecem sua natureza cristológica, pois a expressão, quando foi criada, estava muito mais relacionada à divindade de Cristo do que a uma pretensa superioridade de Maria. Por isto lemos no Credo de Calcedônia:
Fiéis aos santos pais, todos nós, perfeitamente unânimes, ensinamos que se deve confessar um só e mesmo Filho, nosso Senhor Jesus Cristo, perfeito quanto à divindade, perfeito quanto à humanidade, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, constando de alma racional e de corpo; consubstancial, segundo a divindade, e consubstancial a nós, segundo a humanidade; em todas as coisas semelhante a nós, excetuando o pecado, gerado segundo a divindade antes dos séculos pelo Pai e, segundo a humanidade, por nós e para nossa salvação, gerado da virgem Maria, mãe de Deus; Um só e mesmo Cristo, Filho, Senhor, Unigênito, que se deve confessar, em duas naturezas, inconfundíveis e imutáveis, inseparáveis e indivisíveis; a distinção da naturezas de modo algum é anulada pela união, mas, pelo contrário, as propriedades de cada natureza permanecem intactas, concorrendo para formar uma só pessoa e subsistência; não dividido ou separado em duas pessoas. Mas um só e mesmo Filho Unigênito, Deus Verbo, Jesus Cristo Senhor; conforme os profetas outrora a seu respeito testemunharam, e o mesmo Jesus Cristo nos ensinou e o credo dos pais nos transmitiu.


Este credo é aceito por todas as denominações protestantes, com exceção das extremamente puritanas e de algumas seitas que renegam todo o passado da Igreja. É comum encontrar pessoas que a chamam de herética, talvez por associá-la - como que por reflexo condicionado - apenas ao catolicismo. Eu não sou dogmático, e não condeno ninguém por achar errado valer-se da expressão, como católicos a utilizam, e o fazem de forma forçada, a meu ver... só que o título Mãe de Deus não é heresia, como muitos alegam. Talvez haja discordância sobre o seu uso correto, mas não se trata de uma expressão herética. Isto se explica porque as duas naturezas de Cristo estão tão unidas, que a expressão é possível. Vejamos:


Sabemos que Cristo é um ser que possui duas naturezas, a saber, a humana e a divina. Estas naturezas estão intimamente ligadas no ser Jesus Cristo. Assim, o que acontece com uma natureza, acontece com todo o ser Jesus Cristo, e não com parte dele.


É como chorar. Quem desempenha a tarefa de chorar é o olho, mas quando choramos, ninguém diz que é o olho que está chorando, mas nós por completo. A pessoa chora, não apenas o olho.


O mesmo acontece com Cristo. Deus não pode chorar, não é propriedade de sua natureza. Mas na Encarnação, Deus pode chorar através de sua natureza humana. Então quando Cristo chora, Deus chora, pois suas naturezas são uma só em seu ser. Da mesma forma, um homem não pode ser adorado, mas por causa da união entre as duas naturezas, a natureza humana de Cristo recebe adoração como Deus.


Isto precisa ser assim, pois era necessário que Cristo experimentasse a morte, como o autor de Hebreus diz:
(Hb 9:15) E por isso é mediador de um novo pacto, para que, intervindo a morte para remissão das transgressões cometidas debaixo do primeiro pacto, os chamados recebam a promessa da herança eterna.
(Hb 9:16) Pois onde há testamento, necessário é que intervenha a morte do testador.
(Hb 9:17) Porque um testamento não tem força senão pela morte, visto que nunca tem valor enquanto o testador vive.


Ora, se Deus não experimenta a morte, então nós não podemos receber nossa herança eterna!!! Imagine quão perigoso é isto para nossa salvação!!!


E aqui nós podemos perceber quão herético é o aniquilacionismo. Pois se a morte é aniquilação, Deus ao experimentar a morte teria sido aniquilado!!! Nós ao contrário cremos que a morte é uma separação do mundo material, não uma aniquilação do ser completo.


Então, o título "mãe de Deus" é válido sim, pois as propriedades de uma natureza são compartilhadas com a outra, pois Jesus é um ser (mais que) completo, íntegro e co-substancial em suas essências humana e divina. Assim, Deus não tem uma mãe humana, mas através de sua natureza humana ele tem uma mãe. Estas são as palavras mencionadas na confissão de Calcedônia e é como se deve entender esta expressão.


Complementando a idéia acima, sempre me chamou a atenção para o fato que a Bíblia chama muitas vezes Deus de "o Deus Vivo". Isto ela faz em contraste com os deuses mortos dos pagãos.


Bem, nós protestantes entendemos a morte como uma separação do mundo material. O morto não se comunica com este mundo mais, ele não se relaciona com ele. Talvez por isto o contraste bíblico... Os deuses pagãos são incapazes de se relacionar com este mundo, de salvar seus fiéis, de lhes dar esperança.


Já mencionei algumas vezes o fato de Deus ter que morrer como condição apresentada no livro de Hebreus, e muitos acharam a idéia absurda, talvez por que nesta hora pensem na morte como aniquilação... Mas o que acontece é que este não se relaciona mais com o mundo, pelos três dias, e por isto também a solução modalista de que somente Jesus é Deus, que o Pai e o Espírito Santo são modos de Jesus se revelar ao mundo, é herética da mesma forma. Como poderia o mundo ficar sem se relacionar com Aquele que o sustém? Deus deixaria de manter o mundo pelos 3 dias? Assim, a Trindade se impõe como doutrina não por uma manobra político-ideológica, mas como uma necessidade teológica absoluta para explicar a nossa salvação.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Pancadaria no Santo Sepulcro

Eu costumo dizer que o comportamento das denominações cristãs, umas em relação às outras, mais se parece com as torcidas organizadas na saída do estádio de futebol. Infelizmente, monges ortodoxos armênios e gregos confirmaram esta tese ontem, ao protagonizarem um "espetáculo" de violência dentro da Igreja do Santo Sepulcro em Jerusalém, um dos lugares mais sagrados para todos os cristãos. E que a culpa não recaia somente sobre os ortodoxos, podiam muito bem ser católicos e protestantes, pentecostais e fundamentalistas, batistas e presbiterianos, etc.... que triste exemplo estamos dando ao mundo...






(leia a notícia no UOL)

sábado, 8 de novembro de 2008

A "caridade" que condena

Alguém me contou que testemunhou um diálogo numa cidade pequena do interior, em que uma pessoa foi cobrar uma cesta básica de um vereador eleito. Diante da surpresa do eleito, a pessoa em questão retrucou:

- Mas você tem que me dar uma cesta básica. Eu votei em você, agora você tem obrigação de retribuir.

Tudo indica que o diálogo não tenha sido exatamente assim, mas eu imagino que ele se repita aos milhares Brasil afora, sem se importar com o tamanho da cidade. As pessoas não percebem que o voto é livre, comprá-lo é crime, e que se algum candidato consuma esta suspeitíssima "caridade", vai arranjar outro jeito (geralmente ilícito) de recuperar o prejuízo. Assim, na próxima eleição, o voto será trocado novamente por uma cesta básica, enquanto os recursos públicos que deveriam ter sido destinados à saúde e educação, por exemplo, foram "interceptados" no meio do caminho. É um círculo vicioso sem fim.

É fácil criticar a postura desta pessoa, mas no fundo ela é vítima, mais do que da sua imbecilidade, da política de (des)educação deste país. Houvesse educação de qualidade para todos, o voto seria mais consciente e muito pouca gente se submeteria a uma "vantagem" deste tipo. Sai governo, entra governo, passa partido, mas a educação é sempre a prioridade de todos na campanha, esquecida no dia seguinte à eleição. Há um motivo claro, ideológico, para isso: só assim os maus políticos se perpetuam no poder, independentemente da cor partidária que vistam. O que a mão direita faz, a esquerda faz também. Afinal, estão todos unidos pela ideologia da esperteza que condena o Brasil à mais perene mediocridade.

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

De volta aos reformadores


Nesses tempos bicudos, em que vemos muitas pessoas se servindo da Igreja em vez de servir a Deus e ao próximo, não surpreende encontrar nos reformadores quem se opusesse a esta mercantilização da religião. Pena que, na atual era dos "teólogos" profanos do utilitarismo, os reformadores sejam muito pouco lidos e respeitados. Em 1519, Martinho Lutero escreveu o seu "Sermão sobre o Venerabilíssimo Sacramento do Santo e Verdadeiro Corpo de Cristo e sobre as Irmandades" (que pode ser lido clicando-se aqui), em que fala sobre a Eucaristia, ainda numa visão mais próxima da Igreja Católica do que aquela que formularia ao longo do seu ministério. É preciso ler este Sermão levando em conta que Lutero ainda estava no início de sua separação do Vaticano. As 95 teses haviam sido pregadas na porta da Igreja de Wittenberg em 1517, a Dieta de Worms se reuniria apenas em 1521 para julgá-lo, ano em que o papa o excomunga. Para Lutero, a eucaristia era um dos temas centrais da vida da Igreja, e ele enfatiza a questão da fé, da comunhão e do serviço cristãos, que, infelizmente, vêm sido esquecidos pela igreja evangélica brasileira em pleno século XXI:

13. Não é difícil encontrar pessoas que gostam de desfrutar, mas não querem contribuir. Isto é: gostam de ouvir que neste sacramento lhes é prometido e dado auxílio, comunhão e assistência de todos os santos. Elas, entretanto, não querem retribuir a comunhão, não querem ajudar o pobre, tolerar os pecadores, cuidar dos miseráveis, solidarizar-se com os que sofrem, interceder pelos outros. Também não querem apoiar a verdade, buscar o melhoramento da Igreja e de todos os cristãos empenhando seu corpo, seus bens e sua honra. Elas não o fazem porque temem o mundo, porque não querem ter que sofrer desfavor, prejuízo, vergonha ou morte, embora Deus queira que, por causa da verdade e do próximo, elas sejam deste modo impelidas a desejar tão grande graça e força desse sacramento. Estas são pessoas que buscam seu próprio proveito, às quais este sacramento de nada serve, assim como é insuportável o cidadão que quisesse ser apoiado, protegido e favorecido pela comunidade, mas que, em contrapartida, não servisse à comunidade e nada fizesse por ela. Nós, pelo contrário, precisamos deixar claro que os males dos outros também sejam nossos, se queremos que Cristo e seus santos assumam os nossos males; assim a comunhão se torna plena e se faz justiça ao sacramento. Pois onde o amor não cresce diariamente e transforma a pessoa de tal forma que ela participe da existência de todos, aí o fruto e o significado desse sacramento estão ausentes.

[...]

Entra aqui a terceira parte deste sacramento: a FÉ, que é o que importa. Pois não basta saber o que é e o que significa este sacramento. Não basta saberes que se trata de uma comunhão e de uma misericordiosa permuta ou mistura do nosso pecado e sofrimento com a justiça de Cristo e de seus santos. Tu também precisas desejá-lo e crer firmemente que o recebeste. É neste ponto que o diabo e a natureza mais se esforçam, para fazer com que a fé de modo algum persista. Algumas pessoas exercitam sua habilidade e sutileza tentando descobrir onde fica o pão ao ser transformado na carne de Cristo e o vinho [ao ser transformado] em seu sangue, e como, sob tão pequena porção de pão e vinho, pode estar encerrado todo o Cristo, sua carne e seu sangue. Não importa que tu não te preocupes com essas questões. É suficiente que saibas que é um sinal divino, no qual a carne e o sangue de Cristo estão verdadeiramente contidos; deixa o "como" e o "onde" por conta dele mesmo.

[...]

Por isso também é útil e necessário que o amor e a comunhão de Cristo e de todos os santos aconteçam ocultamente, de modo invisível e espiritual, e que nos seja dado apenas um sinal corporal, visível e exterior dos mesmos. É que se esse amor, comunhão e apoio fossem evidentes como a comunhão temporal das pessoas humanas, não seríamos fortalecidos nem exercitados no sentido de confiar nos bens invisíveis e eternos ou de desejá-los; antes, seríamos exercitados em confiar apenas nos bens temporais e visíveis, ficando tão habituados a eles que não abriríamos mão deles de bom grado e seguiríamos a Deus somente na medida em que nos precedessem coisas visíveis e palpáveis. Desta forma, seríamos impedidos de jamais chegar a Deus, pois, para chegarmos até ele, todas as coisas temporais e perceptíveis devem desaparecer e nós devemos nos desacostumar delas por completo.

(Martinho Lutero, in Obras SelecionadasOs primórdios – Escritos de 1517 a 1519, Eds. Sinodal/Ulbra/Concórdia, 2004, vol. 1, 2ª ed., pp. 425-444, tradução de Annemarie Höhn et al.)


De volta à Reforma, já!

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Mercadinho gospel

O site Gospel + informa que mais um produto "gospel" será lançado no mercado, o Leão de Judá-Cola, que chega ao mercado paulistano em dezembro. Ao que parece, continuaremos testemunhando a descida de alguns "evangélicos" ao inferno do consumismo profano desenfreado.

sábado, 1 de novembro de 2008

A apologia do profano


Dicionário Houaiss:


Profano:


Acepções

■ adjetivo

1. que não pertence ao âmbito do sagrado - Ex.: coisas p.

2. que é estranho, que não pertence à religião - Ex.: elementos p. penetraram no santuário

3. que deturpa ou viola a santidade de coisas sagradas - Ex.: atitude p. diante da Bíblia

4. que não é religioso; leigo, temporal, secular - Ex.: instituição p.

5. que não tem finalidade religiosa; mundano


Sinônimos - ver sinonímia de secular

Antônimos - sacro, sagrado; ver tb. antonímia de secular


A coisa no meio dito "evangélico" anda tão desavergonhada, que tem até pastor vendendo consórcio "em nome de Jesus", expressão tão bela e pura que está sendo transformada em mais um dos inúmeros chavões evangélicos que assolam a Igreja no Brasil, ao lado de "palavras mágicas" como "nova unção", "noiva", "apaixonado" e outras do gênero. Meus 45 anos de vida (25 como cristão) muito bem vividos, diga-se de passagem, me dão a convicção empírica de que determinadas atitudes reprováveis e/ou reprimidas por muito tempo, se a pessoa não muda (ou se converte) efetivamente, tendem a se tornar aberrações. Infelizmente, boa parte da igreja evangélica brasileira está sendo consumida pela voracidade das heresias travestidas de piedade, profanando o sagrado, como Paulo havia predito a Timóteo:

2Ti 3:1 Saiba disto: nos últimos dias sobrevirão tempos terríveis.
2Ti 3:2 Os homens serão egoístas, avarentos, presunçosos, arrogantes, blasfemos, desobedientes aos pais, ingratos, ímpios,
2Ti 3:3 sem amor pela família, irreconciliáveis, caluniadores, sem domínio próprio, cruéis, inimigos do bem,
2Ti 3:4 traidores, precipitados, soberbos, mais amantes dos prazeres do que amigos de Deus,
2Ti 3:5 tendo aparência de piedade, mas negando o seu poder. Afaste-se também destes.

O interessante é que este descaramento da pastorzada - que, além de não merecerem o título de pastor, desprezam a importância do nome (e do sacrifício) de Jesus - começa a ser percebido inclusive pela imprensa secular (aquela que, pela sinonímia acima referida, deveria ser profana), como é o caso deste artigo do Ricardo Feltrin no UOL, que merece ser transcrito:


29/10/2008 - 15h46


Pastor usa nome de Jesus para fazer 'merchan' de consórcio na TV

Ricardo Feltrin

Colunista do UOL


Se existe uma "vítima" da chamada Teologia da Prosperidade ela é a própria palavra escrita na Bíblia. Essa teoria (ou prática teológica) tem se disseminado de forma surpreendente, e é defendida por evangélicos que crêem - a grosso modo - que Deus tem algum tipo de dívida para com o ser humano, ou que tem uma espécie de acordo (com ares de obrigação inescapável) de dar-lhe riqueza e felicidade caso a pessoa realmente tenha fé e o queira. A contrapartida geralmente é o fiel desembolsar alguma riqueza própria (dinheiro) em troca da riqueza maior futura.

O pastor evangélico Marco Feliciano, do Ministério Tempo de Avivamento, leva a teoria às últimas consequências em site e em programa na Rede TV. Enquanto garante que Deus atenderá a todos os pedidos de "fiéis", "perseverantes" ou "valentes", ele aproveita e vende cursos de teologia, DVDs, CDs de músicas e camisetas. Até aí, ok, nada demais. Mas ele também usa o nome de Jesus em merchandisings.

Segundos após realizar uma oração inflamada (que inclui palavras de língua desconhecida), pastor Feliciano ressurge como garoto-propaganda no mesmo cenário para vender um consórcio de casa própria, o GMF Consórcios.

"Você realiza, então, em nome de Jesus, o sonho da casa própria", diz o pastor.

Bíblia, hermenêutica e edição

Os pastores e bispos adeptos da teologia ou teoria da prosperidade fazem uso da hermenêutica na leitura da Bíblia para garantir que o que estão fazendo não viola as regras de Deus ou de Jesus. Trata-se de uma espécie de "edição" de conteúdo: cada um usa a Bíblia da forma que lhe interessa.

Senão vejamos: a orientação divina para que os humanos não se percam em desejos materiais em detrimento ao amor por Deus está citada duas vezes, de forma muito semelhante, em dois diferentes Evangelhos.

Em Lucas, 16:13, lê-se: "Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de aborrecer-se de um e amar ao outro ou se devotará a um e desprezará ao outro. Não podeis servir a Deus e às riquezas."

Da mesma forma, em Mateus 6:24, está: "Ninguém pode servir a dois senhores; porque ou há de odiar um e amar o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Não podeis servir a Deus e a Mamom".

Por outro lado há outro trecho em Lucas , 11:9, que diz que ao pedir algo a Deus, o fiel simplesmente receberá o que deseja (de acordo com o merecimento e fé, pressupõem-se). Mas sem precisar fazer um carnê de desafio com uma igreja. Sem intermediários.

"Por isso eu digo: peçam e vocês receberão; procurem e vocês acharão; batam, e a porta será aberta para vocês." No caso do pastor do "merchan", a porta começa com um consórcio para a casa própria.


(PARA VER O TRISTE VÍDEO, CLIQUE AQUI)


Quando o profeta Balaão vendeu-se a Balaque (Números 22), Deus usou uma jumenta para adverti-lo. Na sua insensatez, preocupado que estava em locupletar-se com o sagrado, Balaão nem se deu conta de que estava travando um diálogo acalorado (e estapafúrdio) com uma jumentinha. Quando os pseudo-profetas se rendem ao consumismo desenfreado, e quando o povo de Deus se cala diante de tanta indecência, o Senhor levanta outras vozes para expô-los ao ridículo.

A aberração, a indecência, e a indiferença e o desprezo pelo sagrado (ou seja, o profano), estão se transformando na marca registrada de uma parte enorme da igreja evangélica brasileira. Isto precisa ser combatido e denunciado, pois é assim que a população nos vê, misturados a esses mercadores das coisas santas, a esses atiradores de pérolas aos porcos, e precisamos nos separar desta gente que envergonha o evangelho (e o nome) de Jesus. Ou fazemos isso, ou animemos esses mercadores a usarem o - muito mais apropriado - nome de Esaú:

Hebreus 12:14 Esforcem-se para viver em paz com todos e para serem santos; sem santidade ninguém verá o Senhor.
12:15 Cuidem para que ninguém se exclua da graça de Deus, nem alguma raiz de amargura brote e cause perturbação, contaminando a muitos.
12:16 Não haja nenhum imoral ou profano, como Esaú, que por uma única refeição vendeu os seus direitos de herança como filho mais velho.
12:17 Como vocês sabem, posteriormente, quando quis herdar a bênção, foi rejeitado; e não teve como alterar a sua decisão, embora buscasse a bênção com lágrimas.


O próximo merchan evangélico provavelmente será o Disk-Donkey:

Ligue para nossa jumenta, que te mandamos um prato de lentilhas, em nome de Esaú...


sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Ó-pa-í-ó!

Estréia hoje na Globo, o seriado Ó-pa-í-ó... mais uma chance para o grande público finalmente descobrir que o Lázaro Ramos é apenas mais um canastrão...

quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Como enlouquecer um estádio...

Os tempos mudam...



Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.

Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem (se algum houve), as saudades.

O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve um dia,
E em mim converte em choro o doce canto.

E, afora este mudar-se a cada dia,
Outra mudança faz de maior espanto,
Que não se muda já como soía.


Luís de Camões, soneto 45

Eclesiastes - capítulo 11


Leitura anterior: Eclesiastes - capítulo 10

Eclesiastes 11 é o menor capítulo do livro. Nele, o Pregador inicia a conclusão de seu pensamento, e o faz de uma maneira muito bela, chamando a atenção para o fato de que vale a pena viver. 

Se não concluísse de uma maneira positiva, restaria a impressão de que nada vale a pena na vida, quando ele pensa exatamente o contrário. 

Talvez Fernando Pessoa tenha captado, inadvertidamente, o "espírito" da conclusão do Pregador: "tudo vale a pena se a alma não é pequena". 

É este o sentido dos 3 primeiros versos do capítulo 11, chamando a atenção de que trabalhar ajuda a ter rendimentos para ajudar o próximo. 

"Lança o teu pão sobre as águas, porque depois de muitos dias o acharás" (v. 1) é um belo versículo que algumas vezes é usado fora de contexto, geralmente para dízimos e ofertas, como se fosse algum negócio que pudesse ser realizado com Deus. 

É, sim, um versículo sobre liberalidade, sobre desprendimento, sobre repartir com os outros aquilo que se tem (v. 2), sem esperar nada em troca (v. 6), já que ninguém sabe o dia de amanhã. 

Os tempos são instáveis, imprevisíveis (v. 3), e não devemos ficar parados, apenas observando (v. 4). Os desígnios de Deus também são imprevisíveis, mas boa e oportuna sempre é a Sua providência (v. 5). 

Assim, podemos entender melhor o que significa lançar o nosso pão sobre as águas. Pão é sempre visto na Bíblia como um símbolo do sustento, do cuidado do Pai, do pão nosso de cada dia, fruto do nosso trabalho, e remete à primeira conseqüência do pecado original, quando Deus falou a Adão: "Do suor do teu rosto comerás o teu pão, até que tornes à terra, porque dela foste tomado; porquanto és pó, e ao pó tornarás" (Gênesis 3:19). 

O suor do nosso trabalho não é em vão. Vaidade é reter o pão na vã confiança de que a nossa vida depende dele. 

O maná que caía no deserto durava apenas um dia, exceto o do 6º dia, que podia ser aproveitado no sábado (Êxodo 16:25-26). 

De novo, a providência divina está em evidência aqui. Lançar o pão sobre as águas significa, no contexto de Eclesiastes 11, não retê-lo, mas usá-lo para ajudar ao próximo, para repartir aquilo que não só o nosso trabalho, mas também a providência de Deus, nos permitiu ter e comer. 

E o próprio Deus não reteve Seu Filho, mas o enviou a nós como o "pão da vida" que desceu dos céus para nossa salvação (João 6:33-51).

A idéia básica de Eclesiastes 11:1 é exatamente este lançamento de uma nau aos mares do mundo, ao desconhecido, na esperança de que, de alguma forma, depois de muito tempo, a encontraremos de novo. 

A Bíblia do Peregrino traduz este versículo assim: "Ainda que envies o teu trigo pela superfície do mar, no fim do tempo o recuperarás", e comenta sobre os seis primeiros versículos:

Se Coélet aceita e aconselha algo, é usufruir do fruto do próprio trabalho. Logo, é preciso trabalhar para obter este fruto. Pois bem, a correspondência entre trabalho e resultado não é mecânica, a proporção não é matemática, o êxito não é seguro. Então, não vale a pena trabalhar?
A insegurança é faca de dois gumes: um empreendimento arriscado – o comércio marítimo – tem êxito, um empreendimento normal se expõe a múltiplos riscos; as nuvens fazem a árvore crescer, o vento a derruba, nuvens e vento seguem suas leis, entre firmes e caprichosas. O marido não sabe exatamente quando a mulher vai conceber ou como a vida entra no feto: como vai saber o plano misterioso de Deus que dá e sustenta toda a vida? A conclusão de Coélet é positiva: deve-se trabalhar enfrentando o risco e com esperança.


Desta maneira, o Pregador recupera e dá uma visão mais abrangente daquilo que já havia escrito em Eclesiastes 8:15. "exaltei eu a alegria, porquanto para o homem nenhuma coisa há melhor debaixo do sol do que comer, beber e alegrar-se; pois isso o acompanhará no seu trabalho nos dias da vida que Deus lhe dá debaixo do sol". 

O fruto do seu trabalho não deve ficar só para si, mas deve ser doado, "lançado" aos outros com alegria, pois, segundo Paulo lembra, "Deus ama ao que dá com alegria" (2 Coríntios 9:7). 

E assim, é formado um círculo com Eclesiastes 2:26, onde se diz que "Deus dá sabedoria, conhecimento e prazer ao homem que lhe agrada; mas ao pecador dá trabalho, para que ele ajunte e amontoe, a fim de dar àquele que agrada a Deus". 

Se o pecador, o ímpio, ajunta para dar involuntariamente ao justo, este deve ajuntar o que recolheu com o fruto de seu trabalho e redistribuí-lo voluntariamente aos outros, não apenas o rendimento, o salário, o dinheiro, mas o seu tempo, o seu cuidado, a sua disposição, sabendo que, em tudo, Deus está no comando, e fará prosperar aquilo que lhe apraz, e recompensará a cada um segundo a Sua vontade e providência. 

Aproveitemos o hoje, pois "doce é a luz, e agradável aos olhos ver o sol" (v. 7). No fundo, isso é tudo o que temos, o momento presente, o agora, como lembra o escritor de Hebreus (3:13) que nos aconselha a nos exortarmos "uns aos outros todos os dias, durante o tempo que se chama Hoje, para que nenhum de nós se endureça pelo engano do pecado", e "pecado", na visão do Pregador, significa dar ao trabalho, às necessidades imediatas, enfim, à existência material um valor tal que desvie nossos olhos do Criador, e não nos prepare nem nos console nos dias de trevas, que são muitos (v. 8), pois, finaliza, "tudo quanto sucede é vaidade".

É neste, digamos, "espírito", que o Pregador se dirige aos jovens agora, aconselhando-os a se alegrarem na juventude, recreando o coração nos dias da mocidade, sempre tendo em mente que Deus pedirá contas de todas essas coisas, naquele que é um dos versículos mais conhecidos de Eclesiastes (11:9). 

É interessante perceber que o Pregador não aconselha uma vida de reclusão, de ascetismo, ou de completo isolamento, tanto que no versículo seguinte (10), chama a atenção para que se evite o desgosto, a depressão, a dor, mas se busque a alegria da vida com responsabilidade, sabendo que até a primavera da vida, que é a juventude, também é vaidade, preparando o seu leitor/ouvinte, principalmente jovem, para o conselho maior que dará no primeiro versículo do capítulo 12: "Lembra-te do teu Criador nos dias da tua mocidade, antes que venham os maus dias, e cheguem os anos dos quais dirás: Não tenho neles prazer".



Leitura seguinte: Eclesiastes - capítulo 12


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