Tempo de fazer balanços e projetar 2010.
Tempo também de agradecer a Deus por tudo o que passou, antecipando o que ainda está por vir.
Não importa se foi (ou se vai ser) bom ou ruim, pois somos alertados pela Palavra que “o mundo jaz no maligno” (1 João 5:19), mas “todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus” (Romanos 8:38).
Salomão diz em Eclesiastes 3:11 que Deus “tudo fez formoso a seu tempo” e acrescenta que “também pôs na mente do homem a ideia da eternidade, se bem que este não possa descobrir a obra que Deus fez desde o princípio até o fim”.
É esta ideia da eternidade no coração que move muita gente a buscar, por todos os meios, uma maneira de se perpetuar na lembrança e no coração dos outros, no poder, nas riquezas, na dominação, esquecendo-se de que Quem faz tudo formoso a seu tempo é Deus e não o homem.
Vivemos numa era de megapastores midiáticos e celebridades instantâneas, em que a busca desesperada de poder e fama é uma maneira mal disfarçada de tentar alcançar a eternidade já neste mundo, no ledo autoengano de que se possa roubá-la das mãos de Deus.
O confronto entre o eterno e o provisório é antigo.
O tempo é um enigma que a humanidade vem tentando decifrar há milênios.
Santo Agostinho dizia que todos nos sentimos familiarizados com ele, mas somos incapazes de entendê-lo de forma clara e satisfatória.
Até Einstein, a ciência o considerava absoluto e imutável.
A única alternativa era esperá-lo passar, como muitos fazem à espera do ano novo.
Coube ao gênio da física inferir que, considerados à velocidade da luz, tempo e espaço são grandezas relativas.
Trazendo o tema para o campo da fé (se os queridos leitores nos permitem), Deus se revela no tempo e na história, e o modo pelo qual Ele faz isso não é absoluto, nem relativo, mas - em linguagem bíblica – formoso e oportuno.
A palavra hebraica traduzida por “formoso” em Eclesiastes 3:11 é יפה - yâpheh – que também pode ser traduzida por “belo”, “agradável, “prazeroso”.
A ideia por trás da expressão “tudo fez formoso a seu tempo” é que justamente devemos aproveitar todas as oportunidades que nos são dadas por Deus para viver uma vida plena dedicada a Ele, mesmo nos momentos mais difíceis.
Este é o conselho também dado por Paulo em Efésios 5:15-16, que nos recomenda a sermos sábios e usarmos bem todas as oportunidades (“remindo o tempo”), porque os dias são maus.
E é a Bíblia a melhor demonstração disso, contando a história do povo de Deus (e a Sua intervenção na História) ao longo dos milênios.
Afinal, Jesus veio ao mundo no tempo oportuno (Marcos 12:2; Lucas 20:10; 1ª Timóteo 2:6).
Já nós, humanos, somos seres que nascemos, atuamos, interagimos, e nos despedimos num determinado momento do tempo.
Somos circunstanciais, enquanto Deus é eterno.
Tiago (4:14) descreve a vida como um vapor que aparece por pouco tempo e logo se desvanece, mas, na nossa curta existência, o Senhor coloca dentro do nosso coração este desejo, este sentimento, este vislumbre da eternidade (Eclesiastes 3:11 - veja também um texto interessante de Philip Yancey sobre o tema).
No mesmo livro, onde diz que há tempo para tudo (3:1-8), o Pregador ressalta que o tempo e a oportunidade ocorrem a todos (9:11); logo, aproveitar o tempo e todas as oportunidades que ele nos oferece é um conselho recorrente de Paulo (Efésios 5:16, Colossenses 4:5).
Temos sempre a oportunidade de fazer o bem, não só aos outros mas principalmente a nós mesmos (Gálatas 6:9-10, Filipenses 4:10), e há aqueles que, como aconteceu à enteada de Herodes, aproveitam a oportunidade para fazer o mal (Marcos 6:21), ou para manipular o bem que outros fizeram (2ª Coríntios 11:12).
A oportunidade sempre aparece para que digamos a palavra certa no tempo adequado.
Podemos deixá-la passar, e assim nos tornarmos omissos, ou dizer a palavra fora de tempo (ou de propósito), correndo o sério risco de sermos inconvenientes.
Salomão compara a palavra dita a seu tempo a maçãs de ouro em salvas de prata (Provérbios 25:11, ver também 15:23).
Como o servo sofredor profetizado por Isaías, podemos pedir a Deus que saibamos dizer boa palavra ao cansado.
"Ele me desperta todas as manhãs, desperta-me o ouvido para que ouça como aqueles que aprendem" (Is. 50:4).
Como cristãos, temos, mais que a obrigação, o prazer de aproveitar as oportunidades de dar testemunho da nossa fé (Lucas 21:13, 2ª Coríntios 5:12), enquanto aguardamos o tempo oportuno em que nosso Senhor e Rei se manifestará em glória (1ª Timóteo 6:15), sempre alertas, entretanto, porque o mal absoluto também aproveita as ocasiões de se manifestar (2ª Tessalonicenses 2:6), conforme a própria história da humanidade insiste em comprovar.
C. S. Lewis teve oportunidade de observar isso, imaginando uma carta do Diabo a um aprendiz, em que o coisa-ruim dizia o seguinte:
Os seres humanos vivem no tempo. Porém o Inimigo os destinou à eternidade. É por isso, acredito, que ele quer que os homens atentem basicamente para duas coisas: a própria eternidade e aquele ponto do tempo que chamam de presente. O presente é o ponto em que o tempo toca a eternidade. É no momento presente, e nada mais do que no momento presente, que os seres humanos têm experiências semelhantes àquela experiência que o nosso Inimigo tem da realidade como um todo; é somente nele que lhe são oferecidas a liberdade e a realidade. É por isso que ele quer que os homens estejam constantemente ligados ou com a eternidade (o que significa mantê-lo em mente) ou com o presente – quer seja meditando sobre sua união eterna com ele ou separação dele, ou então, obedecendo à voz presente da consciência, carregando a cruz de hoje, recebendo a graça para hoje e dando graças pelo prazer no presente.
(transcrito de "Cartas do Diabo a seu Aprendiz", em "Um Ano com C. S. Lewis – Leituras Diárias de suas Obras Clássicas", Ed. Ultimato, 2005, p. 279)
Em suma, nós, cristãos, somos privilegiados porque recebemos, no nosso tempo finito – presente -, a visita do Deus infinito, Aquele que faz tudo formoso a seu tempo.
Como lembra Paulo, fomos agraciados com "uma fé e um conhecimento que se fundamentam na esperança da vida eterna, a qual o Deus que não mente prometeu antes dos tempos eternos. No devido tempo, ele trouxe à luz a sua palavra" (Tito 1:2-3), pela qual vivemos e experimentamos a doce invasão do Eterno nas nossas vidas peregrinas neste mundo.
Há momentos, entretanto, em que nossas mãos fraquejam, nossos pés escorregam, nossa vida, aparentemente, se esvai, e o tempo se torna um fardo pesado demais para carregar.
É nessa hora em que todas essas verdades devem ser lembradas, para que façamos como aconselha o escritor de Hebreus (4:16): "Cheguemos, pois, com confiança ao trono da graça, para que possamos alcançar misericórdia e achar graça, a fim de sermos ajudados em tempo oportuno".
Afinal, como lembra o salmista, a natureza se alegra em Deus e espera dEle o seu sustento em tempo oportuno (Salmo 104:27).
O maná que sustentou o povo de Israel no deserto por 40 anos, durava apenas um dia, com exceção da provisão dupla para o sábado, recebida na sexta-feira (Êxodo 16).
De nada adiantava guardar o maná para o dia seguinte, pois o tempo prazeroso e oportuno para comê-lo havia se esgotado.
Entretanto, sempre caía maná no dia seguinte.
Se hoje não é o tempo oportuno, não nos desesperemos, vamos com confiança ao trono da graça, lá há tempo, formosura e oportunidade, mas principalmente graça, sempre...
Para um estudo mais detalhado do livro de Eclesiastes, clique aqui.