
Consultando, pois, os pais da Igreja, é muito interessante ver como eles interpretavam de uma maneira muito mais espiritual alguns textos que hoje são completamente desvirtuados pelos falsos profetas da prosperidade. Em sua obra “O Espírito e a Letra”, escrita por volta de 412 d. C., por exemplo, Santo Agostinho interpreta alguns textos que hoje são deturpados – de maneira totalmente diferente:
Ainda se pode investigar se o Apóstolo se refere à esperança da justiça pela qual a justiça espera ou pela qual a justiça é esperada. Pois, o justo, vivendo da fé, espera certamente a vida eterna, assim como a fé, que tem fome e sede de justiça pela renovação dia a dia do homem interior, aperfeiçoa-se e espera saciar-se dela na vida eterna, onde se realizará o que o salmo diz de Deus: É ele que sacia de bens a tua vida (Sl 103,5).
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Portanto, é réu da condenação sob o seu poder aquele que despreza sua misericórdia quando chamado à fé. Mas a todo aquele eu acreditar e a ele se confiar para ser absolvido dos pecados, curando-se de todos os vícios, inflamado por seu calor e iluminado por sua luz, contará com sua graça para as boas obras. As boas obras o libertarão da corrupção da morte mesmo em seu corpo; será coroado, saciado de bens não temporais, mas eternos, além do que podemos pedir ou pensar (Ef 3,20).
O salmo referiu-se a estes mesmos favores divinos observando a mesma ordem, ao dizer: Bendize, ó minha alma, ao Senhor, e não esqueças nenhum dos seus benefícios. É ele quem perdoa todas as tuas culpas, e que sara todas as tuas enfermidades. É ele quem resgata da morte a tua vida, e que te cora de misericórdia e de graça. É ele quem sacia de bens a tua vida (Sl 103,2-5). E para que a deformidade do homem velho, ou seja, de nossa mortalidade, não se desesperasse de alcançar estes bens, continua o salmo: Renova-se, como a da águia, a tua juventude. Como se dissesse: “Isso que ouviste diz respeito ao homem novo e ao Novo Testamento”. Considera comigo tudo isso um pouco, eu te peço, e contempla com prazer esse louvor à misericórdia, isto é, à graça de Deus.
(Santo Agostinho, “O Espírito e a Letra” (De Spiritu et Littera), caps. XXXII e XXIII, em “A Graça (I)”, Coleção Patrística, São Paulo: Paulus, 1998, pp. 85 e 88)
Felizmente ainda temos esses registros, verdadeiros testemunhos históricos da Igreja cristã, que mostram que a verdadeira prosperidade – para todos os cristãos de todas as eras - é viver uma vida ESPIRITUAL plena e completa, que se projeta para a eternidade na mais absoluta dependência de Deus.