A CRIAÇÃO
O CREDO - SEGUNDA PARTE
O primeiro artigo
Acredito em Deus Pai onipotente, Criador do céu e da Terra
Retrata da forma mais resumida a natureza, a vontade, a atividade e obra de Deus Pai. Como os Dez Mandamentos preceituaram que não se deve ter mais do que um só Deus, pergunta-se então: que espécie de homem é Deus, o que ele faz, como se pode elogiá-lo, ilustrá-lo ou descrevê-lo para que seja conhecido? É isso que este artigo ensina, e o seguinte também. A fé [ou Credo] não passa de uma reposta, de uma confissão dos cristãos diante do primeiro mandamento. Se a gente perguntar a uma criança: - Querido, qual é o deus que você tem? O que você sabe dele? Para assim poder dizer: - Meu deus é este: primeiro, o Pai que criou o céu e a Terra; fora disso, nada é Deus para mim, porque nenhum outro conseguiria criar o céu e a Terra.
Já para os eruditos e os que têm certa instrução pode-se detalhar bastante todos os três artigos, subdividindo-os em tantas partes quantas são as palavras. Mas para os jovens alunos basta apresentar o básico, ou seja, como vimos, que este artigo tem a ver com a criação. Aí devemos nos concentrar nas palavras “Criador do céu e da Terra”. O que significa, ou o que você quer dizer com as palavras “Acredito em Deus Pai onipotente, Criador” et.? Resposta: O que quero dizer e acredito é que sou criatura de Deus, isto é que foi ele quem me deu e continua preservando meu corpo, minha alma e minha vida, membros grandes e pequenos, todos os sentidos, a razão e o entendimento e assim por diante, comida e bebida, roupa, sustento, esposa e filhos, empregados, casa e propriedade etc. Além disso, ele faz com que todas as criaturas tenham utilidade e sirvam para suprir as necessidades da vida: o sol, a lua e as estrelas no céu, o dia e a noite, o ar, o fogo, a água, a terra e tudo o que ela produz com todo o seu potencial, as aves, os peixes, animais, cereais e todos os tipos de plantas; além disso, todos os demais bens materiais e temporais, a gente se dê conta de que ninguém possui nem consegue sustentar por si próprio a vida, nem tudo aquilo que acima foi enumerado e ainda possa ser enumerado, por menos e mais insignificante que seja. Tudo isso está compreendido na palavra “Criador”.
No mais, professamos também que deus Pai não só nos deu tudo o que temos e vemos diante de nós, mas também nos preserva de todo mal e fatalidade, de riscos e acidentes de toda espécie. E tudo isso por puro amor e bondade, sem nenhum mérito nosso, como Pai amável que cuida que não soframos nenhum mal. Outros aspectos nesse sentido estão ligados aos outros dois itens deste artigo, onde se fala do “Pai onipotente”.
A conclusão automática disso é a seguinte: como tudo isso que possuímos, mais aquilo que está nos céus e na Terra, é dado, mantido e preservado diariamente por Deus, certamente temos a obrigação de amá-lo, exaltá-lo e agradecer-lhe o tempo todo; em suma, servir a ele exclusivamente daquela maneira exigida e ordenada por ele nos Dez Mandamentos. Aqui haveria muita coisa a comentar, se quiséssemos entrar em detalhes, sobre como são raras as pessoas que acreditam nesse artigo. Nós passamos por alto, ouvimos e recitamos, mas não enxergamos nem consideramos aquilo que as palavras nos estão dizendo. Se acreditássemos com sinceridade, também agiríamos de acordo, não andaríamos por aí tão orgulhosos, não mostraríamos tanta arrogância, como se recebêssemos de nós mesmos a vida, a riqueza, o poder e a glória, como se as pessoas tivessem que nos temer e servir. É assim que procede o mundo errado e infeliz, soçobrado em sua cegueira, abusando de todas as bênçãos e dádivas de Deus apenas para atender sua arrogância, ganância, deleite e prazer, não dando a mínima para Deus no sentido de lhe agradecer ou de reconhece-lo como Senhor e Criador. Se acreditássemos neste artigo, ficaríamos assustados e humildes! Acontece que pecamos diariamente com os olhos, os ouvidos, as mãos, o corpo e a alma, com dinheiro, bens e tudo o que possuímos, principalmente aquelas pessoas que ainda por cima combatem a palavra de Deus. Mas os cristãos têm a vantagem de reconhecer sua obrigação de servir e obedecer a ele por todas aquelas bênçãos.
Por isso devemos nos exercitar diariamente neste artigo, gravá-lo e lembra-lo em tudo que passamos, em tudo que nos acontece de bom, e quando escapamos de um aperto ou risco. Deus nos proporciona tudo isso para que percebamos seu amor paternal e exuberante para conosco. Isso aquece o coração e desperta a gratidão, fazendo usar todos esses bens para a glória de Deus.
Esse foi, então, um resumo do sentido deste artigo, na medida do necessário para as pessoas simples tomarem conhecimento do que recebemos de Deus e de qual é a nossa obrigação em troca. Trata-se de uma intuição profunda e magnífica, porém um tesouro maior ainda. Damo-nos conta de como o Pai se deu a nós juntamente com todas as criaturas, provendo-nos riquissimamente nesta vida, sem falar de como ele derramou sobre nós bens eternos e indizíveis por meio do seu Filho e do Espírito Santo, como veremos.
(LUTERO, Martinho. Catecismo Maior do Dr. Martinho Lutero / Martinho Lutero. [Tradução de] Walter O. Schlupp. São Leopoldo: Sinodal; Porto Alegre: Concórdia, 2012, págs. 79-80)