Enquanto certos pregadores televisivos ficam dando piti por causa de blogueiros, consultores empresariais aconselham a não se preocupar com a sua reputação online, conforme o artigo abaixo, do jornal Valor Econômico de hoje, 19/04/10:
Jesus é a prova de que a reputação on-line não é importante
Lucy Kellaway
Não há mais sentido em tentar administrar sua reputação na internet. É tarde demais. Esqueletos estão saindo dos armários e em desvario pela internet, e qualquer pessoa pode dizer o que quiser sobre uma empresa ou uma pessoa sem medo de ser corrigida. Logo a coisa vai ficar ainda pior: um site dedicado a espinafrar pessoas será lançado no moldes do Yelp - que permite aos consumidores criticarem empresas sob o manto do anonimato -, de modo que haverá um lugar para que nós possamos ler todas aquelas coisas indecentes (e as menos indecentes) que uns tem a dizer sobre os outros.
Isso tem importância? Na verdade não, disse recentemente o editor do blog Tech Crunch. Ele afirmou que nossas reputações on-line podem ser bestas descontroladas, mas são bestas desdentadas: elas na verdade não podem nos machucar. Para conferir essa teoria, fiz algumas pesquisas sobre um homem que construiu uma reputação muito boa fora da internet: Jesus Cristo. Infelizmente, sua presença na rede contém muita coisa preocupante para seus consultores de relações públicas. Se você pesquisar " Jesus " no Google, o primeiro site que aparece é o Wikipedia, que nos diz que ele foi uma das figuras mais influentes da história e que há exatamente 1980 anos pode ter ressuscitado.
Mas depois disso, as coisas pioram. O próximo site da lista é " Jesus Dress Up! " (algo como " Vestindo Jesus " ), que mostra uma ilustração de um coelho pregado em uma cruz e convida você a vestí-lo com roupinhas elegantes que incluem botas roxas e cuecas cor de rosa.
Se você pular para a Twitter, verá que as coisas não melhoram. Jesus parece estar andando entre nós sob muitos disfarces, de Blackberry na mão e " twitando " , Jesus, JesusHChrist, Jesus_Christ e dezenas de variações com iniciais intermediárias diferentes, pontos e sublinhas, tudo isso fornecendo informações duvidosas sobre o filho de Deus. Ainda mais alarmante é o fato de " Palm Sunday " (Domingo de Ramos) ter sido um dos tópicos mais populares no Twitter recentemente, mas quando cliquei nele, me vi lançada em um mar de pornografia.
O que tudo isso representa para a reputação de Jesus? Eu acho que não afeta em nada. Trata-se de material aleatório, de baixo nível e eu ficaria surpresa se qualquer uma dessas informações afetassem o que as pessoas sentem por ele de uma maneira ou de outra.
A única coisa que a presença de Jesus na internet nos diz é que ele é muito famoso. Muitas pessoas se interessam por ele, embora nem tantas quanto as que se interessam por, digamos, Lady Gaga, que, no dia em que fiz meus testes, apareceu cinco vezes mais no Twitter.
Você poderia dizer que Jesus é um mau exemplo porque: a) sua reputação antecede a internet em cerca de 2 mil anos; b) as pessoas acreditam mais nele do que, digamos, em você ou em mim; c) ele está morto e tudo aconteceu há muito tempo. Mas mesmo para aqueles de nós que estamos vivos e não inspiramos sentimentos são fortes quanto Jesus, eu ainda acho que não devemos nos preocupar tanto com a presença on-line.
Há tantas indiscrições na internet que elas têm tanto valor quanto a moeda do Zimbábue. De fato, se os departamentos de recursos humanos das empresas prestarem atenção em fotografias de bêbados colocadas no Facebook, não restaria ninguém com menos de 30 anos para ser contratado. As observações negativas têm uma importância ainda menor. Todo mundo que obteve qualquer tipo de sucesso na escalada corporativa vai acabar encontrando coisas horríveis sobre si na internet, colocadas por anônimos. A primeira vez que li uma calúnia sobre mim fiquei furiosa. Mas então, percebi que a vida continuava como antes e que ninguém tinha visto nada. Na vez seguinte, dei menos importância. Com os adultos, camadas extras de pele parecem crescer, embora isso possivelmente não ocorra com os adolescentes.
Mas mesmo assim, as pessoas ainda parecem se importar mais com as coisas escritas na internet que fazem sentido. Na semana passada, enquanto alguns blogueiros afirmavam que a reputação estava morta, outros estavam agitados com a revelação aparentemente chocante de que alguns médicos estão buscando informações sobre seus pacientes no Google. Segundo um artigo publicado pela " Harvard Review of Psychiatry " , médicos estão pesquisando pacientes na internet por curiosidade, voyerismo e hábito, e os pacientes sentem que sua privacidade está sendo invadida.
Isso é muito estranho, pois, se algo está disponível para 1,7 bilhão de pessoas ao clique de um mouse, não se trata de algo absolutamente particular. Aquilo que na verdade seu médico pode ver de seu corpo é para mim algo bem mais íntimo do que qualquer coisa que eles eventualmente venham a encontrar na internet.
Isso não quer dizer que eu ficaria feliz se minha médica fizesse uma pesquisa sobre mim na internet. Eu ficaria furiosa. Como o tempo para marcar consultas no centro de saúde local onde vou é de cinco minutos, seria irritante se ela começasse a usar três desses minutos para ver o que poderia desenterrar sobre mim no Google.
Lucy Kellaway é colunista do " Financial Times " . Sua coluna é publicada às segundas-feiras na editoria de Carreira.
Não há mais sentido em tentar administrar sua reputação na internet. É tarde demais. Esqueletos estão saindo dos armários e em desvario pela internet, e qualquer pessoa pode dizer o que quiser sobre uma empresa ou uma pessoa sem medo de ser corrigida. Logo a coisa vai ficar ainda pior: um site dedicado a espinafrar pessoas será lançado no moldes do Yelp - que permite aos consumidores criticarem empresas sob o manto do anonimato -, de modo que haverá um lugar para que nós possamos ler todas aquelas coisas indecentes (e as menos indecentes) que uns tem a dizer sobre os outros.
Isso tem importância? Na verdade não, disse recentemente o editor do blog Tech Crunch. Ele afirmou que nossas reputações on-line podem ser bestas descontroladas, mas são bestas desdentadas: elas na verdade não podem nos machucar. Para conferir essa teoria, fiz algumas pesquisas sobre um homem que construiu uma reputação muito boa fora da internet: Jesus Cristo. Infelizmente, sua presença na rede contém muita coisa preocupante para seus consultores de relações públicas. Se você pesquisar " Jesus " no Google, o primeiro site que aparece é o Wikipedia, que nos diz que ele foi uma das figuras mais influentes da história e que há exatamente 1980 anos pode ter ressuscitado.
Mas depois disso, as coisas pioram. O próximo site da lista é " Jesus Dress Up! " (algo como " Vestindo Jesus " ), que mostra uma ilustração de um coelho pregado em uma cruz e convida você a vestí-lo com roupinhas elegantes que incluem botas roxas e cuecas cor de rosa.
Se você pular para a Twitter, verá que as coisas não melhoram. Jesus parece estar andando entre nós sob muitos disfarces, de Blackberry na mão e " twitando " , Jesus, JesusHChrist, Jesus_Christ e dezenas de variações com iniciais intermediárias diferentes, pontos e sublinhas, tudo isso fornecendo informações duvidosas sobre o filho de Deus. Ainda mais alarmante é o fato de " Palm Sunday " (Domingo de Ramos) ter sido um dos tópicos mais populares no Twitter recentemente, mas quando cliquei nele, me vi lançada em um mar de pornografia.
O que tudo isso representa para a reputação de Jesus? Eu acho que não afeta em nada. Trata-se de material aleatório, de baixo nível e eu ficaria surpresa se qualquer uma dessas informações afetassem o que as pessoas sentem por ele de uma maneira ou de outra.
A única coisa que a presença de Jesus na internet nos diz é que ele é muito famoso. Muitas pessoas se interessam por ele, embora nem tantas quanto as que se interessam por, digamos, Lady Gaga, que, no dia em que fiz meus testes, apareceu cinco vezes mais no Twitter.
Você poderia dizer que Jesus é um mau exemplo porque: a) sua reputação antecede a internet em cerca de 2 mil anos; b) as pessoas acreditam mais nele do que, digamos, em você ou em mim; c) ele está morto e tudo aconteceu há muito tempo. Mas mesmo para aqueles de nós que estamos vivos e não inspiramos sentimentos são fortes quanto Jesus, eu ainda acho que não devemos nos preocupar tanto com a presença on-line.
Há tantas indiscrições na internet que elas têm tanto valor quanto a moeda do Zimbábue. De fato, se os departamentos de recursos humanos das empresas prestarem atenção em fotografias de bêbados colocadas no Facebook, não restaria ninguém com menos de 30 anos para ser contratado. As observações negativas têm uma importância ainda menor. Todo mundo que obteve qualquer tipo de sucesso na escalada corporativa vai acabar encontrando coisas horríveis sobre si na internet, colocadas por anônimos. A primeira vez que li uma calúnia sobre mim fiquei furiosa. Mas então, percebi que a vida continuava como antes e que ninguém tinha visto nada. Na vez seguinte, dei menos importância. Com os adultos, camadas extras de pele parecem crescer, embora isso possivelmente não ocorra com os adolescentes.
Mas mesmo assim, as pessoas ainda parecem se importar mais com as coisas escritas na internet que fazem sentido. Na semana passada, enquanto alguns blogueiros afirmavam que a reputação estava morta, outros estavam agitados com a revelação aparentemente chocante de que alguns médicos estão buscando informações sobre seus pacientes no Google. Segundo um artigo publicado pela " Harvard Review of Psychiatry " , médicos estão pesquisando pacientes na internet por curiosidade, voyerismo e hábito, e os pacientes sentem que sua privacidade está sendo invadida.
Isso é muito estranho, pois, se algo está disponível para 1,7 bilhão de pessoas ao clique de um mouse, não se trata de algo absolutamente particular. Aquilo que na verdade seu médico pode ver de seu corpo é para mim algo bem mais íntimo do que qualquer coisa que eles eventualmente venham a encontrar na internet.
Isso não quer dizer que eu ficaria feliz se minha médica fizesse uma pesquisa sobre mim na internet. Eu ficaria furiosa. Como o tempo para marcar consultas no centro de saúde local onde vou é de cinco minutos, seria irritante se ela começasse a usar três desses minutos para ver o que poderia desenterrar sobre mim no Google.
Lucy Kellaway é colunista do " Financial Times " . Sua coluna é publicada às segundas-feiras na editoria de Carreira.