quinta-feira, 31 de julho de 2014

Justiça de SP condena madrinha que agrediu noiva em cerimônia de casamento

Você, amiga querida, que sonhou com aquela cerimônia de casamento maravilhosa, tome cuidado com as madrinhas que você convida. O perigo pode estar ali do lado do altar. A notícia vem do Tribunal de Justiça de São Paulo:

NOIVA AGREDIDA EM CERIMÔNIA DE CASAMENTO SERÁ INDENIZADA

Acórdão da 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou uma madrinha de casamento a indenizar a noiva em R$ 20 mil, por agredi-la na cerimônia, em São Bernardo do Campo.

A autora relatou que a ré a agrediu com tapas no rosto e atirou copos contra seu noivo, o que fez os convidados deixarem o local. Em defesa, a ré alegou que agiu em legítima defesa de si própria e de sua filha de 2 anos, após terem sido provocadas de forma injusta pela nubente. A noiva pediu indenização pelos gastos relativos ao casamento, lua de mel e tratamento psicológico, acrescida de montante a título de danos morais.

Segundo o desembargador Vito Guglielmi, o dano moral foi evidente, pois uma festa de casamento representa a celebração de um evento especial na vida de qualquer casal, e determinou o pagamento de indenização de R$ 20 mil. Quanto ao prejuízo material, o relator explicou que os valores alegados não foram comprovados. “Diante da inexistência de qualquer comprovante de pagamento relativo a essas despesas, inviável a pretensão de ressarcimento”, anotou em voto.

O julgamento foi decidido por unanimidade. Os desembargadores Paulo Alcides Amaral Salles e Francisco Loureiro também participaram da turma.



quarta-feira, 30 de julho de 2014

Sócios de Deus


Mais um momento antológico da música gospel nacional:




terça-feira, 29 de julho de 2014

Como a Primeira Guerra moldou o mundo que conhecemos

Na esteira do centenário do começo da Primeira Guerra Mundial, tristemente relembrado ontem aqui, reproduzimos excelente artigo de Diego Viena, bem detalhado e abrangente, publicado no Valor Econômico de 24/01/14:

Rastros da guerra

Uma guerra iniciada há cem anos na Europa trouxe consequências até hoje expostas nas divisões que afetam o continente, apesar de décadas de esforços de integração e unificação. Mais do que sugerir paralelos com as dificuldades atuais da Europa, a "Grande Guerra" está sendo lembrada em analogias com um mundo em que o equilíbrio entre potências é frágil, a relação entre governos e suas populações está em xeque e pequenas disputas locais adquirem rapidamente um significado global.

É consenso, entre historiadores, que a Primeira Guerra Mundial marcou o verdadeiro início do século XX: o tempo da guerra total, da industrialização dos conflitos, das mortes contadas aos milhões, do ocaso da Europa e do triunfo dos Estados Unidos. Há divergências, porém. Enquanto cada país avança em suas iniciativas particulares de lembrar os próprios mortos entre 1914 e 1918, com poucas exceções, os esforços para fazer da efeméride um evento global, ou ao menos europeu, não frutificaram. Nem a Comissão Europeia, instituição que representa diretamente o longo e difícil processo de integração do continente, programou eventos que levem sua assinatura.

"A dificuldade de integração é real", diz o historiador Gerd Krumeich, da Universidade de Dusseldorf e do Instituto para a História do Tempo Presente, na França. "A Europa não tem como ficar unida e pacífica se não conseguir passar além dos acordos meramente econômicos e políticos. Também é indispensável que se dissemine o hábito de conhecer melhor a história comum e a mentalidade uns dos outros." Para Krumeich, não se deveria exigir dos alemães que tenham comemorações da Primeira Guerra só porque outras nações comemoram o armistício, em 11 de novembro. "Mas podemos pedir que os alemães entendam por que as outras nações celebram seus mortos: esses mortos têm a ver com a Alemanha, mesmo que os alemães tenham esquecido disso."

Segundo Krumeich, a Primeira Guerra foi tão apagada da memória coletiva alemã que os monumentos aos mortos estão "completamente mofados". Mas, pergunta o historiador, "seria muito pedir aos franceses para colocar uma placa no ossuário de Douaumont, onde 150 mil soldados desconhecidos estão enterrados, lembrando que pelo menos 70 mil deles são alemães?"

A chanceler alemã, Angela Merkel, mencionou brevemente a efeméride em seu discurso de ano-novo, lembrando que também se celebram em 2014 os 75 anos do início da Segunda Guerra Mundial e os 25 anos da queda do Muro de Berlim. Ela chamou atenção para o contraste entre esses três eventos e as eleições para o parlamento europeu, que ocorrerão em maio. A queda do muro, na definição da chanceler, marcou "o começo do fim da separação entre a Alemanha e a Europa". Mas ela também afirmou que, para a prosperidade de seu país, é indispensável um papel de liderança na União Europeia, mais especificamente, na superação da crise da zona do euro.

Tanto a moeda comum quanto a liderança alemã são fonte de desconfiança no continente. A crise tem causas econômicas, que aprofundam as divisões internas na Europa, mas a falta de coordenação na celebração do centenário mostra que ainda não existe uma identidade europeia em termos de história e perspectivas comuns. "Isso quer dizer que não existe um público europeu", afirma o historiador Oliver Janz, da Universidade Livre de Berlim e autor de um livro recém-lançado que, apesar de chamar-se "1914", trata da guerra inteira. "A história é essencialmente sobre identidades. Então, é preciso ampliar o esforço para organizar a história, a memória e as identidades em escala europeia, e não nacional. As rememorações do centenário da guerra deveriam fazer isso."

A memória da Primeira Guerra fomenta outros tipos de paralelos. A historiadora Margaret McMillan, da Universidade Oxford, autora de "Paz em Paris", argumenta que vários sinais apontam para semelhanças entre o mundo anterior a 1914 e o início do século XXI. A instabilidade na Síria, por exemplo, envolve interesses de três dos principais blocos de poder - Estados Unidos, Rússia e União Europeia. No ano passado, o uso de armas químicas naquele país - surgidas, como assinala Margaret, durante a Primeira Guerra Mundial - quase resultou em bombardeios americanos, contra a vontade dos russos. Na Ásia, uma China em rápida expansão econômica começa a testar seus músculos geopolíticos, entrando em rota de colisão com o Japão, aliado dos Estados Unidos.

Assim como na "belle époque" o antissemitismo era uma válvula de escape para qualquer problema doméstico importante, do ponto de vista da opinião pública, diz Margaret, a atualidade tem seu escapismo na forma da xenofobia de partidos de extrema-direita, como a Frente Nacional na França e o British National Party (BNP) no Reino Unido, ambos em expansão paulatina nas últimas décadas.

Em termos internacionais, a ideia de que o comércio produz uma interdependência que afasta o risco de uma guerra de larga escala já não era novidade em 1914. Margaret McMillan cita o livro "A Grande Ilusão", escrito em 1909 pelo jornalista Norman Angell, como argumento da época para a impossibilidade de um conflito entre as grandes potências: o Reino Unido e a Alemanha eram os principais parceiros comerciais um do outro naquele tempo, assim como, hoje, os destinos das duas maiores economias, Estados Unidos e China, estão intimamente interligados.

O casal imperial a minutos de morrerem: flores e sorrisos antes da catástrofe.
"Um paralelo é digno de nota: o caráter explosivo do terrorismo internacional", afirma o historiador americano Jay Winter, da Universidade Yale e autor dos livros "1914-1918: The Great War and the Shaping of the 20th Century" (A grande guerra e a formação do século XX) e "Remembering War: The Great War Between History and Memory in the 20th Century" (Relembrando a guerra: a Grande Guerra entre história e memória no século XX). O conflito, que deixou mais de dez milhões de mortos e redesenhou o cenário político internacional, começou após o assassinato do herdeiro do trono austríaco, Francisco Ferdinando e sua mulher, Sofia Chotek, por um estudante sérvio ligado ao grupo terrorista Mão Negra, contrário à presença do arquiduque na capital da Bósnia-Herzegóvina, em 1914. Em resposta, o império austro-húngaro declarou guerra à Sérvia. "A guerra foi iniciada pelas respostas austro-alemã e russa ao ataque terrorista na Bósnia. O caminho para a paz no Oriente Médio foi irreversivelmente alterado pelo assassinato de Yitzhak Rabin [primeiro-ministro de Israel, de 1992 a 1995] por um terrorista judeu. Os ecos são evidentes", afirma Winter.

A voz dissonante é a de Krumeich. "Essas comparações não me convencem, porque hoje conhecemos a capacidade de destruição das máquinas militares. Em 1914, isso não acontecia. Também sabemos quais são as forças e os limites de uma economia globalizada: não somos mais obcecados por abrir novos mercados como um imperativo que envolve a vida e a morte das nações. É muito diferente." Krumeich lançou no fim do ano passado o livro "Juli 1914: Eine Bilanz" (Julho de 1914: um balanço).

Imprensa americana anuncia guerra contra a Alemanha,
acrescentando que Cuba e Brasil podiam se aliar a eles.
As analogias não dão o tom das celebrações que se preparam. Os principais projetos europeus de rememoração do conflito iniciado em 28 de julho de 1914 têm foco semelhante. Buscam trazer à tona as memórias dos combatentes e das populações envolvidas, mais do que celebrar temas nacionais ou militares. No Reino Unido, os Arquivos Nacionais prometem colocar em livre acesso na internet 1,5 milhão de páginas de diários de guerra escritos por soldados. Na França, uma Comissão do Centenário foi criada para receber projetos de eventos de cultivo da memória da guerra, com consultoria de especialistas de vários países. Foram selecionados mais de 2000 projetos. Na Alemanha, a Associação Popular Alemã de Manutenção de Sepulturas de Guerra colocou no ar uma página que agrega todos os eventos e exposições que relembram os mortos do conflito.

Segundo Winter, que é consultor da comissão francesa, os eventos relacionados ao centenário devem caracterizar-se por uma linha pacifista, "honrando os mortos sem glorificar a guerra", o que seria "como comemorar a peste bubônica do século XIV". "Se há uma mensagem política, é a de que, para entender a importância da integração europeia, é preciso voltar a esse momento espetacular de desintegração da Europa, em 1914."

O mais ambicioso projeto de rememoração do conflito é conduzido pela Biblioteca Europeana, instituição continental de documentação digital, que desde o ano passado recolhe e digitaliza as lembranças e documentos de particulares relacionados ao dia a dia das trincheiras. A França, onde ocorreu grande parte dos combates na frente ocidental, é o país onde essa coleta mais avançou, encabeçada pelos Arquivos Nacionais. Há duas semanas, uma das organizadoras do projeto na França, Catherine Dhérent, comemorou a descoberta de um diário mantido por um soldado desconhecido, com anotações sobre a localização e atividades de sua unidade em cada etapa da guerra. Chamou a atenção da equipe de digitalização o fato de que o próprio soldado censurou passagens que não eram factuais: riscou, rasgou ou cortou todas as partes em que deixava sua opinião.

Cena insólita da Primeira Guerra:
cavalaria contra força aérea.
Na Universidade Livre de Berlim, Oliver Janz coordena um projeto de memória da Primeira Guerra com maior abrangência. A Enciclopédia Internacional 1914-1918 on-line" tem como objetivo realçar o caráter mundial de uma guerra que começou como um conflito localizado nos Bálcãs, entre uma Sérvia que ambicionava se tornar uma potência local e um império austro-húngaro em franca decadência, mas rapidamente se transformou em guerra total na Europa e, ao terminar, tinha envolvido os cinco continentes. Com a participação de 86 editores e cerca de 900 pesquisadores, a enciclopédia pretende resgatar o sentido do conflito em todas as frentes de batalha.

"É uma perspectiva muito eurocêntrica considerar que a guerra aconteceu entre agosto de 1914 e novembro de 1918", diz Janz. "No Leste Europeu, por exemplo, a guerra continuou por vários anos, com a guerra civil na Rússia e na Turquia, o confronto entre a Grécia e a Turquia, a expulsão dos gregos da Anatólia e assim por diante."

A Enciclopédia será lançada em 8 de outubro, na sede do Conselho das Regiões da Europa, em Bruxelas. Segundo Janz, a escolha do local visa realçar o objetivo de superar as perspectivas excessivamente nacionais com que a Primeira Guerra é encarada no continente europeu. Janz lembra também que, do ponto de vista de vários países, a Primeira Guerra foi a amplificação de disputas armadas que já vinham acontecendo. Em 1912 e 1913, houve guerras nos Bálcãs, envolvendo a Sérvia, a Bulgária, a Romênia e o império otomano. A Itália, em 1911, aproveitou-se da derrocada dos otomanos para conquistar a Líbia, em ataque não provocado, graças ao qual sérvios, russos, alemães, ingleses e franceses enxergaram suas próprias possibilidades de acesso aos territórios dominados pelo antigo império muçulmano. Entre esses territórios estão Iraque, Síria e Palestina, que até hoje sofrem de instabilidade geopolítica.

O Japão, que se beneficiou da desintegração do pequeno império colonial alemão em 1919, vinha exercitando sua musculatura militar desde 1895, quando venceu a China, e principalmente 1905, quando derrotou a Rússia. Foi a primeira vez, desde que os otomanos deixaram de expandir seu território, que uma potência europeia foi derrotada por um país não europeu em uma guerra de larga escala. A guerra russo-japonesa de 1905 foi crucial para que os russos concentrassem suas energias em perseguir interesses no lado europeu, contra os otomanos e, principalmente, os austríacos.

Mesmo quando olhada apenas nas duas frentes europeias e no período agosto de 1914-novembro de 1918, vê-se que o conflito provocou uma transformação profunda na maneira como se faziam as guerras, no seu sentido econômico e no impacto sobre populações civis. Por isso, vários historiadores consideram 1914 o verdadeiro início do século XX. Estendida até a exaustão financeira das partes envolvidas, a guerra foi em grande parte decidida com a entrada, no lado aliado, de uma potência com recursos quase ilimitados e uma economia que até então só tinha lucrado com o conflito na Europa: os EUA.

Kaiser Guilherme II e Tzar Nicolau II,
os primos antes da guerra. O primeiro
perderia o trono, o segundo, a vida.
"A derrota da Rússia no inverno de 1917 deu à Alemanha uma grande oportunidade de transferir suas forças para a frente ocidental, mas, a essa altura, a guerra de submarinos conduzida pelos alemães tinha levado os Estados Unidos para a guerra", diz o economista Mark Harrison, da Universidade de Warwick e um dos autores de "The Economics of World War One" (A economia da Primeira Guerra Mundial), livro que examina detidamente a condição econômica de cada país beligerante. "Com a Rússia, os aliados tinham perdido a mais fraca das grandes potências. Com os Estados Unidos, receberam o reforço do mais rico de todos."

O ano de 1914 marca o encerramento de uma era de liberalismo na economia e expansão do comércio e das finanças internacionais, migração em massa com liberdade e integração dos mercados de capitais. "Foram necessárias décadas para reverter o impacto negativo da Primeira Guerra na globalização", diz Harrison. Contrariando a célebre tese de Lênin em "Imperialismo, Fase Superior do Capitalismo", de que a guerra era consequência de disputas econômicas entre grandes blocos de capital, Harrison afirma que, para "a maior parte dos interesses comerciais e econômicos, era pouquíssima a expectativa de lucro com a guerra, mesmo na Alemanha".

Segundo o economista, em quase todos os países envolvidos, o interesse em entrar em guerra estava restrito a uma pequena elite militar e política. As sociedades civis e as elites econômicas preferiam a prosperidade dos tempos de paz. Na Alemanha, o Partido Social-Democrata, o mais representado no parlamento e que aprovaria a emissão de bônus de guerra, manifestou-se contra a escalada armamentista diversas vezes. "O que há de interessante, e um tanto deprimente, é ver como essas pequenas elites conseguiram influenciar o curso dos acontecimentos."

Entre os lançamentos que se anteciparam às celebrações do centenário, tentando explicar precisamente a questão levantada por Harrison, um dos mais traduzidos e discutidos é "The Sleepwalkers" (Os sonâmbulos), do historiador australiano Christopher Clark, da Universidade Cambridge. O livro se concentra na "crise de julho", que se seguiu ao assassinato do herdeiro austro-húngaro Francisco Ferdinand e sua mulher em Sarajevo, em 28 de junho de 1914. Em mais de 600 páginas, Clark descreve os meandros confusos das relações entre as potências do continente no fim da "belle époque", mas também as divisões internas de cada país e o modo de pensamento tradicional e belicoso que motivou os principais artífices da guerra.

No fim do relato, a conhecida tese da responsabilidade alemã pelo conflito aparece bastante mitigada, a não ser pelos blefes e ultimatos lançados ao longo da crise de julho. O expansionismo da Sérvia, o orgulho ferido austro-húngaro, a estratégia russa de assegurar sua predominância na área do decadente império turco, o interesse de autoafirmação da Itália, a perseverança francesa em dar o troco pela guerra perdida contra a Alemanha em 1870 e a arrogância do regime britânico, são aspectos que ganham realce na narrativa de Clark, em paralelo ao pânico de que eram tomados os estrategistas de Berlim, à medida que a aliança de vizinhos hostis ao cáiser crescia em poderio e importância.

O historiador inglês Max Hastings, autor de "Catastrophe: Europe Goes to War, 1914" (Catástrofe: a Europa entra em guerra, 1914), chama atenção para o fato de que a política interna alemã pode ter influenciado as lideranças do país a subir o tom do militarismo. A maioria social-democrata no parlamento alemão, além de hostil ao militarismo, também se empenhava em reduzir os poderes da monarquia. Enquanto isso, afirma Hastings, a Alemanha exibia vantagens em relação aos vizinhos em todos os indicadores econômicos, mas a mentalidade imperial não conseguia reconhecer outra forma de poder que não o número de soldados.

Para Harrison, a difícil relação entre o pensamento político do século XIX e a racionalidade econômica explica em grande medida o interesse equivocado da Alemanha por entrar em guerra. "Naquele tempo, ninguém estava calculando o PIB e os líderes alemães não tinham a menor ideia do que pensariam os historiadores econômicos cem anos mais tarde. Eles raciocinavam em termos de equilíbrio militar e, nesse campo, o que podiam ver era uma aliança anti-alemã crescente." O que a história econômica mostra, e Harrison destaca, "é que a Alemanha poderia perfeitamente ter prosperado sem guerra. Mas não seria a Alemanha que existia na cabeça da elite prussiana: conservadora, aristocrática e militarista". O historiador pergunta o que Otto von Bismarck, chanceler do império alemão, ou o cáiser teriam pensado da Alemanha atual, próspera, liberal, democrática, vivendo em harmonia com seus vizinhos, apesar da perda da Alsácia e da Prússia Oriental. "Provavelmente, não gostariam muito", conclui.

Krumeich elogia o livro de Clark, mas manifesta desconforto com o que lhe parece uma diminuição excessiva da responsabilidade alemã. Foi o regime do cáiser, afinal, que deu o "cheque em branco" à Áustria para atacar a Sérvia - depois que o império dos Habsburgos impôs exigências deliberadamente inviáveis ao governo de Belgrado, na sequência de eventos que começou com o assassinato de Francisco Ferdinando em Sarajevo. Também foi a Alemanha que deu um ultimato à Rússia e, mais tarde, à França, para não se envolverem no conflito que se iniciava. Por fim, foram os alemães que violaram a neutralidade da Bélgica e a invadiram no caminho para a França, provocando a entrada do Reino Unido na guerra.

Ainda assim, Krumeich coloca a questão da responsabilidade pela guerra em outros termos. Tanto os alemães quanto os outros países que, nos anos anteriores, expandiam e equipavam seus exércitos em ritmo acelerado têm responsabilidade por atirar a Europa e o mundo no conflito. Mas os diplomatas e líderes políticos que trabalhavam pela eclosão do conflito não imaginavam que a guerra se tornasse tão prolongada e assumisse dimensões de verdadeira catástrofe. Pensavam que o conflito, ganhasse quem ganhasse, seria curto. Uma guerra de tamanhas proporções era algo que sequer podiam conceber. "A guerra poderia ter sido evitada, se os líderes das grandes potências pudessem imaginar o que seriam as batalhas de Verdun e do Somme" [que, em 1916, mataram, juntas, cerca de 1,4 milhão de soldados], conclui Krumeich.

Janz observa que outros temas importantes são deixados de lado, enquanto a questão da responsabilidade pelo início da guerra continua sendo citada em primeiro lugar até hoje, quando o público começa a se interessar pelo tema. O primeiro fato negligenciado é que um conflito localizado se tornou global e afetou até mesmo países que permaneceram neutros. "Além disso, precisamos encarar essa tragédia como um alerta de que não se pode nunca considerar que a paz está garantida", afirma o historiador. "Um conflito localizado em alguma região instável pode levar à ruína todo o sistema de equilíbrio global. Seria uma ilusão pensar que isso deixou de ser verdade."

Os nomes pelos quais a Primeira Guerra é chamada, cem anos mais tarde, nos países envolvidos revelam a marca que deixou na consciência dos povos. A "Urkatastrophe", catástrofe originária dos alemães, é também a "Great War" dos britânicos ou "Grande Guerre" dos franceses. É a origem da identidade nacional para australianos, neozelandeses e outros povos que emergiram do colonialismo graças à participação no conflito. A resposta rápida e extensa à convocação por contribuições pessoais, na França e na Inglaterra, sobretudo, é uma demonstração, segundo Winter, de que "a Primeira Guerra foi o momento em que a história global e a história pessoal se tornaram uma coisa só, e nunca mais se separaram".

O foco das celebrações em relatos de soldados e histórias de particulares reflete também uma novidade nefasta introduzida pela Primeira Guerra Mundial, que se tornaria um espectro recorrente no século XX: os massacres e deslocamentos forçados de civis. Já nos primeiros dias da guerra, na futura Iugoslávia, ocorreram expurgos de sérvios. Na Bélgica, moradores suspeitos de sabotar as linhas de comunicação alemãs foram executados. Na Rússia, populações de origem alemã foram deslocadas e houve pogroms em comunidades judaicas. O episódio mais sangrento ocorreu no império turco-otomano. O governo acusou a população armênia de colaborar com as tropas russas e passou a considerar cada armênio um inimigo. O resultado foi o genocídio armênio, que vitimou um número estimado em até 1,5 milhão de civis. Até hoje, o governo turco nega a ocorrência do episódio - negação que é um dos entraves à entrada da Turquia na União Europeia.

Quando foi assinado o Tratado de Versalhes, em 1919, considerado o documento que encerrou a guerra, o mundo estava profundamente transformado: seu centro cultural e econômico, a Europa, sede dos grandes impérios coloniais que dominaram o século anterior, estava moralmente humilhado: deixara de ser o exemplo quase único de modernização possível. Regiões até então periféricas, como o Japão e a América Latina, puderam passar a procurar seus modelos de modernização. "Foi o começo de uma era de nacionalismo profundo, tanto em política quanto nas artes", afirma Janz. Movimentos modernistas, como o brasileiro de 1922, têm entre suas raízes, segundo o historiador, um esforço de repensar a condição nacional depois do trauma da Primeira Guerra.

Quatro dinastias centrais para a história dos séculos anteriores haviam sido removidas. Os Hohenzollers alemães e os Habsburgos austro-húngaros haviam sido expulsos e viviam no exílio. No lugar do antigo império turco-otomano, que em 1453 havia derrotado o império bizantino, a jovem república turca era reformada sob o comando de Mustafa Kemal Atatürk. Nicolau II, na Rússia, mais do que removido, havia sido morto, com toda sua família. O novo poder bolchevique ainda deveria enfrentar uma longa e sangrenta guerra civil antes de tornar-se a União Soviética e controlar um enorme território, até a queda do Muro de Berlim, em 1989.

Na Alemanha, as revoluções de 1918, que forçaram o fim da guerra, também quase resultaram em socialismo. Mas o resultado mais palpável foi o ressentimento disseminado pelo país como resultado dos termos draconianos do tratado que encerrou o conflito: estava instalado o ovo da serpente do qual sairia o nazismo.



segunda-feira, 28 de julho de 2014

100 anos atrás, começava a Primeira Guerra Mundial

A guerra das trincheiras
Exatos 100 anos atrás, no dia 28 de julho de 1914, o Império Austro-Húngaro invadia a Sérvia, dando início ao primeiro grande conflito de escala mundial, que ficou conhecido como a "Grande Guerra" até que a invasão nazista da Polônia em 1º de setembro de 1939 inaugurasse outro confronto ainda maior, colocando os ordinais "Primeira" e "Segunda" em cada uma delas.

O estopim para a Guerra de 1914 foi o assassinato, em Sarajevo (capital da Bósnia-Herzegovina), do arquiduque Ferdinando Francisco, no dia 28 de junho daquele ano, conforme já tivemos oportunidade de comentar aqui.

As verdadeiras causas do conflito, entretanto, são outras. A primeira que merece ser citada é o colonialismo tardio europeu, junto de seu irmão gêmeo, o imperialismo que grassava no continente naquela época.

Imperialismo em charge da época:
a China sendo fatiada por Reino Unido,
Alemanha, Rússia, França e Japão.
É estranho para o homem do século XXI pensar em colonialismo nos termos de 100 anos atrás, já que hoje o poder de um país sobre outro se impõe de maneira muito mais, digamos, sutil, e o imperialismo ganhou o adjetivo "econômico".

A Europa continua multifacetada como era 100 anos atrás, uma colcha de retalhos de territórios e povos embalada por um pout-pourri de idiomas e dialetos com fronteiras nacionais mal definidas.

Claro que hoje existe a União Europeia para domar, a duras penas, os nacionalismos basco e catalão na Espanha, apenas para citar um exemplo bem conhecido de todos, mas a tensão continua sempre presente.

Na Europa de 1914 os conflitos étnicos eram muito mais complicados, visto que as fronteiras e os Estados eram muito pior definidos do que atualmente.

Nesse caldeirão de rivalidades, a Alemanha, que havia sido oficialmente unificada em 1871, sob o comando de Bismarck, chegava atrasada à corrida colonialista que espanhóis, portugueses, ingleses e franceses já vinham desenvolvendo com estrondoso sucesso por mais de 3 séculos.

Seu tradicional grande aliado, o Império Austro-Húngaro (oficialmente criado em 1867), tinha tantos problemas com nacionalidades rivais no seu próprio território, que sequer podia pensar em se aventurar além de suas fronteiras.


Mulher dá flores a soldado alemão deixando Berlim para ir à guerra em 1914.
Mal sabiam eles o inferno em que jogariam o mundo por 3 décadas.

A Alemanha unificada não queria continuar assistindo de camarote a hegemonia do grande império britânico, seu maior rival, governando de sol a sol o mundo colônias inimagináveis para o mundo atual, como a China e a Índia.

A Namíbia, por exemplo, se tornou colônia alemã na África a partir de 1885.

A África fatiada entre os europeus
A esse caldo pútrido de colonialismo, imperialismo e nacionalismo exacerbados se somou o tradicional militarismo dos países europeus, tristemente acostumados que estavam às guerras localizadas dos séculos anteriores.

Havia outro ingrediente que hoje é bem conhecido, mas nascia com todo vigor naquela época: a tecnologia, que permitia incrementar as armas e máquinas de guerra.

Fizeram sua estreia no teatro de operações da Primeira Guerra, apenas para citar alguns "apetrechos", a metralhadora, as armas químicas, os tanques, submarinos e aviões.

O período entre o fim da Guerra entre Rússia e Japão (com derrota dos primeiros) em 1905 e 1914 ficou conhecido como "A Paz Armada", o que revelava as tensões latejantes entre as nações.

Enquanto isso, o outrora glorioso Império Otomano (hoje representado pela Turquia) se esfacelava, o que estimulava o apetite das potências da época em levar o conflito a uma escala mundial.

Tudo isso permitiu, por assim dizer, que os alemães e austríacos se sentissem autorizados a promover uma guerra de expansão territorial e econômica dentro do seu próprio continente, mas os seus cálculos se revelaram muito mal feitos.

Tríplice Aliança x Tríplice Entente
Bateram-se inicialmente então, de um lado a Tríplice Aliança, formada por Alemanha, Império Austro-Húngaro e Itália (esta viraria de lado em 1915), e a Tríplice Entente, composta por Reino Unido, França e Rússia, com adesões posteriores de lado a lado.

Apesar do sucesso inicial na invasão da França e - sobretudo - da Rússia, as tropas alemãs tiveram seu avanço detido pela guerra de trincheiras, que, no primeiro ano de guerra, permitiu que situações inusitadas acontecessem, como o Natal comemorado conjuntamente pelos inimigos no Natal de 1914, conforme já tivemos oportunidade de registrar aqui.

No flanco oriental, a revolução bolchevique na Rússia fez com que o novo governo comunista buscasse um armistício com os alemães, o que permitiu a estes que concentrassem suas forças no front ocidental.


Nem tudo são flores no campo de batalha. Ou - pior - não há lugar nem tempo para flores por lá.

Nada mudou, entretanto. Apesar da aparente imobilidade dos exércitos nas trincheiras, os alemães foram colecionando derrotas e - principalmente - gastos.

A mídia alemã vendia ao seu povo a ilusão de que a vitória final era apenas questão de tempo, enquanto os cofres públicos se esvaíam.

Apesar do fôlego obtido com a paz com a Rússia, a entrada dos Estados Unidos na guerra em 1917 fez com que o Império Alemão visse a balança virar em seu desfavor.

1917 foi o ano em que o Brasil também entrou na guerra, em retaliação ao torpedeamento do vapor "Paraná" (em 5 de abril), do navio "Tijuca" (em 20 de maio) e do cargueiro "Macau" (em 23 de outubro), supostamente por submarinos alemães.

A participação brasileira, entretanto, foi mínima, até porque pouco restava o que fazer para encerrar o conflito. Limitou-se a um grupo de aviadores enviado à Força Aérea britânica, um corpo médico-militar integrado às forças francesas e o patrulhamento naval da costa noroeste africana até o estreito de Gibraltar.

Desta maneira, impedidos de sustentar sua máquina de guerra, os alemães se rendem em 11 de novembro de 1918, deixando atrás de si um sangrento rastro de cerca de 20 milhões de mortos espalhados por vastas áreas do globo.

Apesar da insistência do então presidente americano, Woodrow Wilson, em estabelecer uma paz permanente e não tão humilhante para a Alemanha, o Tratado de Versalhes de 1919 impôs condições duríssimas aos teutônicos, o que manteve as tensões latentes para engendrar, pouco tempo depois, o macabro fenômeno do nazismo e o terror da guerra que se seguiu.


Prenúncio do terror: um exultante Hitler saúda o anúncio do início da guerra em Munique em 1914

De certa maneira, as duas Grandes Guerras podem ser consideradas como uma só, com um interstício de 20 anos, visto que tudo o que não foi resolvido na Primeira resultou na Segunda, em que a violência ganhou contornos exponencialmente muito piores.

Hoje, 28 de julho de 2014, é - portanto - uma data que merece ser lembrada porque o fantasma de um novo conflito de escala mundial, apesar de arrefecido por iniciativas de relativo sucesso como a União Europeia e a ONU, continua batendo à porta, e - se vier a acontecer - poderá ser o último que o planeta verá.



domingo, 27 de julho de 2014

Cardeal ganês diz que papa critica o utilitarismo e não o capitalismo


Entrevista publicada no Zenit:

"O Papa critica o utilitarismo, não o capitalismo"

Cardeal Turkson fala sobre doações governamentais, a reforma da Cúria, a possível viagem do Papa à África e a opinião do Papa sobre a economia

Deborah Castellano Lubov

O cardeal ganês Peter Turkson disse que a visita do Papa a África não é totalmente absurda. Em uma longa entrevista concedida a Zenit, o presidente do Pontifício Conselho Justiça e Paz discute se o departamento será reformado e se o Papa vai visitar a África, e esclarece as críticas do Papa contra o "sistema". O cardeal também explica o papel do seu Conselho no incentivo a empreendimentos comerciais nos países em desenvolvimento e expressa sua opinião sobre o apoio financeiro dos governos na cooperação para o desenvolvimento.

Antes de ser entrevistado por ZENIT, o cardeal apresentou um seminário no Vaticano sobre Um bem comum global: rumo a uma economia mais inclusiva, organizado pelo Pontifício Conselho Justiça e Paz, em colaboração com a Secretaria de Estado, realizado nos dias 11 e 12 de julho.

Zenit: Quando o Papa critica o "sistema" está se referindo ao capitalismo? Ou quer dizer um sistema desprovido de valores e ética cristãos?

Cardeal Turkson: O Papa realmente não quer criticar o capitalismo; prova disso é a sua Exortação Apostólica Evangelii Gaudium. Na mesma exortação ele deixa claro [que não está escrevendo] uma doutrina social como a Caritas in Veritate, Centesimus Annus, ou a Populorum Progressio. O Papa deixa claro que este não é seu objetivo.

Acabamos de ter um Sínodo sobre a Nova Evangelização, e depois de cada sínodo, o papa normalmente escreve uma exortação. Por exemplo, o sínodo da evangelização traz a alegria de Cristo às pessoas. O Papa explica que esta alegria não é encontrada em qualquer lugar e que existem problemas e obstáculos na experiência desta alegria. O Papa identifica alguns dos obstáculos à pregação do Evangelho e expõe a alegria como uma condição necessária para os crentes em sua experiência religiosa.

Então, não é e não pode ser um ataque ao capitalismo, porque essa palavra não aparece nenhuma vez neste documento. Embora os economistas digam que o mercado é o agente do capitalismo, o Papa, no entanto, fala estritamente do mercado. O Papa não fala de um mercado que deve acrescentar os valores cristãos em sua ideologia; mas refere-se ao sentido antropológico, ou seja, que o ser humano foi criado para ser o centro da Criação. Quando algo substitui ou nos leva para longe do centro, então, significa que nós nos tornamos escravos do outro. E se, neste caso, é o mercado ou as finanças, então algo está errado. Esta é a questão fundamental do Papa.

A declaração mais forte do Papa é que os mercados devem estar a serviço do ser humano e não vice-versa. Para o Papa, o ser humano não pode ser reduzido a um estado de servidão e não deve ser obrigado a sustentar servilmente as forças de mercado, o que pode levá-lo a centrar-se exclusivamente na produção de mais dinheiro.

Quando isso acontece, o Papa diz que algo não está no caminho certo. O sentido fundamental da antropologia na Criação é que a humanidade está no centro. É a glória de tudo o que Deus criou. Se esta glória for substituída por outra coisa, significa que esta está fadada ao outro. Muitos pobres, abandonados, excluídos são substituídos do centro de Deus pelas forças do mercado. O Papa defende aqueles que se tornam vítimas de um sistema econômico (qualquer quer que seja), que perdem o seu papel central.

Várias pessoas concordam com esta tese. Por exemplo, muitos de vocês recordam que no ano passado Obama citou a Evangelii Gaudium em seu discurso no Congresso. Em 2009, no discurso de posse, o presidente Obama fez comentários semelhantes a estes, ou seja, a necessidade de um mercado que serve o povo, e suas últimas palavras para o Congresso foram que se os Estados Unidos, com todos os seus recursos, fosse incapaz de ajudar os pobres a sair dessa situação, isso significaria que o Estado estaria falhando com muitas pessoas. Portanto, trata-se de um conceito que não é compartilhado apenas pelo Papa, apesar do Papa ter sido capaz de expressá-lo de tal forma que todos agora estão começando a pensar sobre isso.

Em nosso seminário sobre "bem comum global" e uma sociedade mais inclusiva, discutimos a forma de evitar uma visão redutiva da pessoa humana, ou seja, quando a pessoa humana é reduzida no caráter, no estado, e na natureza, e de outras formas, a qualquer coisa.



Zenit: Qual é o papel do Conselho na promoção de iniciativas empresariais nos países em desenvolvimento?

Cardeal Turkson: É um trabalho difícil. Este é o segundo seminário sobre economia que fizemos este ano. O primeiro aconteceu em meados de junho junto com o CRS (Catholic Relief Services) nos Estados Unidos e com a Mendoza Business School na Universidade de Notre Dame, e foi sobre o impacto do investimento.

O impacto do investimento é uma forma mais ampla dos serviços financeiros que foi introduzida para mais e mais pessoas. No contexto da Igreja esta prática ocorre quando o capital de congregações religiosas ou fundos de pensão é utilizado para algo social que produza um bom resultado para a humanidade concretamente e, ao mesmo tempo, um retorno econômico justo. Portanto, não é dinheiro perdido ou subsidiado. Pelo contrário, é o dinheiro utilizado como capital de forma equilibrada para alcançar ambos os benefícios econômicos e sociais, de modo a suprir as necessidades da nossa população, mas com a possibilidade de um lucro com o qual serão realizados novos investimentos.

Após o seminário, a nossa intenção é fornecer ideias para as comunidades eclesiais locais. Nossa sugestão é que com tudo que está acontecendo no mundo hoje, as formas mais tradicionais que as Igrejas locais se esforçam para financiar seus projetos fiquem cada vez mais no passado. Neste sentido, quero dizer que o pedido de ajuda financeira a governos ou a outras partes da Igreja está diminuindo rapidamente. Vários bispos realizam viagens e fazem apelos de missão nos Estados Unidos ou para algumas paróquias da Europa, e, após receberem, eles querem começar a trabalhar da melhor maneira. Muitas vezes, porém, com esse dinheiro não se torna capital de risco (venture capital). Isso significa que temos que mudar a forma de apoiar e manter viva as nossas Igrejas locais. Precisamos pensar em como reconsiderar o capital disponível para investir e gastar parte da renda gerada a partir dele para apoiar as igrejas locais, em direção a certa autossuficiência. Se este for o caso, o que as igrejas vão precisar é um acesso fácil e conveniente ao capital.

Queremos convidar os presidentes de empresas e administradores financeiros , e descobrir como podemos contribuir para tornar essa ideia uma realidade. Eu conversei com alguns dos delegados do Banco Mundial para delinear as ideias que podem ajudar, mesmo que através das igrejas locais, já estejamos explorando todas as possibilidades.

Zenit: O Papa Francisco planeja visitar a África?

Cardeal Turkson: Como qualquer Papa gostaria de visitar cada parte da Igreja. Mas até agora não há nenhum anúncio sobre a África. O Papa tem agendada uma visita à Coreia do Sul e Filipinas. Quem sabe o próximo país será a África. Só porque não foi mencionado, não significa que não vai acontecer.

Zenit: Agora, sobre a reforma da Cúria Romana. O seu Dicastério mudará?

Cardeal Turkson: A história mostra que o nosso Dicastério passou por alguns processos de mudança. Imediatamente após o Concílio Vaticano II foi instituído uma comissão simples, e também uma comissão de leigos, de modo que, o presidente dos leigos poderia cuidar do nosso escritório. Foi assim no pontificado de Paulo VI. Com João Paulo II a comissão evoluiu e tornou-se um conselho. E a partir de então, o conselho permaneceu por conta própria, com o seu próprio presidente e os requisitos típicos de um conselho.

Ao longo da história houve momentos em que o presidente do Pontifício Conselho Justiça e Paz cuidava dos migrantes. O Cardeal Etchegaray foi presidente do Pontifício Conselho Justiça e Paz e também do Cor Unum. O Cardeal Martino, meu antecessor, em um determinado momento era o presidente de ambos, dos migrantes e da justiça e paz. Atualmente, cada setor tem seu próprio presidente.

Tudo isso tem a ver com o documento que rege as operações dos escritórios, conselhos e congregações da Cúria Romana. No caso de João Paulo II, agora São João Paulo II, foi o Pastor Bonus. O Pastor Bonus é o documento que se tornou a constituição apostólica que tem dirigido a existência desses escritórios. Se o papa Francis quiser rever o documento e reconfigurar a Cúria ou encontrar uma nova maneira de realizar, ele tem a liberdade de fazê-lo.

Se tal Constituição Apostólica for alterada de alguma forma, então, a estrutura de certos escritórios ou conselhos da Cúria podem ser mudados. Depende de como o papa Francisco, ou qualquer futuro Papa queira configurar a forma com que governa a Igreja.

Zenit: Qual é o seu ponto de vista sobre as doações governamentais nos países em desenvolvimento? Funcionam ou deveriam sofrer alguma mudança?

Cardeal Turkson: A ajuda do governo pode ser visto de duas maneiras. Em primeiro lugar, a ajuda do governo poderia ser ajuda entre governos ou poderia ser uma ajuda de outro lugar para os governos. Para algumas organizações internacionais, os governos locais e nacionais são seus parceiros naturais.

Se estivermos falando sobre o Banco Mundial ou o Fundo Monetário Internacional, ou outros, todos têm a ver com os governos. Raramente vemos a interação com uma instituição que não seja governamental. Esta é uma de várias situações que acontecem, e quando este for o caso, podemos "fazer esse tipo de coisa com uma mão?" "Depende" parece ser a resposta. A ajuda não vem apenas do Banco Mundial ou o Fundo Monetário Internacional, mas também do governo britânico, através do DFID, do Congresso dos Estados Unidos através da USAID, e o Canadá também tem seus próprios programas de ajuda. Portanto, há muitas agências e diferentes tipos de ajuda externa, que pode ajudar em várias partes do mundo. Sendo ganês, eu sei que em certo ponto o Ministro da Educação de Gana pediu a entidades estrangeiras para financiar o orçamento e o processo educativo no país, o que eu acho triste. 'Triste' se, como um governo, você precisa de alguém para ser capaz de entender como se forma e como se educar a sua população.

O sucesso destes programas de ajuda depende das condições que acompanham esses programas ou das subvenções provenientes destas agências. Às vezes, os doadores, ou aqueles que fazem a concessão, parecem mostrar suas garras. Por exemplo, se eu não estou satisfeito com as políticas locais ou nacionais, mostram as garras e querem tomar uma posição - como parte das condições de financiamento do programa.

Como agora, Uganda, por causa de sua posição sobre a legislação ‘anti-gay’. O apoio financeiro de países estrangeiros pode ser reduzido ou retirado, embora sejam fundos para programas de saúde. Então, quando esses programas não são acompanhados de neutralidade, mas estão vinculados às condições, perdem o objetivo de servir para o bem comum. Com relação à pergunta, "o apoio ajuda os governos locais? O apoio pode ser útil, no sentido de possibilitar a liberdade de agir de alguns governos locais. Pode ser útil se os programas assegurarem a transparência, regras anti corrupção e os fundos não forem dispersos para outras áreas. Pode ser útil se a contribuição econômica, conhecida como "ajuda", não for dissipada no movimento de uma conta bancária para o país beneficiário.

(Trad.:MEM)



sábado, 26 de julho de 2014

Casal gay se unirá em cerimônia coletiva num Centro de Tradições Gaúchas do RS

Humoristas de outros Estados já se mobilizam e a gauchada tá em polvorosa, segundo noticia o Terra:

RS: casamento coletivo terá casal homoafetivo em CTG

Daniel Favero

Um casamento coletivo que contará com a participação de um casal homoafetivo em uma cerimônia a ser realizada dentro de um Centro de Tradições Gaúchas (CTG), na cidade de Santana do Livramento, a 493 quilômetros de Porto Alegre, tem provocado polêmica em meio aos integrantes do Movimento de Tradições Gaúchas (MTG).

O casamento que contará com 30 casais ao todo será realizado no dia 13 de setembro, segundo confirmou, nesta sexta-feira, a Justiça do Rio Grande do Sul.

Em texto divulgado na página do Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG), o presidente da entidade, Manoelito Savariz, diz que o “casamento entre pessoas do mesmo sexo virou moda e parece a coisa mais natural. Se alguém expressa contrariedade com todas essas coisas, é imediatamente taxado de retrógrado, preconceituoso, estúpido, e assim vai. Parece que o correto é aceitar tudo e de qualquer jeito”, escreveu, para em seguida completar que ficam meio a este turbilhão a “maioria de tradicionalistas que entendem ser errado alterar tão rapidamente e tão profundamente os conceitos tradicionais, como família, casamento e respeito”.

Savariz afirma ainda que quando surgiu a polêmica em torno de um casamento homoafetivo dentro de um CTG que a cerimônia ainda não estava marcada, que não tratava-se de um CTG filiado ao MTG e que não era um assunto de interesse cultural.

“Então, por que a mídia colocou o MTG e seus dirigentes no centro da polêmica? Por que tanto interesse em saber ou descobrir o que pensam os tradicionalistas a respeito do casamento gay? Qual o interesse em caracterizar que a novidade e o ineditismo estão no fato do tal casamento ser realizado no interior de um CTG?”, inadagou.

Para alguns tradicionalistas, segundo Savariz, trata-se de um movimento orquestrado de desmoralização do tradicionalismo, ou oportunismo. “Há ainda os que veem nisso tudo um sinal de que o 'mundo está perdido'”.

Ele afirma que não pretende encontrar respostas para seus questionamentos, mas orienta os tradicionalistas a se absterem das críticas, mas completa que “no interior dos galpões e nos ambientes em que se realizam as atividades tradicionalistas, cada um procure se portar segundo o seu gênero, ou seja, os homens tenham posturas masculinas e as mulheres posturas do sexo feminino, tudo segundo a tradição”.

Já a cerimônia agendada para setembro é promovida pela Vara da Família e pelo Cartório de Registro Civil de Santana do Livramento. Segundo o judiciário gaúcho, os casamentos coletivos são realizados para garantir maior proteção à família.



sexta-feira, 25 de julho de 2014

Rapaz se casa 3 dias antes de morrer de câncer em hospital de Botucatu (SP)

Impossível não se emocionar com essa linda história de amor contada pelo G1 - TV TEM região de Bauru e Marília, com vídeo mais abaixo:

Noivo com câncer realiza sonho e se casa três dias antes de morrer

Cerimônia foi em hospital de Botucatu (SP).
Doença surgiu um ano depois que os dois começaram a namorar.

Buquê, alianças, noivos, família, amigos e amor. O casamento de Michele Alves de Oliveira e João Marcos da Silva teve todos os ingredientes de uma cerimônia tradicional, não fosse pelo lugar onde aconteceu: dentro de um hospital de Botucatu (SP). A união simbólica foi o último desejo do noivo, que morreu três dias depois, vítima de câncer em múltiplos órgãos.

O noivo descobriu há quatro anos que tinha câncer no abdômen. Após a primeira cirurgia para tentar conter o avanço do tumor, ele pediu Michele em casamento. No entanto, a doença continuou evoluindo e os planos do casal foram adiados até o dia 30 de junho, quando a união aconteceu, com direito a vestido branco, música e muita emoção.

No corredor, a noiva usava um vestido branco curto e foi guiada até o altar improvisado onde o noivo a esperava. Um painel foi fechado no corredor para dar privacidade à cerimônia. João estava internado no hospital havia três semanas quando ficou sabendo pelos médicos que teria só mais alguns dias de vida. Ele resolveu, então, realizar o sonho de se casar com Michele, com quem namorava há cinco anos.

O jovem passou por vários tratamentos e internações desde que descobriu a doença. Na última passagem pelo hospital, em junho, os médicos avisaram que ele precisaria passar por uma nova cirurgia, que João não aceitou. “A equipe médica alertou que ele não teria muito tempo de vida, mas, quando conversamos, ele me disse que só tinha um sonho para realizar antes de morrer, que era se casar comigo", conta Michele.

A tão esperada união teve ajuda da equipe médica. “Ela saiu triste da sala perguntando se seria possível casar dentro do hospital. Sabíamos que não era fácil, nem comum, mas agimos com o coração”, lembra a técnica em enfermagem Kelly Cristina da Silva, de 23 anos. Na sequência, os funcionários fizeram uma "vaquinha", organizaram a festa que ficou pronta em dois dias, com direito a bolo e salgadinhos, além da presença de um pastor.


Cerimônia

Apesar de não ter tido tempo de planejar o casamento como a maioria das noivas sonha, Michele conta que o resultado no hospital foi marcante. “Foi tudo muito delicado, simples e bonito. Ele dizia que estava muito feliz e que eu estava linda”, lembra emocionada a noiva que cantava e segurava as lágrimas durante a celebração.

Por conhecer o hospital e acompanhar a rotina os pacientes, Kelly lembra que o cuidado e amor que a jovem tinha com o noivo surpreendeu os profissionais. “Ela não saía de lá por nada, ficava até mais que a mãe", afirma a enfermeira, que diz não estar acostumada a ver provas de amor como esta. “Quando uma das duas pessoas está doente, o relacionamento costuma não durar. Não é nem porque não existe amor, mas muitos namoros e casamentos terminam porque aquele companheiro não quer que o outro veja seu sofrimento", afirma.

Convidada 'por acaso'

Entre médicos, enfermeiras, parentes e amigos próximos do casal, uma das pessoas que acompanhava a cerimônia estava lá por um acaso. Uma funcionária administrativa do hospital passava pelo quarto do noivo, quando descobriu o que estava acontecendo e se tornou fotógrafa oficial da cerimônia. “Achei que já tinha visto de tudo dentro de um hospital, e, de repente, vejo essa história bonita de amor acontecer e se realizar. Lindo demais", afirma a funcionária, que prefere não ser identificada.

A "fotógrafa" até postou em uma rede social sobre o quanto estava emocionada em participar daquele momento por acaso. “É impossível descrever a sensação que eu senti e sinto ainda ao pensar em tudo que passei ali naqueles 40 minutos. Deus sabe o quanto eu me segurei para não cair em lágrimas.”



Anos de namoro e dias de casamento

João morreu três dias depois da cerimônia que comoveu o hospital. Para a noiva Michele, o que fica são as lembranças dos bons momentos de anos de namoro e dos poucos dias de casamento. “Nunca o vi reclamando. Ele era divertido, extrovertido, animado, sempre brincalhão e tinha muita fé em Deus. É isso que eu vou guardar do meu noivo.”

Durante o tempo em que acompanhou João no tratamento, Michele conta ainda que muitas pessoas diziam que ela mantinha o relacionamento com ele por pena. No entanto, ela faz questão de afirmar que permaneceu com o namorado/noivo por amor e companheirismo.

"Mesmo enfrentando tudo isso, ele conseguia me fazer sentir a mulher mais feliz do mundo", comenta. Apesar do triste fim da história de amor, a noiva faz questão de contar a sua trajetória para inspirar outras pessoas.

“Não podemos desistir nunca. O João falava para ter fé até o último dia e nada de se abater ou desanimar diante de um sonho. Claro que eu queria que ele estivesse aqui e a gente estivesse comemorando a cura dele, mas acho que o casamento foi um conforto em meio à dor”, conclui Michele.


Há 2 vídeos que podem ser vistos com áudio original na página do G1.



quinta-feira, 24 de julho de 2014

Professor muçulmano é morto por defender cristãos no Iraque


Felizmente ainda há quem se levante contra toda a violência que se perpetra em nome da religião contra seus amigos e irmãos, mesmo que tenha que pagar com a própria vida, como fez esse professor muçulmano do Iraque.

A matéria é do IHU:

Muçulmano sacrificou-se pelos cristãos de Mosul

Não aceitou permanecer em silêncio diante da violência contra os cristãos de Mosul, obrigados a decidir entre a conversão ao Islã, o pagamento da “jizya” (imposto islâmico para os não muçulmanos) ou a fuga. Assim, o professor Mahmoud Al’Asali, que ensina leis no Departamento de Pedagogia da Universidade de Mosul, teve a coragem de denunciar abertamente esta forma de brutal limitação que, na sua opinião, vai contra os preceitos do Islã. Um gesto que pagou com a vida: os milicianos do Isil o assassinaram neste domingo em Mosul.

A reportagem é de Giorgio Bernardelli e publicada no sítio Vatican Insider, 21-07-2014. A tradução é de André Langer.

A notícia foi dada pelo sítio caldeu Ankawa.com, um dos mais ágeis e atualizados sobre a calvário vivido pelos cristãos no norte do Iraque. Entre todos os fatos dramáticos destas horas, os que se ocupam do sítio quiseram que não se esquecesse este grande gesto de coragem por parte de um muçulmano. O professor Al’Asali sabia que estava se arriscando muito: em Mosul, todos sabem que em Raqqa, a cidade síria governada há um ano pelo Estado Islâmico do Iraque e do Levante (Isil), são muitíssimos os ativistas que lutam pelos direitos humanos que pagaram com suas vidas por se oporem à intolerância do Isil.

No entanto, Al’Asali não podia permanecer em silêncio. Como muitos outros muçulmanos, que no domingo, em Bagdá, lançaram uma campanha “Eu sou iraquiano, eu sou cristão”, em resposta aos “N” de “Nazarenos” marcados nas casas dos cristãos de Mosul. Alguns deles se reuniram fora da Igreja caldeia de São Jorge com um cartaz em que se podia ler a referida frase. Depois publicaram a foto no Facebook.

Entretanto, estes gestos de valor são sinais que não freiam a loucura dos fundamentalistas do Estado Islâmico. Seguindo com seu projeto de limpeza étnica, os integrantes do Isil publicaram nesta segunda-feira as tarifas da “jizya”, o imposto islâmico “de proteção” que deverão pagar todos os que não são muçulmanos que queiram permanecer ou voltar para Mosul. O número indicado é de 450 dólares por pessoa/mês: uma soma astronômica para os que vivem no norte do Iraque.

Na segunda-feira, chegou também a notícia de outro lugar cristão cheio de história no norte do Iraque e que caiu nas mãos do Estado Islâmico: trata-se do mosteiro sírio-católico de Mar Benham, muito próximo de Qaraqosh, a cidade cristã da planície de Nínive, para onde fugiu a maior parte dos cristãos. Em Mar Benham, a presença monástica começou no século IV. “Obrigaram os três monges e algumas famílias que vivem no mosteiro a abandoná-lo e deixar-lhes as chaves”, contou à agência Fides o bispo sírio-católico de Mosul, Yohanna Petros Moshe. O mosteiro, indicou o sítio Bagdadhope, havia sido reformado em 1986 e converteu-se, a partir de então, em meta de peregrinação para os cristãos e também para alguns muçulmanos.



LinkWithin

Related Posts with Thumbnails