23/03/2007
Olá para todos, eu sou Pedro, o mais novo desempregado. Vão ouvir falar de mim, principalmente se você faz parte de algum departamento de recursos humanos. É por isto que eu fiquei alguns dias sem atualizar meu diário, pois eu ainda estava reunindo coragem para fazer o que tinha que fazer. Ah, eu também estava curtindo minhas férias forçadas, já que agora vou demorar pelo menos mais 2 anos para ter umas férias remuneradas. Eu gostava de meu último emprego, sério mesmo. Mas infelizmente alguns donos de empresa acham que podem viajar a vontade, gastando seu rico dinheirinho, que não haverá problema algum. No fim das contas, quem paga o pato somos nós, os infelizes empregados.
É incrível como os chefes se dão algumas liberdades que os míseros mortais não podem. Meu último chefe podia gritar em qualquer volume. E isto era engraçado, por que a gente acompanhava em primeira mão as fases da empresa.
No início era "Eu te mandei fazer isto?", ou "Eu não quero saber de problemas! Resolva!", depois foi passando para o "Nós podemos conversar sobre isto melhor", "Eu sei que seu salário atrasou este mês, e eu fico pessoalmente perturbado com isto". Alguns dias depois, a coisa fica mais interessante: "Olha, estou com várias propostas nas minhas mãos, esperando apenas a aprovação dos clientes. Se eu vender tudo isto, nós já temos 120.000 R$ garantidos", e a melhor de todas: "Buááááá, eu apliquei todo meu dinheiro nesta empresa para que vocês pudessem trabalhar aqui com todas as condições possíveis, Buááááá".
Ultimamente o chefe estava ficando mais religioso. Era comum escutar às vezes um "Aleluia". Só que ele era a pessoa religiosa mais estranha que eu já vi. Era católico, que agia como evangélico gritando Aleluia, e vivia com idéias espíritas. Aliás, isto envolveu um evento estranho naquela empresa.
Certo dia, fomos chamados para o refeitório, por que um senhor espírita iria fazer uma apresentação. Nos disseram que ele tinha vindo para "trazer luz" para a empresa. Apesar de estar mesmo difícil para a empresa pagar suas contas de energia, achei que a expressão era engraçada. Pessoalmente nunca tinha ouvido da boca de um espírita tal expressão, achei que era algo mais relacionado com misticismo oriental.
Fomos para o pátio. O senhor se dizia médium, e ele teria psicografado as letras das músicas que ele iria tocar. Eu sempre achei interessante como que os médiuns espíritas pareciam gostar deste papel de marionetes. Você nunca encontra uma estória ou uma letra de música feita pelo próprio médium, elas são sempre feitas por espíritos. Parece que você só fica culto depois que morre.Não era o caso daquele espírito. Acho que pegamos um espírito no início de sua evolução musical. O médium também não ajudava muito. E aquela platéia toda sentada diante dele, mantendo o silêncio por respeito, era uma visão cômica até, quando me lembro hoje disto. Talvez os 2 espíritas que trabalhavam conosco eram os únicos realmente empolgados com a apresentação.
O senhor então tentou cantar umas 3 músicas que o espírito lhe enviou, depois ele partiu para uma espécie de palestra de apologia ao espiritismo. Imediatamente me veio à mente alguns apologistas espíritas que me deparei por aí. Por definição, o apologista espírita deixa de ser espírita para ser apologista. Não espere conversar com um apologista espírita em tom respeitoso, a primeira coisa que ele perde é o respeito. Espere uma conversa respeitosa com espíritas comuns, não com os apologistas. Outra coisa a se lembrar é que, algumas idéias espíritas básicas, como a reencarnação, podem ser a coisa mais simples de se entender. No momento que você disser que discorda dela, e começar a apontar falhas, a resposta padrão é que você não conhece a doutrina. Dependendo das falhas que você apontar, eles podem apontar o que você errou, mas geralmente vão dizer que você não conhece a literatura deles, e gentilmente (desde que não sejam apologistas) vão te encaminhar para alguns livros deles, o que é uma ótima estratégia de doutrinação. Por fim, por mais que digam que não defendem dogmas, não acreditem neles. Por isto, não falei nada naquela palestra. Eu já estaria errado mesmo. Talvez daqui a 100 vidas eu entenderia tudo aquilo.
Ele contou seu histórico de questionar por que alguns nascem doentes, por exemplo. Disse que como obteve uma resposta satisfatória dos espíritas, se tornou um. Um médico poderia lhe dar uma explicação melhor, na minha opinião. Agora ele acredita que o sofrimento na verdade não é um sofrimento, é uma coisa boa, que ajuda as pessoas a evoluírem. Tudo é bom! Então dando todas estas voltas, eles chegaram ao mesmo ponto que eu: que tanto faz, não existe nada bom ou ruim. Só não se deram conta disto. Ironia do destino.A palestra começou a ficar interessante quando o senhor começou a ver espíritos. Para nossa felicidade eles estavam um pouco tímidos, só apareceram para nosso ilustre visitante. Foi então que eu me perguntei se o ilustre John Nash de certo filme que vi não teria sido também um médium. Tudo é possível.
Por fim, o senhor foi embora, e todos nós pudemos voltar ao nosso feliz trabalho injusto. A empresa não sobreviveu muito tempo depois desta visita, o que não deixou de ser curioso.
Eu sou Pedro. Preciso de emprego, então se ouvir falar de mim, fale de mim para quem possa me oferecer um...
sexta-feira, 4 de abril de 2008
Diário de um lunático - 4
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Um comentário:
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Oie sr Pedro quanto tempo essa postagem hein? Descobri seu blog perambulando pelas curvas do google, e eis a curiosidade: já está empregado? Certamente sim, mande-me notícias rsrsrs
ResponderExcluirLegal o seu blog e mais legal ainda é que depois de dez anos dessa postagem ele ainda é atualizado ...