quinta-feira, 28 de julho de 2011

Um terrorista entre Deus e o diabo (ou nenhum dos dois)

No seu manifesto de 1.500 páginas, amplamente divulgado na internet, o terrorista norueguês Anders Behring Breivik, apresentado como "fundamentalista cristão" pela mídia, se revela mais um "darwinista social" no estilo hitleriano do termo, como já tivemos oportunidade de analisar na crítica do filme "A Queda", publicada aqui. A "seleção natural da humanidade" se daria pela força de líderes especiais (como ele) que não mediriam as consequências para levar a batalha adiante e eliminar os mais fracos, naquilo que Breivik chama - curiosamente - de "darwinismo nacional" (ou "nacionalista"). O fato é que o próprio terrorista se autointitula "100% cristão", além de enaltecer sua ascendência viking, traçando as origens nórdicas do seu sobrenome Behring, que significaria "aquele que é protegido pelo urso". Mesmo se dizendo cristão e protestante, Breivik propõe que as igrejas protestantes sejam absorvidas pela católica para que, juntos, possam se contrapor à "ameaça islâmica" que paira sobre a Europa. Só nessas poucas linhas, fica claro o seu narcisismo, ao se julgar um "iluminado" que traça planos mirabolantes para comandar a cristandade no seu combate final contra os pagãos.

A certa altura do seu perturbado manifesto, Breivik justifica seu apreço por Darwin afirmando que “é essencial que a ciência tenha sempre uma prioridade incontestável sobre os ensinamentos bíblicos. A Europa sempre foi o berço da ciência, e deve sempre continuar a ser assim. Quanto a minha relação pessoal com Deus, acho que não sou um homem religioso. Sou em primeiro lugar um homem de lógica. No entanto eu apóio uma Europa cristã monocultural”. Mais adiante, sempre dando ênfase ao verbo conjugado na primeira pessoa, ele prossegue dizendo: "eu creio que a futura liderança de uma hegemonia cultural conservadora na Europa vai assegurar que a atual liderança da Igreja seja substituída e o sistema seja reformado de alguma maneira. Nós precisamos ter uma liderança da Igreja que dê suporte a uma Cruzada com a intenção de liberar os Bálcãs, a Anatólia [região onde está hoje a Turquia], com a criação de três Estados cristãos no Oriente Médio. Esforços devem ser coordenados para facilitar a descontrução da Igreja Protestante, cujos membros deveriam se reconverter ao Catolicismo. A Igreja Protestante teve um papel importante na história, mas os seus objetivos originais foram cumpridos e contribuíram para também reformar a Igreja Católica. A Europa deveria ter uma única liderança da Igreja através de um papa justo e não-suicida [seja lá o que isto signifique], que queira lutar pela segurança dos seus súditos, em especial contra as atrocidades islâmicas".

Trata-se, portanto, de uma mente fragmentada, mas extremamente narcisita, a ponto de não só apontar os rumos da cristandade, como tomar nas próprias mãos (e literalmente executar) a missão autoincumbida de salvá-la do perigo muçulmano. Se, por um lado, tem um discurso religioso, messiânico e "autoglorificador", trata as igrejas apenas como massa de manobra para atingir o seu objetivo (no que não difere muito de tantos líderes políticos atuais e antigos, inclusive o próprio Hitler). Em outros momentos, como quando elogia Darwin e a supremacia da ciência sobre a fé, o seu discurso não difere do que diria Richard Dawkins a um público ateu, por exemplo. Há ainda outra vertente que parece ser a preferida na sua visão de mundo: o cristianismo é uma questão cultural europeia, já que "não é necessário que você tenha um relacionamento pessoal com Deus ou Jesus para lutar por nossa herança cultural cristã e nosso estilo de vida europeu". Uma coisa é certa: crendo ou descrendo, para o bem ou para o mal, Breivik gosta muito de religião. Delírios provenientes de uma mente dilacerada (e que dilacera) em terras boreais.

Fonte: WorldNetDaily

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