quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Justiça social no Velho Testamento - 9


Parte 9 - Justiça e compaixão

por Richard Foster

Mas mais surpreendente que tudo é a maneira como os escritores bíblicos unem a justiça de mishpat e a compaixão de hesed. Dar às pessoas o que lhes é devido é uma coisa; a qualidade de espírito através da qual nos relacionamos com elas é bem outra. Zacarias recebeu esta poderosa palavra do Senhor: “Assim fala o Senhor dos Exércitos: Executai juízo verdadeiro [mishpat], mostrai bondade e misericórdia [hesed] cada um a seu irmão; não oprimais a viúva, nem o órfão, nem o estrangeiro, nem o pobre, nem intente cada um em seu coração o mal contra o seu próximo” (Zacarias 7:9-10). Em seu chamado ao arrependimento, Oséias implora ternamente ao povo: “converte-te a teu Deus, guarda o amor [hesed] e o juízo [mishpat], e no teu Deus espera sempre” (Os 12:6). E no que deve ser considerado um dos resumos mais perceptivos da nossa tarefa em todo o Antigo Testamento, temos de novo a exigência exterior de justiça combinada com o espírito interior de compaixão:

Ele te declarou, ó homem, o que é bom;
E que é o que o Senhor pede de ti,
Senão que pratiques a justiça [mishpat] e ames a misericórdia [hesed], e
Andes humildemente com o teu Deus?
(Miqueias 6:8)

Compaixão e justiça combinada nos chamam à simplicidade de vida.

(FOSTER, Richard. Celebração da Simplicidade. Campinas: United Press, 1999, pp. 42-43)

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

O curral eleitoral evangélico


Não há “espiritualidade” inventada que resista a uma eleição. Os recentes acontecimentos envolvendo o meio evangélico brasileiro - em meio ao bombardeio da campanha eleitoral - revelam a face descarada (com o perdão da tripla redundância) da ideologia barata que tomou o lugar da velha e boa teologia em muitas mentes e igrejas do país. 

E, de novo, surfando na crista da onda do oportunismo está ele - Silas Malafaia -, que escolhemos como exemplo clássico das alianças de ocasião que movem o “mundinho” evangélico brasileiro. 

Até anteontem, ainda que de maneira dissimulada (não tanto no final), apoiava a candidata do PV, Marina Silva. Entretanto, algo muito estranho ocorreu para que ontem Malafaia pulasse a cerca que protegia o aprisco de Marina, para atirar-se nos braços de José Serra, do PSDB. 

Talvez o gramado tucano seja mais verde ainda.

Os argumentos (frágeis, como papéis serrilhados) de Malafaia dizem respeito ao aborto e à descriminalização da maconha, para os quais Marina teria proposto um plebiscito. 

Ora, os planos de Marina são conhecidos há muito tempo, mas só anteontem Malafaia se deu conta disso e chamou a irmã de “pior que ímpio” e “dissimulada” por “ficar em cima do muro”, já que “o povo brasileiro não tem todas as informações necessárias para decidir esta questão de maneira isenta. Temos toda a mídia a favor dessa nojeira do aborto”. 

O problema de Malafaia é que, no Rio, ele apoia Marcelo Crivella para senador, o candidato de Edir Macedo e da igreja universal, que defendem abertamente o aborto. Logo, se Dunga fosse o técnico das eleições, ele certamente perguntaria ao Malafaia: “que coerência é esta, merrrrmão?”

Malafaia mal consegue disfarçar seu desejo mórbido e totalitário de impor ao país uma teocracia não cristã, mas “evangélica”, no pior sentido ideológico do termo. Ele omite – deliberadamente – que, ainda que fosse realizado um plebiscito sobre essas questões polêmicas, ele teria que ser determinada pelo Congresso, e não pelo poder executivo. Este, obviamente, tem um poder político enorme, mas não pode – por si só – impor qualquer lei ao país. Ainda que possa ser objetivamente questionada quanto às suas intenções, se tem alguém nessa história que não foi “dissimulada” foi Marina. O mesmo não se pode dizer do popstar das madrugadas evangélicas da TV brasileira.


A súbita conversão de Malafaia ao tucanato é só mais um episódio tragicômico da ópera bufa em que se transformou o evangelicalismo brasileiro, em sua ânsia por poder. 

Líderes e crentes se movem de um lado para o outro, desfilando seus preconceitos e arrotando suas mentiras, tentando influenciar seus rebanhos a votarem nos seus candidatos, nem que para isso necessitem elaborar rasas teorias estruturantes da suposta “espiritualidade” de suas convicções, não raras vezes apelando a conspirações imaginárias que estariam tentando impedir o crescimento do evangelho no país, quando o que, na verdade, já o teria matado (não fosse a misericórdia divina), é a desfaçatez e o mundanismo de muitos líderes evangélicos e suas alianças de ocasião. 

Nos raros momentos de lucidez, muitos deles atacam esta – lamentavelmente – vicejante mercantilização da igreja no país, mas quando precisam de parceiros para defenderem seus candidatos, não têm qualquer constrangimento em se aliarem ao capeta para elegê-los, nem que precisem recorrer às desculpas mais esfarrapadas para desviar os olhos do rebanho quanto à sua sem-vergonhice e aos seus fingidos interesses religiosos.

Infelizmente, a igreja evangélica brasileira se transformou num imenso curral eleitoral, onde o gado é tangido conforme os inconfessáveis interesses imediatos de cada “pastor”.

 Argumentos são “espiritualizados” ao gosto do freguês, mas não conseguem esconder os lobos que cercam as ovelhas no pasto, se bem que muitas dessas ovelhas parecem estar com as orelhas – estranhamente – muito crescidas para um ovino.

Justiça social no Velho Testamento - 8

Parte 8 - O lugar da compaixão

por Richard Foster

O tema da compaixão está entremeado por todo o Antigo Testamento e pode ser visto de maneira vívida na palavra teologicamente rica hesed (חסד). Hesed é tão carregada de significado que todos os tradutores se debatem para encontrar o equivalente em outras línguas, muitas vezes traduzida por “benignidade” ou “misericórdia”. Mas hesed traz também em si a ideia de capacidade de suportar ou fidelidade. Ela é mais frequentemente usada em referência à compaixão inabalável de Deus por seu povo. Sua maravilhosa hesed é de eternidade a eternidade (Salmo 103:17). Ela dura para sempre (Salmo 106:1). Foi esta qualidade de misericórdia sem limites que Deus revelou a Moisés quando este havia pedido para ver a glória de Deus: “E, passando o Senhor por diante dele, clamou: Senhor, Senhor Deus compassivo, clemente e longânimo, e grande em misericórdia [hesed] e fidelidade; que guarda a misericórdia [hesed] em mil gerações, que perdoa a iniquidade, a transgressão e o pecado” (Êxodo 34:6-7).

Contudo (e aqui está o grande desafio), esse amor da aliança, essa misericórdia duradoura, tão fundamental ao caráter de Deus, deve ser também refletida em nossas vidas. Deus declara através de Oséias, o profeta: “Pois misericórdia [hesed] quero, e não sacrifício; e o conhecimento de Deus, mais do que holocaustos” (Os 6:6). E a sabedoria de Provérbios aconselha: “O que segue a justiça e a bondade [hesed] achará a vida, a justiça e a honra” (Pv 21:21).

(FOSTER, Richard. Celebração da Simplicidade. Campinas: United Press, 1999, pp. 41-42)

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Ateus e agnósticos sabem mais de religião do que católicos e evangélicos

O jornal britânico Telegraph noticia uma pesquisa feita nos Estados Unidos pelo Pew Forum on Religion & Public Life, e que apresentou resultados bastante curiosos. Obviamente, muitos dos entrevistados professam uma fé apenas nominal, como revela o fato de que 45% dos católicos não conheciam o dogma da transubstanciação da hóstia e do vinho. Os símbolos do corpo e do sangue de Cristo eles até conseguiam captar, mas isso não os levava a crer que não se trata apenas de símbolo para a Igreja Católica, mas de verdadeira transformação mística ("transubstanciação") no corpo e no sangue reais do Salvador. Já do lado evangélico, mais da metade não reconheceu Martinho Lutero como um dos pioneiros da Reforma Protestante.

A pesquisa foi feita com base num questionário de 32 perguntas, de níveis variados de conhecimento, entre as quais a que indagava o nome do livro sagrado dos muçulmanos e a que pedia o nome do primeiro livro da Bíblia. As questões envolviam, obviamente, uma série de dados não necessariamente familiares a cada um dos grupos pesquisados (o relatório completo - em inglês - está disponível no site do Pew Forum), o que ressalta o conhecimento que os não cristãos têm sobre o cristianismo, já que havia 12 questões sobre Bíblia e cristianismo, 11 sobre as demais religiões e 4 sobre liberdade religiosa, por exemplo. Além disso, levaram em consideração a complicada diversidade étnica norte-americana, e os intrincados meandros denominacionais, o que confunde bastante os dados cruzados da população entrevistada, mas mesmo assim é possível identificar tendências. No total, das 32 questões propostas, a média atingida por cada grupo foi a seguinte:

Ateus/agnósticos - 20,9
Judeus - 20,5
Mórmons - 20,3
Evangélicos fundamentalistas brancos - 17,6
Católicos brancos - 16,8
Protestantes tradicionais brancos - 15,8
Protestantes negros - 13,4
Católicos hispânicos - 11,6

Outro dado interessante é que, quanto maior o nível de educação do entrevistado, maior o conhecimento dele sobre religião. No geral, aqueles que tinham nível superior conseguiram uma média 8 pontos maior do que aqueles que haviam concluído até o 2º grau. Isto explica, de certa forma, que ateus e judeus tenham conseguido as mesmas médias que os cristãos de maior nível intelectual.

Justiça social no Velho Testamento - 7

Parte 7 - O choro de Jeremias

por Richard Foster

Entre os profetas não havia um clamor mais consternado ou sincero do que a voz de Jeremias. Ele foi chamado de o profeta chorão, e com boa razão. Como ele amava a grandiosa cidade de Jerusalém! Ele se afligia com o pecado do seu povo; implorava-lhe que se arrependesse. Quanto sofreu quando suas próprias profecias de destruição se cumpriram. Ele é um vulto triste mas fiel em tempos aflitivos.

Como outros antes dele, Jeremias conclamou o povo a voltar à antiga aliança com sua exigência: “Executai o direito e a justiça, e livrai o oprimido da mão do opressor” (Jr 22:3). Repetidamente ele os chamou a defender “a causa dos órfãos” e a exercer “o juízo e a justiça” (Jr 5:28; 22:15). Mas, com tristeza, teve de admitir: “Mas os teus olhos e o teu coração não atentam senão para a tua ganância, e para derramar o sangue inocente, e para levar a efeito a violência e a extorsão” (Jr 22:17).

A tragédia foi que o Exílio podia ter sido evitado, se o povo tivesse se voltado para Deus em arrependimento: “Se deveras praticardes a justiça, cada um com o seu próximo... eu vos farei habitar neste lugar, na terra que dei a vossos pais, desde os tempos antigos e para sempre” (Jr 7:5-7). Mas o Exílio ocorreu e a tragédia dele ecoa através dos séculos. A injustiça, entrelaçada com a idolatria, forçaram Deus a enviar Israel ao cativeiro.

(FOSTER, Richard. Celebração da Simplicidade. Campinas: United Press, 1999, pp. 35-37)

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Países religiosos são mais pobres

A Folha de S. Paulo traz hoje mais uma dessas pesquisas que vai pra gaveta "Como mentir com estatísticas", que fica ao lado da gaveta "Colonizações fantasiosas", onde estão as pastas "Que bom se o Brasil tivesse sido colonizado pela Inglaterra" (esquecendo-se que podíamos ser agora uma grande Nigéria), e "Quem dera os holandeses não tivessem sido expulsos" (esquecendo-se que hoje podíamos ser outra Indonésia). Por outro lado, aguardamos ansiosamente o que os "apóstolos", "bispos" e "pastores" da teologia da prosperidade dirão a respeito. Na minha opinião, ao pretender justificar o universo com uma única variável, a pesquisa tem uma conclusão tão rasa que dispensa até maiores comentários. Limito-me a dizer que ela desconsidera aquelas que são, para mim, as maiores variáveis na formação da maioria dos países do mundo: a colonização imperialista e as guerras. Por muito pouco, por exemplo, os muçulmanos não dominaram toda a Europa (chegaram à Espanha pelo Oeste e aos Bálcãs pelo Leste) e o império mongol iniciado por Gengis Khan não derrubou as portas de Viena. Por este mero raciocínio histórico, poderíamos hoje ser todos muçulmanos ou mongóis. A contradição fica mais explícita quando se diz que "a pobreza facilita a expansão da religião", omitindo o antecedente fundamental: ¿o que é que gerou a pobreza? Certamente não foi a religião, já que o próprio texto admite a sua expansão como consequente.

Confira a matéria da Folha:

Quanto mais religioso, mais pobre tende a ser um país

Correlação é conclusão de pesquisa feita em 114 nações; EUA são exceção

Para líder ateu, religião rapta bens, dinheiro e mentes que deixam de ser empregados em atividades econômicas

HÉLIO SCHWARTSMAN
ARTICULISTA DA FOLHA

Quanto mais religiosos são os habitantes de um país, mais pobre ele tende a ser. Essa é a conclusão de uma pesquisa Gallup feita em 114 nações e divulgada no último dia 31 que mostra uma correlação forte entre o grau de religiosidade da população e a renda "per capita".

Correlação, vale lembrar, é um conceito traiçoeiro. Quando duas variáveis estão correlacionadas, tanto é possível que qualquer uma delas seja a causa da outra como também que ambas sejam efeitos de outros fatores.

Desde o século 19, a sociologia tem preferido apostar na tese de que a pobreza facilita a expansão da religião. "Em geral, as religiões ajudam seus adeptos a lidar com a pobreza, explicam e justificam sua posição social, oferecem esperança, satisfação emocional e soluções mágicas para enfrentar problemas imediatos do cotidiano", diz Ricardo Mariano, da PUC-RS.

"As religiões de salvação prometem ainda compensações para os sofrimentos e insuficiências desta vida no outro mundo", acrescenta.

O sociólogo, porém, lembra que há outros fatores: "A restrição à liberdade religiosa, ideologias secularistas e o ateísmo estatal dos países socialistas contribuíram para a baixa importância que sua população atribui à religião, como ocorre na Estônia, campeã nesta matéria, e na própria Rússia".

Já na Europa Ocidental, diz Mariano, "modernização, laicização do Estado e relativismo cultural erodiram bastante a religiosidade".

A grande exceção à regra são os EUA. Com uma das maiores rendas "per capita" do planeta, 65% dos norte-americanos atribuem importância à religião em sua vida diária. Tal índice é bem superior à média dos países mais ricos, que é de 47%.

Sem descartar um papel para as explicações sociológicas mais tradicionais, que chama de "fator ópio do povo", Daniel Sottomaior, presidente da Atea (Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos) aventa algumas hipóteses na direção contrária, isto é, de que a religião é causa da pobreza. "Ela promove o fatalismo e o deus-dará", diz.

Em certos lugares, notadamente alguns países islâmicos, ela desestimula a educação e impede a adoção do pensamento científico.

Além disso, afirma Sottomaior, "a religião não apenas não gera valor como sequestra bens, dinheiro e mentes que deixam de ser empregados em atividades econômicas e de desenvolvimento".

RELIGIOSOS

Para religiosos ouvidos pela Folha, é a riqueza que pode reduzir o pendor das pessoas à religiosidade.

Segundo o padre jesuíta Eduardo Henriques, "a abertura a Deus é inversamente proporcional à segurança oferecida pela estabilidade econômico-financeira, com exceções, é claro. Espiritualmente falando, os pobres tornam-se sinais mais eloquentes de que ninguém, pobre ou rico, basta a si mesmo. Por isso Jesus chamou os pobres de bem-aventurados".

Já para o pastor batista Adriano Trajano, a pesquisa mostra que quanto maior for o estado de pobreza e pouco desenvolvimento econômico no país, "maior será a busca por subterfúgios sobrenaturais, pois a religião tem esse poder de transportar o necessitado a um mundo de cordas divinas". "Que a religião desempenha um papel importante nas sociedades, não há dúvida, resta saber até que ponto esse papel favorece a vida?", pergunta.

O teólogo adventista Marcos Noleto é mais radical: "Há uma incompatibilidade da fé prática com a riqueza. Assim como dois corpos não podem ocupar um mesmo lugar no espaço, na mente do homem não há lugar para duas afeições totais. Veja que Deus escolheu um carpinteiro e não um banqueiro para ser o pai de Jesus".

Justiça social no Velho Testamento - 6

Parte 6 - A denúncia profética

por Richard Foster

Os profetas não pouparam ninguém ao denunciar o fracasso patente do povo em fazer justiça. As denúncias mordazes de Amós são uma legião. Ecoando por todo o livro está a acusação: “Vendem o justo por dinheiro, e condenam o necessitado por um par de sandálias” (Am 2:6). Ele acusa as mulheres de oprimirem os pobres e esmagarem os necessitados em sua concupiscência por um padrão de vida mais alto (Am 4:1). O povo estava tão cheio de ganância que mal podia esperar pelo fim do sábado para poder negociar “diminuindo o efa, e aumentando o siclo, e procedendo dolosamente com balanças enganadoras” (Am 8:4-6). O suborno era a ordem do dia, e juízes justos que falavam a verdade eram desprezados (Am 5:10,12). É de admirar que Amós tenha clamado: “Antes corra o juízo como as águas, e a justiça como ribeiro perene” (Am 5:24) ?

Enquanto Amós vociferava contra Israel ao norte, Isaías, no reino do sul, lamentava: “Cada um deles ama o suborno e corre atrás de recompensas” (Is 1:23). Isaías retrata uma cena de juízo na qual Deus é o promotor que expõe as práticas injustas dos governantes: “Que há convosco que esmagais o meu povo e moeis a face dos pobres?” (Is 3:13-15).

A opressão de Judá se havia estendido até os decretos oficiais e livros da lei. Da mesma forma que Deus havia institucionalizado um sistema de justiça compassiva, os governantes haviam institucionalizado um sistema de injustiça rígida: “Ai dos que decretam leis injustas, dos que escrevem leis de opressão” (Is 10:1-2). Lemos que Deus aborrecia todos os rituais piedosos de Judá porque faltava-lhes relevância social. A vida que agrada a Deus não é encontrada numa série de deveres religiosos mas na obediência. O jejum que Deus desejava era “que soltes as ligaduras da impiedade” e “deixes livres os oprimidos”. As palavras de Deus para eles foram: “Que repartas o teu pão com o faminto, e recolhas em casa os pobres desabrigados” (Is 58:5-7).

(FOSTER, Richard. Celebração da Simplicidade. Campinas: United Press, 1999, pp. 40-41)

domingo, 26 de setembro de 2010

Um esboço sobre John Wycliff

No dia 31 de outubro comemora-se o dia da Reforma Protestante. Neste dia, Lutero teria fixado suas famosas 95 teses na porta da Igreja de Todos os Santos, em Wittenberg. 

Este evento marca o início dos conflitos do reformador alemão com a igreja católica, no entanto, esta não era a primeira tentativa de reforma da igreja.

Houve uma época onde o poder do papa ainda não era definido, e onde a igreja discutia ainda se era o papa ou os concílios que deveriam decidir sobre a vida da igreja. 

Neste tempo, surgia um homem na Inglaterra que denunciava a corrupção dos papas e tentava impulsionar uma reforma na Igreja: John Wycliff.

Este homem discordava de várias coisas ensinadas na igreja, entre elas a doutrina da transubstanciação, que ainda não era aceita completamente. Wycliff entendia também que todo cristão deveria conhecer as Escrituras, pois somente elas são nossa regra de fé. Não poupou esforços para torná-las públicas, se lançando inclusive à tarefa de traduzí-las para o inglês.

Obviamente uma pessoa que apontava sem medo os erros de seus contemporâneos não teria sossego por parte deles. Assim, Wycliff é forçado a abandonar a universidade de Oxford, onde dava aulas.

Mesmo depois de morrer, ele não teria sossego. Condenado postumamente no concílio de Constança, seu corpo foi exumado e seus ossos foram queimados, suas cinzas foram jogadas no rio Swift.

Qual o legado de Wycliff? Bem, além de ter influenciado Jan Huss, Wycliff nos deixa uma importante lição, lição esta que Lutero defendia muito bem: o direito de todo cristão conhecer as Escrituras e utilizá-las como regra de fé. 

Acredito que esta lição é a que mais precisamos ter em mente hoje em dia, pois não somos impedidos de ler as Escrituras apenas quando estas são oferecidas em idiomas estranhos não... 

Somos impedidos de ter as Escrituras também, quando elas são mal interpretadas a nós, e nós somos desmotivados a verificar se estas Escrituras realmente dizem aquilo que pastores e apóstolos modernos estão pregando.

Como comemoração ao dia da Reforma, o site e-cristianismo estará disponibilizando vários textos, um a cada domingo até o dia 31 de outubro. O texto de hoje nos fala sobre a vida de John Wycliff, este homem que não teve medo de defender aquilo que achava correto: nosso direito de conhecer as Escrituras.

Vida de John Wycliff:

http://www.e-cristianismo.com.br/pt/historia/biografias/175-john-wycliff

Justiça social no Velho Testamento - 5

Parte 5 - O clamor por justiça

por Richard Foster

O chamado à justiça é um dos grandes temas que ecoam por toda a Antiga Aliança. É a palavra hebraica mishpat (משׁפּט) que nos oferece uma percepção desse clamor por justiça. Ela era uma palavra frequentemente usada, rica de significado; um termo legal que também trazia em si conotações éticas e religiosas. Mishpat envolvia uma moralidade acima e além da justiça legal limitada. Ela incluía a observância dos bons costumes ou práticas estabelecidas, especialmente a prática de uma distribuição equitativa da terra. Era usada tão constantemente em conjunção com a palavra hebraica para justiça que o estudioso bíblico Volkmar Herntrich acredita que os dois conceitos deveriam ser vistos como virtualmente sinônimos. Isto é visto vividamente no apelo apaixonado de Amós: “Antes corra o juízo como as águas, e a justiça como ribeiro perene” (Am 5:24).

Em Deuteronômio lemos que Jeová “faz justiça ao órfão e à viúva, e ama o estrangeiro, dando-lhe pão e vestes” (Dt 10:18). E mais uma vez o salmista declara: “O Senhor faz justiça, e julga todos os oprimidos” (Sl 103:6).

Esta justiça envolvia a sabedoria de produzir relacionamentos equilibrados, harmoniosos entre as pessoas. Salomão orou para receber sabedoria para governar o povo e Deus respondeu: “Pediste entendimento, para discernires o que é justo [mishpat]” (1 Reis 3:11).

Líderes políticos deveriam exercer esta qualidade de compaixão ética em favor de todo o povo. Miquéias acusa os governantes de Israel de canibalismo econômico por sua injustiça brutal. “Comeis a carne do meu povo” e “os repartis como para a panela e como carne no meio do caldeirão”, lamenta Miquéias (Mq 3:1-3). Jeremias ficou desconsolado por não poder encontrar a justiça em parte alguma de Jerusalém, embora ela fosse procurada em todas as ruas (Jr 5:1).

Havia advertências repetidas contra a falha de prover justiça: “Maldito aquele que perverter o direito do estrangeiro, do órfão e da viúva” (Dt 27:19). Grande era a bênção prometida àqueles que de fato exercessem a justiça: “Bem-aventurado aquele... que faz justiça aos oprimidos e dá pão aos que têm fome” (Sl 146:5-7).

(FOSTER, Richard. Celebração da Simplicidade. Campinas: United Press, 1999, pp. 39-40)

sábado, 25 de setembro de 2010

Tiririca, televisão e educação política

Toda eleição segue mais ou menos o mesmo roteiro, em que alguns candidatos inexperientes são eleitos apenas com base na sua celebridade. Neste ano não é diferente, e a candidatura mais criticada é a do palhaço e humorista Tiririca, que concorre a deputado federal por São Paulo e, com uma campanha debochada (seu slogan é "pior do que tá não fica"), parece ser o destinatário de um tsunami de votos nas urnas do próximo dia 3 de outubro. É óbvio que a provável eleição de Tiririca é um escárnio da democracia representativa e do recurso (válido) ao chamado “voto de protesto”, mas a análise merece ser aprofundada.

Tiririca é um fenômeno de mídia da década de 90, quando surgiu com a “música” Florentina, repetida à exaustão. Seu intérprete, que era palhaço de circo até então, fez carreira de humorista na televisão, razão principal pela qual ainda é bastante conhecido. Agora é criticado pela mesma imprensa que o promoveu, a exemplo de tantos outros de gosto duvidoso que alcançaram os píncaros da fama no país. Como os jornais são lidos por uma minoria insignificante do ponto de vista quantitativo, a televisão é a grande promotora das celebridades instantâneas que são alçadas ao palco da fama nacional. Logo, é no mínimo estranho que se volte contra o seu próprio rebento. A mão que afaga é a mesma que apedreja.

É, portanto, no mínimo hipócrita a posição de boa parte da imprensa que critica essas candidaturas esdrúxulas. Num país pobre como o Brasil, com uma política educacional reiteradamente arruinada, a televisão tem sido, nas últimas décadas, a grande fonte de educação e cultura da imensa maioria da população. São 40 anos, pelo menos, de (des)informação massiva. Tempo houve para que a televisão formasse uma população mais culta, mais afeita às questões da cidadania, sobretudo naquela emissora que monopolizou como quis o acesso à informação e cultura, a Globo. Poderia ter dado ao seu público o acesso qualificado aos bens culturais, mas vem vez de formá-lo, preferiu deformá-lo para adequá-lo aos seus interesses políticos e - principalmente - mercadológicos. Se este veículo poderoso chamado televisão tivesse feito a sua parte, talvez hoje estaríamos discutindo a eleição de maestros e cientistas. Teremos que nos contentar com o palhaço que ela mesmo promoveu e agora finge que não pariu...

Justiça social no Velho Testamento - 4

Parte 4 - O dízimo e os excluídos


por Richard Foster

Nos regulamentos relacionados ao dízimo podemos ver a preocupação especial de Deus com os indefesos e os necessitados, que é sempre um ingrediente importante na simplicidade. A cada três anos, o dinheiro do dízimo devia ser juntado e usado especificamente para aqueles que eram incapazes de cuidar de si mesmos. “Ao fim de cada terceiro ano levarás todos os dízimos da tua colheita do mesmo ano, e os depositarás dentro das tuas portas. Então virá o levita (pois nem parte nem herança tem contigo), o peregrino, o órfão, e a viúva, que estão dentro das tuas portas, e comerão, e fartar-se-ão; para que o Senhor teu Deus te abençoe em toda obra que as tuas mãos fizerem” (Deuteronômio 14:28-29). Em uma sociedade agrária, a terra era o meio principal de sustento, e assim o levita e o estrangeiro ficavam de fora do meio normal de ganhar a vida. Na cultura patriarcal, os órfãos e as viúvas também ficavam de fora dos meios normais de sustento. Dada a estrutura da cultura judaica naquele período, estes quatro grupos de pessoas eram os menos capazes de cuidar de si mesmos. E devido ao interesse compassivo de Deus para com eles, esta provisão foi escrita no dízimo.

Faríamos bem em considerar, dado o estado da sociedade moderna, se há pessoas hoje que equivalem aos levitas, aos estrangeiros, aos órfãos e às viúvas. Pela própria natureza da nossa cultura, há grupos que ficam de fora dos meios normais de renda para sustento próprio? Se há, será que o restante de nós não tem obrigação de responder à sua necessidade?

Deveria ser notado que o Novo Testamento não usa o dízimo nem as primícias. Jesus tinha uma porção de coisas a dizer sobre a nossa atitude para com os bens materiais, mas menciona o dízimo apenas duas vezes, em ambos os casos negativamente (Lc 18:21, Mt 23:22). O apóstolo Paulo teve uma porção de coisas a dizer sobre dar, mas qualquer referência à lei do dízimo está notoriamente ausente. Nem Jesus nem Paulo jamais fez do dízimo a base para a administração cristã dos bens materiais.

Talvez o patriarca Abraão devesse ser o paradigma para a nossa compreensão do princípio de generosidade. Ali estava um homem a quem foi dada grande riqueza. Contudo, nunca foi uma riqueza a ser acumulada; antes, foi livremente repartida com o clã. De fato, Abraão demonstrou uma postura incomum de tranquila indiferença para com os bens materiais. Quando o espírito cobiçoso de Ló os colocou em conflito, Abraão literalmente deu-lhe o direito de escolher a terra que quisesse (Gn 13:5-12). De graça ele recebeu, de graça deu.

(FOSTER, Richard. Celebração da Simplicidade. Campinas: United Press, 1999, pp. 38-39)

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Padre monta pelotão mirim na Argentina

Num tempo em que a violência impera em todo o mundo e a Igreja Católica é assolada por denúncias de pedofilia, soa no mínimo estranho que um padre se disponha a montar um pelotão de crianças, seja a que pretexto for, conforme noticia a Folha de S. Paulo de hoje:


Padre cria polêmica ao fundar "polícia mirim" na Argentina



Com colete à prova de balas, crianças de 9 a 14 anos têm atividades físicas e artísticas

GUSTAVO HENNEMANN
DE BUENOS AIRES

O grupo marcha, faz exercícios e veste colete à prova de balas sob as ordens de um comandante, como um pelotão policial. A diferença é a faixa etária: de 9 a 14 anos.

Formada por 45 crianças, a "polícia mirim" da cidade argentina de Esquel, na Província de Chubut, foi criada em janeiro passado pelo capelão da polícia local.

Aos sábados, os integrantes se reúnem em um ginásio da polícia para receber treinamento de oficiais e realizar atividades esportivas e artísticas sob a orientação do capelão, padre Adrián Mari.

O objetivo, segundo o perfil do grupo no Facebook, é que as crianças "encontrem seu policial interior". Além de fotos, o site disponibiliza vídeos com as atividades da "polícia mirim".

"Eles se conhecem, brincam e aprendem, sobretudo coisas sobre família, amizade, vocação e a vida. E, com isso, vão aprendendo o que é ser policial. Se Deus quiser, com o tempo, pode surgir alguém que deseje estar a serviço da comunidade", diz o padre em um dos vídeos.

As crianças também visitam delegacias, mas não exercem nenhuma "missão policial", segundo o padre.

Divulgado anteontem pela imprensa argentina, o projeto recebeu críticas de entidades de defesa dos direitos humanos e de educadores.

A polícia de Chubut disse que o padre não tem aval da instituição para realizar o trabalho. O governo da Província anunciou que afastará Mari da função de capelão e que investigará o caso.

Em Esquel, pais dos "policiais mirins" protestaram ontem contra o governo e pediram que o projeto continue.

Para a socióloga da Universidade de La Plata Patricia Redondo, a "polícia mirim" de Esquel não é uma iniciativa isolada ou um fato curioso. Mas reflete o pensamento de parte da população, que aposta na disciplina e na militarização para resolver problemas sociais do país.

"Todos rechaçaram publicamente a atitude do padre, mas é difícil acreditar que ele possa ter reunido essas crianças sem que alguém [do governo] tenha percebido."

A Folha tentou contato com o padre Mari, mas ele não atendeu o telefone.

Malafaia paga imprensa para defender liberdade de imprensa

Em anúncio pago publicado hoje nos principais jornais do país (veja abaixo), Silas Malafaia lança um manifesto à nação brasileira defendendo a liberdade de imprensa. 

Mesmo que diga no final que "não tenho autoridade para falar em nome de todos os evangélicos do Brasil", Malafaia se apresenta como "representante" de 25% da população brasileira. 

Faz uma salada de conceitos como "liberdade de imprensa", "liberdade de expressão" e "opinião pública", dizendo-se, ainda, que "eu mesmo já sofri muito... tão sujeito a ser caluniado, difamado ou incompreendido por meus atos e pelos princípios que defendo". Coitadinho...

(pausa para verter lágrimas pelo perseguido discípulo de Cerullo e Murdock)

Primeiro, é interessante observar que um anúncio pago como este custa milhares e milhares de reais e seria interessante que o Malafaia dissesse de onde tirou o dinheiro para subvencionar a sua publicação maciça, assim como aquele outro anúncio em que criticou a diplomacia brasileira em relação ao Irã. 

Será que foi das ofertas de 900 paus do Cerullo ou do milhão de almas do Murdock? Desconfio que não... Afinal, quantas vezes você já ouviu Malafaia - desesperadamente - pedindo ofertas porque não tem condições de manter seu programa no ar? Justo ele que jura de pé junto que "não tô nem aí pra você, crítico!"...

Segundo, "liberdade de imprensa" é um conceito muito diferente de "liberdade de expressão". 

A confusão proposital que se faz entre ambas serve apenas a interesses escusos, pois todos nós deveríamos ter direito a ambas, mas a "liberdade de imprensa" se restringe tão-somente a algumas famílias que detêm o monopólio da informação no país e são os únicos a exercê-la de fato. Ai de você, querido blogueiro, se resolver bater de frente com eles...

Se não existisse a internet hoje em dia, certamente ficaríamos sem saber de muitas notícias, e - mais do que isso - não poderíamos nos opor à manipulação de notícias muitas vezes feita por esta mesma imprensa, que de "livre" não tem nada. 

Felizmente, a liberdade de expressão tem seu terreno fértil na internet, mas deveria ter também na imprensa conhecida como tal, jornais, revistas, rádio, televisão.

Em terceiro lugar, a posição de Malafaia é política (o que é normal) e partidária, já que a chamada "grande imprensa" está sendo atacada pelo presidente Lula por suas afeições partidárias. 

O que Lula quer (e a imprensa teme) é ampliar a possibilidade de informação, e isto inevitavelmente se dará por uma reforma das leis atuais de comunicação. 

O que tanto o presidente como boa parte da sociedade querem é justamente MAIS imprensa. Que não fiquemos limitados ao que a Veja publica na manhã de sábado, o Jornal Nacional repercute no sábado à noite e o Estadão e a Folha ampliam no domingo. 

É muito pobre e perigoso depender exclusivamente das famílias Civita, Marinho, Mesquita e Frias para discutir o país. 

O próprio fato deles publicarem o que querem mostra que há liberdade de expressão no país, que só neste caso - em relação a eles - coincide com a liberdade de imprensa. 

Só que, quanto mais acesso à informação, melhor para todos, sobretudo em tempos globalizados e tecnológicos, em que seria interessante, a meu ver, que tivéssemos inclusive canais de televisão abertos em outros idiomas, como inglês e espanhol, e isso não ficasse restrito a quem pode pagar por uma TV a cabo. 

Logo, Malafaia está "jogando" do lado da oposição, num oportunismo barato que lhe é conveniente, já que diante das críticas (legítimas) e das difamações (ilegítimas e vergonhosas) que estão sendo veiculadas por muitos evangélicos contra a candidata da situação, de qualquer maneira vai sobrar público para sustentar o seu programa, ao qual ele chama de "ministério", num exemplo claro de a quantas anda o utilitarismo evangélico, ou seja, Malafaia pode continuar vendendo suas "unções" cerullianas e murdockianas à vontade, que vai haver público que se diz "evangélico" para fazer vistas grossas se juntar às suas colunas. 

Alguns torcerão o nariz, fingindo cara de nojo, mas desde que o Malafaia jogue no mesmo time deles, pode envergonhar o evangelho sem qualquer limite.

Esqueça a teologia, o que impera no meio "evangélico" brasileiro hoje é a ideologia utilitária do oportunismo e da conveniência. E isto custa caro, muito caro...


quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Justiça social no Velho Testamento - 3

Parte 3 - As primícias e o dízimo

por Richard Foster

A lei das primícias também ilustra como nossa generosidade flui da generosidade de Deus. Esta lei estipulava que os primeiros frutos da safra a amadurecer fossem dados a Deus. Era, na realidade, um ato de confiança na generosidade de Deus. Eles davam na confiança de que conseguiriam colher o restante da safra. Era um confissão palpável de Deus como o Doador gracioso de todas as coisas boas.

Semelhante à lei das primícias, o dízimo era um conceito de celebração jubilosa. Nos dias de Jesus esta regra encantadora tinha se tornado tão distorcida e abusada quando tem sido em nossos próprios dias. É triste pensar que o dízimo, projetado para expressar liberação e liberdade, tem sido tantas vezes transformado em outra forma de escravizar as pessoas.

O costume de dar o dízimo é mencionado na Bíblia pela primeira vez em conexão com Abraão. Quando voltou de um ataque-surpresa de retaliação, Abraão deu alegremente a Melquisedeque um décimo dos despojos e deu 100 por cento do restante ao rei de Sodoma. Embora o rei protestasse, Abraão insistiu: “para que não digas: Eu enriqueci a Abraão” (Gn 14:17-24). Abraão deu generosamente em celebração do poder de Deus sobre seus inimigos. Ele não estava contando cada siclo para assegurar sua parte justa – queria se livrar de tudo aquilo. Havia um espírito de alegria e liberdade ligado à doação.

A lei mosaica mantém este senso de alegre festividade. O total de dez por cento da renda dos israelitas, além das primícias, era para ser dado em celebração da provisão graciosa de Deus. O dinheiro era usado para cuidar dos levitas, do forasteiro e dos pobres e necessitados. Era usado também para financiar as despesas das festividades envolvidas na celebração da generosidade de Deus.

Deuteronômio 14:22 Certamente darás os dízimos de todo o produto da tua semente que cada ano se recolher do campo.
23 E, perante o Senhor teu Deus, no lugar que escolher para ali fazer habitar o seu nome, comerás os dízimos do teu grão, do teu mosto e do teu azeite, e os primogênitos das tuas vacas e das tuas ovelhas; para que aprendas a temer ao Senhor teu Deus por todos os dias.
24 Mas se o caminho te for tão comprido que não possas levar os dízimos, por estar longe de ti o lugar que Senhor teu Deus escolher para ali por o seu nome, quando o Senhor teu Deus te tiver abençoado;
25 então vende-os, ata o dinheiro na tua mão e vai ao lugar que o Senhor teu Deus escolher.
26 E aquele dinheiro darás por tudo o que desejares, por bois, por ovelhas, por vinho, por bebida forte, e por tudo o que te pedir a tua alma; comerás ali perante o Senhor teu Deus, e te regozijarás, tu e a tua casa.
27 Mas não desampararás o levita que está dentro das tuas portas, pois não tem parte nem herança contigo.

Com efeito, isso equivalia a um feriado religioso com todas as despesas pagas. O dinheiro do dízimo usado para uma gloriosa festa santa! No cerne do dízimo estava um espírito alegre de generosidade, adoração, celebração.

(FOSTER, Richard. Celebração da Simplicidade. Campinas: United Press, 1999, pp. 36-37)

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Aprenda rugby com os All Blacks

Pra quem não conhece este esporte pouco divulgado no Brasil, a seleção da Nova Zelândia é para o rugby o que a seleção canarinho é para o futebol: a "grife" mais famosa do respectivo esporte. Como o uniforme é todo preto, eles são conhecidos como os "All Blacks". Veja no vídeo abaixo o que eles fazem com a "bola" oval:

Moisés teria dividido o Nilo e não o Mar Vermelho

É o que supõem pesquisadores americanos, segundo noticia o site Folha.com:


Dupla americana simula milagre de Moisés; divisão do mar teria sido no Nilo


REINALDO JOSÉ LOPES
EDITOR INTERINO DE CIÊNCIA

Segundo o texto bíblico, "um forte vento leste" soprando sobre o mar teria aberto as águas para Moisés e os israelitas que fugiam do Egito. Agora, dois cientistas dizem que o "milagre" é compatível com as leis da física.

Carl Drews, do Centro Nacional de Pesquisas Atmosféricas dos EUA, e Weiqing Han, da Universidade do Colorado em Boulder, traçam um cenário que eles consideram "relativamente próximo" do descrito no livro do Êxodo, o segundo da Bíblia.

Em artigo recente na revista científica "PLoS One", eles estimam que um vento de velocidade próxima de 100 km/h, soprando sobre a desembocadura do rio Nilo por 12 horas, teria sido suficiente para empilhar as águas e abrir uma passagem com alguns quilômetros de largura.

Drews e Han chegaram a essa conclusão com simulações, em computador, do comportamento do líquido, e levando em conta como seria a topografia do Egito no fim da Idade do Bronze (por volta de 1250 a.C.). Essa é a época mais aceita para a suposta fuga dos escravos israelitas, liderados pelo profeta Moisés.

Um detalhe importante para que a análise dê certo é que, de acordo com essa hipótese, a travessia dos fugitivos não teria acontecido no mar Vermelho atual.

MAR DE CANIÇOS

A maioria dos estudiosos do texto bíblico considera que a melhor tradução para o termo original hebraico, "Yam Suph", não é "mar Vermelho", mas sim "mar de Caniços". A expressão seria uma referência, portanto, não ao mar entre a África e a Arábia, mas a uma área pantanosa (daí os caniços, plantas aquáticas) onde o Nilo encontra o mar Mediterrâneo.

Acontece que as simulações de como era o delta do Nilo nessa época, levando em conta as rochas e sedimentos da região, indicam a presença de um grande braço do rio, o qual se conectava com uma lagoa salobra, o chamado lago de Tânis.

O vento leste descrito no Êxodo, portanto, teria feito recuar as águas rasas (com cerca de 2 m de profundidade) do braço do Nilo e do lago, o que, em tese, teria permitido a passagem de Moisés e seu povo para longe dos guerreiros do faraó.

EXEMPLOS MODERNOS

Além das simulações e dos dados geológicos, os cientistas citam a ocorrência de fenômenos parecidos em épocas recentes. O vento conseguiu façanha parecida em 2006 e 2008 no lago Erie, nos EUA. No fim do século 19, oficiais britânicos viram algo do tipo acontecer no próprio Nilo (leia texto abaixo).

Como tudo que cerca o lado histórico dos textos bíblicos, a pesquisa já nasce polêmica. Drews, por exemplo, fez algo pouco comum em outros artigos científicos: declarou, logo no início do estudo, que poderia ter conflitos de interesse sobre o tema, já que é cristão e tem um site no qual defende a compatibilidade entre ciência e fé.

Nem ele nem Han dizem ter provado a veracidade do Êxodo. Toda a história da fuga dos israelitas do Egito, aliás, é muito contestada por arqueólogos e historiadores.

Gente como o arqueólogo Israel Finkelstein lembra, primeiro, que não há menções ao épico nos registros egípcios nem artefatos ligados à migração de 40 anos de Moisés e hebreus no deserto.

Em segundo lugar, tanto a língua quanto os artefatos dos povos que formariam mais tarde o reino de Israel são praticamente idênticos aos dos povos que já habitavam a antiga terra de Canaã (hoje dividida entre judeus e palestinos), supostamente invadida pelos israelitas.

Por isso, muitos arqueólogos apostam que o povo de Israel teria surgido dentro da própria Canaã, a partir de tribos que já viviam por lá.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Justiça social no Velho Testamento - 2

Parte 2 - A terra

por Richard Foster

Outra coisa interessante a respeito do Jubileu era a perspectiva que ele dava à terra, uma perspectiva que era característica do pensamento do Antigo Testamento. A terra não tinha valor em si e de si própria em termos do número de colheitas que produziria até o Jubileu (Lv 26:16). Ela não era usada como um investimento, coisa comum nos nossos dias. A questão central era que o povo de Israel não possuía a terra; apenas tinha permissão para usá-la. Deus era o soberano da terra: “Também a terra não se venderá em perpetuidade, porque a terra é minha” (Lv 25:23). Como o tesoureiro de uma companhia ou a governanta de uma mansão, a autoridade humana sobre a terra era de supervisão. Deus havia distribuído a terra de tal forma que todo o povo podia se beneficiar com sua produção.

Este princípio de distribuição equitativa em vez de acúmulo, e administração em vez de posse, era tão revolucionário naquela época como é agora. O que aconteceria se esta ideia – de que o propósito da terra é servir às necessidades da humanidade em vez de prover os meios para auto-engrandecimento – fossem aceitos hoje? O que isto diria aos nossos investimentos em bens imóveis? Talvez este enfoque não recebesse a aprovação geral, mas e se os cristãos cressem que a terra era para o bem de todas as pessoas igualmente? É possível que apenas este grupo pudesse liberar recursos que amputariam a fome da face da terra?

Não temos nenhuma evidência histórica de que os filhos da aliança jamais implementaram o Jubileu. Contudo, isto nos diz apenas que eles eram frequentemente um povo de dura cerviz e desobediente. Não joga nenhuma luz sobre a correção ou viabilidade ou mesmo conveniência desse tipo de providência. O que o princípio do Jubileu de fato nos mostra é a preocupação profunda e permanente de Deus com a justiça e a equidade.

(FOSTER, Richard. Celebração da Simplicidade. Campinas: United Press, 1999, pp. 36-37)

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Vertigem

Quer sentir um pouco de vertigem? Então se segure na poltrona e veja o vídeo abaixo, gravado por engenheiros que escalaram uma torre de 538 metros de altura, por iniciativa do site The Online Engineer:


domingo, 19 de setembro de 2010

Justiça social no Velho Testamento - 1

Parte 1 - O Jubileu

por Richard Foster

A maior generosidade de Deus para conosco nos liberta para servir de exemplo desta generosidade para com os outros. Porque ele deu, somos capacitados a dar.

Esta celebração da generosidade de Deus e liberdade de dar em retorno é vista claramente no ano do Jubileu (Levítico 25). O Jubileu era um chamado a uma libertação divinamente capacitada dos bens materiais e uma reestruturação equilibrada das classificações sociais.

Uma vez a cada cinquenta anos, no Dia da Expiação, a trombeta vibrante devia tocar proclamando “liberdade na terra a todos os seus moradores” (Lv 25:10). Todos os escravos deviam ser libertos. Todas as dívidas deviam ser canceladas. Todas as terras deviam ser devolvidas ao proprietário original.

Inerente ao conceito do Jubileu estava um espírito descuidado de alegre confiança. Podia-se contar com Deus para prover o que fosse necessário. Ele prometera: “E vos darei a minha bênção” (Lv 25:21). Era este espírito interior de confiança que capacitava as pessoas a cumprirem as estipulações do Jubileu.

Havia um princípio social importante no Jubileu. Se executado fielmente (o que não era), ele teria eliminado completamente o antigo problema de os ricos ficarem mais ricos e os pobres ficarem mais pobres. Era, com efeito, justiça legislativa a favor dos pobres; um mecanismo legal institucionalizado para resolver um problema social e espiritual. O ciclo vicioso de pobreza podia ser quebrado. Pais que tinham perdido tudo e eram forçados a vender-se como escravos para sobreviver sabiam que seus filhos não precisavam ser esmagados por sua herança econômica. Podiam ter um novo começo. Inversamente, os ricos não podiam oprimir para sempre os menos afortunados. Sua posição vantajosa não era perpétua.

Faríamos bem hoje em olhar com atenção esta abordagem singular de contenção da injustiça social. Vivemos num mundo no qual o abismo que separa os que têm dos que não têm está se alargando a uma velocidade fenomenal. Naturalmente, é o cúmulo do pensamento simplista presumir que se pode tomar uma lei antiga e local e tentar universalizá-la e aplicá-la à cena internacional complexa. Mas tampouco é o princípio do jubileu totalmente irrelevante aos nossos dias. De fato, ele poderia nos dar algumas pistas importantes das maneiras como poderíamos ter um mundo mais equilibrado, mais justo.


(FOSTER, Richard. Celebração da Simplicidade. Campinas: United Press, 1999, pp. 35-36)

sábado, 18 de setembro de 2010

Os militantes evangélicos

Época de eleições é o melhor período para verificar o quanto o discurso evangélico está mais atrelado a um projeto de poder político do que propriamente ao anúncio da boa nova. 

Ideologia (e não teologia) é o que os anima. 

Há muitas e honrosas exceções, obviamente, mas já não é mais possível identificar onde que está a regra, justo os evangélicos que sempre disseram ter a Bíblia como única regra de conduta. 

Nada inesperado, infelizmente, já que quem não tem escrúpulos no trato da verdade fática que o rodeia, menos compromisso terá ainda com a Palavra. 

A boataria e as teorias de conspiração que tomam conta das caixas postais e da blogosfera cristã é de deixar qualquer um envergonhado. 

Informações bombásticas e caluniosas são repassadas como se verdades fossem, sem que ninguém se dê ao trabalho de checar a sua veracidade, tudo no afã de apoiar este ou aquele partido político. 

Candidatos são demonizados ou canonizados conforme o gosto do freguês. 

Tudo é preto ou branco, não há mais espaço para tons de cinza nem para a humanidade que nos nivela a todos. 

Como se todos fôssemos membros de torcidas organizadas brigando nas imediações do estádio, precisamos eliminar uns aos outros sem qualquer clemência. 

Como cristãos evangélicos, deveríamos nos considerar reciprocamente como irmãos, mas se um vota no partido A e outro no partido B, então não podemos mais ter comunhão.

É legítimo que cada cristão tenha sua opinião política, e que dialoguemos respeitosamente sobre as nossas diferentes visões de mundo. 

Daí a querermos impor ao outro os nossos valores absolutos obtidos em fontes mentirosas e tendenciosas (evangélicas ou não) vai uma grande distância. 

Existem meios e momentos próprios para a discussão política, e eles devem ser incentivados. 

Entretanto, o que tem se visto e lido é uma militância evangélica exarcebada a favor deste ou contra aquele candidato, sem nenhum compromisso com nossas raízes mais profundas (senão as únicas), onde está fincada a mensagem da cruz de Cristo. 

É natural que uma determinada candidatura nos chame a atenção por se adequar melhor à nossa cosmovisão cristã, mas nem por isso ela é perfeitamente evangélica nem as outras são completamente contrárias à Igreja, sobretudo num país como o Brasil, em que a pulverização partidária e utilitarista leva às alianças mais improváveis. 

Lembro-me, por exemplo, das eleições de 1986, em que votar (o que fiz) no Mário Covas e no Fernando Henrique Cardoso para senadores (eram duas as vagas), então no PMDB, foi considerado como pecado por muitos cristãos, já que naquele ano se formava a Assembleia Constituinte que promulgaria a Carta Magna em 1988, e os dois eram vistos como favoráveis a toda uma gama de temas-tabu (do aborto à reforma agrária) que apavoravam muitos cristãos fundamentalistas. 

Nas eleições presidenciais de 1989, aventar a possibilidade de votar no Roberto Freire (então comunista do PCB, hoje PPS) era mais do que suficiente para que alguns irmãos lançassem dúvidas sobre a sua fé. 

Esses eram escândalos político-evangélicos da década de 80. Mais de vinte anos depois, nenhum dos terrores preconizados foi perpetrado, e todos esses nomes (à exceção do finado Covas) estão do mesmo lado de muitas igrejas evangélicas que os demonizavam, mas se esqueceram convenientemente das restrições que lhes faziam à época, porque se revelaram apenas mentiras de ocasião.

Estamos na reta final das eleições de 2010, e há uma militância evangélica aguerrida, semeando divisão, ódio e confusão. 

Gente boa dissemina boatos falsos e inverossímeis, associando-se a colegas “pastores” de vida suspeita, estes também ligados a candidaturas e projetos políticos inconfessáveis. 

Gente que você preza, que queria ter como irmão ou pastor, mas que nessas horas mete os pés pelas mãos e ofende os mais comezinhos princípios de inteligência e fraternidade. 

Aí a gente percebe que eles, infelizmente, estão mais preocupados com um projeto político pessoal - com os favores daí decorrentes -, no qual empenham as suas melhores forças. 

Lindo seria se tivessem a mesma disposição e usassem a mesma energia para pregar o evangelho de Jesus Cristo. 

Só isso...

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Bento XVI associa ateísmo a nazismo

Na Inglaterra, o papa causa polêmica, conforme notícia do site Opera Mundi:

Associação entre ateísmo e nazismo feita pelo Papa gera protestos no Reino Unido‏

O discurso feito pelo papa Bento XVI no Parque do Palácio Real de Holyroodhouse, na cidade escocesa de Edimburgo, durante o qual relacionou o ateísmo ao nazismo, gerou protestos entre as entidades britânicas ateias.

"O conceito de que foi o ateísmo dos nazistas que os levou a suas odiosas visões extremistas é uma terrível difamação dos que não acreditam em Deus", declarou um porta-voz da British Humanist Association (Associação Britânica Humanista, em tradução livre).

Em uma das passagens mais significativas de sua fala perante a rainha Elisabeth II e outras autoridades locais, no primeiro dia de sua visita de Estado ao Reino Unido, o Pontífice comentou "as advertências do extremismo ateu do século XX".

Citando a resistência britânica durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), o Papa afirmou que a nação se opôs "a uma tirania nazista que pretendia erradicar Deus da sociedade e negava a muitos nossa humanidade comum, especialmente aos judeus, que eram considerados indignos de viver".

Após seu pronunciamento, Bento XVI deixou Holyroodhouse no papamóvel, e manifestações de integrantes do movimento Protest the Pope foram contidas durante seu percurso. O grupo é o mesmo que está organizado uma marcha para o sábado, em Londres, no dia da Vigília de Oração pela Beatificação do Cardeal John Henry Newman, no Hyde Park. Os manifestantes se reuniram ao longo da mesma via onde estava a maior parte dos católicos de Edimburgo que pretendiam saudar o Pontífice.

Os protestos se concentraram, em geral, nos posicionamentos tradicionais da Igreja. Nos cartazes carregados pelos membros da organização, frases destacavam que "a oposição do Papa aos preservativos mata" e "a homofobia de Bento custa vidas".

Já cerca de 60 seguidores do reverendo presbiteriano e ex-primeiro ministro irlandês Ian Paisley - o qual disse recentemente que a visita do chefe de Estado do Vaticano deveria ser cancelada - se reuniram em outro local, onde o ex-premier fez um sermão.

"Existem muitos problemas no interior da Igreja Católica e muitos católicos me escreveram expressando preocupação com seus filhos e me perguntando por qual motivo o Papa não tomou uma posição clara sobre a questão", disse Paisley, em alusão aos escândalos dos padres pedófilos que causaram uma crise na instituição. "Devemos aproveitar esta ocasião para dizer claramente como pensamos", completou.

A visita ao Reino Unido é uma das mais complexas do Pontificado de Bento XVI, e a primeira de um papa desde o cisma de Henrique VIII com a Santa Sé - com exceção da estadia de João Paulo II no país em 1982. Desde seu anúncio, o evento foi criticado por organizações locais, não só devido às posturas da Igreja e aos casos de abuso, mas também aos custos que impõe aos cofres públicos, de até 12 milhões de libras esterlinas.

Ainda hoje, o chefe de Estado do Vaticano presidirá uma missa em Glasgow, no Bellahouston Park, e à noite seguirá para Londres - cidade na qual permanecerá até o domingo, quando viaja a Birmingham.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

O debate imparcial

A seguir, o debate dos sonhos da imprensa brasileira, pela trupe d'Os Melhores do Mundo.

Obs1.: linguagem chula dos 07m:20s aos 08m:10s de vídeo

Obs2.: alguns ideólogos evangélicos se identificarão com o trecho de 08m:55s a 09m:10s




(Vi no blog Esquerdopata)

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Placebo gospel

Numa simplificação assumidamente insuficiente, “placebo” é um “remédio” que, na verdade, não é remédio, mas uma espécie de simulação de medicamento que, quando administrada a um paciente, faz com que ele apresente certos resultados fisiológicos decorrentes da, digamos, “sensação” de que está sendo devidamente tratado da doença que o acomete. Um placebo seria, por exemplo, uma pílula de farinha que faria as vezes de um analgésico ou antidepressivo, o que geraria no paciente que sofre de dor ou depressão um certo alívio nos seus sintomas em virtude dele acreditar que aquela pílula inócua e inútil teria o condão de realmente atacar e curar a sua enfermidade. Em termos metodológicos, o placebo é frequentemente utilizado para se medir a eficácia de um novo medicamento em testes controlados, em que parte das pessoas que o testam são tratadas com placebo e outras com o medicamento que está sendo pesquisado. O controle em questão é feito mediante protocolos reconhecidos por outros pesquisadores e instituições científicas. Na outra ponta dessa metodologia estão as críticas que se fazem a terapias alternativas, sem comprovação científica, às quais se atribuem o efeito placebo quando ocorre alguma melhora da condição do paciente.

Dito isto, a analogia que proponho é em relação ao tipo de evangelho que, com o perdão da palavra, está sendo “servido” hoje ao povo brasileiro. Se bem que, muitas vezes, parece que o correto seria dizer que está sendo “testado”. No que tange ao “antigo” evangelho decorrente da mensagem da cruz de Cristo, parece que esta simples e pura boa nova, experimentada, acolhida e – principalmente - vivida por gerações ao longo dos milênios em todos os rincões do mundo, já não é mais suficiente para os brasileiros do século XXI. Estes preferem uma espécie de “placebo gospel” embalado numa mensagem açucarada que não ataca nem cura o âmago do ser humano, mas as suas necessidades imediatas e – muitas vezes – supérfluas de bens, autoafirmação e consumo, fornecendo-lhe doses cavalares de pílulas de autoengano que lhes permitam enfrentar a dureza da vida.

Não por acaso, segundo o dicionário Houaiss, a palavra “placebo” vem do latim placebo, que significa “eu agradarei”, 1ª pessoa singular do futuro do indicativo do verbo placére (“ser do agrado, agradar, aprazer”). Uma espécie de balinha doce para agradar paladares e estômagos menos exigentes, mas inservível para alimentar, e que, infelizmente, está sendo oferecida de muitos púlpitos espalhados pelas igrejas evangélicas no Brasil. Alívios momentâneos para o cansaço e o pecado mediante refrões e discursos pré-fabricados, mas que não transformam vidas nem salvam almas, já que a cruz de Cristo é esquecida ou sublimada. Não por acaso, Paulo já advertia quanto aqueles “que são inimigos da cruz de Cristo; cujo fim é a perdição; cujo deus é o ventre; e cuja glória assenta no que é vergonhoso; os quais só cuidam das coisas terrenas” (Fil 3:18-19).

Este placebo que emana dos púlpitos não só engana sua audiência como tece uma rede de conformismo e autoemulação coletiva entre pastores e líderes de outras tantas igrejas evangélicas, que abandonam o seu senso crítico em troca de “unções” e conchavos suspeitos. Enquanto na metodologia científica, tanto o placebo como o remédio verdadeiro são averiguados e checados pela comunidade de pesquisadores, na “metodologia” religiosa, os placebos são aceitos como verdades insofismáveis, as quais não é lícito a ninguém o simples questionar. Tudo é engolido a seco sem qualquer critério, e líderes se juntam a outros líderes com base apenas no título que ostentam e na denominação que representam, como se o simples fato de se autoafirmarem “evangélicos” fosse suficiente para autorizá-los a se confraternizarem em convescotes e banquetes da vaidade, em que o Espírito Santo é barrado na porta.

Isto me lembra da homeopatia, que é frequentemente atacada pela comunidade científica como um exemplo de placebo. Sem entrar nesta questão específica, numa definição também reconhecidamente rasa, a grande característica da homeopatia é a diluição sucessiva de uma determinada substância até se atingir determinada potência do seu princípio ativo. Parece que é este o fenômeno que tem atacado a mensagem do evangelho no Brasil. A cruz de Cristo vai sendo sucessivamente diluída em tantos rituais e discursos inúteis que, ao contrário do que reza a teoria homeopática, termina perdendo todo o seu potencial de transformação do ser humano.

Atitude um pouco diferente têm os católicos devotos de Frei Galvão. As suas “pílulas” são uma espécie de placebo ao qual se atribuem milagres. Pelo menos, ao distribuí-las, as freiras do mosteiro da Luz não escondem de ninguém de que se trata apenas de palavras microscópicas enroladas num papel minúsculo.

domingo, 12 de setembro de 2010

Stephen Hawking e a existência de Deus

Artigo de Marcelo Gleiser na Folha de S. Paulo de hoje:

Hawking e Deus: relação íntima

É lamentável que físicos como Hawking divulguem teorias especulativas; ele está querendo ser Deus

Stephen Hawking, o famoso físico da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, está mais uma vez ocupando manchetes e blogs pelo mundo afora. A razão é a publicação de seu livro "O Grandioso Design" ("The Grand Design"), com Leonard Mlodinow, do Caltech (Instituto de Tecnologia da Califórnia).

A atenção é consequência da afirmação feita por Hawking de que a física resolveu a questão da origem do Universo e que, portanto, Deus não é necessário. Na verdade, isso não passa de mais uma batalha numa guerra um tanto longa e inútil.

Em seu bestseller "Uma Breve História do Tempo", publicado em 1988, Hawking escreveu: "Se o Universo é contido em si mesmo, sem borda ou fronteira, não teria começo ou fim: simplesmente seria. Neste caso, qual o lugar de um criador?"

Mais adiante: "Se descobrirmos uma teoria completa, filósofos, cientistas e o público leigo tomariam parte na discussão de por que o Universo e nós existimos. Se encontrarmos a resposta, seria o grande triunfo da razão humana, pois, então, conheceríamos a mente de Deus".

Hawking afirma que tem novos argumentos que colocam Deus para escanteio de vez. Será?

A ideia dele, que já circula de formas diferentes desde os anos 70, vem do casamento da relatividade e da mecânica quântica para explicar a origem do Universo, isto é, como tudo veio do nada.

Primeiro, usamos as propriedades atrativas da gravidade para mostrar que o cosmo é uma solução com energia zero (o "nada" de onde tudo vem) das equações que descrevem sua evolução.

Segundo, como na mecânica quântica (que descreve elétrons, átomos etc.) tudo flutua, o Universo pode ser resultado de uma flutuação de energia nula a partir de uma entidade que "contêm" todos os Universos possíveis, o multiverso.

Nosso Universo é o que tem as propriedades certas para existir por tempo suficiente -quase 14 bilhões de anos- para formar estrelas, planetas e também vida.

Em meu livro "Criação Imperfeita", publicado em março, argumento exatamente o oposto. Descrevo como afirmações que defendem a existência de uma "teoria de tudo" são incompatíveis com a física.

As teorias que Hawking e Mlodinow usam para basear seus argumentos -teorias-M, vindas das supercordas- têm tanta evidência empírica quanto Deus.

É lamentável que físicos como Hawking estejam divulgando teorias especulativas como quase concluídas. A euforia na mídia é compreensível: o homem quer ser Deus.

O desafio das teorias a que Hawking se refere é justamente estabelecer qualquer traço de evidência observacional, até agora inexistente. Não sabemos nem mesmo se essas teorias fazem sentido. Certas noções, como a existência de um multiverso, não parecem ser testáveis.

Ademais, a existência de uma teoria final é incompatível com o caráter empírico da física, baseado na coleta gradual de dados. Não vejo como poderemos ter certeza de que uma teoria final é mesmo final.

Como nos mostra a história da ciência, surpresas ocorrem a toda hora. Talvez esteja na hora de Hawking deixar Deus em paz.

Leitores interessados podem ver uma comparação entre meu livro e o de Hawking no blog do jornal "New York Times":

São Kassab

O Estadão de hoje deu um jeito de canonizar pelo menos um Kassab:

Tio-bisavô de Kassab é santo da Igreja Maronita

Trânsito, excesso de lixo, superpopulação e falta de vagas em creches. O prefeito Gilberto Kassab (DEM) é um homem comum encarregado de resolver esses e outros problemas. A diferença dele para os outros 11 milhões de habitantes de São Paulo é que, se quiser pedir um milagre, pode rezar para a própria família. São Naantalla Kassab, beatificado em 1998 e canonizado pelo papa João Paulo II em maio de 2004, é tio-bisavô do prefeito da capital.

Naantalla Kassab é um dos quatro santos da Igreja Maronita, religião fiel ao Vaticano com sede no Líbano, terra de origem da família do prefeito. Ele viveu no século 19 e teria feito milagres tanto em vida quanto após a morte, em 1858.

Na Igreja Maronita, São Naantalla Kassab também é chamado de "Al-Hardini". "Não é bem um apelido. É que é tradição chamar uma pessoa pelo nome da região de onde ela vem. Hardini é a região onde nosso santo nasceu", diz o padre Sleiman Eid, também conhecido como padre Salomão, pároco da Catedral Nossa Senhora do Líbano, na Liberdade, no centro de São Paulo.

"Há uma proximidade, mas ele não é tão próximo", diz o prefeito, ao comentar a ligação com o parente santificado. "Ele foi canonizado há alguns anos e, para a família, é um motivo de orgulho", diz. A resposta séria, dada antes de uma entrevista coletiva na sexta-feira, foi feita depois de um momento de descontração. "São dois santos na família. Ele e eu", brincou Kassab, cujo "milagre" mais famoso, por enquanto, é a Lei Cidade Limpa, aprovada em 2007 e até hoje sua principal vitrine política.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Sossegai!

Há dias de muita luta em nossas vidas, há momentos terríveis que atravessamos, em que a paralisia parece que vai nos vencer. O medo toma as rédeas das nossas emoções e a atitude mais cômoda, por contraditório que pareça, é simplesmente deixar-se levar pela correnteza, inapelavelmente. Entretanto, temos que seguir em frente, não podemos olhar pra trás, pois o que passou, passou, há desafios enormes pela frente, mas, graças a Deus, a vitória é garantida. Quando nosso inconsciente se depara com estes desafios, ele provoca um curto-circuito geral, porque o que vem à frente é novo e inovador, desconhecido mas – provavelmente - infinitamente melhor do que tudo o que já vivemos, mas o nosso inconsciente é uma criança mimada e insegura, que prefere agarrar-se à falsa segurança de emoções antigas, ainda que sejam erradas, destrutivas, e carregadas de culpa.

Há esperança, todavia. Podemos optar pela verdadeira segurança, que é entregar a Deus todo o nosso caminho, o que significa certeza de abrigo, mesmo em meio à tempestade, certeza de resgate, mesmo em meio ao mar enfurecido, certeza de paz, mesmo debaixo do bombardeio incessante, certeza de salvação, mesmo vivendo num mundo destinado à perdição. O que passou, passou, não voltará, e se a sensação de paralisia é forte demais, podemos nos inspirar no que fez Paulo, durante a tempestade na viagem pra Roma, deixando de lado, por longos dias, todos os meios humanos pra tentar se salvar no barco à deriva (Atos 27:13-44). Se é esta a situação em que estamos, deixemos o barco à deriva até que o Senhor decida em que ilha nós vamos aportar, ou em que pedra o barco vai se estilhaçar, mas, em toda e qualquer situação, nós seremos salvos (Atos 27:22), e apenas o barco, a carcaça desta velha vida, naufragará.

De qualquer maneira, o sol beijará outra manhã, o mar voltará a cantar canções de ninar, o vento tornará a acariciar no seu vem e vai, e nós continuaremos vivos e de pé na presença do Senhor, eternamente. Nunca perca esta verdade do seu horizonte.

Com Cristo no barco, tudo vai muito bem...

Sossegai...


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