Parece que a batata está assando na igreja renascer com a condenação que o Tribunal de Contas da União aplicou à bispa Sonia Hernandes, esposa do "apóstolo" Estevam Hernandes, negando provimento - em julgamento realizado no último dia 24 de janeiro de 2012 - ao recurso que ela havia impetrado contra decisão anterior (de abril de 2011) que já a havia sentenciado a devolver R$ 785.000,00 (setecentos e oitenta e cinco mil reais), além de pagar multa de R$ 100.000,00 (cem mil reais) por não ter comprovado a efetiva aplicação de recursos federais obtidos através do FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, que foram repassados pelo Ministério da Educação à Fundação Renascer entre 2003 e 2004, então dirigida pela bispa em questão. Pelo contrato, a verba pública deveria ter sido aplicada na alfabetização de 8.000 jovens e adultos. Segundo o TCU, não há qualquer prova concreta de que o valor destinado à Fundação Renascer tenha sido efetivamente aplicado para esse fim, e o valor teria sido (estranha e) integralmente sacado à vista na boca do caixa, o que levou o Tribunal a instaurar o competente procedimento administrativo visando a recuperação do dinheiro supostamente desviado. Além disso, o Ministério Público Federal vem buscando, desde 2010, a responsabilização criminal tanto da bispa Sonia como dos demais diretores da Fundação Renascer. A pendenga teria sido, provavelmente, uma das razões que levaram o bispo Zé Bruno a se afastar da igreja renascer e fundar a sua própria denominação, já que consta a assinatura dele nos convênios firmados em 2003 e 2004, época em que tanto Estevam como Sonia estavam ausentes e ele assinou como vice-presidente e, lógico, representante substituto dos manda-chuvas da instituição. Como o julgamento do processo (que tem o nº 007.494/2010-6 no TCU) é muito recente, o Acórdão (de nº 209/2012) que confirmou a sentença anterior ainda não foi publicado, mas no acórdão anterior, de nº 2573/2011 (disponível na íntegra no site do TCU), se pode obter mais detalhes de tudo o que está envolvido nessa polêmica. Abaixo, transcrevemos apenas o voto do Relator do caso, Dr. Aroldo Cedraz, que finaliza o Acórdão:
A presente tomada de contas especial foi instaurada pelo FNDE em decorrência da inépcia da prestação de contas de convênio firmado com a Fundação Renascer/SP para comprovar a correta aplicação de R$ 785.663,95 transferidos para ações de alfabetização de jovens e adultos em São Paulo/SP, uma vez que:
a) foram realizados saques em espécie na conta corrente do convênio, sem identificação do destinatário dos recursos;
b) a documentação apresentada era insuficiente para comprovar o nexo entre o desembolso de valores e as despesas realizadas, haja vista que somente foi apresentada relação de nomes dos alfabetizadores e coordenadores e respectivos pagamentos supostamente realizados, sem nenhum documento comprobatório, além de não terem sido encaminhadas notas fiscais dos materiais adquiridos, recibos dos alfabetizadores referentes às bolsas e aos vales-transportes recebidos e folhas de frequência dos alunos alfabetizados.
2. Inicialmente, foram citados a Fundação Renascer/SP e seu ex-vice-presidente José Antônio Bruno, cujas alegações de defesa, conforme demonstrou a Secex/SP (fls. 638/644 do volume 3), comprovaram sua ausência de responsabilidade pelas irregularidades e pelos débitos apurados.
3. Acompanho, nesse particular, as conclusões da unidade técnica, que insiro entre minhas razões de decidir, e considero que aqueles responsáveis devem ser excluídos desta relação processual. No caso da pessoa física, porque ficou configurado que o ex-vice-presidente não teve qualquer participação na execução do convênio, não praticou qualquer ato de gestão de recursos e somente assinou o termo de convênio em representação da ex-presidente, que se encontrava em viagem. No caso da pessoa jurídica, hoje sob intervenção judicial e em processo de liquidação, porque não ficou comprovado qualquer benefício por ela auferido com o uso dos recursos repassados.
4. Foi feita, assim, a citação da ex-presidente Sônia Haddad Moraes Hernandes, que alegou, em síntese, que:
a) não participou da celebração e da gestão do convênio e não foi cadastrada como responsável junto ao FNDE;
b) o objeto do ajuste foi executado, os objetivos foram atingidos e a respectiva prestação de contas demonstra a correta utilização dos recursos, tanto assim que foi aprovada pelo FNDE.
5. Como demonstrou a Secex/SP, cujas análises e conclusões novamente incluo entre os fundamentos de meu entendimento, tais argumentos não merecem ser aceitos, eis que:
a) a ex-presidente assinou o plano de trabalho, a prestação de contas e as justificativas a questionamentos formulados por auditoria do FNDE (fl. 313 do volume 1), o que significa que participou da celebração e da execução do convênio, e somente não assinou o respectivo termo porque estava em viagem;
b) as irregularidades na prestação de contas acima descritas (item 1 deste voto, alíneas a e b), impedem o estabelecimento de vínculo entre os valores transferidos e as despesas realizadas e a efetiva execução do objeto com recursos do convênio;
c) embora tenha sido inicialmente aceita pelo FNDE, como afirmou a responsável, a prestação de contas foi posteriormente reavaliada por aquela autarquia e rejeitada.
6. Deve ser registrado, ainda, que a ex-presidente da Fundação Renascer/SP deixou, em duas oportunidades, de apresentar a documentação complementar que permitiria comprovar a boa e regular utilização das quantias por ela recebidas: por ocasião da fiscalização realizada no local pela Controladoria-Geral da União, que anotou não haver sido “possível realizar a fiscalização pretendida devido à dificuldade encontrada pela equipe em ser atendida pelos responsáveis pela Fundação Renascer, que não disponibilizaram a documentação do convênio” (fls. 350/352 do volume principal), e por ocasião da apresentação de sua defesa perante esta Corte, à qual não foi juntado nenhum dos elementos comprobatórios mencionados no ofício citatório.
7. Assim, diante da persistência da ausência de comprovação do correto uso dos recursos, acato os pareceres da Secex/SP e do MPTCU e voto pela adoção da minuta de acórdão que trago à consideração deste colegiado.
[...]
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de tomada de contas especial em decorrência do não encaminhamento de documentação exigida para correta prestação de contas dos recursos do convênio 828.035/2004, por meio do qual foram repassados R$ 785.663,95 (setecentos e oitenta e cinco mil seiscentos e sessenta e três reais e noventa e cinco centavos) à Fundação Renascer/SP, em 2004 e 2005, no âmbito do Programa Brasil Alfabetizado, para alfabetização de 8.000 (oito mil) jovens e adultos, com idade superior a 15 (quinze) anos, da zona urbana de São Paulo/SP.
ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão da 2ª Câmara, com fundamento nos arts. 1º, inciso I, 16, inciso III, alíneas c e d, 19, caput, 23, inciso III, 28, inciso II, e 57 da Lei 8.443/1992, c/c o art. 214, inciso III, alínea a, do Regimento Interno:
9.1. excluir a Fundação Renascer/SP e José Antônio Bruno deste processo;
9.2. julgar irregulares estas contas especiais;
9.3. condenar Sônia Haddad Moraes Hernandes a recolher ao FNDE as importâncias a seguir discriminadas, atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora das datas abaixo apontadas até a data do pagamento:
Data Valor (R$) Natureza
18/11/2004 471.398,37 Débito
03/01/2005 314.265,58 Débito
07/10/2005 80,69 Crédito
9.4. aplicar à responsável multa de R$ 100.000,00 (cem mil reais), a ser recolhida ao Tesouro Nacional atualizada monetariamente do dia seguinte ao do término do prazo abaixo estipulado até a data do pagamento;
9.5. fixar prazo de 15 (quinze) dias a contar da notificação para comprovação do recolhimento das dívidas acima imputadas perante o Tribunal;
9.6. autorizar a cobrança judicial das dívidas, caso não atendida a notificação;
9.7. encaminhar cópia desta deliberação e do relatório e do voto que a fundamentaram ao procurador-chefe da Procuradoria da República no Estado de São Paulo.