quarta-feira, 6 de abril de 2011

A era dourada da Igreja Católica no Brasil colonial

Pelo jeito, Edir Macedo não é nada original em matéria de arrecadar dinheiro com uma igreja no Brasil. Ainda que tenha feito escola entre os neopentecostais dos nossos (tristes) dias, essa infeliz tradição brasileira vem de longe, empoeirada pelos séculos, como revela o livro Boa Ventura!- A Corrida do Ouro no Brasil (1697-1810), do jornalista Lucas Figueiredo. Pagava-se para entrar na igreja e assistir a missa (com comunhão incluída saía mais caro) e também havia uma tabela de preços bem detalhada se você quisesse adicionar música e um sermão. E tem muita igreja "evangélica" fazendo o mesmo por aqui atualmente, só que de maneira um pouco mais velada (nem tanto, porque ninguém é de ferro e alguns "pastores" e cantores gospel são de ouro, né!). O próprio autor compartilha parte de um capítulo da obra no blog Amálgama, do qual destacamos o seguinte trecho:

O setor de serviços era igualmente dinâmico. Como já não havia terras de sobra nos centros urbanos e os melhores terrenos eram disputados literalmente a peso de ouro, surgiu uma figura impensável poucos anos antes: o corretor imobiliário. Outra atividade lucrativa que surgiu a reboque do rush foi a agiotagem. Nas lavras de Vila Rica, por exemplo, padre Faria “enriqueceu com o ouro que lá Deus lhe deu, pondo-o a razão de juros na cidade do Rio de Janeiro”. O negócio da fé também era um ímã poderoso para atrair ouro. Dentro da igreja, tudo era pago. Na missa, quem comungava pagava 4 gramas de ouro e quem não comungava, 2 gramas. Um batismo saía por 4 gramas, um casamento por 11, e um serviço fúnebre, 14. Era preciso abrir a carteira e desembolsar 57 gramas de ouro para mandar rezar uma missa cantada. E se o culto incluísse sermão, a fatura subia para 72 gramas.

Tal qual seu distante rei, os súditos da Coroa em Minas não economizavam quando se tratava de agradar a Deus. As associações leigas (ordens terceiras, irmandades e confrarias) disputavam entre si qual conseguia erigir as maiores e mais luxuosas igrejas. Os artesãos da região costumavam receber pedidos elaborados, como o da capela-mor da igreja matriz de Catas Altas do Mato Dentro. Ao custo aproximado de 9,6 quilos de ouro, foram encomendadas, entre outras peças, “uma figura de pelicano com três ou cinco filhos tirando-lhe sangue do peito” e uma mesa com “pés de camelo ou garras de leão”.

A partir da década de 1720, a construção de templos religiosos se multiplicou e vários deles foram erguidos simultaneamente. Em 1740, enquanto Vila Rica assistia ao soerguimento da capela de Nossa Senhora das Mercês e dos Perdões e acompanhava os trabalhos do altar de São José da matriz de Nossa Senhora do Pilar, Mariana, a 12 quilô metros de distância, via subir a matriz de Nossa Senhora do Rosário de Sumidouro. As igrejas estavam no alto dos morros, nas praças, nas ladeiras, às vezes uma ao lado da outra. Só Nossa Senhora da Conceição ganhou oito matrizes. Santo Antônio mereceu seis, e São Francisco de Assis, cinco. Por fora, a maioria não chamava atenção, a não ser, porventura, pelo porte grandioso. Mas por dentro, mesmo as pequeninas eram de uma beleza delirante: cores, formas, luzes, sombras e muito ouro — só o douramento das talhas da nave central e da capela-mor da matriz do Pilar de Vila Rica consumiu 434 quilos do metal precioso. Muitos templos se assemelhavam a teatros de ópera, com camarotes faustosos e tribunas. As esculturas, as pinturas, os móveis finos e as riquíssimas peças sacras remetiam ao luxo dos palácios. Era o Barroco que, com um século de atraso em relação à Europa, chegava a Minas para mostrar a força da Igreja e do Estado e encantar os fiéis.

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