O arcebispo de Porto Alegre (RS), D. Dadeus Grings, se meteu numa encrenca daquelas com o Poder Judiciário nacional, pois, ao criticar os Tribunais de São Paulo e de Brasília, teve a resposta num nocaute duro e direto do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que - tomando as dores de seus pares - o chamou de "um homem intolerante, agressivo, preconceituoso, vingativo e rancoroso, [que] mostra-se a antítese do cristão de que nos fala a Bíblia". Tudo começou em Mogi Guaçu, interior do Estado de São Paulo, onde D. Grings exercia à época as funções de bispo da diocese de São João da Boa Vista (que engloba Mogi Guaçu), e defendeu a iniciativa da Prefeitura em desapropriar um imóvel de uma família influente da cidade, o que, cá entre nós, já é um tanto quanto estranho, já que os cuidados de um bispo católico deveriam se concentrar nas necessidades espirituais de sua comunidade, o que inclui também - obviamente - as necessidades materiais e sociais da sociedade em que ela está inserida, mas daí a defender desapropriação de imóveis vai uma certa distância, a não ser que fosse o último pedaço de terra disponível no planeta, do que não se trata, é claro, o caso. Na confusão causada pelo processo judicial, D. Grings teria dito - numa carta particular endereçada à família - que os advogados deles não “deixavam a impressão de lisura”, o que, também cá entre nós, pode ser até uma maneira bonita de se expressar uma ofensa à honra de alguém, mas a belezura da calúnia não tira dela o condão de crime previsto no Código Penal brasileiro, nem exime o ofensor de indenizar o ofendido pelos danos morais causados por uma afirmação no mínimo leviana como essa. O fato da ofensa ser feita por escrito, mesmo que particularmente, não tira dela o poder de ferir a reputação de alguém. Poderia até corresponder à verdade, mas o bispo teria que ter comprovado a veracidade de sua acusação. Oportunidade para tanto teve, mas se não o fez, é porque não tinha prova de que a família proprietária do imóvel em questão (e os seus advogados) eram desonestos ou haviam cometido algum crime previsto em lei para conseguir seus objetivos.
A família então exerceu o seu legítimo direito de processar o então bispo de São João da Boa Vista pelos meios permitidos pela legislação brasileira, e o acusado teve a oportunidade de se submeter ao contraditório e se defender em todas as instâncias, com todos os recursos cabíveis, até que - depois de 16 anos vagando pelos meandros dos Juízos e Tribunais brasileiros - a decisão final transitou em julgado (no popular: tornou-se definitiva, não cabendo mais qualquer recurso) e tanto D. Grings como a Diocese de São João da Boa Vista foram condenados a pagar cerca de R$ 936 mil, atualizados até agosto de 2011 (a correção monetária continuará incidindo sobre o montante enquanto não for paga - na íntegra - a verba indenizatória). Agora, portanto, diante da irrecorribilidade da sentença, D. Grings, já arcebispo de Porto Alegre, veio a público acusar o Poder Judiciário em geral de corrupção, dizendo que "os juízes estão desligados da realidade. Os ministros da Igreja católica não recebem salários polpudos, como eles, nem amealham fortunas", imolando-se "espiritualmente" ao final da nota que distribuiu à imprensa: "Se me quiserem prender – conforme o Advogado querelante há 14 anos preconizava, - estou às ordens. Só assim o mundo saberá quanto nosso Judiciário é corrupto e arbitrário".
Não é surpresa, portanto, que a primeira reação à critica do arcebispo tenha vindo justamente do Judiciário gaúcho, que, em tese, não teria nada a ver com o imbroglio que envolve os Tribunais de São Paulo e da capital federal, mas se sentiu diretamente atingido pela acusação generalizada de corrupção feita pelo religioso católico e a rechaçou dizendo: "O Poder Judiciário manifesta sua indignação e repúdio às declarações do arcebispo de Porto Alegre, que mais uma vez optou pelo caminho da agressão e do escândalo frente a uma condenação judicial. Dom Dadeus, ao apresentar-se como um homem intolerante, agressivo, preconceituoso, vingativo e rancoroso, mostra-se a antítese do cristão de que nos fala a Bíblia. A Igreja Católica não merece ser colocada no centro de polêmicas equivocadas e movidas por simples recalques e frustrações pessoais. O arcebispo deveria deixar as questões legais para os corretos e competentes advogados da Cúria Metropolitana e, à sua vez, submeter-se com humildade às lições de convivência e urbanidade pregadas por sua própria religião".
Parece mesmo que Deus não concedeu ao arcebispo, sabe-se lá por quê, os dons da temperança e do domínio próprio, pois D. Dadeus Grings não tem papas na língua e nem prima pela discrição e sabedoria no seu falar, como quando da ocasião já noticiada aqui no blog, em que procurou defender os padres acusados de pedofilia dizendo que "a sociedade é pedófila", como se um erro global (fictício, no caso) justificasse o outro. Em março de 2009, D. Grings foi notícia no mundo inteiro por ter dado uma entrevista à revista Press & Advertising, na qual disse que houve muito mais vítimas fatais entre os católicos e ciganos na Segunda Guerra Mundial do que os judeus, “mas isso não aparece porque os judeus têm a propaganda do mundo”, como se boa parte dos católicos mortos durante a guerra não fosse de soldados nazistas que serviam aos ideais genocidas de Hitler. Talvez o falastrão prelado católico alimente demais não só o seu ego, mas sobretudo sua veia autoritária e se julgue acima do bem e do mal, achando que sua cátedra episcopal permite que ele dispare juízos definitivos e pronuncie qualquer bobagem sem que seja questionado por isso (no que não difere muito de alguns "pastores evangélicos", diga-se de passagem). Como já ensina o ditado popular, "em boca fechada não entra mosquito". Que Deus dê a D. Dadeus o dom do silêncio, com todas as virtudes que o seguem. De qualquer maneira, muitas águas turvas ainda vão rolar debaixo dessa ponte e encher o Guaíba de lágrimas e ranger de dentes, mas resta a esperança de que tanto o Poder Judiciário como a Igreja Católica saiam dessa crise mais humildes e mais sábios para lidar com as grandes questões da sociedade brasileira. Quem viver, verá!
"a sociedade é pedófila", como se um erro global (fictício, no caso)
ResponderExcluirO problema da pedofilia e abuso de menores só veio à tona nos últimos tempos porque o assunto é usado para atacar a Igreja Católica, caso contrário ele continuaria completamente ignorado pela mídia,
e voltará a ser ignorado quando a Igreja concluir o processo para aumentar a proteção dos menores no ambiente da Igreja, como a lei canônica que obriga o bispo comunicar imediatamente às autoridades seculares sobre qualquer evidência de agressão contra menores por parte de padres, religiosos ou qualquer um no ambiente da Igreja.
Segundo o estudo de Philip Jenkins, professor de Justiça Criminal, colunista da Christianity Today, e não católico, os casos de abuso relacionados com a Igreja Católica envolvem apenas 0,3% do clero num período pesquisado de 30 anos. É um número ínfimo se comparado com outros grupos de profissionais, como professores por exemplo.
Segundo a ONG 1in6, Inc, 1in6.org , UM em cada SEIS meninos sofre abuso sexual nos Estados Unidos da América, geralmente pelo próprio pai, que na maioria das vezes é branco e protestante, ainda segundo a ONG que mantém o site stopbaptistpredators.org , são milhares de casos de pastores que cometem abusos contra menores, não só batistas mas também presbiterianos como pode ser visto no site da presbiteriana PCUSA http://gamc.pcusa.org/ministries/ici/ , também existem casos envolvendo rabinos, no entanto a mídia fecha os olhos para esses casos, a impressão geral é que pedofilia é um problema exclusivamente da Igreja Católica, quando na verdade é justamente o grupo com menos casos.
Quando esse assunto não puder mais ser usado contra a Igreja Católica, então ele será novamente enterrado, que Deus tenha piedade dessas crianças.
Obrigado pelo seu comentário, Alexandre!
ResponderExcluirAqui no blog eu tenho a preocupação de dar notícias sobre pedofilia que são as que têm maior repercussão, e não as limito apenas aos católicos. Se você clicar na tag "pedofilia", verá que a maioria dos temas envolve católicos, mas a maioria delas não envolvem um fato particular denunciado (como no caso dos padres de Arapiraca, por exemplo), mas críticas internas e externas da Igreja Católica. Também procuro mostrar que há denúncias contra evangélicos, protestantes, e inclusive há uma denúncia contra um rabino judeu muito conhecido em Israel, que foi acusado de pedofilia. Um dos casos publicados no blog envolve um padre católico e um bispo anglicano, por exemplo.
Então, sei que é impossível balancear o noticiário sobre isso, mas eu tento na medida do possível, evitando publicar notícias que são apenas especulativas ou sensacionalistas, mas reconhecendo que é difícil estabelecer o limite entre uma e outra coisa.
Continuo achando, entretanto, que a justificativa de que "a sociedade é pedófila", embora seja até interessante explorá-la do ponto de vista filosófico-hedonista, é muito fraca para fugir da exploração de menores que existe em todas as religiões.
Paz e Bem!