Sempre que uma descoberta é feita na área da arqueologia bíblica, todo cuidado é pouco. Geralmente estas descobertas podem ser obras de gananciosos falsários ou de pessoas que desejam a todo custo (mesmo às custas da mentira), provar que sua fé é verdadeira.
É dentro deste contexto que a mera menção da descoberta de um novo manuscrito de Marcos causa ceticismo. Isto de fato é bastante natural. Porém, dadas as circunstâncias, há uma grande possibilidade desta descoberta ser realmente verdadeira. Como devemos reagir a esta notícia?
Primeiramente, para definirmos nosso posicionamento com relação à notícia, devemos expor como ela foi dada. O anúncio deste manuscrito foi feito em um debate entre Bart Ehrman e Daniel B. Wallace. Este já é a terceira vez que um debate entre os dois acontece. Todos devem conhecer Bart Ehrman por livros como "O que Jesus Disse? O que Jesus Não Disse? Quem mudou a Bíblia e por quê" ou "Evangelhos Perdidos: As Batalhas pela Escritura e os Cristianismos que não chegamos a conhecer", que procuram demonstrar que não podemos ter certeza qual era o texto original das Escrituras (já fizemos uma pequena crítica de Ehrman aqui no blog). Por outro lado, Daniel B. Wallace é o autor da gramática intermediária de Grego Koiné mais usada nos seminários norteamericanos, e que recentemente foi traduzida para o português, Gramática Grega - Uma sintaxe exegética do Novo Testamento, além de dirigir o Center for que Study of New Testament Manuscripts, que se dedica a digitalizar e tornar disponível a todos os estudiosos os vários manuscritos bíblicos.
Neste debate, a pergunta direcionada a Bart Ehrman foi: Onde estão todos os primeiros manuscritos? Ele então teria respondido que nós não temos qualquer manuscrito antigo. Foi dentro deste contexto que Daniel B. Wallace respondeu que nós temos sim manuscritos bem antigos. Nós temos pelo menos 18 manuscritos do segundo século (seis dos quais foram recentemente descobertos), e um manuscrito do primeiro século. Pelas palavras de Daniel B. Wallace, este manuscrito foi recentemente descoberto, e se for realmente um manuscrito do primeiro século, teremos uma descoberta fantástica.
Os detalhes deste novo manuscrito estão sendo mantidos em segredo até o lançamento de um livro sobre ele, que será publicado pela E. J. Brill. Por este motivo, não temos ainda nada de concreto sobre esta nova descoberta. O que temos sobre o manuscrito é uma declaração do próprio Wallace, que diz em seu texto sobre o debate que Ehrman teria questionado a validade do manuscrito. Sobre isto ele teria respondido que um renomado paleógrafo havia estudado o manuscrito e definido esta data.
Temos apenas uma declaração sobre o manuscrito, e mesmo assim já há discussão sobre ela. Por exemplo, Timothy Michael Law em seu blog diz:
De qualquer forma a existência de um manuscrito é quase irrelevante a menos que ele dê alguma luz à história do texto, e pelo que se sabe, é incrivelmente difícil, se não impossível, definir uma data no primeiro século com base paleográfica: a linha entre o primeiro e o segundo século é muito embaçada.
O próprio Daniel B. Wallace já havia comentado sobre este ceticismo relacionado ao método paleográfico, ao discutir a datação do papiro P52 que traz o evangelho de João em um texto que está traduzido no site e-cristianismo:
A declaração do autor que “paleografia não é o mais efetivo método para datar textos” parece implicar que um melhor método está disponível para nós para este fragmento. Este não é o caso, como Nongbri admite. De fato, ele usa a paleografia para tentar desacreditar a datação-padrão deste fragmento! Mas ele não parece querer reconhecer o mesmo que P52 traz muito para a discussão a respeito da data de João. Sua conclusão que o papiro “não pode ser usado como evidência” para a data de João é certamente exagerada. Que a vasta maioria dos manuscritos do Novo Testamento é datada estritamente com bases paleográficas, e que há vários outros papiros de João tão antigos quanto o segundo século, sugere que o ceticismo de Nongbri é sem sentido.
Se a vasta maioria de manuscritos do Novo Testamento é datada com bases paleográficas, por que este manuscrito não poderia ser datado assim? Não é o uso ou não do método que deveria produzir questionamentos sobre a veracidade da data, mas as condições do manuscrito, evidências, etc... Precisamos ter acesso às informações relacionadas ao manuscrito para termos condições ou não de questionar esta data.
Temos portanto somente as palavras de D. Wallace. Há um bom tempo acompanho suas obras e sei como ele trabalha. Em sua gramática - por exemplo - ele gosta sempre de expor as explicações possíveis que um texto pode ter, para depois com base em evidências, apontar para a a melhor explicação. Quando há textos que ele acha difícil a decisão por uma interpretação, ele diz claramente. O mesmo pode ser observado nos artigos que ele escreve, que podem ser encontrados tanto no site e-cristianismo como em outros sites pela internet. Ele mesmo rejeita a identificação de 7Q5 como um pedaço do texto de Marcos com base em evidências. Ele demonstra ser bem cuidadoso em suas afirmações e sempre busca bases fáticas para elas. Assim, baseando-se na forma que ele trabalha, há uma boa expectativa de que o que ele afirmou neste debate seja verdadeiro. Pelo menos podemos acreditar que ele deve ter boas bases para concluir que o manuscrito encontrado seja realmente do primeiro século.
Como devemos reagir a esta notícia então? Obviamente, temos que esperar pelo relatório sobre o manuscrito. A forma de trabalho de Daniel Wallace só nos dá grandes expectativas, mas isto por si só não deve servir para nós de argumento. Somos obrigados a aguardar. Ansiosamente...
Tomara que seja confirmado para provar a tais grupos como os muçulmanos por exemplo de que a bíblia não sofreu alterações.
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